24.9.11

A justa causa é uma questão pequena

Por Antunes Ferreira

«NINGUÉM quer acabar com a justa causa» de despedimentos, disse, sorrindo como é seu hábito, o ministro da Economia e do Emprego. O País descarregou o cenho, mas manteve as suas dúvidas, apesar da afirmação de Álvaro Santos Pereira. Nunca fiando, nomeadamente num governante que parece estar sempre a arreganhar a cepa.
Mas o membro do Executivo chefiado por Passos Coelho não se ficou por aqui. Para ele «a questão laboral é simplesmente uma pequena questão em relação às questões mais abrangentes da competitividade». «Estamos a falar ao nível de políticas activas do emprego, que estão a ser discutidas no seio da concertação social, estamos a falar de outras políticas de competitividade que também serão discutidas em sede de concertação social» acrescentou.
E, pelo sim, pelo não, sublinhou que o Governo está apenas «a implementar aquilo que foi acordado no memorando de entendimento» com a troika, medidas «com que o país se comprometeu em troca de ter a ajuda externa de que precisamos». Transcrevi passos da notícia ontem publicada no Expresso on-line.
Recordo que foi feita uma proposta aos parceiros sociais, que servirá de base de discussão ao grupo de trabalho sobre Políticas de Emprego e Reforma da Legislação Laboral, na qual o Executivo defende a alteração do conceito de despedimento com justa causa, introduzindo a possibilidade de o trabalhador ser despedido por não cumprir os seus objectivos ou ser menos produtivo, independentemente da introdução de novas tecnologias ou de outras alterações no local de trabalho.

A questão laboral, ao invés da opinião de Santos Pereira, não é simplesmente uma questão pequena. É enorme. Não avanço com a estafada fórmula dos direitos adquiridos. Mas posso perfeitamente afirmar que as lutas dos que trabalham para melhorar a sua condição, e garantir o trabalho são, até melhor, as que podem ser utilizadas com algum efeito.
Hoje, cada vez é mais difícil saber exactamente o que é o proletariado e quem o integra. A luta de classes está démodée, exceptuando, obviamente, para os partidos comunistas e radicais de esquerda, que continuam a brandi-la como bandeira. O Mundo está cada vez mais diferente, porque os homens são cada vez mais diferentes.
Mas uma coisa é equacionar os termos deste melindroso tema laboral, outra, bem diferente, é considerá-lo «uma questão pequena, em relação às questões mais abrangentes da competitividade». O neo-liberalismo desta gente que nos governa, ou melhor que em nós manda (porque nós adoramos a canga), considera pois que os problemas do trabalho e, portanto, de quem trabalha, são despiciendos.
Haverá muito para mudar no que concerne à produtividade de nós todos, aos hábitos da bica frequente, da discussão futebolística, do faz que anda mas não anda, enfim disso tudo em que nós, os Portugueses somos especialistas. Para tal, há que mudar as mentalidades, os hábitos e várias normas. Nisso, estou de acordo, mas não se mudam as regras a meio do jogo.
Portugal recorreu ao auxílio externo, quiçá tardiamente, mas… recorreu. E ninguém empresta um cêntimo a quem quer que seja, de acordo com as exigências de quem esmola. É triste, mas é assim.
Porém, quando Passos Coelho e os seus comparsas são mais papistas do que o Papa e se adiantam a quem marcou o andamento do País para nos dar uma mãozinha, e dizem que os sacrifícios são para todos, o seu silêncio e as declarações tímidas em relação às declarações do homem da Madeira são o exemplo acabado do que é a tibieza em Portugal. Que é de hoje e de muitos anos e muitos Governos.
Mas, perguntar-se-á, o que tem a ver a questão laboral «pequena» com a Madeira da nossa vergonha? Respondo. Quando Alberto João Jardim afirmou na última quinta-feira que a dívida regional era «uma coisinha de nada no meio de todas» - o despedimento por justa causa não pode deixar de existir.

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