24.7.08

A pena de morte é um furúnculo

Por C. Barroco Esperança
A PENA DE MORTE é uma barbárie que repugna ao humanismo e um acto de vingança que envergonha os Estados e os cidadãos. É natural que tenha vindo a ser erradicada dos países civilizados, sobretudo daqueles onde são mais fundas as marcas do Iluminismo e melhor defendidos pela Constituição os direitos, liberdades e garantias.
Se a rusticidade da violência é já, em si, uma enormidade que afronta a civilização e a decência, há motivos que juntam, à vingança e crueldade, a demência.
No Irão acabam de ser condenados à morte por lapidação, uma pena do especial agrado de Maomé, oito mulheres e um homem acusados de adultério, crimes que resultam sobretudo da violência doméstica e onde os condenados carecem de instrução básica para perceberem o crime de que são acusados.
As teocracias são contrárias à democracia e não se espera contemplação do Profeta ou de quem promulga as suas divinas leis. São irrelevantes as circunstâncias do crime, ou a confusão obscena entre crime e pecado, para o direito canónico – arremedo de Código Penal, de sabor medievo, dos países sob tutela clerical.
Em Portugal, Camilo e Ana Plácido estiveram presos, ele por ter copulado com mulher casada e ela por adultério, pena exclusiva de mulher. O homem só era punível quando apanhado em flagrante delito «sós e nus na mesma cama» ou por existência de carta ou documento escrito. Foi uma carta que perdeu Camilo. O escritor cumpriu mais de um ano de prisão preventiva e Ana Plácida um pouco mais. Terá pesado a ousadia de retirar do Convento da Conceição, em Braga, a mulher que devia dedicar-se à contemplação mística e à oração em vez de dar-se a relaxações eróticas.
Camilo e Ana Plácido foram presos em Portugal mas já decorreu século e meio. No Irão ainda hoje vigora o crime, com efeitos muito mais arrasadores. Em Portugal resta, como resquício teocrático e vergonha dos legisladores, o crime de blasfémia, punível com prisão, preterido pela jurisprudência perante um bem maior – a liberdade de expressão.
No Irão dos aiatolas a polícia e os tribunais são um mero instrumento do clero que arrepia o mundo civilizado e envergonha qualquer tradição ou cultura.
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NOTA (CMR): esta crónica, juntamente com outras do mesmo autor, está também no blogue Ponte Europa

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