17.5.12

Novas oportunidades

Por Manuel António Pina
PASSOS Coelho não é propriamente um desastrado, porque um desastrado sempre acerta uma de vez em quando. É certo que tem azar, pois só por impensável azar o INE se lembraria de divulgar os novos números do desemprego - um milhão de portugueses sem trabalho - poucos dias após Passos Coelho ter revelado aos desempregados o lado feliz e solar da sua situação. Mas, para mim, ele é, sobretudo, um incompreendido: ou as suas mensagens vão ter ao lugar errado (aos ouvidos dos surdos, como em "A lição", de Ionesco) ou são emitidas em códigos inacessíveis aos mortais comuns.
De facto, no mesmo parágrafo do já famoso elogio do desemprego como excitante oportunidade de mudança de vida, Passos Coelho faz afirmações intrigantes como: "Quem já passou por experiências mal sucedidas tem obrigação de acrescentar alguma coisa ao seu saber de não voltar a repetir esses erros" (imagino o penitente desempregado perguntando-se: "Que erro terei cometido?"); ou: "os erros são limitados" (onde é posta em causa a generalizada convicção de que errar é próprio do homem); ou ainda: "ser despedido (...) tem de representar uma livre escolha" (interrogação, em termos metafísicos, da questão do livre arbítrio patronal em matéria de despedimentos).
Quem se surpreenderá que, de Jerónimo de Sousa ao professor Marcelo, ninguém tenha percebido onde ele quis chegar?
«JN» de 17 Mai 12

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