16.3.05

PMB - 1


Cheguei a ser um entusiasta tão grande do Porta-moedas Multibanco que imaginei até uma rábula em que os árbitros o usavam para a função de moeda-ao-ar (*). Mas em breve a realidade portuguesa se iria impor:
*

Ligaduras e Cabeças Duras

Há alguns meses atrás parti um braço, e - como andava engessado - não podia guiar.

E foi assim que, durante bastante tempo, passei a fazer grandes e saudáveis caminhadas até ao emprego.

-ooOoo-

Ora, pelo caminho que eu seguia, havia (e há) algumas leitarias, muitos cafés e vários bancos.

E foram precisamente os empregados bancários quem começou a vulgarizar o uso do Porta-moedas Multibanco por esses lados.

Para mim era coisa que vinha mesmo a calhar pois, tendo eu um braço quase paralisado, era dramático quando tinha que andar a abrir e a fechar porta-moedas e a manipular notas e trocos para pagar a bica da manhã.

Pois foi num desses dias que entrei num café onde nunca tinha ido e dei o cartão para pagar a despesa.

O patrão - pois foi ele quem me atendeu - informou-me com ar agastado e maldisposto:

- Fica-me a dever. Não tenho a maquineta dessa coisa. Não tenho, nem quero ter!

Então, num silêncio embaraçado, procurei a custo bem no fundo dos bolsos e lá encontrei - mesmo à conta! - as moedas necessárias para lhe pagar.

Não desenvolvi a conversa, mas - à saída - ainda pude ouvir o homem comentar para o empregado:

- Ora se o gajo até tinha trocado, porque é que me veio com aquela porcaria?

E o outro, em contraponto:

- E mesmo que não tivesse trocado! A gente ainda sabe fazer trocos!

Escusado será dizer que nunca mais lá voltei, e foi até com algum gozo perverso que fui acompanhando o declínio do negócio do homem em proveito dos vizinhos.

Sim, porque o que o fazia definhar não era só o facto de não aceitar o PMB:

O que deu cabo dele foi a atitude que lhe estava subjacente, e que se reflectia em tudo: desde os empregados maldispostos até às cadeiras rachadas; desde as mesas sujas até ao telefone avariado; desde o WC sem sabão até às moscas omnipresentes...
E este caso - passe o palavrão - é paradigmático:

Simboliza bem a completa incapacidade que um certo tipo de empresários tem para se adaptar aos tempos que inexoravelmente vão mudando.

E nem falta, nesta história, o inconfessado pavor aos bits, às teclas, aos écrans, e ao dinheiro virtual!
De facto - como dizia o meu amigo Jeremias mesmo sem saber que eu andava de braço ao peito:
- Isto anda tudo ligado!
--
CMR - EXPRESSO - 10 Out 98
(*) Essa história, intitulada «Vivó (...)!», faz parte do e-book «Crónicas da Inforfobia», disponível em PDF gratuito no site www.jeremias.com.pt
O desenho de CMR que aqui se vê é de lá.

1 Comments:

Blogger Carlos Medina Ribeiro said...

Teste de Aviso Comentário
CMR

24 de março de 2005 às 10:22  

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