Regateio
Por João Paulo Guerra
O que se passa há mais de um ano com a eleição do Provedor de Justiça seria uma vergonha, se ainda houvesse vergonha na cara desta espécie de democracia.
OS PARTIDOS QUE SE APOSSARAM da democracia e do poder em Portugal andam a regatear o nome do Provedor, e eventuais contrapartidas para a votação, e nunca mais se entendem. Nascimento Rodrigues, o Provedor em exercício, está sequestrado pelo "centrão" há mais de um ano, porque a proposta do PS para a substituição é inamovível, o PSD não vota no candidato do PS que, por sinal, foi fundador do PPD e pai da Constituição, e também o PCP quis meter a colherada, ao que parece procurando compensações para votar PS.
A figura do Provedor de Justiça foi criada consensualmente com a Constituição da República. Mas foi-se percebendo que cada partido esperava do Provedor um papel meramente decorativo, a enfeitar a lapela da democracia. O pior é que em geral o Provedor, defendendo a Justiça, o Estado de Direito e os Direitos dos Cidadãos, entrou em conflito frequente com o poder.
O regateio do nome a votar para preencher o cargo de Provedor avilta a democracia e desacredita a função e quem a venha a exercer. Nem a figura institucional do Provedor de Justiça, nem mesmo o nome do proposto dr. Jorge Miranda, mereciam esta licitação e arrematação públicas do preço da sua eleição. Mas isso não pesa quando no outro prato da balança dos partidos está a partilha do bolo do Estado e a conquista de mais uma trincheira. E assim, um cargo que deve ser exercido com independência fica à partida manchado por uma querela por cadeirões do poder. Isto passa-se, sem pudor, numa situação que fica exposta às claras. Calcule-se o que se passará com os arranjos no escuro.
«DE» de 3 de Junho de 2009
Etiquetas: autor convidado, JPG
2 Comments:
Vale sempre a pena recordar uma velha foto... [aqui]
Este escândalo da não-substituição do Provedor de Justiça já aqui foi abordado por "contribuidores" do blogue, pelo que, em princípio, não se afixaria hoje um texto que acaba por ser redundante.
Mas acho que merece que se abra uma excepção, não só pela gravidade do assunto, como pelo que nele está subjacente - e que JPG resume na última frase:
Calcule-se o que se passará com os arranjos no escuro.
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