8.8.05

Depois de Sócrates, o quê?

J.L. Saldanha Sanches

O ENGENHEIRO José Sócrates começou o seu mandato com medidas impopulares e corajosas. Sabendo-se que os reformadores costumam ter aplausos tímidos de quem acha as reformas necessárias e críticas sonoras dos interesses atingidos, nem se pode queixar de falta de apoio. Surgiu, então, um largo leque de economistas (mais largo que o PS) a aplaudir as suas medidas e a justificá-las.

A OTA e o TGV alteraram tudo. A mesma coligação que tinha justificado o aumento do IVA e aplaudido os primeiros passos de Sócrates voltou a falar para condenar sem apelo nem agravo os novos investimentos públicos.
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(O texto integral, publicado com autorização do autor, está em «Comentário-1»)

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Blogger Carlos Medina Ribeiro said...

Depois de Sócrates, O quê?

O engenheiro José Sócrates começou o seu mandato com medidas impopulares e corajosas.
Sabendo-se que os reformadores costumam ter aplausos tímidos de quem acha as reformas necessárias e críticas sonoras dos interesses atingidos, nem se pode queixar de falta de apoio. Surgiu um largo leque de economistas (mais largo que o PS) a aplaudir as suas medidas e a justificá-las.

A OTA e o TGV alteraram tudo. A mesma coligação que tinha justificado o aumento do IVA e aplaudido os primeiros passos de Sócrates voltou a falar para condenar sem apelo nem agravo os novos investimentos públicos.
Percebe-se bem porquê: depois do Centro Cultural de Belém, da
Expo-98 e dos dez estádios estamos como estamos. E desta vez não estamos perante a falácia post hoc, ergo propter hoc.

É muito bom ter um Centro Cultural em Belém mas é apenas que já nem haja dinheiro para pagar a temporada de ópera do S. Carlos, A Expo-98 criou um belo espaço urbano mas não ajuda nada a equilibrar a balança de pagamentos. E a ideia que os dez estádios acabaram a recessão em 2004 é uma história da carochinha que só pode caber na cabeça do Dr. Silva Pereira. E já nem queremos falar das comissões e das derrapagens que caracterizam o investimento público em Portugal.
Só com uma fé ilimitada na intervenção do Estado na economia com aquela fé que remove montanhas e que conduz à paralisia cerebral se pode aplaudir o investimento público português. É preciso por exemplo acreditar que a Caixa Geral de Depósitos possa ser hoje outra coisa senão uma estância de repouso para políticos de vários quadrantes em trânsito para indemnizações e reformas de vário tipo.

Quando o pobre eleitor que olha para a televisão em férias se recorda que um investimento de milhões e milhões como Metro do Porto continua a ter à sua frente o Major Valentim “batatas” Loureiro começa a sentir-se mal ou é de repente acometido por uma variante lusa do neo-liberalismo selvagem. Tudo menos o investimento público!

E depois ainda faltam as tais reformas: em Outubro vamos ter todo o folclore das eleições autárquicas e a apresentação do Orçamento que tem de reduzir o défice. Sem mais espaço para habilidades contabilísticas e sob o olhar atento da Comissão Europeia.

Onde vão ser os cortes desta vez com o eng. Sócrates a esquecer as reformas e a falar de milhões?
E a recuar no regime de aposentação da função pública ou nos sistemas de saúde da PSP.
Nesta situação que Governo podermos ter?

O PS tem a maioria absoluta mas está a perder de dia para dia aquele mínimo de legitimação que lhe poderia permitir fazer as reformas a que não tem maneira de escapar. Vai encontrar em Outubro uma situação social degradada e um sector privado exangue e incapaz de continuar a sustentar o sector público com os seus direitos adquiridos e inviáveis.

Se não fosse o euro teríamos as divisas a acabar e em Portugal uma delegação do Fundo Monetário Internacional à espera que o Governo desvalorizasse o escudo e reduzisse os salários reais para reequilibrar a balanço de pagamentos. Com o euro que cria uma moeda que não pode ser desvalorizada esse papel cabe à comissão mas os problemas subjacentes são os mesmos.

Até desse ponto de vista (o regime monetário) a nossa situação é parecida com a da Argentina que tinha a sua moeda ligada ao dólar mas não conseguia controlar o défice do orçamento. E tinha também políticos tão prestigiados como os nossos.

Crise económica, crise política. Se a perda do Ministro das Finanças for apenas a primeira perda de um Ministro das Finanças e tivermos aquela tão sul-americana dança de cadeiras nas pastas económicas saberemos também que com ou sem maioria o governo está a prazo. Mas depois de Sócrates, o quê?

Um outro governo PS? Não se vê qual. Novas eleições e governo PSD? Sabe-se lá como reagiriam os eleitores e qual seria o nível de abstenção.

Seja como for as perspectivas são todas más. Que PSD poderia ser uma alternativa a este se o Governo deixar de conseguir governar?
Sintomas de que isso pode acontecer não faltam.

Quando se ouve falar em défice obsessão ou em défice prisão estamos perante o conhecido movimento de recusa da realidade. Quer dizer que começa a haver no Governo quem pense que isto não pode ser assim tão mau e tem de haver outras alternativas.

A Ota e o TGV são essa busca desesperada de alternativas. E uma mudança de rumo que pode ser o fim do Governo.

Se o fizer perder o único crédito que tinha – a coragem de tomar medidas difíceis – sem que desapareça a necessidade de as tomar como vai conseguir governar?
Adenda: a única coisa que está a correr bem a este governo é o aumento das cobranças fiscais e a convicção generalizada de que começa a haver algum perigo nas formas mais cruas de fraude fiscal. E ainda falta uma coisa: a melhor utilização dos sinais exteriores de riqueza em relação aos numerosos contribuintes que não declaram ou declaram valores insignificantes.

J.L. Saldanha Sanches
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«Expresso/Economia» de 6 Ago 05. A publicação neste blogue é feita com autorização do autor.

8 de agosto de 2005 às 18:02  

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