Alta tensão
Por Carlos Fiolhais
Sob o título “37 milhões para estudar alta tensão” noticia o último “Expresso” na primeira página:
Sob o título “37 milhões para estudar alta tensão” noticia o último “Expresso” na primeira página:
“Portugal vai ter um programa de investigação pioneiro sobre os efeitos das linhas de alta tensão nas pessoas. A iniciativa financiada pela REN executada pela Faculdade de Farmácia de Lisboa, importará em 37 milhões de euros e estender-se-á por dez anos”.
HÁ MUITAS COISAS ESTRANHAS nestas poucas linhas. Tantas coisas estranhas quantas as linhas. Em primeiro lugar a palavra “pioneiro”: revela um desconhecimento da enorme literatura científica sobre o assunto que desde há muitos anos tem sido publicada internacionalmente (não há nada de especial com as linhas de alta tensão portuguesas pois são iguais às dos outros países!). Em segundo lugar o financiamento pela REN: a Rede Eléctrica Nacional é parte interessada e sabe muito bem os resultados que quer. Em terceiro lugar, a Faculdade de Farmácia: ela não é o sítio certo para fazer um estudo desse tipo, pois a questão dos efeitos biológicos das radiações é mais do âmbito da da biologia, da medicina, da física e da engenharia electrotécnica.
Uma notícia deste tipo aproveita-se da falta de cultura científica nacional e não é por acaso que surge numa altura em que há populações muito sensíveis para a questão da saúde das pessoas que vivem perto de linhas de alta tensão. Também não será por acaso que aparece um financiamento deste género numa altura em que as universidades estão subfinanciadas. Vale tudo?
Etiquetas: CF
8 Comments:
POis é, este nosso país vale tudo e o Zé povinho que se amanhe!
Claro que vale tudo, caro professor. Mas para os menos avisados, Fac. de Farmácia?! Valha-nos S. Francisco, santo da minha devoção.
O Carlos Fiolhais invoca a falta de cultura científica nacional. De facto, não há muita, mas não me parece que o principal problema resida aí. As pessoas não podem saber tudo acerca de tudo e a questão dos alegados riscos das linhas de AT passa pelo conhecimento de matérias muito específicas, que ultrapassam as “simples” equações do electromagnetismo e entram pelo campo da interacção dos campos electromagnéticos com a fisiologia.
O problema é mais aquilo que faz funcionar os bancos e os seguros: CONFIANÇA.
Quem não sabe, confia em quem sabe. Mas, infelizmente, os responsáveis políticos não dão provas de merecer confiança. Os académicos e os especialistas, muitos deles enredados com o poder político, outros fechados nas suas conchas, também não.
Embora possam suspeitar de que os alarmistas estarão a vender-lhes banha da cobra, as populações preferem acreditar naqueles que chamam a atenção para uma eventual ameaça. É a aplicação do princípio da precaução.
O grau de crendice das populações é também uma medida da falta de credibilidade das “elites” de um país.
O Jorge Oliveira "tocou na ferida":
Sendo a electricidade mortal em certos casos e, mais a mais, não se vendo, ou se confia em quem sabe, ou então está tudo estragado.
O problema é que o "luso-povão", à força de ser enganado por todo o bicho-careta, já não acredita em ninguém nem em nada do que lhe dizem - mesmo quando o que está em causa (como aqui) são instalações eléctricas iguais às existentes em todo o mundo!
Uma senhora foi dizer em tribunal que o estudo da EDP era "matreiro" (sic), e outra argumentou que, às vezes, via "umas luzes azuis a percorrer os fios".
recomenda
WHO's guidance
For high-level short-term exposures to EMF, adverse health effects have been scientifically established (ICNIRP, 2003). International exposure guidelines designed to protect workers and the public from these effects should be adopted by policy makers. EMF protection programs should include exposure measurements from sources where exposures might be expected to exceed limit values.
Regarding long-term effects, given the weakness of the evidence for a link between exposure to ELF magnetic fields and childhood leukaemia, the benefits of exposure reduction on health are unclear. In view of this situation, the following recommendations are given:
* Government and industry should monitor science and promote research programmes to further reduce the uncertainty of the scientific evidence on the health effects of ELF field exposure. Through the ELF risk assessment process, gaps in knowledge have been identified and these form the basis of a new research agenda.
* Member States are encouraged to establish effective and open communication programmes with all stakeholders to enable informed decision-making. These may include improving coordination and consultation among industry, local government, and citizens in the planning process for ELF EMF-emitting facilities.
* When constructing new facilities and designing new equipment, including appliances, low-cost ways of reducing exposures may be explored. Appropriate exposure reduction measures will vary from one country to another. However, policies based on the adoption of arbitrary low exposure limits are not warranted.
Pelos vistos, recomenda-se precaução face às incertezas existentes
Sobre oa telemóveis, a coisa parece mais clara:
«Considering the very low exposure levels and research results collected to date, there is no convincing scientific evidence that the weak RF signals from base stations and wireless networks cause adverse health effects.»
http://www.who.int/mediacentre/factsheets/fs304/en/index.html
Correcto.
Para esse efeito, fazem-se medições dos campos electro-magnéticos, cujos valores devem ser menores do que os considerados perigosos.
O pior é quando, apesar disso, as populações dizem:
«Pois é, mas quem vai medir é a própria interessada nos resultados (a REN), por isso não confiamos nas conclusões!»
Quando chegamos aí, pouco há a fazer...
É verdade, daí a importância deste aspecto:
«Member States are encouraged to establish effective and open communication programmes with all stakeholders to enable informed decision-making.»
é como diz Jorge Oliveira: "O grau de crendice das populações é também uma medida da falta de credibilidade das “elites” de um país."
Essas "elites" deste país estão pouco habituadas a explicarem-se perante o povo.
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