Falar lá fora cá para dentro
Por Ferreira Fernandes
FAÇO análises económicas lendo as nuvens. Cumulonimbus, os mercados vão tornar-se voláteis, stratocumulus, aumenta endividamento externo, e assim por diante.
É um método bizarro mas tão bom como o de The Economist: a ambos, a mim e à revista, durante o ano de 2008 escapou-nos a maior crise económica desde 1929, até ela morder-nos as canelas... Outro meu método é ler o Financial Times e deitar-me a adivinhar.
Ontem, Passos Coelho - que já tinha feito o mesmo há semanas em entrevista ao alemão Die Welt - em artigo agora assinado, escreveu no FT que, apesar de otimista, "não há garantias". Nunca se sabe - foi a sua tese.
Essas dúvidas, antes, seriam fatais. Os mercados são tramados, é preciso tratá-los com mil cuidados ou eles investem, ou melhor, desinvestem. Então, por que o primeiro-ministro pôs as dúvidas? Lendo-o, não sei, mas deixem-me adivinhar: ele permitiu-se falar assim porque os mercados já não nos mordem as canelas! Estão já convencidos do nosso bom rumo e não reagem mal a augúrios dubitativos (alô, professor Vítor Gaspar, já não é preciso dizer que lá estaremos e de peito feito, em setembro de 2013, a vender dívida...) Então, se Passos Coelho insiste em falar com "mas" e "contudo" lá fora, é porque fala cá para dentro. Avisa sobre um possível cenário negro para que, por cá, aguentemos as medidas duras.
Mas fica o mistério: se a mensagem é interna, porquê em inglês? Vou ler nuvens e depois respondo.
«DN» de 19 Abr 12Etiquetas: autor convidado, F.F
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