Duas catástrofes
Por Rui Tavares
NÃO SEI que mal fizemos à deusa da democracia, mas ela está a sujeitar-nos a uma duríssima prova.
Diz ela: Portugal, escolhe entre duas catástrofes. Preferes uma catástrofe económica e social? Ou antes uma catástrofe política?
A catástrofe económica e social é Pedro Passos Coelho, que é um líder do PSD muito mais banal do que parece. O que sabe de política aprendeu como líder de uma juventude partidária; em vez de ter maturado, a sua temporária ausência da política fê-lo regressar como personagem plastificada. A imagem de extremista ideológico que a esquerda compôs dele pode até, de certa forma arrevesada, creditá-lo de uma consistência de pensamento que eu — salvo melhor intuição — não lhe encontro.
Temo-lhe a ligeireza mais do que o extremismo. A privatização das águas, a extinção do ministério da Cultura, tudo parece emergir no seu discurso com a mesma falta de questionamento.
Certas pessoas parecem não ter dúvidas por dogmatismo. Outras não têm dúvidas por inconsciência — e Passos Coelho é uma delas. Uma pessoa assim é perigosa, sobretudo quando rodeada por uma clique de taticistas disposta a bajular o líder para alcançar os seus próprios objetivos. Pedro Passos Coelho está rodeado destes bajuladores por todo o lado, e eles parecem mais movidos pelo lucro do que pela glória.
Com um país em crise, vai ser difícil distinguir entre a privatização e a pilhagem.
A catástrofe política é José Sócrates.
Para quem nunca comprou a teoria, tão conveniente em certos setores da esquerda, de que PS e PSD são iguais, apostar em Sócrates para combater Passos Coelho poderia ser uma opção.
Mas eu não me posso esquecer de outro Sócrates. O Sócrates dos processos judiciais contra opinadores e jornalistas, do um-contra-todos, dado aos ataques de fúria, à paranóia e às derivas autoritárias. O Sócrates que fez da arrogância uma forma de respiração.
Ao contrário de Passos Coelho, este Sócrates não se consegue esconder. Ele está ali, por debaixo da pele, e todos nós o conhecemos demasiado bem. Quando ele deu uma entrevista como “simpático” ninguém acreditou. O verdadeiro Sócrates estava impaciente por aparecer.
Estas características são — para quem se preocupa com a democracia — mais do que apenas uma caricatura. Sócrates fez muito para desvalorizar o valor da palavra política nos últimos anos. A confiança foi virada de pernas para o ar demasiadas vezes. O sectarismo impregnou o ar, também por culpa dele, e contaminou o país.
De caminho, Sócrates esvaziou o PS por dentro como o dono de um banco. Um partido outrora orgulhoso das suas raízes democráticas, progressistas e abertas tem agora medo do chefe. Esse foi outro dos efeitos da ação de Sócrates, e toda a gente que o escolher para barrar Pedro Passos Coelho sabe que conta com a catástrofe política para conter a catástrofe social e económica.
Mas alguma coisa fizemos de mal à deusa da democracia. O ambiente em que vivemos não é só culpa de dois homens; é culpa de uma cultura política própria de beco sem saída.
In RuiTavares.netNÃO SEI que mal fizemos à deusa da democracia, mas ela está a sujeitar-nos a uma duríssima prova.
Diz ela: Portugal, escolhe entre duas catástrofes. Preferes uma catástrofe económica e social? Ou antes uma catástrofe política?
A catástrofe económica e social é Pedro Passos Coelho, que é um líder do PSD muito mais banal do que parece. O que sabe de política aprendeu como líder de uma juventude partidária; em vez de ter maturado, a sua temporária ausência da política fê-lo regressar como personagem plastificada. A imagem de extremista ideológico que a esquerda compôs dele pode até, de certa forma arrevesada, creditá-lo de uma consistência de pensamento que eu — salvo melhor intuição — não lhe encontro.
Temo-lhe a ligeireza mais do que o extremismo. A privatização das águas, a extinção do ministério da Cultura, tudo parece emergir no seu discurso com a mesma falta de questionamento.
Certas pessoas parecem não ter dúvidas por dogmatismo. Outras não têm dúvidas por inconsciência — e Passos Coelho é uma delas. Uma pessoa assim é perigosa, sobretudo quando rodeada por uma clique de taticistas disposta a bajular o líder para alcançar os seus próprios objetivos. Pedro Passos Coelho está rodeado destes bajuladores por todo o lado, e eles parecem mais movidos pelo lucro do que pela glória.
Com um país em crise, vai ser difícil distinguir entre a privatização e a pilhagem.
A catástrofe política é José Sócrates.
Para quem nunca comprou a teoria, tão conveniente em certos setores da esquerda, de que PS e PSD são iguais, apostar em Sócrates para combater Passos Coelho poderia ser uma opção.
Mas eu não me posso esquecer de outro Sócrates. O Sócrates dos processos judiciais contra opinadores e jornalistas, do um-contra-todos, dado aos ataques de fúria, à paranóia e às derivas autoritárias. O Sócrates que fez da arrogância uma forma de respiração.
Ao contrário de Passos Coelho, este Sócrates não se consegue esconder. Ele está ali, por debaixo da pele, e todos nós o conhecemos demasiado bem. Quando ele deu uma entrevista como “simpático” ninguém acreditou. O verdadeiro Sócrates estava impaciente por aparecer.
Estas características são — para quem se preocupa com a democracia — mais do que apenas uma caricatura. Sócrates fez muito para desvalorizar o valor da palavra política nos últimos anos. A confiança foi virada de pernas para o ar demasiadas vezes. O sectarismo impregnou o ar, também por culpa dele, e contaminou o país.
De caminho, Sócrates esvaziou o PS por dentro como o dono de um banco. Um partido outrora orgulhoso das suas raízes democráticas, progressistas e abertas tem agora medo do chefe. Esse foi outro dos efeitos da ação de Sócrates, e toda a gente que o escolher para barrar Pedro Passos Coelho sabe que conta com a catástrofe política para conter a catástrofe social e económica.
Mas alguma coisa fizemos de mal à deusa da democracia. O ambiente em que vivemos não é só culpa de dois homens; é culpa de uma cultura política própria de beco sem saída.
Etiquetas: autor convidado, RT
0 Comments:
Enviar um comentário
<< Home