Subir escadarias em brandos costumes
Por Ferreira Fernandes
A semana acabou, nas escadarias de São Bento, na correria em vaivém das forças da ordem. Estas, embora manifestando-se, cumpriam a lei. A da gravidade, pelo menos: o que sobe, desce. Ou, como diria Isaac Newton: a força de atração entre dois corpos - no caso, o Corpo de Intervenção e o corpo de polícias manifestantes - depende das suas massas. Sendo estas, as massas, poucas (aliás, era a razão de todos estarem ali), a atração, a força gravítica, seria branda e bem portuguesa. Razão tinham os dois leões no sopé da escadaria. Apesar de simbolizarem sentinelas, eles viram subir os manifestantes e nem se mexeram na pedra, só bocejaram, certos de que aqueles que subiam, esganiçando-se - "Invasão! Invasão!" -, haveriam de descer. De facto, se lá no alto, na frontaria parlamentar, há duas estátuas, a da Justiça e a da Força, o que justificava o movimento ascendente, também há outras duas, a Prudência e a Temperança, que remeteram os nossos polícias para a base.
Por cá sobe-se e desce-se em caracol, mesmo nas escadarias monumentais, somos terra de Manoel de Oliveira, o dos movimentos pacatos. Não somos terra russa de Serge Eisenstein, aquele que vendo uma escadaria logo sonha com couraçados Potemkin e revoluções e põe um carrinho de bebé a rolar por degraus...
Para tudo ser bem nosso, o ministro podia ceder e fazer uma promessa aos sindicatos de polícia: diga-lhes que vai mandar instalar umas escadas rolantes em São Bento.
«DN» de 24 Nov 13 Etiquetas: autor convidado, F.F
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