6.7.08

Como tantos outros alimentos

Por Nuno Brederode Santos
COMO TANTOS OUTROS ALIMENTOS, a nossa espécie frita de fora para dentro. Daí que a fase estival aguda não seja a do sovaco transpirado, com cada qual, no seu planeta de ar condicionado e cerveja bem gelada em riste, a dedicar o olhar comatoso ao dedo grande do pé. Não. Essa é a de Julho, quando à nossa contemplação se oferecem os mundos maravilhosos das festas privadas em público, dos ricaços fora do prazo e da família que nos abrem os seus barcos de aluguer e das vaporosas meninas que eles sobraçam e que dão as suas primeiras entrevistas intimistas. A fase aguda é a da fritura dos neurónios, quando uns pares de estalos entre bêbados merecem capa de jornal e as televisões nos galvanizam com grandes predadores alienígenas que destroem colheitas e dizimam rebanhos. Esta fase costuma vir com o mês de Agosto, arrastar-se por Setembro dentro e tomar conta de nós nos intervalos de grandes incêndios, pequenos e médios fogos e, em desespero de causa, perigosas acendalhas. Só que, neste nosso ano de todas as pressas, veio tudo trocado. Já tivemos o leão da Maia. Não foi mau, mas soube a pouco: dois dias depois da cuidada e científica observação da primeira peugada (a tal que justamente denunciava o grande felino), o bicho explodiu em prosa, virou cão e levou guia de marcha urgente para o mais severo anonimato. E tivemos o crime de Verão, aquele que é movido por algo de intermédio entre o dolo e a negligência e que devia situar-se na categoria (inovadora) do crime de mau feitio. Veja-se o velho pastor, em figurino de cowboy, a regougar coisas, talvez malsãs mas mais certamente imprudentes, sobre a magistrada que o julgou. Já só faltam os noticiários com quarenta minutos de chamas que ameaçam o repórter pelas costas e as entrevistas brejeiras com gigolos algarvios - e o Verão está feito. É só deixar passar o tempo: coisa que o tempo faz por puro gozo, sem nos reclamar empenho ou esforço. Recolhamos, pois, a pálpebra pesada e concentremo-nos de novo no dedo grande do pé.
(...)
Texto integral [aqui]
«DN» de 6 de Julho de 2008

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1 Comments:

Blogger Nids said...

o DN é um jornal asqueroso: foi fachista, comunista, etc, e agora é socratista. Patético!

6 de julho de 2008 às 12:24  

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