Cristiano Ronaldo (1)
O HOMEM muda de penteado no intervalo dos jogos, e Gay Talese, o
jornalista cujos retratos de desportistas são os melhores que li, só usa
fatos, coletes e gravatas feitos de propósito para si.
O homem
irrita-se quando falha um golo, e estou a ver Gauguin a dar um pontapé
na caixa das tintas por causa de uma pincelada falhada.
O homem acha-se o
maior, e V. S. Naipaul também...
Cristiano Ronaldo tem sido acusado de
defeitos tão alheios ao que nos interessa dele como comprarmos um
automóvel porque a cor vai com as riscas do nosso pijama. Mais, um dos
seus defeitos irrelevantes revela uma qualidade invejável: ele zanga-se
mesmo, com autenticidade, quando não cumpre um remate.
Há dias, a bíblia
do capitalismo, o Wall Street Journal, contou as horas e declarou ser
Cristiano Ronaldo o desportista que mais trabalhava. Mas esse
profissionalismo podíamos já todos ter dado por ele, bastando vê-lo
furibundo por não ter sido perfeito - a cara zangada vem-lhe da mesma
vontade com que nadava piscinas e mais piscinas para conseguir o físico
que não tinha, precisava e conseguiu.
Há muitos grandes futebolistas a
quem só nos resta admirar porque eles foram dotados com talentos que não
temos. Cristiano Ronaldo, além disso, merece servir de lição. Muito
dele não é destino, é feito pela sua vontade e seu profissionalismo.
É
extraordinário que de Cristiano Ronaldo falemos de lantejoulas sem
interesse quando há tanto fato-macaco.
«DN» d e 25 Jun 12 Etiquetas: autor convidado, F.F
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