22.11.11

Em Louvor dos Preconceitos

Por Maria Filomena Mónica

OS PRECONCEITOS têm uma reputação, negativa, que julgo injustificada. A realidade mostra que os nossos cérebros têm lá dentro uma espécie de disco, onde vamos armazenando informações cujos fundamentos tendemos depois a esquecer. Em vez de nos prejudicarem, estes pré-conceitos, note-se o hífen, facilitam-nos a vida. Reconhecer que os temos é bom, porque mesmo quem não o admite os alberga.

A lista dos meus é infindável. Não gosto de graffitis, de canções tirolesas, de call centers, de telemóveis, de astrólogos, de tatuagens, de música nos elevadores, de cachecóis futebolísticos e de nouvelle cuisine. Tenho outros, mas, se entro por este caminho, prevejo que receberei cartas a explicar-me que nem todos os alemães são nazis. Dito isto, reconheço que alguns, nomeadamente os que andam ligados à raça, são perigosos. Anteontem, ao cruzar no meu bairro um jovem de ar escandinavo, estive para atravessar a rua, por ter associado o seu aspecto a Anders Breivik.

Muitos foram os filósofos que, com razão, criticaram a teoria de Locke, o qual defendia que, à nascença, o cérebro humano era uma tabula rasa. Uma vez que as nossas mentes são, desde o início, habitadas por uma atitude genérica perante o mundo, a sua tese está errada, o que não quer dizer que estejamos ferreamente condicionados. À medida que crescemos, a nossa personalidade vai-se alterando, o que leva a que os nossos preconceitos também se transformem.

Ao contrário do que parece, uma vida sem preconceitos é perigosa. Veja-se o caso de Bazarov, o niilista de Pais e Filhos, de Turgueniev, o qual apenas acreditava na Ciência, desprezando as opiniões que nela se não baseassem. Imagine-se o que seria um mundo em que não pudéssemos enunciar juízos morais e estéticos, mas apenas científicos. Como toda a gente percebe, dizer que o David, de Miguel Ângelo, é belo tem um estatuto diferente da afirmação que declara ser a água uma substância formada por oxigénio e hidrogénio.

Claro que há preconceitos estúpidos, mas daí não se pode concluir que todos o sejam. O essencial é isolar os bons. É isso que tento praticar. Por vezes, basta-me saber de onde provêm certas afirmações para imediatamente me colocar do outro lado da barricada. Uma das razões porque gosto de ler os artigos do Prof. Boaventura de Sousa Santos é porque me libertam da tarefa de pensar. Quando vejo o seu nome no fim de um texto, sei que devo afirmar o contrário.
Dir-me-ão que é um preconceito. Começou, de facto, por o ser, mas já não o é, uma vez que acabo de ler o seu último livro, Portugal: Ensaio contra a Autoflagelação. Como se isto não bastasse, tomei conhecimento de que, a 7 de Outubro, proferiu a lição inaugural de uma cátedra, despudoradamente intitulada Boaventura de Sousa Santos em Ciências Sociais, criada pela Universidade de Coimbra. Segundo revelou o reitor, a instituição está em risco de encerrar por falta de verbas, pelo que espero que a novel cátedra esteja a ser financiada pelo Sociólogo-Mor do Reino.

«Expresso» de 12 Nov 11

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5 Comments:

Blogger SLGS said...

Doutora Filomena Mónica:
Em termos generalistas concordo com o seu escrito, mas quando leio: "Anteontem, ao cruzar no meu bairro um jovem de ar escandinavo, estive para atravessar a rua, por ter associado o seu aspecto a Anders Breivik." pelo preconceito que sobre si tenho formado, apetece-me dizer: mentirosa...

22 de novembro de 2011 às 16:55  
Blogger Nuno Trato said...

Os verdadeiros preconceitos da Madame são mais sobre as criadas.
Vêm do tempo em que os papás metiam no carro os meninos, a tralha, os animais domésticos e ... as criadas (sic) a caminho da Praia das Maças.

22 de novembro de 2011 às 22:46  
Blogger Luís Ferreira said...

Olavo de Carvalho também fala destas inteligências, a propósito de outros temas :-)

http://ilcao.cedilha.net/?p=2491

23 de novembro de 2011 às 20:14  
Blogger Carlos Medina Ribeiro said...

Resposta de MFM a Luís Ferreira:

«Agradeço o comentário de Luís Ferreira, acompanhado de um «you tube» de um brasileiro, Olavo de Carvalho, contra o Acordo Ortográfico. Eu já era contra o disparate. Depois de o ouvir, fiquei ainda mais contra, pelo que decidi escrever um artigo sobre o tema, apelando à desobediência civil, ou seja, que todos os docentes e alunos deste país se recusem a ensinar e usar a nova ortografia. Podemos ir para a prisão –ou será prizão? – mas se formos muitos vamos divertir-nos, Maria Filomena»

24 de novembro de 2011 às 12:08  
Blogger Táxi Pluvioso said...

Com a idade ficamos amargos e preconceituosos. É um problema hormonal.

25 de novembro de 2011 às 07:38  

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