ENTRE ESPERTO E ESPERTALHÃO
Por Rui Tavares
JÁ OUVI SÓCRATES DIZER vezes suficientes que não decidiu se convocará o referendo ao Tratado de Lisboa para dar a essa hipótese uma probabilidade mais alta do que o habitual. E também acho que é uma boa ideia.
Os contras, na perspectiva dos líderes europeus, toda a gente os conhece: se os políticos nacionais começam a brincar à democracia correm o risco de a ver funcionar. Cada referendo convocado, e neste momento só o da Irlanda é certo, é um convite a que se façam mais dois ou três. Que dirão os colegas de Sócrates se, depois de tantas mostras de pragmatismo, ele acabar por metê-los em apuros perante os seus eleitorados?
Internamente, porém, a coisa é pouco menos do que irresistível. Sócrates tem agora euro-crédito suficiente para arriscar um bocadinho. Lá mais para o fim do mandato cumpre-se uma promessa, revertendo o que se fez no começo ao aumentar os impostos. O “não” dificilmente ganharia. E para os adversários é uma chatice. O PSD não quer referendo e vai ter de remeter-se a desculpas mal amanhadas para não ter posição ou evitar fazer campanha atrás do PS. O CDS também não quer referendo porque acha uma maçada ter posição sobre o assunto. A direita anti-Tratado fica completamente abandonada, com efeitos previsíveis na oposição interna dos respectivos partidos.
À esquerda, a situação também não é assim tão melhor. É claro que se o BE exigir muito o referendo pode proclamar uma vitória importante se ele vier a ser convocado, mas a sua posição simultaneamente anti-Tratado e pró-Europa não vai ser fácil de explicar. Só o PCP, como sempre, se safa com uma relativa e fortuita tranquilidade: não e não.
Pode dizer-se que estas são as piores razões para se convocar um referendo. Pode dizer-se que é irresponsável colocar Cavaco perante o incómodo de assumir que não quer referendo nenhum. Simplesmente, cada qual sabe de si e os políticos também se fizeram para ser espertos.
Os contras, na perspectiva dos líderes europeus, toda a gente os conhece: se os políticos nacionais começam a brincar à democracia correm o risco de a ver funcionar. Cada referendo convocado, e neste momento só o da Irlanda é certo, é um convite a que se façam mais dois ou três. Que dirão os colegas de Sócrates se, depois de tantas mostras de pragmatismo, ele acabar por metê-los em apuros perante os seus eleitorados?
Internamente, porém, a coisa é pouco menos do que irresistível. Sócrates tem agora euro-crédito suficiente para arriscar um bocadinho. Lá mais para o fim do mandato cumpre-se uma promessa, revertendo o que se fez no começo ao aumentar os impostos. O “não” dificilmente ganharia. E para os adversários é uma chatice. O PSD não quer referendo e vai ter de remeter-se a desculpas mal amanhadas para não ter posição ou evitar fazer campanha atrás do PS. O CDS também não quer referendo porque acha uma maçada ter posição sobre o assunto. A direita anti-Tratado fica completamente abandonada, com efeitos previsíveis na oposição interna dos respectivos partidos.
À esquerda, a situação também não é assim tão melhor. É claro que se o BE exigir muito o referendo pode proclamar uma vitória importante se ele vier a ser convocado, mas a sua posição simultaneamente anti-Tratado e pró-Europa não vai ser fácil de explicar. Só o PCP, como sempre, se safa com uma relativa e fortuita tranquilidade: não e não.
Pode dizer-se que estas são as piores razões para se convocar um referendo. Pode dizer-se que é irresponsável colocar Cavaco perante o incómodo de assumir que não quer referendo nenhum. Simplesmente, cada qual sabe de si e os políticos também se fizeram para ser espertos.
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A NÓS, EM GERAL, ser-nos-ia feita a elementar justiça de termos informação, opinião e voto na matéria. Mas atenção: há duas maneiras de fazer o referendo. Uma é esperta; a outra é – como dizer? – espertalhona. Com muita pena minha, é como vejo a proposta de duas pessoas que admiro francamente. Vital Moreira e Ana Gomes têm vindo a sugerir que, perante um Tratado de Lisboa demasiado ocultista para se conseguir referendar, a solução alternativa seria votarem os portugueses sobre se querem ou não continuar na União Europeia. Sempre se perguntava qualquer coisita mais simples aos eleitores, infelizmente tão demasiado evidente que não deve haver muita gente interessada em ir votar. Se é só para decidirmos coisas sem risco de surpresas ou consequências de maior, mais vale referendar o regresso da monarquia ou as cores da bandeira.
Para mais, essa estratégia acabaria por prejudicar o principal interessado. Um referendo ao Tratado (que então era Constitucional e agora é Reformador) foi aquilo que Sócrates nos prometeu. Um referendo sobre se queremos abandonar a União Europeia não seria tanto uma quebra de promessa como uma chantagem emocional. Além da compreensível abstenção, a pior das consequências seria o eleitorado sentir que estavam a querer dar-lhe a volta na véspera das eleições. A linha entre esperto e espertalhão é daquelas que convém não franquear.
Para mais, essa estratégia acabaria por prejudicar o principal interessado. Um referendo ao Tratado (que então era Constitucional e agora é Reformador) foi aquilo que Sócrates nos prometeu. Um referendo sobre se queremos abandonar a União Europeia não seria tanto uma quebra de promessa como uma chantagem emocional. Além da compreensível abstenção, a pior das consequências seria o eleitorado sentir que estavam a querer dar-lhe a volta na véspera das eleições. A linha entre esperto e espertalhão é daquelas que convém não franquear.
«Público» de 5 de Novembro de 2007 - c.a.a.
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