26.6.12

Os Ricos São Diferentes

Por Maria Filomena Mónica
            TENHO andado a pensar nos ricos e conclui que, mais do que inveja, me provocam perplexidade. Na famosa discussão entre F. Scott Fizgerald e E. Hemingway, era o primeiro – que dizia que os ricos eram diferentes - que tinha razão. Os ricos são diferentes, não apenas por possuírem mais dinheiro, mas por terem uma atitude especial perante a vida.
            Conheço melhor os velhos do que os novos ricos, mas o que vou dizer aplica-se a todos, embora com mais exactidão aos primeiros. Criada entre algumas das mais poderosas famílias do país, pude observar o seu comportamento e sei que formavam uma casta à parte. Lembro-me de quão austera era a educação que davam aos filhos e, em geral, quão comedido era o consumo doméstico. A ostentação era tida como uma possidoneira de quem recentemente havia adquirido dinheiro. Não recordo um único adolescente – e estou a referir-me àqueles que possuíam os apelidos que o dr. Cunhal gostava de citar como inimigos de classe – a quem tenha sido oferecido um carro aos 18 anos. As festas que davam eram tão comedidas quanto a indumentária. Eu não pertencia bem a este «grupo» – muitos tinham antepassados que provinham da aristocracia de Corte - mas nunca me trataram com desprezo. Só tarde, e por me ter doutorado em Sociologia, percebi que o meu estatuto era o de uma híbrida social: pertencia e não pertencia ao «grupo». Isto, que me podia ter feito sofrer, teve uma vantagem: a de poder olhar os ricos por dentro e por fora. Sem ressentimentos, nem ódios. Com alguns forjei até uma amizade que ficou para a vida: foi num deles que depositei um dos mais bem guardados segredos da minha vida.
Claro que o conceito de riqueza é relativo. Para uma pessoa frugal como eu, quem dispõe de um salário anual de 300.000 euros, é, por definição, muito rico. São estes indivíduos que me suscitam curiosidade. A interrogação que surge no meu espírito de cada vez que noto os salários auferidos por Eduardo Catroga, António Mexia, Zeinal Bava e António Borges prende-se com a forma como gastam o dinheiro. Comprada uma boa casa, uns quadros modernaços e um automóvel topo da gama, que mais podem desejar? Barcos a motor, férias no Nilo, amantes de luxo? Notem que não os estou a criticar, mas a tentar perceber o seu comportamento.
Eu gosto de ser rica – suponho que por ganhar quase dez vezes o salário mínimo é assim que tenho de me considerar - porque o dinheiro me dá liberdade. Sei-o, porque já fui rica, já fui pobre, já fui remediada e agora sou, de novo, rica (apesar de o actual governo ter cortado 40% do salário que recebo). É a experiência que me leva a afirmar que é melhor ser rica do que pobre, não só pela razão, evidente, de não ter de passar fome, mas porque a condição me dá a possibilidade de fazer o que me apetece, de criticar os governos e de afirmar o que me vem à cabeça. Aos ricos, tudo lhes é dado, incluindo a possibilidade de ser independente. É pena que a não aproveitem mais vezes.
«Expresso» de 23 Jun 12         

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