31.10.12

Este homem é perigoso

Por Baptista-Bastos
PEDRO Passos Coelho gosta de dizer coisas. Já se sabe. Poucas vezes, porém, as diz acertadas. Há, neste homem envelhecido, acabrunhado e notoriamente consumido, a revelação subjacente de que se envolveu num labirinto cujo término ignora. As políticas que desenvolve, com desvios, evasivas, recuos, imperfeições, criam desesperos, angústias e perplexidades. Completamente desorientado com o rumo dos acontecimentos que não domina, descobriu, nas jornadas parlamentares do PSD-CDS, o verbo "refundar", e originou não só o pasmo nas suas hostes como a perturbação nas de António José Seguro. 
Marcelo Rebelo de Sousa explicou a natureza do erro e a dimensão do tolejo político. Passos, incisivo e fatal, declarou que a "refundação" do protocolo de ajustamento com a troika nada tinha a ver com "renegociação"; é outra coisa. Mas não explicou a natureza das suas elucubrações. Os participantes nas jornadas saíram em silêncio, entreolhando-se, porém, com a farpa da dúvida cravada no ânimo. "Ele parece lelé da cuca", disse alguém. 
Estamos entregues às insuficiências de um homem que baralha tudo e que presume enganar os outros com atropelos semânticos. O nosso cansaço advém de já termos compreendido que a inépcia de Passos Coelho não é uma escolha entre contradições, sim um processo mental complicado, pela obstinação no erro e pela recusa em o admitir. 
Alguém de recta consciência e no perfeito domínio das faculdades elementares pode apoiar e sustentar o representante de uma ideologia que, sem pudor, já se não esconde nem sequer se dissimula? A sociedade, transversalmente, critica, execra e até expele, com insultos nunca vistos e ouvidos, este Executivo; e o dr. Cavaco (também objecto de escárnio e maldizer) cala-se, admitindo a redução da democracia ao funcionamento processual. O descalabro associa-se à pouca vergonha. 
O poder já não dispõe de suporte legítimo porque espezinhou as delegações sociais, políticas e morais que lhe foram atribuídas. Ainda não há muito se dizia que um "governo celerado" era o que desdenhava da própria qualidade das pertenças mútuas. Os conflitos de valores inultrapassáveis, que dilaceram a nação e nos transformam em títeres de uma experiência maléfica, irão resultar em que confrontos imprevisíveis? A responsabilidade do caos só pode ser atribuída ao dr. Cavaco. Já lhe dissemos que não queremos esta gentalha. Então? Por muitíssimo menos, Jorge Sampaio escorraçou Pedro Santana Lopes. 
A "refundação" do protocolo de ajustamento não é uma falácia: corresponde a uma manobra sórdida, que repõe a questão do poder e da liberdade, entre a pluralidade das escolhas e os ínvios atalhos da "inevitabilidade." Atentemos nas evidências: Pedro Passos Coelho não é aquele sujeito afável que se apresentou aos costumes. É perigoso, e cada vez mais, quando se lhe avizinham as tormentas.
"DN" de 31 Out 12

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2 Comments:

Blogger José Batista said...

Este comentário foi removido pelo autor.

2 de novembro de 2012 às 22:14  
Blogger José Batista said...

Sobre o governo, respigo do Jornal de Letras nº 1097, de 17 a 30 de outubro de 2012, de uma entrevista a Mário de Carvalho:
"Acho que este é um governo de pardalada. E não quero ser insultuosos, mas estas pessoas são muito agarotatas e sobretudo não têm a noção do bem comum, do interesse público. Não faz parte dos seus quadros mentais. Não quer dizer que Passos Coelho seja um mau rapaz, mas o percurso desta gente é de quem vive de expedientes e está atrelado a interesses. Gostava de ser governado por homens livres. Nunca vi as coisas tão degradadas".[página 8]

Enfim, ao jeito ou à força, estamos entregues a canalha. Nada inocente...

2 de novembro de 2012 às 22:16  

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