9.9.22

Corrida sem parar

Por Joaquim Letria

Antigamente, quando as pessoas eram criteriosas em vez de serem só espertas, as coisas eram medidas de maneira diferente.

Hoje, tudo se mede pelo padrão do êxito.

O melhor programa é o que tem maior audiência, as pessoas são melhores à medida dos likes e do número de seguidores. A pessoa a deitar abaixo é aquela que atinge quotas elevadas de popularidade e o que importa, seja no que for, é chegar primeiro, e não interessa donde e é irrelevante como. Há muito tempo que a sociedade classificou de corridas de ratos esta atitude hoje glorificada e que com desempregados a espreitarem a cada esquina persiste sem alterações nem mudanças de sentimentos.

Dantes, as coisas mediam-se de maneira diferente. As pessoas compreendiam que o livro de maior sucesso não era necessariamente o melhor, o programa com mais audiência era invariavelmente o mais detestável, entendiam que o futebol, mau grado despertando grandes paixões e arrastando multidões pelo mundo era um jogo muito interessante embora o xadrez não deixar de ser um jogo inteligente e também apaixonante. Também não era preciso explicar que a opinião dum comentador, por muito popular e profissional que este fosse, não era mais acertada do que a dum especialista em matérias levianamente abordadas.

Tudo isto é uma questão de medida. Estabeleceu-se o êxito como metro-padrão, pois então se tratava da tradução mais correcta para dinheiro, partindo-se do princípio de que o melhor filme, melhor livro, melhor programa, melhor personalidade seriam sempre aqueles que mais lucros gerassem.

Não vale a pena ser nostálgico, recordar o antigamente, ter saudades do antes, pensar que dantes era melhor. Era só diferente. Por isso, nesta corrida para que muitos se deixam arrastar, depressa se descobre que não podem mais parar. Se abrandam, pisam-nos, se perguntam para onde vão ninguém lhes sabe responder. Só uma coisa se lhes afigura certa – a pressa de todos é muito grande, a vontade de perceber o labirinto que percorrem muito pouca ou nenhuma. Que alguém tenha pena deles quando não tiverem outro remédio senão parar sem ser por vontade própria nem esclarecimento pessoal.

Publicado no Minho Digital 

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