30.1.08

"Pode haver pressão para subir notas aos alunos"

O REGIME de avaliação dos professores está em vigor. Em diálogo com o DN, Nuno Crato, da Sociedade Portuguesa de Matemática, elogia o princípio da avaliação "frequente e sistemática" do trabalho dos professores, mas critica aspectos da avaliação, como o aparente incentivo a dar boas notas aos alunos.
Com a publicação, no dia 10 deste mês, do decreto regulamentar 2/2008, ficou instituída a avaliação de desempenho consagrada no novo Estatuto da Carreira Docente (ECD), aprovado há um ano. A reforma, defendida pela tutela como fundamental para "valorizar" o trabalho individual dos professores, promete influenciar profundamente o percurso profissional dos educadores.
A avaliação, bienal, assentará numa grelha de classificação que vai do insuficiente ao excelente. E ao contrário do que sucedia no anterior modelo, em que praticamente a totalidade dos professores progredia ao mesmo ritmo, as notas serão mesmo fundamentais para decidir quem sobe, quem estagna e quem arrisca mesmo ser expulso da carreira. Quem for "muito bom" ou "excelente", uma classificação sujeita a uma quota máxima de 20% dos avaliados, vai subir mais rapidamente. Quem ficar abaixo do "bom", correspondente a uma média de 6,5 a 7,9 valores numa escala de 10, não progride. Quem repetir duas ou mais classificações insuficientes fica sujeito a procedimentos que poderão conduzir mesmo à sua expulsão da rede do Ministério da Educação.

Nuno Crato, professor universitário e presidente da Sociedade Portuguesa de Matemática (SPM), é assumidamente um defensor de uma cultura de avaliação no sistema educativo português. E, como não poderia deixar de ser, acredita que os docentes não podem ficar de fora desse esforço: "A avaliação dos professores é necessária. E são bem-vindos todos os esforços para que esta seja feita de forma mais frequente e sistemática."
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DN: É justo que se estabeleçam quotas para as melhores notas?
NC: O estabelecimento de quotas para as melhores classificações, eliminando, na prática, a possibilidade de todos poderem almejar à excelência, tem sido um dos aspectos da reforma mais criticados pelos sindicatos do sector. É uma regra, dizem, que serve objectivos" economicistas", permitindo controlar os aumentos salariais.
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Nuno Crato reconhece que o princípio das quotas "tem algo de perverso", mas, diz, "tem algumas vantagens óbvias. Sabemos que a ausência de quotas leva a que toda a gente tenha muito bom".
DN: Os aspectos e a forma de avaliação são os melhores e mais rigorosos para traduzir a realidade?
NC: A avaliação dos professores terá várias etapas. A primeira componente é a auto-avaliação (obrigatória), em que o profissional analisa o cumprimento dos objectivos a que se propôs no início do ano lectivo e descreve o enriquecimento profissional que conseguiu, nomeadamente através de acções de formação. O docente é também avaliado pelo coordenador, por necessidade um professor que já chegou à categoria de titular, preferencialmente da mesma área de docência. Este coordenador vai analisar aspectos como o planeamento das actividades lectivas, o trabalho em sala de aula (tem de assistir a pelo menos duas aulas por ano), a relação com os estudantes e os progressos por estes obtidos. Numa terceira fase entra a direcção executiva da escola, ponderando aspectos qualitativos como a assiduidade, o serviço distribuído ao professor e também os progressos dos alunos e redução do abandono escolar dos mesmos, a participação em actividades da escola e do grupo de docência.

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Extracto da entrevista feita por P. S. Tavares, do «DN», publicada em 26 Jan 06; texto integral [aqui]

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3 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Com tanto pensador que este país tem, fico espantado como é possível não perceberem o que está na base de todo o modo em que assenta o processo.

Alguém já se deu ao trabalho de juntar a bota com a perdigota e verificar como é que esta aberração funciona? Alguém já percebeu que não é a qualidade do ensino que esta gente pretende? Alguém percebe alguma coisa sobre a qual emite opinião?

Parece que temos que concluir que os pensadores em Portugal padecem de analfabetismo ou de cegueira!

30 de janeiro de 2008 às 22:18  
Blogger César said...

Por falar em ensino e, especificamente, na Matemática, caro Nuno Crato, já sabia desta?

http://cafepuroarabica.blogspot.com/2008/01/bandalheira-geral-3.html

(desculpe a publicidade - literalmente)

31 de janeiro de 2008 às 14:20  
Blogger Rui Baptista said...

Das coisas que mais impressão me causam é o ataque que se fazem sob anonimato, v.g.: "Parece que temos que concluir que os pensadores em Portugal padecem de analfabetismo ou de cegueira!". Pode ser que pareça, mas não é!

Quanto ao medo da avaliação é provável que repouse no facto de nunca me ter sido respondida a pergunta que tenho feito, amiúde em artigos de jornais, sem qualquer resposta: Em anos do processo avaliativo anterior, excluindo o número de professores que tenham falecido ou desistido de "motu proprio" qual a percentagem de professores licenciados que, apenas cumpridos os anos a tanto necessários,não atingiram o 10.º escalão?

3 de outubro de 2008 às 22:35  

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