GRALHAS
Por Joaquim Letria
Há, pelo menos, quatro categorias de gralhas.
As primeiras são as que se subtraem ao bom critério de quem lê, mas que carecem de importância ainda que molestem a vista. As segundas são as que trocam uma palavra por outra, correcta em si mesma, que são as mais perigosas porque podem induzir a desorientações e a alguns erros. As terceiras são aquelas gralhas que inventam uma palavra e são capazes de confundir filólogos e outros estudiosos da língua. Por fim, as quartas, que são aquelas que levam o ouvido a confundir duas noções diferentes, muito utilizadas nos meios audiovisuais e outros propagadores da cacofonia.
As primeiras são muito cordatas. Escrever, por exemplo, “choclate” em vez de chocolate, numa frase em que se refere o pequeno almoço com torradas, manteiga e geleia de laranja.
As segundas podem ser incómodas, uma vez que a leitura parece correcta. Por exemplo, falar do open do pénis da Austrália em vez do desporto da Navratilova e do Federer.
Das terceiras dei uma vez notícia delas quando uma aluna minha leu um texto meu e me perguntou o meu propósito quando ali escrevi que “comer uma maca por dia mantém o médico à distância”. Só nesse momento conheci que tinha uma gralha no texto e pude então esclarecer que onde o tipógrafo por lapso escrevera “maca” se devia ler maçã, o que fazia sentido e correspondia à correcta tradução do provérbio inglês que nos ensina que uma “apple a day keeps the doctor away”.
Quanto à quarta categoria de gralhas, todos nós temos experiência constante e surge com frequência nos actos solenes e nos rodapés dos noticiários dos audiovisuais e podem não ser mais do que transcrições fonéticas da errónea conjunção copulativa “e” com o adjectivo “responsável”, tomando-se por certo o insulto que atinge o “experiente e responsável político” ao lhe chamar “experiente irresponsável”. Mas não faz mal. Desde que temos este acordo ortográfico já não se sabe bem o que se escreve, o que se lê e o que está certo. Por isso, há que manter sempre um sorriso e não lhes dar grande importância.
Publicado no Minho Digital
Etiquetas: JL
1 Comments:
Antes do acordo ortográfico, escrevia-se “experiente e responsável político”.
Depois do acordo ortográfico, escreve-se “experiente e responsável político”.
Qual é a diferença? Não há diferença nenhuma. O acordo ortográfico tem as costas muito largas!
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