O 'não' às vezes é demasiado fácil
Por Ferreira Fernandes
A
JUNTA militar birmanesa, no poder há 50 anos, permitiu eleições para
alguns lugares no Parlamento. As panelas de pressão foram inventadas sob
o mesmo princípio, com uma válvula para deixar escapar um bocadinho de
revolta.
Em abril, Suu Kyi, a Nobel da Paz, e o seu partido ganharam a
esmagadora maioria (43 de 45) dos lugares a votos. Ontem, vi uma foto do
Parlamento com Suu Kyi, frágil, firme e bela, como nos habituámos a
vê-la, nos intervalos em que nos permitiam vê-la, ao longo das suas duas
décadas de prisão domiciliária. O pano de fundo da foto era composto
por militares, deputados também, porque a junta reservara lugares não
eleitos para os seus. Eles tinham cara amarrada, o que sublinhava a
silhueta elegante de Suu Kye. Havia um problema: ela fizera campanha
contra a constituição, escrita pela junta militar e muito limitativa nos
direitos. Como poderia ela dizer que ia "proteger" a constituição, como
a obrigava o juramento para ser deputada? Suu Kye tentara explicar o
paradoxo ao presidente da junta, propôs até uma solução: diria
"respeitar" a constituição, termo mais manso e ainda razoável. A junta
foi definitiva: ou "proteger", ou nada. Então, Suu Kye foi dura como
sabe ser quem tem, mesmo, uma meta a atingir: recuou e jurou proteger a
constituição.
A foto foi depois do juramento, a cara amarrada dos
deputados dizia que tinham percebido. Suu Kye não é das que fazem
finca-pé. É das que vencem.
«DN» de 4 Mai 12 Etiquetas: autor convidado, F.F
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