15.4.08

António Barreto e a carta falsa

Por Ferreira Fernandes
ANTÓNIO BARRETO publicou, no Público (domingo), uma carta de 1974, enviada pelo almirante Rosa Coutinho, alto-comissário em Angola, a Agostinho Neto, presidente do MPLA.
O almirante diz que, depois de "reunião secreta (...) com os camaradas do PCP", se decidiu "dar execução imediata à segunda fase do plano".
Rosa Coutinho incita Neto a dar "instruções secretas aos militantes do MPLA para aterrorizarem os brancos, matando, pilhando e incendiando (...). Sede cruéis sobretudo com as crianças, as mulheres e os velhos (...)".
Pois é, o documento é falso. Basta lê-lo. Não gosto de Rosa Coutinho, não gosto dos comunistas e da política deles em Angola. Mas aquele documento pertence à mesma família de os comunistas comerem crianças ao pequeno-almoço.
"Sede cruéis com as crianças [brancas]", escreveu o governador (em papel timbrado do seu gabinete), depois de programar a matança com as cúpulas do PCP...
A carta apareceu num jornal sul-africano em 1975.
Eu li-a e sei porque é falsa: porque sim.
«DN» de 15 Abr 07 - c.a.a.
NOTA (CMR): a referida crónica de António Barreto foi publicada neste blogue [aqui]. Num dos comentários que suscitou, consta o link para o citado documento, de que em cima se mostra o início.
*
Actualização: no «DN» de 21 Abr 08, Ferreira Fernandes retoma o assunto:
HÁ DOIS DOMINGOS, António Barreto publicou, no Público, uma carta de 1974, que disse ser de Rosa Coutinho a Agostinho Neto.
Na carta, Rosa Coutinho, depois de "reunião secreta com os camaradas do PCP", ordenava ao presidente do MPLA aterrorizar "os brancos [portugueses], matando, pilhando e incendiando." E exortava: "Sede cruéis sobretudo com as crianças, as mulheres e os velhos."
Apresento os portugueses de que falo: Barreto é uma voz respeitada; Rosa Coutinho era o alto-comissário em Angola; e o PCP está no Parlamento. Não falo de gente menor e, no entanto, a extraordinária carta não teve eco. Com duas excepções: uma crónica minha, no DN (eu dizia que ela era falsa), e um debate na blogosfera.
O que deveria ter acontecido: um sobressalto nacional para tirar a coisa a limpo. Diz-se que o governador português e um partido português exortaram um grupo estrangeiro a aterrorizar portugueses - e nada!
Ou eu tenho razão, e a carta é falsa, ou este silêncio é doentio.

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11 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Documentos como este, forjados (ainda por cima) por aprendizes analfabetos ao nível de taxista do aeroporto da Portela, são aos milhares. Até aqui nada de novo.
O que admira é como uma pessoa como A. Barreto "comeu" uma garotice destas, como aqueles peixes que engolem minhoca, anzol e até a linha!

15 de abril de 2008 às 10:33  
Blogger Jorge Oliveira said...

Fico mais descansado ao saber que o documento é falso e que um oficial português não subscreveu uma enormidade daquelas.

Mas não deixo de pensar que recomendações do mesmo teor devem ter sido dadas aos militantes dos movimentos de "libertação", porque foi exactamente isso que eles fizeram...

E alguém deu essas instruções, certamente os paladinos das ideologias moralmente "superiores", genericamente designadas pelo termo "socialismo". É tempo de percebermos com quem temos andado metidos.

15 de abril de 2008 às 14:14  
Blogger Luís Bonifácio said...

Sem fazer juízos de valor sobre a autenticidade do documento em questão, acho que Ferreira Fernandesdiz é bastante abjecto.

É falsa porque sim!!!!!

Isso parece um argumento do Dr. Cunhal em relação aos crimes de Estaline, ou do Presidente do Irão em relação ao Holocausto.
Ou até eu achar, não o conhecendo de parte alguma, que você é um "parvo" ... PORQUE SIM!

Se acha que é falsa então prove!

15 de abril de 2008 às 14:32  
Blogger Florêncio Cardoso said...

Afirmação: «Essa história dos gambosinos não tem pés nem cabeça»

Resposta: «Se acha que é mentira, então prove!»

(Silêncio embaraçado)

Conclusão: quem diz que «Essa história dos gambosinos não tem pés nem cabeça» faz uma afirmação ABJECTA!

15 de abril de 2008 às 15:34  
Anonymous Anónimo said...

Este comentário foi removido pelo autor.

15 de abril de 2008 às 15:54  
Anonymous Anónimo said...

Quantos documentos semelhantes querem que eu escreva, deixando depois aos visados o ónus de provarem que as acusações são falsas?
Claro que, na dúvida, quem afirma é que tem de provar. Neste caso, é o tal jornal da África do Sul (olha quem!) que, ao apresentar um determinado papel, teria de o fazer.

Quando o cronista escreve «é falso porque sim», está a fazer uma aposta (demasiado optimista...) num mínimo de inteligência de quem o lê e de quem leu o "documento".
De contrário, estaria a colocar-se na posição do infeliz que se vê obrigado a explicar «porque é que uma nota de €4 é falsa».

15 de abril de 2008 às 15:56  
Blogger Carlos Medina Ribeiro said...

Jorge Oliveira,

Seria muito interessante saber se, em relação à carta, há diferenças de opinião (entenda-se: de credulidade) entre quem fez o SMO nos tempos da guerra colonial (como eu e tu) e quem não o fez.

Julgo que as encontraríamos facilmente, pois quem fez a tropa nesses tempos difíceis sabe bem que textos daqueles eram o B-A-BA da contra-informação e feitos às dúzias.

Só há aqui um "senão": é que o da amostra é tão mau, tão mau... que o grumete encarregado de o redigir deve ter sido mandado varrer a parada (ou lavar sanitas) durante um mês!
Com que então, reuniões secretas relatadas em papel timbrado hem?

15 de abril de 2008 às 17:39  
Blogger Nuno Castelo-Branco said...

O comportamento das pretensas autoridades portuguesas da época fala por si. Basta informarem-se acerca do que se passou em L. Marques no 7 de Setembro e verificaram a forma vergonhosa como a tropa fandanga se comportou. Se a carta é falsa - confesso que quero que NÃO seja -, que provem, porque os jornais da época estão cheios de material indiciador de culpa formada. Cheios! Aquela gente falava demais.
Quanto à falta de qualidade do escriba, o que tem isso de anormal? Aqueles fulaninhos não eram propriamente uns intelectuais e a boçalidade pode até ser um indício. E logo o Rosa Coutinho!

15 de abril de 2008 às 21:50  
Blogger Jorge Oliveira said...

Medina : é claro que isso leva a crer que o documento é falso, mas a verdade é que eu tive um sobressalto, já relatado no outro post, pelo facto de a divulgação partir de um cronista como António Barreto, que me merece um elevado crédito. Espero agora a reacção de Barreto a tudo isto.

15 de abril de 2008 às 21:52  
Blogger Agnelo Figueiredo said...

Argumento indestrutível:
"... é falso: porque sim!"

16 de abril de 2008 às 19:45  
Blogger Atom said...

Não sei se o documento é falso ou não mas sei que quando rosa coutinho era governador militar e não só, de Angola eu tinha 13 anos e vivia em Luanda. Vivia aterrorizado porque após 28 de Setembro de 1974 os Angolanos começaram a queimar e a saquear as casas dos Portugueses. Nessas altura o meu pai já estava a tratar do regresso para Portugal. Enquanto isso não acontecia ele fez parte duma comissão de Portugueses que foi pedir ao rosa coutinho protecção dos militares que ainda estavam no terreno. Quando esta comissão reportou os factos, enumerando-os (assaltos, incendios etc.) a resposta do rosa coutinho ficou famosa "Isso é boato". Portanto ele pode não ter escrito a carta mas com os seus actos (ou melhor a falta deles) permitiu o mesmo resultado final. Não sei se a escreveu mas que o considero capaz disso considero!

10 de janeiro de 2011 às 20:27  

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