2.4.17

Sem emenda - Mulheres batidas

Por António Barreto
Há termos em voga: assédio sexual e violência doméstica, por exemplo. Nenhum é falso. Mas ambos escondem qualquer coisa: a violência masculina! É sobretudo disso que se trata.
Pode haver estudos e análises. Consultas e exames. Nunca se chegará bem a saber o que leva um homem a espancar a mulher, a bater na mãe, a desancar a namorada, a surrar a amante e a sovar a filha! Mas sobretudo a mulher, a mãe dos seus filhos, a pessoa que se ocupa dele, lhe faz as refeições e trata da casa! Ou simplesmente a pessoa que com ele vive e dorme.
É uma das piores baixezas da humanidade! A violência masculina tem razões estranhas: sexo, ciúme, insegurança, impotência, desconfiança, exibicionismo, ignorância, vingança, álcool, prepotência… Não é de esquerda nem de direita. Não é do Norte, nem do Sul. Não é do crente, nem do ateu. Não é do rico, nem do pobre. Não é do doutor, nem do analfabeto. Não é do inteligente, nem do estúpido. Não é do velho, nem do novo. Não é do português, nem do estrangeiro. Não é do rústico, nem do citadino.
Que animal é este, difícil de compreender, impossível de entender? Podemos recorrer a psicólogos, médicos, psicanalistas, sociólogos, polícias e juristas: nenhum satisfaz a necessidade de compreender.
São anualmente cinco a dez mil mulheres as que, após violência continuada, apresentam queixa. Mas são cinquenta a cem mil as que nunca apresentaram queixa, não se sabe bem porquê, mas suspeita-se com certeza. Por medo e pavor. Por timidez e vergonha. Ou por pobreza e miséria. E são cerca de cinquenta as que, anualmente, já não apresentam queixa, pela simples razão de que foram assassinadas. Isso mesmo, assassinadas! Há homens assim, que assassinam a mãe dos seus filhos! Nem animais!
O homem bate-lhe porque tem ciúmes, porque ela olhou para outro, no restaurante, porque ela sorriu para outro, no emprego, porque ela falou com outro, ao telemóvel, porque ela ouviu as histórias do outro, no autocarro.
Bate-lhe porque o patrão se zangou, porque o chefe o censurou, porque teve má avaliação no emprego e, ao chegar a casa, bateu em quem tinha à mão.
Bate-lhe porque deu uma nega, porque esteve impotente com a amante, porque não conseguiu sair com uma namorada.
Bate-lhe porque ela não obedeceu a uma ordem dele, porque respondeu ou resmungou, porque ela lhe disse que estava cansada, que precisava de dormir ou porque não quis fazer amor com ele.
Bate-lhe porque ela lhe disse que ele bem podia ajudar em casa, com os filhos, com os pais ou os sogros, nas compras, na louça, nos pagamentos e no lixo.
Bate-lhe porque, no golfe, as coisas não correram bem, porque as acções na bolsa baixaram 5% num só dia ou porque o banco exigiu o pagamento da dívida.
Bate-lhe porque bebeu uns copos a mais, porque o seu clube de futebol perdeu e um amigo lhe estragou o carro.
Bate-lhe porque ela lhe disse que ele bebia de mais, que podia passar um pouco menos de tempo diante da televisão, ou no escritório, à noite, ou no café, com os amigos.
Bate-lhe porque é como o Sebastião, que come tudo, tudo, tudo, que come tudo sem colher, que fica todo barrigudo e depois dá pancada na mulher.
Bate-lhe porque o peixe estava queimado e a carne estava crua, porque a mesa não estava posta a horas, porque ele chegou tarde e o jantar estava frio.
Bate-lhe porque ela esteve a ler livros que não devia ler, a ver filmes que não devia ver e a ouvir música que não devia ouvir.
Bate-lhe porque é o seu direito, porque é a sua mulher, para lhe lembrar que quem manda é ele, porque ela não sabe cuidar dos filhos, porque os filhos têm más notas, porque é frustrado e traumatizado, já o pai dele batia na mãe e consta que o avô batia na avó.
Bate-lhe porque ela estava mesmo a pedi-las, com aquela maneira de se vestir e de se comportar diante de toda a gente.
Bate-lhe porque ela disse que se queria separar ou pedir o divórcio.
Bate-lhe porque uns tabefes nunca fizeram mal a ninguém.
Bate-lhe porque ela gosta.
Bate-lhe porque ela está ali.

DN, 2 de Abril de 2017

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3 Comments:

Blogger José Batista said...

O ser humano encerra em si aspectos monstruosos. Creio que nunca saberemos que circunstâncias exactas podem despertar essas monstruosidades. Por isso há necessidade de cada ser humano responder permanentemente pelos seus actos que influenciem terceiros, perante os outros, já que não é suficiente que o faça perante a sua consciência, a qual pode, simplesmente, não existir.

2 de abril de 2017 às 19:02  
Blogger opjj said...

Parece que se perderam os valores morais.
Quando as TVs dão corpo ao dito pelo sujeito chamado GEORGE director da Saúde que sem qq retenção abre os pulmões e canta " o sexo oral é o culpado pela propagação da hepatite A " mas como tem Cu e Medo, andou em derivações e incapaz de chamar os bois pelos nomes, " homossexuais"
Houve um dia pelas 9 da manhã tomando o pequeno almoço com as minhas netas, ligo a SIC e lá vem o "sexo oral"
Isto está minado de gente sem princípios!

Cumps

4 de abril de 2017 às 20:04  
Blogger Ilha da lua said...

Quando num país "as mulheres batidas", mesmo depois de alertadas as autoridades, têm, por motivos de segurança, abandonar a casa e muitas vezes os filhos, enquanto o agressor permanece em casa, aguardando pela morosidade do processo e da justiça...dá que pensar.

12 de abril de 2017 às 17:54  

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