24.3.12

Uma Gralha na Varanda - Tiroliroliro

Por Antunes Ferreira

PALAVRA de honra que nem eu queria acreditar, mas acontecera. Conto, sem necessidade de tradução. Se vos custar a acreditar bem podem encolher os ombros; mas, aconteceu e posso assegurar que o espanto foi meu e, obviamente, da Raquel. Esta terra tem preciosidades que nunca poderia imaginar, não fora o caso de as ter visto e ouvido.

O caso nem sequer podia ter sido assinado por Mr. Erle Stanley Garneder, porque não tem mistério, assassínio, muito menos julgamento empolgante, para não falar de Miss Della Street e de Mr. Paul Drake. Desculpem se o escriba se meteu por caminhos ínvios, não pode nem deve deixar-se levar pela imaginação e meter ao barulho romances policiais. Donde, deixe-se o cronista de frioleiras e, por conseguinte, volte-se ao ocorrido.

Tínhamos ido a Pangim para a minha cara-metade fazer umas compras, encontrar umas pulseiras semana (um conjunto de sete aros mas todos separados) destinadas a ofertas, apreçar uns tecidos para o mesmíssimo efeito e mais umas quantas diligências concomitantes. Para tal contava – e contou – com a Dr.ª Ângela, médica, prestimosa esposa do Dr. José Gracias Menezes, igualmente clínico, companheira da Raquel nos sete anos do então Liceu Nacional Afonso de Albuquerque. Ao casal já me referira em textos que escrevera há cinco e há dois anos. Um encanto.

Enquanto as senhoras saíram para shopar (neologismo que acabo de criar, ou seja fazer shopping, estão a ver, obviamente sem ter em conta o Acordo Ortográfico), o Zico e eu ficámos a conversar sobre o nosso Sporting. Perdoe-se o autor, ele crê que já o terá dito, mas o motivo da quiçá repetição é justíssimo: o ilustre hipocrático é um leão de madrugadas a ver os jogos dos nossos que a RTPI transmite. Magnífico cidadão, portanto.

Perguntarão os que ainda fazem o obséquio de seguir estas linhas desconchavadas onde raio é que entra o tiroliroliro do título. Já lá vamos. Tem o repórter de seguir o caminho que entende ser o mais completo possível, e lá se chegará, em tempo. As Donas foram-se atrasando, que nestas coisas de mercas respeitar o decurso do tempo é condição sine qua non. Por isso a charla virou-se para o novo Governo local chefiado pelo Shri Parrikar e para a necessidade de limpar o território. Todas as moedas têm duas faces. Este caso da sanidade pública está a transformar Goa numa lixeira por toda a parte.

Já o escriba neste blogue contou de três coisas menos boas por estas bandas, mas repete-as: a corrupção, as muitas minas ilegais e o lixo. Em paralelo com a enorme diferença entre os muito ricos e os muitos pobres. Há outras, esta terra não é o Paraíso, dizem que já o foi; mas, comparado com o que temos pelo triste e desanimado Portugal que espera pelo casal Ferreira, é ainda uma maravilha. As novas que nos chegam de Lisboa são assustadoras. E PPC até diz que tem sido «o lombo» dos tugas a pagar, mas há que aguentar. Um exemplo do é preciso sofrer cá na terra para se ganhar o céu. Sina danada.

O autor já voltou a descarrilar. Tem de meter os travões a fundo, porque desta maneira desgarrada não conseguirá terminar o escrito. Voltaram as compradoras, acabou a conversa, já era tarde para cá, rondavam as oito da noite. Vá de tomar um táxi para se voltar a Mapusa. Os 16 quilómetros custam… 350 rupias. Recorde-se que um euro anda à volta das 65. O condutor é um goês bem-disposto, o que, de resto é facílimo de encontrar. Chama-se Ajay. Hindu.

Foi uma viagem muito agradável. O homem falava inglês e fazia comentários com muita graça e oportunos, de resposta pronta na língua. Desde as considerações sobre a política e o descrédito da esmagadora maioria dos que a exercem, até às pontes. Porquê? Porque para ele as do «tempo dos portugueses» são estreitas, mas não caem. Agora, se duram dez anos é uma festa…

Voltam as gargalhadas e o escriba pergunta-lhe se sabe alguma coisa de Português. Respondeu: olá, como está? E de seguida, bom dia, boa noite, muito obrigado, Cristiano Ronaldo, Mourinho. O pai era secretário das Finanças, falava a nossa língua, a mãe, não, mas ele, já depois da libertação, muito miúdo aprendera com o progenitor umas palavras e umas frases. E, de repente, disse que se lembrava de uma cantiga: lá em cima… E o cronista respondeu: está o tiroliroliro. Até a música o Ajay sabia. Acabámos em coro com um sonoro: cá em baixo está o tiroliroló, juntaram-se os dois à esquina, a tocar a concertina e a dançar o solidó.

E ele tirou as mãos do volante para fingir que tocava o acordeão. No meio do trânsito louco, nem foi motivo de cagaço, tão-só, de galhofa com imensos decibéis. E foi a Raquel que, do banco de trás, recomendou atenção. A que o dueto não ligou peva.

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2 Comments:

Blogger Maria said...

AF
Gostei. O tiroliroliro é canção que conheço há muito. Nunca a percebi, mas cantei-a muitas vezes, tal como o teu amigo motorista.
Então aí as pontes feitas por nós não caem? Pena, que cá não seja assim. Cai tudo, até as pontes. Só "ele" está de pedra e cal.
Por cá, cada vez pior. Até o desgraçado do Pessoa, comeu. Um homem pacífico, nada dado a políticas, sempre sossegado na mesa, sem se meter com ninguém e leva. A sorte, é ter a cabeça rija.
Houve quem ficasse com ela a sangrar. Deixa-me cantar o tirolilo, antes que comece a cantar a Portuguesa, naquela parte que diz: "São como beijos de mãe".
Gaita! Estou mesmo lixada com isto.
Eu quero ir para a Índia. Ao menos as pontes são seguras.
Maria

24 de março de 2012 às 21:56  
Blogger José Batista said...

Caro Antunes Ferreira,

Isto por cá está um "tirolirolitro".
Que só não é igual ao litro porque nos sai do lombo.
E vai continuar a sair. Enquanto houver lombo.

24 de março de 2012 às 23:00  

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