Novas oportunidades
Por Manuel António Pina
PASSOS Coelho não é propriamente um desastrado, porque um desastrado
sempre acerta uma de vez em quando. É certo que tem azar, pois só por
impensável azar o INE se lembraria de divulgar os novos números do
desemprego - um milhão de portugueses sem trabalho - poucos dias após
Passos Coelho ter revelado aos desempregados o lado feliz e solar da sua
situação. Mas, para mim, ele é, sobretudo, um incompreendido: ou as
suas mensagens vão ter ao lugar errado (aos ouvidos dos surdos, como em
"A lição", de Ionesco) ou são emitidas em códigos inacessíveis aos
mortais comuns.
De facto, no mesmo parágrafo do já famoso elogio do desemprego
como excitante oportunidade de mudança de vida, Passos Coelho faz
afirmações intrigantes como: "Quem já passou por experiências mal
sucedidas tem obrigação de acrescentar alguma coisa ao seu saber de não
voltar a repetir esses erros" (imagino o penitente desempregado
perguntando-se: "Que erro terei cometido?"); ou: "os erros são
limitados" (onde é posta em causa a generalizada convicção de que errar é
próprio do homem); ou ainda: "ser despedido (...) tem de representar
uma livre escolha" (interrogação, em termos metafísicos, da questão do
livre arbítrio patronal em matéria de despedimentos).
Quem se surpreenderá que, de Jerónimo de Sousa ao professor Marcelo, ninguém tenha percebido onde ele quis chegar?
«JN» de 17 Mai 12 Etiquetas: MAP
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