22.1.06

Os surdos-mudos cibernéticos

ALGUNS amigos meus queixam-se de pessoas que nunca lhes respondem aos e-mails.
Aqui fica, pois, um extracto de uma crónica sobre esse assunto, publicada na revista «VALOR» (*).

TODOS os dias tenho de me cruzar com pessoas que não dizem bom-dia nem boa-tarde.
Quero dizer: quando as cumprimento, não me respondem. Nem a mim nem a ninguém.
São uma espécie de zombies, que, no entanto, até falam, pois se precisam de alguma coisa lá aparecem eles, cheios de sorrisos.

Mas o mundo é mesmo assim, e temos de aturar todas as idiossincrasias.

Ora esta atitude também tem a sua expressão no ciberespaço: são os que não respondem aos e-mails:

Perguntei ao Climático - com indicação de urgência - se sabia a nova morada da minha Repartição de Finanças. Recebeu a mensagem, sabia a resposta... mas não respondeu!

Soube que a Ana Lógica estava a precisar imenso de uma minuta para uma procuração. Arranjei-lha e fiz-lha chegar, através do ciberespaço. Resolveu o seu problema... mas até hoje não foi capaz de mo dizer!

Preveni o Carunchoso de que a casa dele ia ser inundada pelas cheias do Tejo. Precaveu-se, pôs a mobília a bom recato... mas nem disse água-vai!

Acontece que, tendo eu bastantes biólogos na família, aprendi a distinguir algumas espécies destas. É que, além dos simplesmente mal-educados, há ainda os ciberzombies, os inforfóbicos e os infor-trôpegos.

Ora atente-se nesta pequena história verdadeira:

- Então?! Não viu a encomenda que lhe fiz por e-mail na semana passada?! - pergunto eu, pelo telefone, a um fornecedor.

- Sim, sim, vi. Porquê? - Nota-se alguma insegurança no homem...

- Porque não me respondeu! - Argumento eu, convencido de que uso uma lógica imparável.

Mas um bom infor-trôpego tem sempre boas respostas:

- Bem, o problema é que não sei como é que se faz isso...

- Então você não vê no monitor um ícone que diz reply?! - (Não desarmo!)

- Reply, diz você? Não... Ora deixa cá ver... ora deixa cá ver... Temos: Abrir, Fechar, Reenviar, Responder...
***
Há dias estive a reler uma história que se passou comigo e com o meu amigo Oliveira (**).

Vinha ela a propósito de um velho recorte de jornal em que se dava a entender que até já o John Lennon teria usado o e-mail nos tempos do «Let it Be», o que se calhar explicava porque é que ele escreveu também o «No Reply».
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(*) Foi a última de 58 publicadas nessa revista com as aventuras de «Salvador, o Consultor». Podem ser lidas em www.janelanaweb.com/humormedina
(**) Está em www.centroatl.pt/medina/34modernices.html