Ir lá fora ver se chove
Por Helena Matos
VAI UMA GRANDE AGITAÇÃO por esse país fora. Dado o tumulto que o tema gera supor-se-ia que se discutem assuntos sérios como a sustentabilidade da segurança social. Mas na verdade não é o futuro da segurança social que se equaciona. Aliás nem da segurança social nem de qualquer outra forma de segurança. Nesta matéria os cidadãos são obrigados a acreditar que a palavra governamental tem os poderes do verbo divino: a segurança existe porque assim o diz o Governo. E ponto.
Também poderíamos supor que a Pátria descobriu finalmente que fez mau negócio quando desistiu de exigir o socialismo ao PS. A separação entre o sonho – o socialismo, variante de cavaleiro andante surgido a cada campanha eleitoral – e o partido – espécie de grande loja por vezes muito mal frequentada mas muito bem afreguesada – tornou o PS na mais eficaz máquina de conquista do poder e controlo do aparelho de Estado em Portugal.
Não que os outros partidos não gostassem de fazer o mesmo mas felizmente para nós ou não têm uma ideologia que o legitime – casos do PP e do PSD – ou precisamente por causa da ideologia – caso do PCP – os portugueses olham com muito maior desconfiança a sua apropriação da máquina estatal.
Com o PS nada disto acontece.
Com o S de socialismo ganha as eleições. Com o P de partido governa. E o rosa, cor de fundo, tudo atenua e desculpa. De manhã os governantes PS são adeptos do mercado e por isso usam a CGD como coisa sua. Seguidamente fazem uma paragem para café – seguindo naturalmente os ditames da DGS sobre os pastelinhos saudáveis – enquanto preparam o anúncio do encerramente de serviços de saúde no interior a par do aumento das receitas fiscais. A meio da tarde evocam as lutas académicas dos anos 60 antes de aprovarem a divulgação de mais uma lista negra de devedores e infractores. À noite os seus assessores confirmam nos últimos noticiários se se mantém eficaz a propaganda que garante tudo isto não passa da ‘indispensável optimização de sinergias para salvar o estado social’. Um estado tão perfeito que longe de nos garantir o que acreditávamos ser próprio dum Estado como a justiça, a defesa e a segurança, passou sim a procupar-se com aquilo que são as preocupações da sua nomenclatura: cobrar cada vez mais impostos pois só estes geram as verbas suficientes para que a nomenclatura, à semelhança dos patrícios romanos, alimente os seus clientes e a sua plebe.
O absurdo do politicamente correcto, as taxas, multas, coimas, entidades reguladoras a par das autoridades disto e daquilo encarregam-se de domesticar os mesmos cidadãos que é suposto constituirem a maioria dos contribuintes. Hoje a polícia andou em Portugal atrás de fumadores. Aos mesmos cafés onde não aparece em caso de assalto acorreu para levantar autos por causa duns cigarros. Loucura governamental? Nem pensar. Não só os ladrões não costumam pagar multas como todo este totalitarismo sanitário nos reduz de cidadãos livres em criaturas de tal modo atarantadas com a lei que confundem a cidadania com um correcto índice de massa corporal.
A legislação anti-tabágica é mais uma forma para em bom português dizer ao povinho para ir lá fora ver se chove... ou se alguém está a fumar. O povo tem ido.
«Público» de 3 de Janeiro de 2008 - c.a.a.
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2 Comments:
Não li declaração de interesses, mas dá para ver que a Sra. fuma.
Ontem à noite estive no Casino Estoril.
Não havia dísticos de proibição de fumar e toda a gente fumava em todo o lado.
Perguntei a um funcionário, que confirmou que se podia fumar no Casino.
Claro que não lhe perguntei porquê, mas percebe-se que esta lei afinal tem excepções.
Nada impede que uma lei tenha excepções, só que devem ser anunciadas e explicadas.
Jorge Oliveira
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