28.5.20

A banalização do mal e o adormecimento das consciências

Por C. B. Esperança 

A jornalista Hannah Arendt acompanhou, em Israel, o julgamento de Adolfo Eichmann e, quer o carrasco nazi fosse ou não o homem comum que a jornalista viu nele, intuiu a tragédia da “banalidade do mal”, expressão que usou no livro que, a seguir, escreveu, “Eichmann em Jerusalém – Um relato sobre a banalidade do mal”, onde diagnostica a origem dos totalitarismos.
A expressão é hoje frequente, porque as consequências são devastadoras e repetitivas, e está longe de provocar a reflexão que devia. A democracia tem descurado a sua defesa, mesmo quando a Constituição a protege sem ambiguidades.
O advento de partidos neofascistas é hoje evidente, na Europa e no Mundo, e Portugal não foge à regra, apesar de a CRP os proibir.
O Tribunal Constitucional errou ao legalizar o ‘Partido Cidadania e Democracia Cristã (PPV/CDC)’, onde aparece a sigla referente a ‘Portugal pró-Vida’, permitindo o nome, por serem ilegais as referências confessionais. Fê-lo, aliás, contrariando a sua própria jurisprudência.
Já no caso do Chega é difícil dizer que errou. É fácil apresentar um programa aceitável constitucionalmente e ter uma prática delituosa, incompatível com a CRP, a decência e a salubridade política.
No primeiro caso foi uma decisão infeliz, mas sem riscos; no segundo foi uma decisão legítima, mas perigosa. Ser reacionário não é crime; ser fascista, é. A ideologia fascista, em si, é um mero anacronismo, mas a sua práxis é delituosa. O aparecimento de um partido que defende abertamente a subversão democrática, que promove o racismo e incita ao crime cai sob a alçada legal, mas sabemos como é frouxa a democracia a defender-se dos adversários. É, aliás, o único regime que os permite.
O partido nazi/fascista, que goza de amplas cumplicidades nos média, nas redes sociais e em nostálgicos da ditadura, vai-se infiltrando nas forças policiais, militares e sindicais, e normaliza o que, ainda há pouco, raros ousavam verbalizar. É o guarda-chuva aberto a marginais, terroristas ideológicos, membros de seitas e outros indivíduos de mau porte.
As semelhanças com o ambiente dos Anos Trinta do século passado causam perplexidade e calafrios. A publicidade concedida ao Chega e a displicência com que é tratado, como se fosse um partido democrático, amedrontam os que sofreram a ditadura.
Falar do mal é dar-lhe publicidade, mas ignorá-lo é deixá-lo à solta a envenenar os que esqueceram a mais longa ditadura europeia e suportaram 13 longos e dolorosos anos de guerra colonial.
A tragédia da pandemia não faz mais do que adensar receios de novos totalitarismos, como aconteceu com a gripe espanhola, há um século. E os totalitarismos podem ser de natureza antagónica.

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1 Comments:

Blogger José Meireles Graça said...

"A ideologia COMUNISTA, em si, é um mero anacronismo, mas a sua práxis PODERIA SER CONSIDERADA, POR EXTREMISTAS, COMO delituosa. O aparecimento de um partido que defende NOS SEUS TEXTOS PROGRAMÁTICOS abertamente a subversão democrática, que promove o ÓDIO AOS RICOS e incita À LUTA DE CLASSES NÃO cai sob a alçada legal, mas sabemos como é FORTE a democracia a defender-se dos adversários QUANDO RESPEITA O DIREITO À EXPRESSÃO LIVRE DA OPINIÃO". Tomei a liberdade de refazer a frase, para lhe conferir a razoabilidade que não tinha.

28 de maio de 2020 às 15:55  

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