MENEZES: LOGO SE VERÁ
Por Baptista-Bastos
CADA UM DE NÓS é a causa de um momento. Estou em crer que Luís Filipe Menezes aproveitou o seu momento para se transformar na causa de si próprio. O novo presidente do PSD quer reunificar o partido (uma impossibilidade), escrever outra Constituição (um disparate), extinguir o Tribunal Constitucional (outro), remover injustiças sociais e alargar a flexibilização (uma contradição), enfrentar José Sócrates e reduzir a subnitrato o PS (uma temeridade). Menezes manifestou outras intenções, diversas e dispersas, no magno discurso de Torres Vedras. Infere-se do texto que partilha o famoso princípio de Napoleão: "On s'engage et puis on voit."
A escolha dos conselheiros (chamemos-lhes assim) obedece à estratégia de "alteração de herança", que pretende extirpar os resquícios do "cavaquismo", ainda presentes em nostálgicas almas cândidas. Entre aqueles, mais do que um está muito bem informado, lê, é culto, utiliza a cortesia como substância congénita, e compreende o antagonismo político entre o possível e o desejável. A ironia ácida de um desses está consignada numa metáfora devastadora: "Entre mim e o dr. Cavaco separa-nos a distância de 20 quilómetros de livros."
Menezes quis fazer uma "frente ampla" entre as "sensibilidades" do PSD. Irritou toda a gente. O que, rigorosamente, não é nada mau. Porém, a verdade, nestes casos, é sempre elusiva. A hostilidade de certa direita e a perplexidade de certa esquerda talvez procedam dessa irritação. Até hoje, as consequências políticas da ascensão de Luís Filipe Menezes a presidente do PSD não foram analisadas. O labéu de "populista" é escasso para definir o contorno ideológico do homem. "Populista" porque se dirige às "bases"? Porque faz promessas avantajadas e de duvidoso cumprimento? Porque o seu discurso repreende o desperdício social, e é beligerante e apologético? Qual dos dirigentes no activo, ou desactivado, está impune destes pecados?
Agora, aquela certa direita e aquela certa esquerda têm de se acautelar. E de reflectir sobre o discurso de Menezes, descrente de teorias infalíveis, desconfiado dos condestáveis. Pelos precedentes, o provável é que do interior do partido surjam os grandes ardis e as mais hábeis armadilhas. Se limparmos a superfície "ideológica" do PSD repararemos que o conteúdo resulta de um fenómeno de operações de empréstimo, mordomias e trocas de favores, muito comum, desde o século XIX, nos partidos da "regeneração". Sá Carneiro criou um problema, cuja solução não impendia, apenas, dele. Menezes, como os anteriores presidentes, vai dirigir um implacável concentrado de interesses, e precisa de mais do que uma proposta moral para superar os escolhos.
Mas o debate vai sair da letargia e animar. O homem vai dar guerra.
«DN» de 17 de Outubro de 2007
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