13.9.06

Bife no novo Império? Não, obrigado (*)

COMO co-autor da petição pela manutenção do "bife à Império", e tendo regressado de férias, quis ver com os meus próprios olhos se se confirmava tudo quanto me diziam acerca da reabertura do Café Império, pois "obras" costumam significar, em Lisba, "vandalismo". E, se à primeira vista se fica bem impressionado com o que se vê: o "hall" de entrada está mais bonito, o mobiliário é melhor e a disposição também, poucos segundos depois se conclui ser afinal sol de pouca dura, confirmando-se as piores suspeitas. "Lettering" desnecessariamente estilizado, paredes tingidas a "bordeaux" e pejadas de actores do passado (coitados), cadeiras de costas e assentos ovais, forrados a azulão; ementas co menús-degustação, com expressões brasileiras e erros de português.
Lá no alto, múltiplos televisores debitando decibéis e, lá no fundo, no sítio do antigo "self-service", qual buraco de poço dos infernos, o pior de tudo: um "cabaré da coxa", composto de "plateau" negro como breu, coroado por "écran" gigante, ligado em rede aos demais televisores; bombardeado por néons" dos mais variados projectores, e girando como num "dancing days" de outro sítio que não aquele. Imperceptíveis devido à escuridão quase total do salão, escondem-se os painéis de azulejos classificados, e as magníficas esculturas dependuradas da parede principal, por detrás do "écran" gigante.
Dos lados, fizeram-se umas cercas em jeito de camarotes, com as mesmas cadeiras, destino: bodas. Tremendo dilema o que se abate sobre os nossos empresários, quando se tem dinheiro mas não se tem gosto! A nova gerência do Café Império está completamente equivocada: o Café Império nunca foi um café de "glamour" ("gleimur", como agora se diz), mas sim um café genuinamente popular, local de peregrinação dos clientes do cinema que lhe dá nome, do bairro e, acima de tudo, por causa do bife.
Tudo aquilo que ali está hoje nada é, porque quer ser tudo. Tudo isto nos faz pensar se afinal vale a pena gastar-se tempo e paciência com petições, discussões, artigos, votações, recomendações e embargos ... por um bife que, com muita pena minha, me recusarei a comer naquelas condições, que podem ser melhores do ponto de vista sanitário, mas que são execráveis do ponto de vista estético e do respeito pela memória e genuinidade do local.
Fica no ar o pensamento se não seria melhor termos deixado o café encomendar a sua alma ao criador...
(*) Texto de Paulo Ferrero publicado hoje no «PÚBLICO» (na secção «Local-Lisboa») e aqui transcrito com sua autorização

2 Comments:

Anonymous Anónimo said...

É evidente o "des-gosto" de Paulo Ferrero e, pior ainda, o seu desânimo, tanto quanto ao caso em apreço como quanto ao sentido das petições.

Lembro-me do que minha mãe me dizia: toda a moeda tem 2 faces.

E isto porque:
1. agora que tenho lido as queixas dos moradores do Parque das Nações quanto à confusão de trânsito e ao ruído, particularmente aos fins-de-semana, devido à localização do Casino de Lisboa;
2. continua sem solução a degradação do Parque Mayer (uma zona com poucos residentes) e afinal seria porventura melhor ter-se ali localizado o casino dando maior animação (e captação de receitas) dada a maior afluência de turistas nesta zona da cidade.

13 de setembro de 2006 às 16:06  
Blogger mfc said...

Tinha lá ido, em pequeno, de certeza. Fui recentemente e pensei. Ora aqui está uma tentativa muito mal conseguida de imitação.

13 de setembro de 2006 às 16:29  

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