26.4.12

Olhos secos para ver o que é bom

Por Ferreira Fernandes
ESTA semana, o duelo aqui do lado, por adversários interpostos, contra o Chelsea e o Bayern, sublinhou dois futebóis. Ao fim do duelo, sabe-se, morreram os dois. Eu sei que os adeptos de um ou de outro, culés e merengues, depois de curadas as mágoas próprias, acabarão com mais desdém pelo outro. 
Numa noite de 1965, eu estava pela primeira vez no Estádio da Luz. O Manchester United veio ganhar 5-1 e, à minha volta, chorava-se e rasgavam-se cartões de sócio. Eu guardei os olhos secos e vi o nascimento de uma estrela, George Best. Desde aí fiquei-me agradecido por saber, apesar da cor preferida, olhar para um campo inteiro (não foi lição que me tivesse ficado só para o futebol). Eis o que me permite sair do duelo desta semana ganhando com ele. Barcelona e Real Madrid, um, contemplação, outro, emoção. 
Vermeer a pôr uma pérola num brinco, Goya a fuzilar numa colina. Luchino Visconti, lento como a cara de um pescador siciliano, Fellini, excessivo como um par de mamas na Emilia-Romagna. Santa Teresa de Ávila, mística, São Jorge com a lança na goela do dragão. 
Porque excluir, quando posso juntar? Vejo dois, Messi tecendo, Cristiano Ronaldo explodindo, e não me arrependo de querer ver os dois. Ainda bem que o posso dizer com os dois por terra, para que se saiba que é um gosto e não uma moda. 
Barcelona e Real Madrid perderam? Pois eu ganhei com eles. 
«DN» de 26 Abr 12

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