3.5.08

O dilúvio ‘up to date’

Por Antunes Ferreira

QUANDO JEOVÁ COMUNICOU A NOÉ que ia castigar a terra, com aviso prévio, através de um dilúvio que ficaria na memória dos tempos, simultaneamente ordenou-lhe que construísse uma arca bué grande e nela metesse um casal de todos os animais existentes, de forma a que a normalidade reprodutiva se pudesse reatar depois da cheia universal. E, claro, no mesmo sentido, embarcaria a família dele, Noé.
Um Deus, qualquer ele que seja, adora dar ordens e, por vezes, uns quantos conselhos. Aos que o adoram, naturalmente. Por que bulas haveria o patriarca de se safar de tal situação? Não tinha a mínima hipótese. Porém, quem era este senhor que, segundo as Escrituras, viveu 950 anos?
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Noé ou Noá (em hebraico significava "descanso, alívio, conforto") é o nome do herói bíblico que "recebeu ordens de Deus para a construção de uma arca, para salvar a Criação - do Dilúvio". De acordo com o Pentateuco, ou seja o conjunto dos cinco primeiros livros do tradicional Velho Testamento escritos por Moisés, Noé era filho de Lameque, que era filho de Matusalém, que era filho de Enoque, que era filho de Jarede, que era filho de Malalel, que era filho de Cainan ou Quenã, que era filho de Enos, que era filho de Sete, que era filho de Adão, que era filho de Deus. Safa! Isto não é erudição: é Wikipédia.
É então a Bíblia que regista que Deus decidiu eliminar a população da Terra através desse dilúvio universal. Pessoal mal comportado, tinha, no entender do Senhor, de receber o que merecia. Ora toma! Porém, resolveu poupar a vida de Noé e de sua família. O nosso homem era um justo e, de acordo com o Géneses, 6:8 ganhou graça aos olhos do Senhor. Resumindo: safar-se-ia. Safou-se.
Ora bem, a arca flutuou durante 40 dias, performance excelente para um construtor que nem possuía estaleiros nem era profissional, tratando-se, portanto, de biscate de ocasião. Passados esses 40 dias, quando a chuva cessou e a água começou a descer, Noé soltou uma
pomba, que lhe trouxe uma folha de oliveira, indicando que a Terra já estava seca. A arca teria ficado encalhada nos Montes Ararat (Urartu), na Arménia. Ao que dizem.
Os heróis, como os restantes humanos, têm sempre os seus altos e baixos. A vida de Noé após o dilúvio, porém, é curiosamente marcada e enxovalhada pelo alcoolismo. Em certa altura, embebedara-se com o vinho produzido de sua própria videira, de tal modo que foram dar com ele despido até ao pescoço na sua tenda.
O seu filho
encontrou-o nestes preparos, e foi dizer aos que estavam fora. Os outros dois descendentes, ao saberem disso, entraram na tenda, de costas, para cobrirem Noé sem o ver nu. Consequência: quando recuperou a consciência, o pai amaldiçoou o seu filho Cã e o seu neto Canaã, e abençoou os outros, Sem e Jafé. Mai nada.
Ainda de acordo com o texto bíblico, Noé terá vivido 950 anos. Já andava pelos 500 quando gerou Sem, Cã e Jafé. Aos 600 anos enfrentou o dilúvio e ainda viveu mais três séculos e meio, o que significa que poderia ter falecido nos dias de
Abraão, já na décima geração dos seus descendentes. Coisa complicada, difícil de entender. Mesmo tratando-se da Bíblia… E não consta que por tais alturas já houvesse as célebres cápsulas de alho Rogoff.
Consta que, durante essa quarentena molhadíssima, a arca se terá tornado num verdadeiro pandemónio, com animais enganados por outros e outros por mais outros. Terá sido, até, um verdadeiro adultério non stop. O texto sagrado não regista esta versão. Também era melhor que o fizesse. Jeová não gostaria mesmo nada e, a posteriori, o planeta nunca seria repovoado. Se o Senhor soubesse o que vai por aqui hoje, talvez se possa dizer que outro galo cantaria. Assim, é o que temos.
Sem, por conseguinte, a garantia suficiente para demonstrar a sustentabilidade desta estória, resta-nos a esperança de que, ainda que não seja verdadeira, é muito bem achada. Os italianos afirmam, convictos que si non e vero, e bene trovato. Não estamos, assim, orgulhosamente sós em tais andanças.
A que vem então este episódio aquoso/bíblico? Aqui, há que fazer uma advertência: o que se segue é da exclusiva responsabilidade do escriba, façam o favor de não misturar Moisés ou qualquer outra personagem dos Testamentos - nele. Mas, nesta altura do texto, não pode o escriba deixar de meter a sua colherada, de outra forma nada justificaria o tema, muito menos a glosa.
Ao saber através das queixas dos cornudos o que se estava a passar nas suas barbas e no interior da famigerada arca, Noé fez reunir os casais todos no tombadilho. Aguardava-se, com perplexidade q.b. e até alguma apreensão o que diria o comandante, habitualmente parco de palavras, um tanto ensimesmado e introspectivo, sem grandes dotes oratórios. Nem pequenos, adite-se. Foi curta a expressão, porém incisiva e directa: Que pensam vocês que isto é? Entreolharam-se os ditos irracionais, mais ou menos pecaminosos, mais ou menos licenciosos. E Noé: se isto fosse transmudado para o ano 2008 que há-de vir, a pergunta seria outra. Vocês pensam que isto é o PSD?
NOTA (CMR) imagem obtida [aqui]

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1 Comments:

Blogger Enigma said...

Falta a legenda da imagem:"Há sempre um filho da p***".

3 de maio de 2008 às 13:07  

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