25.12.12

Presentes de Natal

Por Maria Filomena Mónica
NESTE NATAL, os presentes de luxo acabaram: decidi nada oferecer que excedesse os 5 euros. Entre os adultos, depois de termos reconhecido que a descoberta de qualquer coisa em lojas repletas de gente dava mais trabalho do que a alegria sentida por quem recebia o objecto, optámos por nada trocar. O meu filho não concordou, mas teve de aceitar o voto da maioria. Faltava convencer os netos. Telefonei-lhes, com pezinhos de lã, mas quando uma das netas me comunicou desejar um Micro Pig – um porquinho vivo, estilo bonsai, que se vende pela Net – decidi não auscultar as aspirações dos irmãos.
Em suma, filhos e netos vão ser corridos a livros baratos, como o ensaio de Mónica Leal da Silva, «A Crise, a Família e a Crise da Família» (da Relógio d´Água /FFMS, que custa 3.50 euros em versão brochada). O Natal é a festa da família, não é? É assim o momento para sobre ela reflectir. A autora, que vive nos EUA, capta a nossa atenção nas primeiras linhas: «Antes do politicamente correcto, a praça pública era um lugar mais boçal». A frase talvez alegre os representantes da direita e enfureça os de esquerda, mas nem uns nem outros têm razão, porque ela é uma livre pensadora, não no sentido jacobino associado a estes termos, mas no sentido, antigo, o de alguém que não se deixa encarcerar dentro de ortodoxias. Eis o que diz no final: «Este livro foi escrito em particular a pensar em todos os que, sem emprego, sem ordenado nem a satisfação de uma carreira e de um título, trabalham discretamente, mas com energia e generosidade, para as suas famílias e as dos outros».
Tal é o peso das ortodoxias que hoje é quase impossível abordar o tema da família sem gritos de todos os lados: a esquerda não gosta do assunto e a direita só é capaz de dele falar em termos idealistas. Apesar de louvar o Estado Social, a autora defende que o mesmo não pode servir de desculpa para esquecer quem, junto de nós, está a sofrer com a crise. Daí o seu ênfase na família: «Este texto é uma defesa da família como rede social insubstituível». Logo a seguir, relembra uma coisa que, por ser incómoda, tendemos a meter debaixo do tapete: «As famílias podem ser pesadas, não por precisarem de nós, mas porque têm uma capacidade única de nos magoar». 
Leal da Silva aborda ainda outros assuntos, como o papel dos homens no lar; o trabalho, o emprego e o prestígio social; as dificuldades da chamada geração sanduíche, composta por mulheres, entaladas entre pais que envelhecem e filhos que crescem; a relação entre a escola e a família; e o que se esconde sob o eufemismo «flexibilidade laboral». O facto de ser capaz de falar, num tom aparentemente leve, de obras académicas e de filmes de ficção, de jornais diários e de letras de canções, de poesia moderna e dos Proceedings of the National Academy of Sciences provém da sua louvável displicência em relação às modernas pretensões universitárias. 
«Expresso» de 22 Dez 12

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