Limpa, suja ou encardida?
Por Baptista-Bastos
Uma
pessoa de recta consciência não pode deixar de se indignar, com nojo e
abominação, ante o cerimonial em que o inexcedível Passos Coelho
anunciou a "saída limpa" da nossa subalternidade. A comunicação social e
os comentadores estipendiados usaram, como na Idade Média, tubas e
atabales de regozijo perante tão fausto acontecimento. E o
primeiro-ministro, useiro e vezeiro em manter com a verdade uma relação
conflituosa, disse a um país perplexo a seguinte bojarda: "A liberdade
de decisão foi reconquistada."
A simulação da realidade brada aos
céus. Portugal continuará, por mais algumas décadas, sob vigilância
apertada, e a gulodice daqueles indicados nossos "credores" não se
apaziguará. Os portugueses não sabem a quem devem dinheiro; mas,
parafraseando a frase imortal daquele banqueiro impante, agressivo e
tolo, lá que devem, devem.
Continuamos, pois, imersos na miséria,
na fome e no desespero sem esperança. Um pequeno grupo de burocratas
ignorantes prosseguirá na tarefa infame de dar ordens a quem quer que
esteja no Governo. Nada sabe da nossa história, da nossa cultura, das
idiossincrasias que, apesar de tudo, nos diferenciam. Um deles fez uma
declaração comovente: iria voltar a Portugal, como turista, por causa
dos pastéis de nata de Belém! A rede foi estendida com sagaz
competência, e as estruturas do capitalismo tornaram-se cada vez mais
vorazes, porque não confrontadas com um antagonismo competente e sólido.
O "socialismo democrático" é uma desgraça por toda a Europa; há
governos que o são sem estar avalizados pelo voto, como acontece em
Itália. A indigência moral, política e ideológica da "esquerda moderada"
abriu caminho à avalancha da extrema-direita, cuja soberba começa a ser
assustadora.
Os partidários desta política, caso de Passos
Coelho e dos que tais, presos na insanidade de um suicídio colectivo, já
não constituem uma decepção permanente porque tornaram "natural" a
aberração histórica sob a qual vivemos. Manifesta--se uma ofensiva
ampliada contra o ideal democrático, e a sub-reptícia proposta de
despersonalização ética, substituída pela ordem que inculca a ideia da
desnecessidade de governos eleitos. O "Estado mínimo" e a entrega da
representatividade política e social aos privados, tão do agrado da
catequese neoliberal, não encontra resposta nos partidos "socialistas",
os mais próximos de uma confrontação urgente e fundamental.
Hollande
é um desgraçado sem tino, que colocou nas funções de primeiro-ministro
um direitinha contumaz. Nós, por cá, tudo mal ou embezerrado. Os
reforços de Jorge Coelho e José Sócrates, assomados para socorrer
António José Seguro da flexibilidade demonstrada, não chegam para "dar a
volta" a um partido que perdeu há muito as distintivas de "esquerda."
«DN» de 7 Mai 14 Etiquetas: BB
1 Comments:
Não chegam para dar a volta?
Eles, aqueles, são bons para dar voltas!
O primeiro é, de resto, amigo do Relvas. Ele o disse.
E o segundo foi quem nos empurrou para as voltas que agora damos, nas mãos de magarefes diligentes.
Tudo gente competente, bem formada e devidamente preparada.
Uns esfolam, outros assomam. E nós? Dá vontade de fugir.
Mas para onde?
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