Mas o bacalhau, Senhor?!...
Por Ferreira Fernandes
FOI ADIADA a decisão da União Europeia, mas vai ser inevitável. O bacalhau será branquinho e embebido em polifosfatos, antes dos seus exportadores (os noruegueses) o venderem. Resumindo: adeus a Gomes de Sá, Zé do Pipo e outros heróis nacionais... Exagero, mas não muito. Pôr aquela coisa no bacalhau não será obrigatório, só uma possibilidade. O problema é que será "a" possibilidade. Os exportadores vão preferir exportar um bacalhau com maior humidade, garantida pelos polifosfatos, e portanto com mais peso e maior lucro. E por cá a indústria de transformação precisará de mais tempo de secagem, o que irá encarecer as postas. Apesar de ser assunto do mais íntimo e patriótico, porque nos toca o estômago, não nos podemos insurgir e vencer como fazem os franceses com o foie gras. É que o bacalhau, tão português a jusante, no prato, não o é a montante, no anzol. Abatemos a frota bacalhoeira sem pensarmos que ela nos garantia a soberania do palato, com os seus navios almirantes, por vezes veleiros, e as suas fragatas chamadas dóris. Nem soubemos garantir a nossa presença no mundo: o Instituto Camões como vai fornecer bacalhau seco aos restaurantes do Rio e de Luanda?
Como o califa Boabdil foi obrigado a ouvir de sua mãe quando fugia de Granada, "chora como uma mulher, o que não soubeste defender como um homem", só nos resta fazer uma manifestação desesperada: "O bacalhau quer alho, não quer polifosfatos!"
«DN» de 1 Fev 13 Etiquetas: autor convidado, F.F
2 Comments:
Não podemos fazer nada? Nem protestar?
Não podemos é deixar de fazer alguma coisa. E devíamos começar já a fazer alguma coisa.
Então o Durão Barroso não pode ouvir os conterrâneos? E mexer alguma palhinha, já não digo em defesa de Portugal, que não merece que o defendam, uma vez que gosta que lhe limpem os sapatos em cima e ainda se queixem da má qualidade do capacho...
Mas sim em defesa da saúde, da higiene e da decência...
Já agora, para se ver que há quem faça alguma coisa:
Para que não julguem que se trata de obsessão: em Janeiro de 2011, o canal norueguês NRK transmitiu um documentário denunciando a utilização de polifosfatos e outros aditivos no bacalhau capturado naquele país, bem como na Islândia. Em Fevereiro, a eurodeputada dinamarquesa Christel Schaldemose menciona, numa pergunta à Comissão, a “proibição geral da utilização de polifosfatos como aditivo”, sobretudo tendo em conta o facto de a maior parte desse peixe ser exportado para os países do sul («fazendo com que pareça mais fresco, e por outro lado para aumentar o seu peso, o que implica que o consumidor pague mais do que devia por aquilo que compra»). Ela pergunta: “Pode a Comissão garantir que não é perigoso aditivar o peixe com polifosfatos?” A 31 de Março, a Comissão garante que não está autorizada a utilização de polifosfatos para branquear o bacalhau, e que «it is not clearly demonstrated that the polyphosphates are sufficiently removed and that their use has no effect on the final food as consumed by the consumer. Furthermore, the soaking process, which would remove the substance, is not done by the producer but by another company or by the final consumer.» Essa autorização vai acabar por ser concedida. Não que não existissem alertas. Nem mais alertas.
Escrito pela mão de Francisco José Viegas, aqui: http://origemdasespecies.blogs.sapo.pt/
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