31.12.06

Parabéns, Sergei!

Sergei (*) acaba de publicar este saboroso livro de pequenas «histórias de compadres» que, felizmente, conseguem fugir ao estereótipo das histórias de alentejanos. Na sua página (www.sergeicartoons.com), que merece bem uma visita, podem ver-se, além de inúmeros cartoons, caricaturas e anedotas (seus e de convidados), a totalidade das tiras que compõem este livro - que, naturalmente, também lá pode ser comprado.
Esperemos que, em próximas edições, sejam corrigidas algumas gralhas que podiam ter sido evitadas com uma revisão mais cuidada - mas isso é conversa para outra altura.
(*) O autor, que não conheço pessoalmente, é, no entanto, um velho amigo deste blogue, a ponto de, e por mais do que uma vez, ter feito «caricaturas a pedido» para ilustrar alguns posts.

Corpos e almas

PROPÔS-SE ESTE GOVERNO subordinar o que lhe vai na alma às urgências orçamentais e financeiras que condicionam todos os corpos e almas do regime. A intenção não é nova e até já fez as suas baixas: Durão Barroso tentou o mesmo e desistiu, Santana Lopes quis fingir que não era nada e foi desistido. As dificuldades actuais da oposição de direita não resultam só de PSD e CDS estarem em oposição a uma maioria absoluta, mas também do facto de eles terem perdido a sintonia com o seu eleitorado. Este aceita e quer (globalmente, pelo menos) que se endireite o que estruturalmente se entortou, repondo-se um ponto de partida que permita a saudável e plural competição de todos os programas partidários. E suspeita que a oposição, numa casuística sem rumo nem agenda, apenas quer o fracasso da governação, como se fosse o PS o único a sofrer-lhe as consequências.
Mas, para o Governo e para o PS, não há um cenário de recuo, nem inteligente, nem inteligível. Como na historieta do homem que nada até meio do rio e, por cansaço e receio, volta à margem de partida, para só então se aperceber de que, com o mesmo esforço e risco, teria já passado à outra margem. A lógica de mudança, que a direita nem fez passar do discurso, terá de fazer o seu caminho, mas dentro de parâmetros e salvaguardas que não a comprometem.
Primeiro: a continuidade das políticas sociais que defendam os mais pobres dos efeitos imediatos das reformas. Algo se fez, contra muitas previsões, mas mais se terá de fazer. Segundo: a enunciação de um desígnio para a próxima legislatura que, por já não estar tão subordinado às contingências financeiras, permita ao PS concorrer com um programa próprio e demarcado, e não como mera guarda avançada de uma frente nacional contra a crise. Se estas coisas não forem feitas, o PS que, em 2009, se sujeitasse ao juízo popular não teria uma alma para mostrar e propor ao País.
Boa parte disto joga-se em 2007. Pior: em parte de 2007. Porque a preparação da presidência portuguesa deverá intensificar-se bem antes do mês de Julho e o Ministério dos Negócios Estrangeiros terá de ser apenas o coordenador no terreno de esforços que largamente o transcendem, porque requererão o empenhamento de vários outros ministérios. E a partir daí não há que esperar senão a gestão do curso do que já foi reformado, pois mexer no que é estrutural a um ano de eleições é um lirismo que nem a quadra comporta.
«DN» de 31 Dez 06

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Na terra das Leis-da-Treta

Há algum tempo, mostrou-se aqui esta imagem, acompanhada da seguinte explicação:
Apesar de ser um "prédio de arquitecto", o nº 156 do Campo Grande foi, em tempos, ornamentado com as inevitáveis marquises de alumínio - ficando como se vê na imagem.
Não se conformando com isso, um condómino protestou, e a questão acabou por ir parar a tribunal.
Ao fim de várias sessões, e uma vez provada a clandestinidade da "coisa", o queixoso ganhou a acção (...).
Seguia-se um questionário de resposta múltipla em que se perguntava aos leitores o que achavam que, nesse seguimento, teria acontecido.
Aqui está a resposta - pelo menos tal como era anteontem, 29 Dez 06, às 16h:


30.12.06

Os nossos talibãnzinhos

Na sequência de sucessivos vandalismos, a famosa estátua Eça e a Verdade (da autoria de Teixeira Lopes) teve de ser substituída, no Largo Barão Quintela, por uma cópia em bronze.

O original (com que me deparei, ontem, num recanto envergonhado do Museu da Cidade, ao Campo Grande) está assim:



Lembram-se dos talibans que não descansaram enquanto não destruíram as estátuas de Buda?
Pelos vistos, nós também temos por cá imbecis desses - embora à nossa escala pequenina, é claro...

Num país onde a polícia é a sério



(Env. por JESCA)

Será assim tão difícil apresentar um inquérito decente?

Aqui se vêem 5 inquéritos online - nenhum deles totalmente correcto.
Sistema Pollhost, gratuito: em geral, as percentagens somam 100% - mas nem sempre, como se vê neste caso...
«Correio da Manhã-online»: não interessa saber quanta gente votou?
« Diário Digital»: não interessa saber quanta gente votou?
« EXPRESSO-online»: não interessa saber quanta gente votou?

« PÚBLICO-online»: porque será que, invariavelmente, as percentagens somam 99%?!

Os meus factos e figuras de 2006

Figura nacional do ano: José Sócrates. Poderia ser Cavaco Silva, primeiro Presidente de direita depois do 25 de Abril, só que até ao momento o seu consulado tem sido um aborrecimento. Sócrates está menos fresquinho, mas durante 2006 ninguém o agarrou. Por enquanto, não se percebe qual é a sua maior vocação - mudar ou mandar? Sócrates manda para conseguir a mudança ou apenas muda para mostrar quem manda? A resposta a esta pergunta embrulhada é o que separa um grande líder de um pequeno tiranete. O que será?
Acontecimento nacional do ano: "Apito Dourado". Que a corrupção infesta o futebol é tão evidente quanto ao dia suceder-se a noite. O processo "Apito Dourado" apenas confirma uma evidência, com esta graça adicional: estava em estado comatoso até um livro salgado o vir ressuscitar. A prosa de uma amante ressabiada teve mais força do que o Ministério Público e a Judiciária. Idiossincrasias da justiça portuguesa, que vai chapinhando nas águas da amargura.
Figuras internacionais do ano: Nicholas Stern e Al Gore. O nome de Stern não é propriamente conhecido, mas o autor do relatório sobre o aquecimento global encomendado por Tony Blair corre o sério risco de ficar na História. Pela primeira vez, foi colocado um número nos custos das mudanças climáticas, cada vez mais o grande tema - e a grande preocupação - do século XXI. A coisa é tão importante que até um morto-vivo chamado Al Gore, até há pouco o político mais aborrecido da América, se transformou em guru da causa ambientalista à boleia do documentário Uma Verdade Inconveniente.
Acontecimento internacional do ano: Crise dos cartoons e discurso do Papa em Ratisbona. Os cartoons não mostraram a intolerância da rua islâmica: mostraram, em primeiro lugar, a facilidade com que o Ocidente abdica de valores fundamentais, como a liberdade de expressão. Ironicamente, teve de ser um Papa conservador a colocar as coisas no seu lugar: o Ocidente é o lugar onde a fé hebraica se uniu ao logos grego, e essa é a mais preciosa das nossas heranças.
João Miguel Tavares
«DN» de 30 Dez 06 [PH]

Outros tempos...

Um ano mais dentro dentro de nós

SOMOS PEQUENOS DEMAIS. À mínima avaria ficamos dependentes de quem sabe. E, ainda incipientes e infantes, tacteamos nas tecnologias o arranhar do futuro.
Algumas coisas fomos conseguindo. Os elevadores já possuem memória selectiva; os esquentadores passaram a ser inteligentes; os comboios mais cómodos; os aviões mais seguros. A Medicina prolongou-nos a idade; as auto-estradas rasgaram-nos alcances; o ar condicionado torna-nos mais suportáveis o frio e o calor. Já não concebemos a nossa correspondência com o Mundo sem ser por Internet, rápida, directa e pessoal; sabemos da Guerra e da Paz – infelizmente mais da Guerra que da Paz – no minuto do ataque ou do tratado. Colocamos robótica nas casas, sonares no mar, inovações espantosas na Cirurgia, na Engenharia, na Arquitectura, na Comunicação.
Podemos nascer na China, crescer no Zimbabué, casar no Uruguai, emigrar para o Alasca, trabalhar na Austrália e vir a morrer em São Tomé.
Os horizontes, de facto, alargaram-se. Aprendemos as línguas distantes e difíceis. Vamos de férias ao Vietname, só para conhecer as gentes e a paisagem.
E os anos vão passando, amigos.
A questão é esta – vivemos melhor? Melhorou o Mundo?
Conhecer mais ter-nos-á tornado mais felizes?
Pessoalmente digo-vos que quanto mais conheci, estudei e viajei, mais me convenci que uma tão vasta riqueza e variedade de sítios, culturas e raças não oculta a pequenez acabrunhante da pessoa humana. A nossa colectiva e existencial limitação e finitude. Por isso regresso sempre satisfeito por saber mais. Mas triste por nunca poder abraçar o infinito do saber de que tomo então, se possível for dizê-lo, mais conferida consciência.
Bom ano?!
Confesso-vos uma coisa ao ouvido: não acredito muito em nada. Sou uma ímpia criatura. Embora cheia de grandezas interiores, bons sentimentos e excelentes intenções.
Mas creio, por isso mesmo, numa profunda e imensa religiosidade interior. É o sítio onde se luta por justiça e paz; e sentimentos belos, superiores. E paisagens, e volúpias, e sabores. Numa força gigantesca que a cada dia levanta o Mundo e faz acordar o Homem e a sua peregrina vontade de alcançar e melhorar-se.
É nesse ponto que acho alma e significado neste xadrez de viver. O resto deixou há muito de me interessar. Por isso busco em mim, todos os dias, o mesmo alento.
O tal que já me vai faltando e tanto me cansa, por vezes, convocar. Mas que doeria ainda mais, se uma manhã cinzenta deixasse de me visitar e não chegasse.
Não saberia viver sem essa luta, essa procura.
É nela que reside a força, a vontade, a beleza, a busca, o prazer, o orgulho, afinal, de sermos gente. Porque, para lá do pacote tecnológico de facilidades, há pessoas de carne, desejo e pensamento.
Gente ansiosa – ao nosso lado ou do outro lado do mundo – a gritar dramaticamente que não é mais feliz por lhe injectarem diariamente tais facilidades.
Viver melhor passa instantemente por um mundo de felicidades adquiridas.
Mas a aquisição da felicidade possível passa bem mais profundamente por dentro de nós a cada dia. Nunca a compraremos adquirindo, mas sim sentindo.
Rodeados de tudo podemos ser, ainda assim, a mais infeliz das criaturas.
No recanto secreto de cada um de nós, acalentamos sempre um sonho de ternura por cumprir. É nele que acharemos um viver melhor, segundo creio. Talvez até a Paz.
Tão cheia de difíceis equilíbrios.
Tão necessária. Tão íntima.
Tão merecida.
E talvez aí os anos, tal como nós, fossem realmente melhores.

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29.12.06


Vírus em cartões de Boas-Festas? Não seria o primeiro...

Como toda a gente que tem e-mail, também eu recebo, com frequência, mensagens a anunciar grandes desgraças se não avisar toda a gente acerca de não sei que vírus - quase sempre inexistente.
No entanto, este aviso, tendo em conta quem o divulga, parece credível. Vale a pena, pelo menos, ler a notícia.

http://idgnow.uol.com.br/seguranca/2006/12/29/idgnoticia.2006-12-29.4918574168

Na terra do Faz-de-Conta...

Boato?

Acabei de receber, enviado por JMF, este e-mail:
ATENÇÃO
A GNR-BT, nos auto-stops, começou a fiscalizar os CDs piratas que temos no carro.
Se os CDs não forem originais, ou então se não possuímos o original que deu origem à cópia, a viatura pode ser apreendida e sujeitamo-nos às respectivas sanções.
Retirem urgentemente os CDs piratas do carro, não vá o "diabo tecê-las".
Este controlo foi efectuado este fim de semana, na A1.
Será verdade, ou apenas mais um daqueles hoaxes que, tendo um fundo de verdade, acabam por ser credíveis e se propagam como vírus?

De saudar, evidentemente!

"Post-aberto" das sextas-feiras



Como habitualmente, aqui fica este espaço para quem o quiser utilizar.

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28.12.06

«ACONTECE...»

Na morte de Eduardo Street

MORREU HOJE O HOMEM que dedicou toda a vida ao teatro radiofónico, numa RDP que não o merecia.
No seu livro “Teatro Invisível”, onde está a única história que se escreveu sobre o teatro radiofónico em Portugal, Eduardo Street deixa a memória completa e minuciosa de uma arte moribunda entre nós. Lançado há poucos meses, constitui uma espécie de testamento do que o autor imaginava que pudesse ser o renascimento de um género e de uma velha tradição.
Mas não. O Eduardo morreu, desiludido sem amarguras, resistente sem sarcasmos, impiedoso sem deselegâncias.
Na sua RDP, onde teimou continuar como colaborador mesmo depois de reformado, bravejou até ao fim contra o desprezo a que os directores de antena votavam o “seu” teatro. Recuperou peças do arquivo, encenou textos clássicos e modernos, traduziu e adaptou títulos que jaziam na ignorância dos seus superiores hierárquicos. Depois, quando chegava a hora da emissão, ou não havia lugar na programação, ou arranjavam-se umas gavetas que não ofendessem os novos ventos que fazem da RDP uma rádio cada vez mais desinteressante e cada vez menos de serviço público. Mas ele lá continuava a teimar, sereno, modesto, elegante e… cabeçudo.
Fomos colegas de Direcção na Sociedade Portuguesa de Autores durante dois mandatos. Tínhamos o pelouro da Rádio. Por isso pude conviver longas horas com aquele espírito sempre tranquilo e sempre inquieto. Quantas vezes nos rimos, quantas nos irámos perante o desastre em que caiu, num País imbecilizado, uma das armas mais populares de difusão de ideias e estéticas, como é o teatro na rádio. Pouco depois da saída do seu livro levei o Eduardo ao meu programa de rádio “Acontece” e ali gravei uma conversa riquíssima. Havia pormenores, histórias – sobretudo subentendidos! – que o Eduardo não tinha querido escrever, mas deixou ali contado, na sua voz grave, bem colocada, de verdadeiro homem de teatro. Hoje mesmo ofereci a algumas rádios cópias dessa entrevista, na esperança de que aquele precioso arquivo fosse novamente arejado.

Não, a RDP não merecia a dedicação daquele seu profissional. Não merecia, sobretudo, a sua militância pela causa do “teatro invisível”. Porque uma rádio surda não consegue ouvir vozes inteligentes. Claro que fico numa vaguíssima esperança de que, ao menos por causa desta morte e do coro que há-de levantar-se, de todos os actores e autores, tradutores e sonoplastas que ficaram literalmente órfãos naquela Rádio de serviço público, ao menos por causa disso, se possa abrir um rasgão de bom senso na programação das Antenas do Estado e haja outra vez teatro radiofónico em Portugal. Ao menos na rádio pública. Mas, como digo, não passa de uma esperança vaguíssima.
Tão esfarrapada é esta esperança, quanto o telejornal desta noite - digo bem: o Telejornal, da RTP, a mesmíssima casa habitada pela RDP - pura e simplesmente ignorou a morte de Eduardo Street. Desgraçado homem que não foi futebolista, nem apresentou concursos idiotas na antena do serviço público de televisão. Ou seja: Ninguém o conhecia na RTP. Não teve direito a notícia.

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Vídeos da TVE - Absolutamente a não perder!

Consegui localizar o segundo filme acerca do mesmo assunto.

Como se sabe, a TV Cabo tem feito uma publicidade "difícil de classificar" (passe o eufemismo...) à base de lares que se vão desfazendo porque o dono-da-casa não quer gastar €15.

Este maravilhoso vídeo, da autoria da TVE (!!), mostra que há outras formas - porventura mais sérias - de encarar o público televisivo.


EM ÉPOCAS de muito tráfego, ao ouvir as habituais entrevistas com os homens das Brigadas de Trânsito, fico sempre com a ideia de que as televisões podiam poupar muito dinheiro.
Faziam assim:
Juntavam em estúdio uma dúzia de agentes fotogénicos e bem-falantes, punham em fundo umas imagens de carros amolgados, e, com pouco trabalho, despachavam em meia hora entrevistas que seriam válidas por muitos anos e maus. E isso porque, infelizmente, o que há a dizer é quase sempre o mesmo - com variantes apenas de pormenor:
«Registaram-se mais acidentes, mais feridos e mais mortos do que em igual período do ano passado. O principal motivo foi o excesso de velocidade...».
Claro que seria interessante discorrer sobre a responsabilidade de quem permitiu que fossem - e continuem a ser - dadas cartas de condução a assassinos e suicidas, mas isso é assunto que não cabe aqui, além de que a culpa deve ser... da Sociedade.
O certo é que, para muitos "artistas do volante", qualquer coisa acima de 0 km/h é, de facto, "excesso de velocidade".
Recordo-me de uma pessoa amiga que um dia, em plena Baixa, chocou com um cilindro. Garantia, e falando muito a sério, que a culpa fora do outro...
«EXPRESSO» - 13 Abr 02

27.12.06

Curtas-letragens

Amanhecer

CHEGOU AOS OITENTA sem maiores problemas que os sobressaltos habituais da vida e então o cérebro decidiu fechar-se ao mundo e repousar. João dos Santos caiu num estranho coma e daí se recusou a sair. Os esforços clínicos ao longo de semanas revelaram-se vãos, nenhum tratamento parecia recuperar e nem sequer estimular o cérebro adormecido, até que os médicos aconselharam enfim desligar a máquina de vida mecânica que o assistia e aceitar, com humildade, o destino: a cama e as atenções eram necessárias para outros. A família dividiu-se em opiniões antagónicas, as discussões por vezes azedas substituíram o empenho, a solidariedade, a fé de todos eles na recuperação. No limite foi Dª Ângela que pôs termo às desavenças e aceitou a responsabilidade de o trazer de volta, de lá onde João estivesse.
As visitas dos familiares à casa-mãe sucederam-se a bom ritmo e sem desfalecimentos durante meses, sempre às mesmas horas, sempre com a mesma duração, uma réstia de esperança na despedida, no beijo lançado e perdido entre os cabelos brancos de Ângela. Depois, as visitas foram paulatinamente espaçando-se, encurtando-se, surgindo as desculpas e as impossibilidades, reduzindo as hipóteses de João à presença constante e inabalável de Dª Ângela.
Nunca disse a ninguém o que fazia para além da rotina sanitária e higiénica com o enfermo, como passava as horas debruadas a silêncio e quietude, como as enchia junto do seu João. Era um segredo que ela guardava tão ciosamente como a intimidade mais sagrada dos seus pensamentos: temia, talvez, que se rissem, ou pior, que a forçassem a desistir e a ter de tomar a decisão última que jamais tomaria por si só. E era um belo segredo.
Começou por Camões, os sonetos e as rimas; Sá de Miranda depois, mais tarde os românticos, depois os modernos. Lia-lhe os poemas em voz baixa, ritmo pausado, como se os pensasse antes de ler, só para ele e mais ninguém. O rosto de João permanecia sereno, em paz, como se dormisse uma interminável sesta. Quando Ângela esgotou a modesta biblioteca caseira, repetiu as leituras, escolhendo aqueles poemas de amor que mais a tocavam: e João dormia. Quando finalmente uma sombra de dúvida se instalou por trás do olhar de Ângela, teve a inspiração definitiva: foi ao cofre das cartas, desatou o laço, abriu uma por uma até que encontrou o poema escrito por João para ela cinquenta anos atrás. Sentou-se junto dele, bem perto do rosto sereno, e leu. Leu como nunca, com emoção contida, a tremer de amor. No fim, o seu João moveu os lábios e com um fio de voz pediu: ‘lê-mo outra vez’.

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Dias demarcados

Vale a pena atentar bem nos termos desta notícia:
Se a GNR promete ser absolutamente inflexível numa coisa de tal gravidade, é porque não costuma sê-lo. Além disso, somos informados de que esse rigor é só para cinco dias.
Se a moda pega, a juntar às zonas demarcadas (que são as estradas da «Tolerância Zero» - onde é preciso cumprir a lei!), vamos passar a ter dias demarcados...
Continuem assim, que vão bem!

Outros tempos... - 14

Já que falámos de claques...

Mil e uma vozes

A RTP LEVANTA-SE CEDO para cumprir o serviço público. No passado dia 24, véspera de Natal, às 9 da manhã, deu o concerto “Mil Vozes na Catedral”, com um milhar de jovens da Europa a cantar cânticos populares, religiosos, pequenas peças de grandes compositores. Um evento exemplar que ajuda a perceber o espírito da Europa, a compreender o significado de cooperação, a valorizar a palavra educação e a bem simbolizar cultura.
Este concerto é transmitido através da Europa em horário nobre, para um público familiar transversal, constituindo um marco como o concerto de Ano Novo de Viena. Claro que transmiti-lo às 9 da manhã liberta o “primetime” para a pimbalhada.
Vi o concerto todinho. Não só porque gosto, mas também para ouvir os jovens portugueses, que os há a poderem representar-nos bem. Qual quê? Russos, checos, alemães, italianos, suíços, espanhóis, cipriotas, ingleses, gregos, polacos, irlandeses, húngaros, letões, franceses e lituanos, digam mais, que estavam lá. Portugueses é que não mostraram um. Por fim, esperei os “No Name boys”, “Diabos Vermelhos”, “Juve Leo”, os “SuperDragões”. Nem esses. Foi falta de verba, com certeza.
«25ªHORA» - «24 horas» de 27 Dez 06

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26.12.06

O "itenerário" misterioso

NÃO SEI se o IC2 liga Lisboa ao Porto. O que sei é que não é nenhum itenerário, independentemente de, por lá, costumar - ou não - haver acidentes de aviação...


Erros ou brincadeira - vá lá saber-se...

HÁ DIAS, encontrei na Internet este anúncio atafulhado de erros, motivo pelo qual era exposto aos cibernautas:

Como cheirava a exagero, resolvi verificar:

Afinal, estava tudo bem. Terão os erros sido, entretanto, corrigidos ou a empresa foi, apenas, vítima de uma brincadeira de duvidoso gosto - como outras que aqui já foram referidas?

Outros tempos... - 13