24.6.07

COMETI UM ATENTADO CONTRA A HONRA DE DOIS GATUNOS

Por Ferreira Fernandes
UM CARRO ABANDONADO numa auto-estrada. Dois motociclistas param, um tira o capacete, rebenta com um vidro, retira alguma coisa de dentro e arrancam, os dois. Como classificá-los, aos motociclistas? Classificá-los, digo, da maneira mais simples: bons ou maus?
Pois é relativo. Anteontem, li as notícias do carro da ETA com explosivos, na A-49 espanhola a caminho do Algarve, abandonado porque o condutor fora alertado de que havia uma operação stop. O condutor é recolhido por um cúmplice e fogem. Pouco depois (dizem as notícias), aparecem dois motociclistas e acontece a cena acima contada. Nas notícias, os motociclistas eram apresentados como tipos da ETA que tinham vindo recolher alguma coisa importante. Anteontem, se me tivessem perguntado "como classificá-los, aos motociclistas?", eu teria respondido: "Maus."
Tenho de me penitenciar. Rapazes das motas, sei que fugiram em direcção a Sevilha e quem me dera estar aí para vos pagar uns pavías de pescado ou tão-só um copo de amontillado. Vocês são bons rapazes e eu, em pensamentos, insultei-vos. Gostaria de me passear com vocês pelo casco viejo de Sevilha, dizendo a quem nos cruzasse: "Estes meus amigos são simples gatunos. Gente boa!"
Tudo é relativo. Notícias de ontem, mudaram completamente a minha opinião sobre os dois motociclistas. Segundo a polícia espanhola, os dois motociclistas eram gatunos que passavam pela auto-estrada, viram um carro parado, assaltaram e roubaram. Gente comum, como eu. Eu não parto vidros de carros estacionados nem roubo mas no essencial sou como aqueles gatunos. O mundo está dividido em duas partes: os da ETA (e os que estão com ela), os canalhas, de um lado; do outro, os outros.
O meu coração aperta-se-me só de pensar que com a pancada do capacete no vidro do carro juntava-se o tal nitrato de amónio e o alumínio, abanavam-se os detonadores e ia tudo pelos ares... Por favor, especialistas, não me escrevam a dizer que era impossível, que o amonal não explode assim, com pancadas de capacete. Em assunto que meta a ETA não preciso de explicações. Sou contra.
E há outra coisa. Estou envergonhado pelo dia inteiro em que andei a insultar os dois rapazes pensando-os da ETA. Foi aquele "pouco depois" (ver acima) que me levou ao engano. Na verdade, foi duas horas depois de o carro ter sido abandonado que apareceram os motociclistas. É verdade que a polícia encontrou um computador no carro, deixado na precipitação da fuga dos terroristas, e estes podiam ter voltado para o recuperar. Mas voltar duas horas depois revelava coragem. Os dois motociclistas não podiam, pois, ser da ETA. Perdão, rapazes.
«DN» de 24 de Junho de 2007 - [PH]

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1 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Que pacóvia esta crónica! Brincar enfastiadamente com a ETA? Hombre... Vê-se mesmo que és de Angola!

25 de junho de 2007 às 00:32  

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