16.2.11

Récita

Por João Paulo Guerra

NÃO É POR se apresentarem muitas moções que haverá alguma censura ao Governo. Antes pelo contrário. Mas a verdade é que o PCP já tinha anunciado, o Bloco anunciou, o CDS promete e o PSD não exclui. Ou seja: na actual conjuntura, em matéria de moções de censura ao Governo vigora o princípio "cada um, com a sua". Para o Governo não pode ser melhor: quatro moções de censura rejeitadas é mais fácil, mais barato e dá mais milhões de votos que uma moção de confiança aprovada.

O que verdadeiramente acontece é que a política em Portugal se transformou num acto de comédia, ou talvez mais farsa, quiçá farsola. E porque não mesmo uma zombaria ou pantomima? Para o dicionário tanto faz: impostura ou fingimento são sinónimos comuns a cada um dos géneros teatrais. Ou talvez, neste caso, "teatétricos" neologismo para designar o chamado teatro tétrico, ou anti-teatro. Seja como for, faz-se com comparsas e figurantes que, em vez de dialogarem, à antiga, praticam sobreposições de monólogos.

O ‘script' é o faz-de-conta. Faz-de-conta que eu quero, tu queres, ele quer derrubar o governo. Sendo certo que nós não queremos, vós não quereis e eles não querem sujeitar-se ao desgaste de governar agora. Primeiro, porque quem lá está faz muito bem o seu papel no sentido de transformar o país em terra queimada de direitos sociais e baldio de pobreza, sendo certo e sabido que muitos pobres são necessários para fazer cada rico. Segundo, porque todos querem ser governo mas não agora, obrigado.

E então assiste-se a este entrecho de pacotilha: no "hemicirco", quando se ligam as câmaras, todos bramam contra o Governo. Para as antecâmaras rezam para que tem-te, não caias. Ou, como diria Mestre Gil Vicente: Todo o Mundo é oposição e Ninguém quer governar. Uma récita para lamentar.
«DE» de 16 Fev 11

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