Privatizar espiões é emagrecer Estado
O CERCO aperta-se. O Ministério Público já deve ter reparado que as
minhas crónicas estão cheias de "li no Público...", "como dizia Le
Monde..."
Os magistrados não são tolos, vão relacionar-me com o
escândalo do SIED e de Jorge Silva Carvalho. Este, depois de se demitir
de superespião e ter ido para a Ongoing, continuou a receber o clipping
dos serviços secretos e distribuía-os por privados.
Ora, apesar do nome
inocente, clipping não quer dizer entortar fios de arame para material
de escritório: esse serviço consiste em fornecer recortes de jornais. É
das aventuras mais perigosas de um espião português: contactar um
agente adormecido, que é como costumam estar os velhotes dos quiosques, e
depois de municiado de resmas de jornais, ir, rasando os muros, para a
sede. No gabinete sem janelas, o agente secreto recorta os jornais. Como
só há uma coleção (crise...), os segredos locais (por exemplo: "o gato
de Honório Novo chama-se Gaspar") vão para o SIS, segurança interna, e
os internacionais, para o SIED, segurança externa.
Aqui entra outra
coincidência que me incrimina: no meu jornal há quem me chame "grande
recórter" por andar a cortar jornais e a distribuir notícias... Ainda
vou acabar por ser o único incriminado no processo. Sim, porque o
ex-espião Silva Carvalho, acusado de pôr atuais espiões a trabalhar para
os privados, tem álibi: não é essa a moda? Se se fala de privatizar
cemitérios e prisões, por que não, espiões?
«DN» de 10 Mai 12 Etiquetas: autor convidado, F.F
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