O velho e o novo
Por Antunes Ferreira
ALQUEBRADO, DESMIOLADO, abandonado, o velho desgraçado tentou mover a cadeira de rodas empurrando estas com as mãos vacilantes e anquilosadas. Em vão. As articulações carregadas de artrite piores estavam do que dobradiça enferrujada. Sem óleo que lhes valesse, encarquilhadas, pendentes, eram apêndices de estorvo e pouco mais. Chegavam para limpar o nariz e as beiças – sem lenço.
Conseguiu a muito custo puxar a manta esburacada até o meio do peito escanzelado, costelas marcadas, contáveis uma a uma. Pretendia leva-la até ao queixo, num intento desesperado de proteger o pescoço. Um frio infiltrava-se-lhe pelos pés, e com tantas agulhas se cozia, que, por certo, era o do fim. Que estava a chegar, insidioso, tiritando-o. É a morte, congeminou, e ele sem desejo nenhum dela. (...)
Texto integral [aqui]ALQUEBRADO, DESMIOLADO, abandonado, o velho desgraçado tentou mover a cadeira de rodas empurrando estas com as mãos vacilantes e anquilosadas. Em vão. As articulações carregadas de artrite piores estavam do que dobradiça enferrujada. Sem óleo que lhes valesse, encarquilhadas, pendentes, eram apêndices de estorvo e pouco mais. Chegavam para limpar o nariz e as beiças – sem lenço.
Conseguiu a muito custo puxar a manta esburacada até o meio do peito escanzelado, costelas marcadas, contáveis uma a uma. Pretendia leva-la até ao queixo, num intento desesperado de proteger o pescoço. Um frio infiltrava-se-lhe pelos pés, e com tantas agulhas se cozia, que, por certo, era o do fim. Que estava a chegar, insidioso, tiritando-o. É a morte, congeminou, e ele sem desejo nenhum dela. (...)
Etiquetas: AF
0 Comments:
Enviar um comentário
<< Home