30.6.20

No "Correio de Lagos" de Jun 20

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O PORTUGAL QUE AINDA SOMOS

Por A. M. Galopim de Carvalho
A propósito do momento político que estamos a viver pergunto: como é que a democracia consente o crescimento de um poder que a irá destruir? O protagonismo que, em especial, as televisões estão a dar ao partido neonazi (a cumprir muito bem o seu papel) está a dar-lhe, precisamente, o que ele pretende: - crescer.
A resposta só pode ser uma: elevar o nível cultural e civilizacional dos cidadãos.
“Fomentar o pensamento crítico, criativo e independente, contribuindo assim para a promoção da tolerância e da paz”, está contemplado no teórico e ilusório propósito oficial da nossa escolaridade obrigatória, agora de 12 anos.

Basta ler os textos de alguns dos responsáveis pelo nosso ensino para verificar que assim é. A verdade é que continuamos a ser um povo em que ainda são muitos os desinteressados pelos valores da ciência e da cultura, alienados pelo “jogo da bola” e outro venenos, e em que muitos militantes e a maioria dos simpatizantes dos partidos políticos desconhecem os fundamentos das respectivas ideologias. Basta, aquando dos congressos partidários, estar à entrada e entrevistar os participantes que vão chegando.

A Revolução de Abril, escancarou as portas, os portões e as janelas ao conhecimento dos mais variados temas das culturas científica, humanística e artística. Mas a grande maioria do povo (a maioria que dá vitórias em eleições) continua a viver de costas voltadas para estes valores, entretida com futebol e três televisões que nos entram portas adentro, duas delas, privadas, essencialmente vocacionadas no lucro (o que não choca, como empresas que são e garantem trabalho a muita gente) e uma, pública, paga por todos nós, que “dá ao povo aquilo de que o povo gosta” e que, assim, não sai da incultura em que cresceu, vive e vai despedir-se deste mundo. É de justiça dizer que não é o que se passa com a RTP2, com propostas muito louváveis, mas que, infelizmente, não conseguem captar audiências.
Não obstante os belos propósitos, que eu diria falhos de convicção, de responsáveis pelo ensino como, por exemplo o que diz que “a escolaridade obrigatória estabelece que um aluno, no final dos respectivos 12 anos, esteja “munido de múltiplas literacias que lhe permitam analisar e questionar criticamente a realidade, avaliar e selecionar a informação, formular hipóteses e tomar decisões fundamentadas no seu dia a dia”, a verdade é que, com as sempre existentes, mas raras excepções, são muitos os rapazes e as raparigas, que pouco ou nada leram, que chegam à universidade, falhos de todas as culturas, sem saberem escrever português.
Entre os objectivos da referida escolaridade pretende-se que o jovem, cumprida a escolaridade obrigatória, “seja livre, autónomo, responsável e consciente de si próprio e do mundo que o rodeia”, mas basta ver a elevada percentagem de abstenções nos actos eleitorais, para constatar a falência deste nobre propósito.
Os programas oficiais estabelecem que, nas diferentes áreas de competências, os alunos aprendam a “colaborar em diferentes contextos comunicativos, de forma adequada e segura, utilizando diferentes tipos de ferramentas (analógicas e digitais), com base nas regras de conduta próprias de cada ambiente”. Um belo e elevado propósito que não teve e continua a não ter realidade visível na média dos nossos cidadãos e cidadãs. O que salta à vista nos dias que correm e nesta geração de adolescentes, que teve e tem o privilégio de fruir da condição de estudante, é o uso obsessivo dos telemóveis, onde quer que estejam e seja a que horas forem.
Ninguém da geração dos homens e mulheres com mais de 60 anos duvida que a revolução iniciada com o 25 de Abril nos trouxe grandes progressos materiais e sociais, por demais apontados pelos profissionais do comentário e das análise políticas, aos quais não pretendo acrescentar nada que eles não saibam. Mas há um sector para o qual basta estar atento para se ter opinião. Pouco ou nada mudámos nas mentalidades.
Vimos um vislumbre de um real propósito de elevação do nível cultural dos portugueses no fugaz e efémero programa da 5ª Divisão de Estado-Maior-General das Forças Armadas, logo após a Revolução dos Cravos, chefiada pelo saudoso primeiro-tenente médico Ramiro Correia, mas não vimos nada que se lhe comparasse em nenhum dos governos constitucionais destes quarenta e quatro anos de democracia. À semelhança do sempre esquecido mundo rural, as nossas cidades têm, ainda, uma lamentável percentagem de analfabetos funcionais, a par de uma classe média a que a escola deu diplomas mas não deu cultura nem o gosto pelo saber, marcada pela iliteracia de quase tudo, alienada, como disse atrás, pelo futebol e pelos programas televisivos de entretenimento que nos impõem e nos entram pela casa dentro a toda a hora.
Com um povo assim, não admira assistir ao crescimento, ou melhor, ao reaparecimento da extrema direita, a mesma que matou a democracia e nos privou da liberdade e nos manteve em pobreza nos quarenta anos do Estado Novo. Basta pensar em Trump e Bolsonaro para ver como é que um povo inculto se deixa arrastar por populismos e tudo o que eles escondem.
A classe política, particularmente interessada nas lutas pelo poder, esqueceu de facultar, aos cidadãos, cultura civilizacional e humanística, Assim, continuamos a ser o mesmo povo que, embora materialmente mais avançado, permanece maioritariamente alheado dos valores da democracia e do conhecimento científico e cultural, o mesmo povo que a minha geração viu encher Praças, como a do Comércio, em Lisboa, ou a da Liberdade, no Porto, com vivas a Salazar.
Termino com outra pergunta: como é que, em democracia. um partido antidemocrático, que, todos sabemos, nega a liberdade, pode crescer e, até, conquistar o poder? Foi o que aconteceu na Alemanha, em 1933

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29.6.20

REFLEXÕES SOBRE O ENSINO DA GEOLOGIA NO BÁSICO E NO SECUNDÁRIO

Por A. M. Galopim de Carvalho
Mesmo durante os 40 anos em que ensinei nas licenciaturas em Geologia, na Faculdade de Ciências de Lisboa e nas Universidade do Algarve e dos Açores, e na licenciatura em Geografia na Faculdade de Letras de Lisboa, nunca deixei de estar muito próximo das nossas escolas, agora ditas do básico e do secundário. Quer como orientador de estágios pedagógicos, anos a fio, quer proferindo palestras e dando aulas, a convite dos professores, por todo o País, de Norte a Sul, nas Ilhas e, até, em Macau. Continuo a fazê-lo por dever cívico, independente de tutelas, pelo que me sinto capacitado para partilhar com os leitores as reflexões que aqui deixo à atenção dos interessados.
Num país, como Portugal, onde a investigação científica e o ensino superior da Geologia estão ao nível dos que caracterizam os países mais avançados, é confrangedor assistir à iliteracia neste domínio do conhecimento da quase totalidade dos portugueses, incluindo os das classes sociais ditas cultas, e constatar a pouquíssima importância, nos ensinos básico e secundário, deste mesmo domínio científico, essencial como motor de desenvolvimento, mas também como componente da formação cultural do cidadão.
De há muito que venho alertando, em textos escritos e em conversas públicas, para a pouca importância dada ao ensino da Geologia nas nossas escolas dos ensinos básico e secundário. Isto porque, em minha opinião, quem decide sobre o maior ou menor interesse das matérias curriculares, parece desconhecer que a geologia e as tecnologias com ela relacionadas estão entre os principais pilares sobre os quais assentam a sociedade moderna, o progresso social e o bem-estar da humanidade. 
As minhas repetidas e insistentes diligências junto dos sucessivos governantes, no sentido de inverter esta deplorável situação, nunca surtiu efeito, o que é desesperante e lamentável.
Exceptuando aqueles que, por formação académica e profissional, possuem os indispensáveis conhecimentos deste interessante e útil ramo da ciência, a generalidade dos nossos ministros, secretários de estado e deputados não conhecem nem a natureza, nem a história do chão que pisam e no qual assentam as fundações dos edifícios onde vivem e trabalham. Uns mais, outros menos, sabem o que neste território se passou desde a fundação da nacionalidade, centenas de anos atrás, mas muitíssimo pouco ou nada, sobre os milhões de anos de história deste torrão que é o nosso. 
Não sabem que o lioz, ou seja, a pedra calcária usada na cantaria e na estatuária de Lisboa e arredores, nasceu num mar que aqui existiu há cerca de 95 milhões de anos, um mar muito pouco profundo e de águas mais quentes do que as que hoje banham as nossas praias no pino do verão. Não sabem que o basalto das velhas calçadas da capital brotou, como lava incandescente, de vulcões que aqui extrudiram há uns 70 milhões de anos, nem que o granito, a pedra que integra o belo barroco da cidade invicta, tem centenas de milhões de anos. Não imaginam que o Tejo já desaguou mais a Sul, por uma série de canais entrançados, numa larga planura entre a Caparica e a Aldeia do Meco. Não sabem que a serra de Sintra é o que resta de uma montanha bem mais imponente e ignoram que, por pouco, não rebentou ali, há uns 85 milhões de anos, um grande vulcão. 
Sou levado a pensar, e não estou só nesta ideia, que grande parte da confrangedora situação que caracteriza o ensino da Geologia em Portugal radica, precisamente, no conjunto dos que, pedagogicamente têm assessorado o Ministério da Educação neste domínio. Nunca conheci nenhum destes elementos, mas é a eles e, também, necessariamente, a quem lhes foi dando posse, que se deve este estado de coisas que, oiço dizer, não é exclusivo da disciplina pela qual me venho batendo há décadas.
É, pois, preciso e urgente olhar para esta realidade do nosso ensino. É preciso e urgente que o Ministério da Educação chame a si meia dúzia de professores desta disciplina capazes de proceder à necessária e profunda revisão de tudo o que se relacione com o ensino desta área curricular, a começar nos programas, passando pelos livros e outros manuais escolares, pela formulação dos questionários nos chamados pontos de exame e, a terminar, na conveniente formação dos respectivos professores.
A imagem que aqui mostro (capa de uma publicação do Gabinete de Avaliação Educacional, do Ministério da Educação) confirma o que ando a dizer há anos: Mercê dos programas, dos manuais usados, das orientações superiores e do tipo de exames, os professores, em vez de poderem ensinar e formar cidadãos, são levados a "amestrar" os alunos a acertar nas questões que lhes são colocadas nos exames. É bom para as estatísticas, mas é mau para os alunos e para o País

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28.6.20

Grande Angular - Corrupção e democracia

Por António Barreto
Notícias recentes, quase em sequência, marcaram a retoma gradual de actividade na área da Justiça. Depois de uma espécie de hibernação misteriosa, os processos relativos ao BES, a Sócrates, à EDP, às Parcerias Público Privadas e a outros temas delicados deram sinais de vida. Ainda nos encontramos em fase de intensidade processual, de recursos, de diligências de recusa e de manobras de diversão, mas houve movimento, o que de imediato se saúda.
Directa ou indirectamente, estão em causa aspectos essenciais da vida portuguesa: a corrupção, o nepotismo, o tráfico de influências e o favoritismo. São problemas fáceis de avaliar: todos são contra. Quando aprofundamos um pouco, damo-nos conta de que quase todos são contra os pecados dos outros! Os dos próprios, simplesmente, não são pecados. A corrupção do adversário é péssima, a do aliado tem explicação. O nepotismo dos rivais é condenável, o dos amigos tem justificação. O tráfico de influências dos concorrentes é detestável, o dos correligionários é confiança política.
O pior de tudo é a banalização da corrupção. A normalidade do nepotismo. A democratização do tráfico de influências. Por outras palavras, o que se faz não é corrupção, não é nepotismo, nem é tráfico de influências. Terá outros nomes: eficácia, confiança política, prontidão, proximidade, justa recompensa e até direito legítimo. Mas, muitas vezes, não são. Trata-se de eufemismos destinados a encobrir realidades bem mais sórdidas.
Ora, é esta normalidade que está na origem e na perenidade da corrupção habitual e da justiça impotente. É, por exemplo, uma tradição consolidada: o uso do poder político para fazer e desfazer empresas ou fortunas, obter concessões e autorizações, proporcionar empréstimos e alimentar grupos económicos!
A democracia encontrou uma fórmula consagrada, “é o poder político que manda no poder económico”. “O primado do poder político” faz com que se admita um poder político discricionário relativamente ao poder económico. Ou ao poder social ou cultural, se é que tais entidades existem. O “primado do poder político” poderia entender-se como o “primado do soberano”, ou da decisão do povo, mas não como o primado funcionários, deputados ou membros do governo. Na verdade, o primado do soberano não é a mesma coisa do que o primado do burocrata executivo.
Em ditadura ou em democracia, com economia de mercado ou sob dirigismo estatal, os procedimentos informais, a meio caminho entre o nepotismo e a corrupção, sempre informaram a sociedade e a política portuguesas. Nunca ou raramente a justiça foi intolerante, quase sempre a religião foi condescendente e jamais a política condenou tais comportamentos. As famílias e as profissões também não. Os adversários deste sistema, que os há, são tantas vezes impotentes! E os progressos, por vezes reais, tão lentos!
Absolutistas e liberais; monárquicos e republicanos; católicos e maçónicos; democratas e socialistas; fascistas e comunistas; todos aceitaram regras ocultas de base. Primeira: é o poder político que define, alimenta e protege o poder económico. Segunda: o trânsito entre o poder político e o poder económico é fácil. Terceira: um partido político vencedor de eleições tem o direito de recorrer à “confiança política”, a fim de proceder a nomeações, conceder autorizações e tomar iniciativas de investimentos. Quarta: os processos de corrupção e nepotismo têm desculpa, se for para o “bem comum”, como sejam a criação de emprego, a promoção de minorias e a protecção do sistema político.
poder político tem usado todos os dispositivos imagináveis: roubo, esbulho, expropriação sem indemnização ou com esta calculada pelas autoridades… Alvarás, autorizações, licenças para criação de empresa, ocupação de posição no mercado, protecção da concorrência, “condicionamento” industrial, financiamentos bonificados e fixação de margens: todos estes mecanismos elaborados para conter o mercado, regular a concorrência, evitar as falências ou os desastres económicos, tiveram como resultado favorecer grupos do poder económico e interesses de titulares de poder político. O “cambão” empresarial e a “confiança política” são as duas grandes chagas da sociedade, da economia e da política.
Os últimos anos, talvez duas ou três décadas, têm assistido a algumas iniciativas (leis, instituições, regras europeias…) no sentido de “moralizar” os ímpetos, mas nunca erradicaram as tradições que criaram o Estado fazedor de poder económico, nem o poder político de “confiança”. A categoria espanhola dita dos “amigos políticos” é exactamente isso, a “confiança política”. Só que em Portugal a “confiança política” figura explicitamente nas regras e na tradição.
Mais do que o interesse imediato ou a ambição, mais do que o bairrismo dos vizinhos ou a parceria dos cúmplices, há um espírito e um clima que inspiram comportamentos perante os quais soçobra a lei. Os ricos pensam que tudo lhes é permitido, por serem ricos. As “pessoas bem” acham que devem ter o que querem, porque é assim. Os militantes dos partidos, sobretudo os que ganham eleições, entendem que a democracia é isso mesmo, uma distribuição de despojos. Os sindicalistas crêem que a democracia foi feita para os trabalhadores, o que se deve traduzir em vantagens. Os católicos aceitam que o povo de Deus deve receber os devidos benefícios, porque é natural que assim seja. Os maçons não têm Deus nem Mestre, mas devem ter privilégios, porque deles é a virtude cívica. A esquerda entende que a política deve comandar a economia. A direita não acha errado que a política se possa submeter à economia.
É este espírito que faz com que seja natural que os seus ajudem os seus. Que as tribos e as comunidades tenham a sua força. Jovens, mulheres, negros, velhos, doentes, trabalhadores, minorias e cultos acreditam piamente que todas as medidas e todos os gestos que desfaçam desigualdades e que promovam antigos oprimidos e explorados têm absoluto fundamento.
O problema é ter a certeza de que, quando não houver tribos nem comunidades, quando não houver pessoas do mesmo grupo ou com a mesma crença, quando só houver gente da mesma condição, quando tivermos a igualdade total, nessa altura, estaremos a viver em plena ditadura totalitária. E teremos uma sociedade sem corrupção. E sem liberdade.
Público, 28.6.2020

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27.6.20

«É a Economia, estúpido!» (*)

EMBORA a C. M. de Lagos tenha decidido que os parques infantis e biossaudáveis deviam encerrar para evitar a propagação do Coronavírus, o certo é que os três do Parque da Cidade se mantiveram escancarados até ao dia 6 de Maio, como aqui se referiu no mês passado. 

Como se não bastasse terem decorrido sete longas semanas desde a declaração do Estado de Emergência até que fossem colocadas fitas dissuasoras, ainda foi possível assistir à sua remoção por grupos de ADULTOS, que se permitiram fazê-lo ostensivamente! 

A partir daí, a situação foi-se sempre degradando, com os parques a serem utilizados como se não estivéssemos até em Estado de Calamidade — tudo facilitado pelo facto de, já há anos, terem sido quebrados os fechos das portas dos parques infantis.

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INDIVÍDUOS como esses costumam argumentar que “morre mais gente de gripe sazonal” do que de Covid-19. Talvez não saibam que existem 7 coronavírus, 4 benignos e 3 letais. O da gripe sazonal faz parte dos primeiros, e para ele já existe vacina; ao invés, o da Covid-19 (o SARS-CoV-2) é um dos segundos, pelo que é incorrecto, quando não mesmo desonesto, considerar que se equivalem, não só em termos de SAÚDE, como de ECONOMIA.
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IMAGINE-SE, p. ex., uma fábrica que faz parte de um “cluster” industrial, e onde aparecem uns quantos trabalhadores com gripe sazonal. O que sucede? Simples: irão para casa e voltarão quando estiverem recuperados; mas, entretanto, a actividade da empresa prosseguirá. E se, por qualquer motivo, um deles morrer? Bem... certamente, alguns colegas irão ao funeral e haverá uma referência no obituário da casa; mas, também nesse caso, a produção não deverá sofrer interrupções de maior.
Imagine-se agora que, em vez de uns quantos trabalhadores com a gripe sazonal havia um — e apenas um! — que morria com Covid-19.
Ah!, nesse caso, tudo seria bem diferente pois, como a doença só se manifesta ao fim de alguns dias, seria altamente provável que ele tivesse, entretanto, desencadeado uma cadeia de contaminações, e não apenas no seu local de trabalho; e então, com os testes e quarentenas que se seguiriam, tudo ficaria de pantanas, afectando inclusivamente a empresa-mãe, mesmo que nela não tivesse havido um único infectado.
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TODOS sabemos que esse exemplo não é ficção. Mas então como se explica o referido estado-de-negação relativamente ao flagelo com que o mundo está confrontado?
As explicações são várias: antes de mais, existe a ideia generalizada de que a doença só é perigosa para os velhos; depois, surgiu uma barragem de “fake news” (com origem e motivações bem conhecidas), intimamente relacionada com o facto de a situação obrigar a uma escolha POLÍTICA entre SAÚDE e ECONOMIA — uma quadratura-do-círculo onde todos os países esbarram, pois sem saúde a economia fica fragilizada, e sem uma economia saudável não haverá dinheiro para a saúde. E isso tem levado muito boa gente a um estado de esquizofrenia, como quando, no dia 16 de Maio, António Costa apelou para que se saísse à rua, enquanto, no dia seguinte, uma resolução do seu Conselho de Ministros dizia exactamente o contrário! 
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À DATA em que escrevo, a zona de Lisboa e Vale do Tejo debate-se com um inesperado surto de Covid-19 que se traduz em centenas de novos casos por dia. Pelo contrário, Lagos continua a ser poupada, uma realidade que para nós não tem preço, pelo que há que a preservar a todo o custo, evitando facilitismos tontos, pois o perigo continua à espreita, não faltando quem queira vir para cá — menos por amor à nossa terra do que para usufruir das vantagens de um “porto seguro” que, até agora, Lagos tem sido.
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(*) – Frase criada por James Carville, o estratega da campanha de Bill Clinton nas eleições de 1992 contra George Bush (pai).
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C. Medina Ribeiro
“Correio de Lagos” de Jun 20

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26.6.20

UMA AULA MAGISTRAL

Por Joaquim Letria
Marcelo Rebelo de Sousa deu uma aula sobre cidadania na actual Telescola, transmitida pela RTP. Tal como um aluno diligente assisti à aula do Chefe do Estado. E gostei muito. Pelo conteúdo da mensagem, pela forma de apresentação e pelo que este simples gesto encerra. Foi uma aula magistral.
Aprendi alguma coisa nova? Talvez não, mas arrumei ideias, confirmei juízos e apreciei a atitude do Presidente da República ao se disponibilizar a colaborar numa aula para os portugueses mais jovens e para aqueloutros, como eu, que admirando-o fizeram questão de assistir. https://www.youtube.com/watch?v=BptdR-W893o
Como se poderia esperar, surgiram logo os críticos a dizer mal. Natural. E o que é que eles dizem? Antes de mais que Marcelo nem a Telescola desdenha para fazer a sua campanha eleitoral. Depois, que os jovens alunos, coitados, tiveram de aturar o Presidente a falar de coisas fora do currículo das disciplinas que ali estudam por aquele meio de ensino à distância. E disseram mais umas coisas que o bom senso e a boa educação aconselham a não reproduzir. Imagino o chorrilho das redes sociais… 
Que mais posso eu acrescentar? Bom, para começar que Marcelo falou, dum modo muito interessante, da vida, das dificuldades e das experiências de vida que os mais jovens estão a ganhar para toda a sua existência ao viverem os tempos difíceis que atravessamos sem fim à vista e, perante tal realidade qual o espírito e o comportamento que os deve marcar. Coisas de que muitas vezes pais e professores se esquecem de falar.
Marcelo não fez campanha, foi didáctico e interessante, como de resto sempre foi na sua vida de Professor Catedrático da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. E comunicar também nunca foi um problema para ele, como nos podemos recordar dos seus comentários durante anos na TV.
Houve ainda quem dissesse que a experiência da Telescola actual vai tão mal que teve de recorrer à ajuda de Marcelo neste acto de propaganda. Nada mais falso: o êxito das aulas do tele ensino é tal que ultrapassa as audiências do programa da Cristina Ferreira e do Manuel Luís Goucha.
Para terminar, deixem-me que lhes diga que trabalhei anos com o Presidente Eanes, de quem fui porta-voz, e conheço alguma coisa da vida da Presidência da República. Não votei em Marcelo, de quem sou amigo pessoal, mas entendo que é um extraordinário e raro Chefe de Estado. E deixem-me acabar como comecei: a aula de Marcelo na Telescola foi uma aula magistral!
Publicado no Minho Digital

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25.6.20


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O padre António Vieira e a iconoclastia

Por C. B. Esperança

O padre António Vieira, cuja vida percorreu quase todo o século XVII (1608/97), numa época em que a longevidade era rara, é um dos mais lídimos paladinos da língua portuguesa.
Os seus sermões constituem a apoteose do barroco na história da literatura portuguesa, o triunfo de um género a que o génio imprimiu a beleza, a coerência e a grandeza com que delicia os leitores, ainda hoje.

Vieira usou as palavras como Bernini o mármore e cinzelou-as com o fulgor da erudição e a força das convicções. Quem nunca leu Vieira não entenderá a grandeza do orador e o brilho do pensador que estendeu ao labor epistolar.
No campo das ideias, por mais difícil que seja entender como pensava um intelectual há quatro séculos, é consensual que foi defensor dos direitos humanos, na luta contra a exploração dos indígenas, e, mais tarde, contra a Inquisição, de que foi o alvo apetecido, salvo pela sorte e proteções pontifícia de que gozou.
Trouxe hoje à colação a figura ímpar do padre António Vieira pela vandalização da sua estátua, em Lisboa. Já em 2017 houve uma manifestação contra o ‘esclavagista seletivo’ junto à estátua que foi agora alvo da fúria mimética de quem possivelmente não leu um único sermão, uma só carta, e ignora a biografia do estatuído. Saberiam porventura tais imbecis que António Vieira defendeu os judeus, a abolição da distinção entre cristãos-novos e cristãos-velhos e a abolição da escravatura? Ou que foi um insigne diplomata?
Sou dos que aceito, no calor de uma Revolução, quando há vítimas do despotismo, as manifestações predatórias contra os símbolos da repressão. Entendo que, num contexto democrático, as estátuas dos ditadores e cúmplices deviam, por pudor, ser guardadas em vez de expostas, tal como os nomes dos facínoras exonerados da toponímia.
O que não pode, em período de normalidade democrática, é consentir-se a vandalização do património, o julgamento popular da iconografia, a delapidação dos símbolos de um passado, misérias e grandezas cuja história se procura reescrever em cada novo regime ou ao sabor de talibãs que se arvoram em defensores da virtude e dos bons costumes.
Não estão em causa opções políticas, são casos de polícia a exigir julgamento.
Claro que há estátuas afrontosas, como a do cónego Melo, em Braga, ou insólitas, como a do Papa João Paulo II, em Coimbra, mas não é na sua vandalização que se faz justiça, devendo a primeira ir para o arsenal da Câmara e a segunda trasladada para Fátima.
O que é válido para clérigos, a que me conduziu a figura do padre António Vieira, serve também para a iconografia de militares, políticos, escritores ou quaisquer outros onde o nosso país não é particularmente rico.
No caso em apreço senti repulsa e desprezo pelos energúmenos sem sensibilidade nem gabarito cultural ou ético para julgarem a escultura de que o padre António Vieira não precisava para ser um dos mais altos paladinos da língua portuguesa.

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24.6.20

No "Correio de Lagos" de Jun 20

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22.6.20

No "Correio de Lagos" de Jun 20

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Grande Angular - O Banco de Portugal e as tentações

Por António Barreto
Tanto foi dito e escrito! O caso parece estar arrumado. Mas não está. A saída de Centeno e a sua substituição no Ministério das Finanças, assim como a nomeação do futuro governador do Banco de Portugal, são assuntos de primeira importância transformados em querelas obscuras. É pena que assim seja. A questão é séria e o mistério criado traduz desprezo pela opinião pública. Era o momento adequado para discutir a questão das funções dos bancos centrais e de ver o que a política do euro fez de útil e o que não fez ou deu mau resultado. Era também o momento para ver melhor o comportamento do BCE, do Banco de Portugal e do governo em questões tão difíceis como as do BES, do BPN, do BANIF, de Angola, do Montepio, das PPP e da crise da dívida soberana. Mas não. Não aproveitámos a oportunidade e agora já é tarde.
É possível que a saída de Mário Centeno, em plena pandemia e no início de uma crise económica inevitável, tenha justificações. É possível mas não parece. Mário Centeno não se mostrou incompetente nem pusilânime a ponto de justificar o seu afastamento. Pelo contrário, revelou serenidade e competência.
Estranha-se que num período tão difícil como este o Primeiro-ministro dispense o contributo de um ministro com o prestígio internacional e a popularidade nacional deste. Não é fácil perceber que um governo não esteja interessado em manter o seu ministro como presidente do Eurogrupo. É verdade que estes cargos (Comissão, Banco central) muitas vezes prejudicam, mais do que favorecem, os países de origem dos titulares. Mas o desempenho por um nacional gera algum respeito.
Também não nos é dado perceber que um ministro, no auge da sua acção, solicite a demissão. A não ser que tenha perdido o apoio do Primeiro-ministro. Se há razões pessoais para esta demissão, não ficamos felizes com o facto, porque em boa parte muitas das razões pessoais são desprezíveis (inveja, ambição, receio…).
Como é evidente, um ministro que conseguiu o que Centeno conseguiu seria da maior utilidade nesta nova crise. Se a substituição foi motivada por razões pessoais aceitáveis, seria bom que tal se soubesse, mesmo sem desvendar o pormenor. Mas temos de reconhecer que tudo foi feito, por Costa e Centeno, de modo a afastar essas razões e a deixar intactas as suspeitas de que se trata de motivos inconfessáveis ou de razões políticas que nos deixam inquietos.
A hipotética ida de Centeno para o Banco de Portugal afasta razões pessoais e deixa intactas as políticas. Como elimina possíveis razões técnicas: na verdade, a liderança do Banco é tão exigente quanto a de um ministério. As reacções de certos sectores políticos eram de prever. Uns consideram incompatível a saída directa do ministério para o banco. Outros chegaram mesmo a elaborar uma proposta de lei para tal proibir. O que é estranho. Aprovar uma lei à lufa-lufa, dirigida a uma pessoa, é gesto condenável. Talvez mesmo inconstitucional. O que alguns deputados tentaram fazer contra Mário Centeno foi isso mesmo: um gesto de despeito político e de ignorância jurídica. O que impressiona é que haja tanta gente disponível para subscrever o disparate.
É preferível nomear um Governador sem responsabilidades políticas recentes, dado que tal garante talvez um pouco mais de independência. Mas esse trânsito não é crime. Nem inédito. Catorze Governadores (num total de dezassete) foram ministros ou secretários de Estado das Finanças, da Economia, da Agricultura, do Ultramar e dos Negócios Estrangeiros. Na Monarquia, na República, na Ditadura, no Estado Novo e na Democracia, só três não foram membros do Governo. Parece ser a regra, com poucas excepções. O actual governador, Carlos Costa, é mesmo um dos raros que não foram antes ministros de coisa nenhuma. A regra é a de ter sido ou vir a ser ministro. Ou as duas coisas, antes e depois.
Do sector público para o sector público: esta transferência parece aceitável. Ou pelo menos não é condenável imediatamente. O preferível é que não fosse um costume, que houvesse gente suficiente. Mas, com uma classe política tão curta e com dedicações exclusivas tão reduzidas, é inescapável que haja esta circulação. Esta é mil vezes preferível à porta giratória do Estado para a privada, do governo e da Assembleia para as empresas privadas.
A circulação entre Governos, bancos nacionais, Banco Central Europeu, Fundo Monetário e Banco Europeu de Investimento não parece muito inconveniente. Nada comparável às grandes circulações com as consultoras e as empresas financeiras mais famosas do mundo, que desempenharam papel importante em Portugal, que determinaram decisões, que deixaram passar da privada para a pública e vice-versa… Verdade é que há quem queira atacar Centeno pelo seu papel no governo e nas finanças públicas. Tenha ou não cometido erros, Centeno vai ficar na história das finanças públicas portuguesas.
Tal como ficará Carlos Costa, deixado sozinho durante os casos gravíssimos do BES, da Troika, da crise financeira internacional e da crise da dívida soberana, com governos a assobiar para o ar. O actual Governador, homem honrado, sai sem uma palavra de gratidão, merecida, dos poderes que o quiseram utilizar. Em condições de extrema dificuldade, foi um exemplo de serviço público. Um Alto Funcionário de integridade pessoal e institucional. Un Grand Commis d’État!
Há governadores de bancos centrais para todos os gostos, designados pelos governos, chefes de Estado, parlamentos e accionistas. E por combinação entre vários poderes. Cada país tem os seus costumes. Há mesmo quem faça concursos abertos e admita candidatos estrangeiros, como foi o caso do Banco de Inglaterra. O nosso sistema é o que é. Com a ajuda do Presidente e do Parlamento, é o governo que tem a palavra decisiva na nomeação. Mas a influência do Banco Central Europeu é grande. Depois de nomeado, o governador depende mais do BCE do que de qualquer entidade portuguesa. A ponto de se poder considerar que os bancos nacionais são sucursais do banco europeu.
Apesar de tudo, o Banco de Portugal é apetecível. Pode ser uma formidável arma de ameaça, vigilância ou cumplicidade com o sistema financeiro, a banca e a política monetária. Uma boa parte dessas esperanças são ilusórias, dado que, com o Euro, uma ingerência do governo no banco central paga-se caro.
A força das instituições cria-se com legislação que as preserve, com funcionários dedicados, com uma população que as respeite e com dirigentes à altura. O que dependia de Carlos Costa foi cumprido.
Público, 21.6.2020

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21.6.20

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20.6.20

No "Correio de Lagos" de Jun 20


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19.6.20

HÁ BASALTOS E BASALTOS - À atenção dos professores do Secundário.



Por A. M. Galopim de Carvalho
Talvez que, por obediência ao programa oficial, os alunos tenham de “saber dizer” o que é o basalto, o professor que os ensina deve saber muito mais. E esse muito mais é uma minúscula parcela do conhecimento científico ao nosso dispor.
Na Antiguidade, os gregos chamavam-lhe “basanites”, nome proposto por Teofrasto (372-287 a.C.), com raiz no termo “basanos” que, entre eles, referia toda a pedra negra, dura e compacta, usada pelos ourives como “pedra de toque”, de que é exemplo o lidito.
Um parêntese para dize que o lidito é uma rocha siliciosa microcristalina (como o sílex, conhecida entre os profissionais por cherte) negra, devida a impregnação de matéria carbonosa, descrita na região de Lydia, na Ásia Menor (Turquia). 
Na sua História Natural, o romano Plínio, o Velho (23-79 d.C.) usou a versão “basaltes” para dar nome ao “mármore negro”, assim se designava vulgarmente o basalto, uma vez que toda a pedra usada em cantaria era, então, conhecida por “mármore”. Foi, pois, ao latim, que fomos buscar a nossa palavra “basalto”. Muito mais tarde, na Alemanha, Agricola (1494-1555), reconhecido pioneiro da mineralogia e da geologia, usou o termo “Basalt” para referir a pedra negra, compacta, de Stolpen, na região de Dresden, Alemanha. O termo “basaltóide”, criado por René Just Haüy, em 1822, para referir o basalto negro do Egipto, é hoje um nome geral atribuído às rochas vulcânicas afins do basalto.
Vocábulo antigo dos léxicos geográfico, naturalista e, mais tarde, geológico, “basalto” é, pois, o termo geral que designa o equivalente vulcânico do gabro, a rocha plutónica de composição máfica, rica em magnésio e ferro, e com baixo conteúdo em sílica (52 a 49%), pelo que uma e outra são qualificadas como básicas. 
Mais de 90% das rochas básicas são vulcânicas e, dentro delas, mais de 90% são basaltos, constituindo o essencial da crosta oceânica. No seu conjunto, os basaltos são as rochas magmáticas mais abundantes na crosta terrestre, onde ocupam cerca de 70% da superfície. Os granitos (em sentido lato, ou seja, os granitóides) ocupam os restantes 30%, confinados à crosta continental. 
Basalto é hoje um vocábulo petrográfico muito abrangente das rochas vulcânicas com as características químicas e acima definidas (conteúdo em sílica entre 52% e 49%). Aplica-se, não só àquelas cuja lava brota à superfície e aí arrefece e solidifica, como às que, no decurso desta actividade, solidificam a meio caminho da extrusão. É o caso dos chamados basaltos das soleiras, diques, chaminés e outros corpos intrusivos de relativamente pequena profundidade, muitos deles designados por doleritos
Tem sido usual, entre os petrólogos e petrógrafos, distinguir três tipos fundamentais de basaltos, com base nos valores da razão (Na2O+K2O)/SiO2:toleíticos, calco-alcalinos e alcalinos
BASALTOS TOLEÍTICOS, também conhecidos por toleítos (do nome da região de Tholey, no Sarre, Alemanha, onde foi descrito) são relativamente ricos em sílica e pobres em alcalis. Provêm da fusão parcial por descompressão dos peridotitos dos níveis mais elevados do manto superior. Este tipo de basaltos está bem representado nas dorsais meso-oceânicas e nas camadas superiores da crosta oceânica, em grande parte ocultos sob os sedimentos aí existentes. É igualmente a rocha dos trapps, palavra sueca que quer dizer escadaria, usada internacionalmente para referir os imensos e espessos empilhamentos de derrames sub-horizontais de lava, no interior dos continentes (vulcanismo intraplacas continentais), onde cobrem milhares de quilómetros quadrados de superfície, como são os da bacia do Paraná, no Brasil, da Sibéria, do Decão, na Índia, do Karoo e dos Libombos, no SE africano, da bacia do Rio Columbia, na América do Norte, de Madagáscar e da Austrália. São igualmente toleíticos os basaltos trazidos da Lua pelas missões Apollo.
BASALTOS CALCOALCALINOS – contêm plagioclase rica em cálcio (labradorite), geralmente acompanhada de minerais ferromagnesianos com cálcio, como augite e horneblenda. São característicos dos arcos insulares e das margens continentais activas onde há fusão parcial das rochas do manto devido à adição de fluidos aquosos provenientes da crosta subductada e contaminação do manto por materiais dessa mesma crosta. O vulcanismo associado a este tipo de rochas é, geralmente, explosivo, por vezes, com grande violência, devido à maior viscosidade do respectivo magma. É o que acontece no chamado Anel de Fogo do Pacífico. 
BASALTOS ALCALINOS – além dos minerais comuns no basalto, contêm feldspatóides, sendo, por isso, também conhecidos por basaltos feldspatóidicos. São provenientes de zonas peridotíticas do manto superior, 50 a 80 km mais profundas do que as que alimentam os basaltos toleíticos e em relação com plumas mantélicas.
Mas há ainda, relativamente a este tipo de rochas vulcânicas, outros nomes consagrados, mais descritivos das respectivas composições mineralógicas. Eis alguns.
ANCARAMITOdescrito em Ankaramy, Madagascar, em 1916, é um basalto alcalino, olivínico, muito escuro, rico em augite e pobre em plagioclase. 
BASANITO, basalto alcalino com olivina (>10%) e feldspatóides (leucite ou nefelina); o termo, proposto por Teofrasto (320 a.C.) radica em basanos, nome grego antigo, como se disse atrás, de toda a pedra negra dura e compacta, usada pelos ourives como “pedra de toque”. 
HAVAITO, descrito na Ilha de Havai, caracterizado pela sua riqueza em olivina.
OCEANITObasalto, rico em olivina, com alto teor de magnésio, gerado por acumulação gravítica da olivina em escoadas espessas ou em soleiras; o termo apresentado por Alfred Lacroix (1863-1948) para designar este tipo de basalto gerado por lavas das Ilha de Havai e Reunião.

TEFRITO, basalto alcalino com feldspatóides abundantes (leucite ou nefelina), plagioclase e, em menor quantidade, olivina (< 10%). O nome deriva do grego téfra, que significa cinza, em virtude da sua cor cinzenta. 

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DEIXEM-NOS SER COMO SOMOS

Por Joaquim Letria
Todos nós ouvimos dizer, na fase final do estado de emergência, que a pandemia era terrível mas fora boazinha em certas coisas, como, por exemplo, até nos terá transformado em melhores pessoas. O Presidente da República, falando à nação, foi muito simpático e chegou mesmo a dizer que nós éramos verdadeiros heróis e até éramos os melhores do Mundo.
Sem desejar contrariar ninguém, sempre senti que quando a pandemia passar nós voltamos a ser o que éramos, com os mesmos defeitos e qualidades. E, infelizmente, ainda estamos muito longe do fim da pandemia, para além desta abertura às facilidades —  sem grande controle  para nos fazerem respeitar as indicações sanitárias — que ainda nos vai levar a piores resultados, como já sucede em Lisboa e Vale do Tejo.
Quando os ingleses começarem a desembarcar no aeroporto de Faro, os espanhóis a darem cabo dos bons resultados do Alentejo— e Lisboa, Porto, Gaia, Póvoa, Setúbal e Costa da Caparica a albergar festas de rua, comícios e a vender álcool nas bombas de gasolina até de madrugada — vão dizer que somos ainda melhores do que éramos e transformam-nos em verdadeiros super-heróis.
Esta coisa de sermos bonzinhos tem, como com muitas outras coisas, que ver com a educação, o civismo e o respeito pelos outros que nos ensinaram e cada um de nós aprendeu. E o que sabemos de tudo isso é o que já sabíamos. Por outro lado, as consequências sociais da gravíssima crise económica e as novas dificuldades para encontrarmos um sítio onde nos albergarmos da miséria, agravarão o salve-se quem puder que compreensivelmente já se começa a fazer sentir.
Portanto, o que importa – sem adjectivos nem elogios – é cuidarmos  da nossa saúde  e tratarmos o melhor possível da vida de todos nós.
Temos quase 900 anos de História e conseguimos manter-nos juntos e fazermos muitas coisas notáveis e outras menos boas. Mas chegámos até aqui pelos nossos meios e à nossa custa. E desta vez vai continuar a ser assim. Não precisamos que nos chamem bonzinhos, bons, heróis ou super-heróis.
Deixem-nos ser como somos, ajudem-nos e não estraguem as coisas boas que somos capazes de fazer, com todos os nossos defeitos e qualidades.
Publicado no Minho Digital

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18.6.20

No "Correio de Lagos" de Jun 20

A página deste mês foi inspirada pelos que nos chamam “bota-abaixistas”, mas são pessoas sem espírito crítico que não sabem que “só se critica aquilo de que se gosta”, que “só os medíocres estão sempre satisfeitos”, e que “a melhor forma de combater os que dizem mal é fazer bem”.
Muito mais se poderia dizer acerca dos “críticos dos críticos”, mas iríamos fazer a bizarra figura de “críticos dos críticos dos críticos”...
Por isso, deixemos o assunto para quem tenha mais paciência do que nós, e vamos ao que interessa, começando com duas notas de humor:
A da esquerda, em imagem dupla, remete-nos para o período difícil que vivemos durante o Estado de Emergência e, embora publicada em França, foi bem válida para Portugal.
A da direita é uma fotomontagem que dá uma boa sugestão para o que fazer no caso em que as praias tenham gente a mais.

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A pandemia e os vendedores de ilusões

Por C. B. Esperança
Ninguém imagina quando, como e em que situação nos deixará a crise em curso, e não faltam vendedores de ilusões sobre o futuro radioso, se outro governo substituir o atual.
Habituei-me a não deificar pessoas, mitificar instituições e, sobretudo, a não mistificar a realidade para a adaptar aos meus preconceitos ou desejos.

Admitindo que a pandemia terminará dentro de alguns meses, do que duvido, é difícil imaginar que o nível de vida regresse a padrões anteriores, com uma recessão e níveis de desemprego de dois dígitos, seja qual for o governo que vier.

Não faltará quem se aproveite da força para exigir a maior fatia possível de proventos, nem quem, com legitimidade, se sinta maltratado em termos relativos, e a justiça social passa mais pela divisão de sacrifícios do que pelo aumento dos benefícios.

Se não aproveitarmos a catástrofe natural para tornar mais verde a economia, o trabalho mais dividido e menos desigual a retribuição, não haverá mudanças tranquilas nem paz social duradoura.

Vencido o medo, se continuar a avidez do lucro, a competição desenfreada e a exibição da riqueza como troféu, o Planeta não consentirá a sucessão de agressões, da explosão demográfica e da voracidade com que se consomem os recursos.

As lideranças políticas dos países mais poderosos são inquietantes e a opinião pública é débil e timorata, e todos seremos chamados a escolher entre o abismo que se avizinha e a sustentabilidade da vida humana progressivamente posta em causa.


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15.6.20

No "Correio de Lagos" de Mai 20

I — COMO se sabe, a descoberta do vírus que actualmente nos inferniza ocorreu em Wuhan, na China, no final de 2019, a que se seguiram esforços de entidades oficiais para “calar o mensageiro”. No entanto, em meados de Janeiro já o mundo sabia o que aí vinha, e foi por isso que ficámos de cabelos-em-pé quando, em Espanha, o governo autorizou (e até incentivou) as manifestações do Dia Internacional da Mulher que, só nas ruas de Madrid, juntaram 120 mil pessoas no dia 8 de Março. Algum tempo depois, Salvador Illa, Ministro da Saúde, reconheceu publicamente que “os contágios já estavam descontrolados duas semanas antes”, e Pedro Duque, Ministro da Ciência e da Inovação, que “o Governo já conhecia, em Janeiro, a gravidade do coronavírus”! 
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II — DIZIA um saudoso primo meu que “O Homem só aprende por catástrofes”, mas o certo é que nem com catástrofes aprende, como também pudemos ver por cá: ao mesmo tempo que a DGS, na sua “Orientação” de 10 e 16 de Março, dizia que se deviam “adiar ou cancelar todos os eventos que impliquem, ou possam implicar, a concentração de mais de 100 pessoas”, Ferro Rodrigues fazia finca-pé em juntar 130 para as comemorações do 25 de Abril, como se não estivéssemos em pleno Estado de Emergência. Julgo que, perante a celeuma que se seguiu, o número de participantes veio a ser encurtado por forma a satisfazer o recomendado, mas o sinal já estava dado, e a sequela não tardou, no 1.º de Maio, também com o aval do Governo e do PR.
Quanto a nós, e enquanto “fazemos figas” para que as coisas corram bem, podemos ir pensando que no próximo ano teremos oportunidade de votar em função dessas e de muitas outras coisas, nomeadamente aquelas que os poderes públicos fizeram — ou deixaram de fazer — quando tiveram nas suas mãos as nossas VIDAS.
E informação é coisa que não nos falta pois, em pouco tempo, todos ficámos especialistas em percentagens, exponenciais, geopolítica e política internacional; passámos a conhecer o pesadelo dos lares de idosos e dos alojamentos de refugiados, bem como as contingências do teletrabalho e do ensino à distância; pasmámos com o petróleo a preços negativos, enquanto aprendíamos higiene e infecciologia; e, o mais importante de tudo, pudemos ver como há gente que não hesita em pôr em perigo as vidas dos cidadãos — por mera incompetência, ou se isso favorecer os seus interesses pessoais, de seita ou partidários.
Sim, aprendemos tudo isso e muito mais, mas a principal lição, em termos práticos, foi ficarmos todos a perceber a forma como se propaga o vírus, o que acontece quando uma pessoa infectada expele gotículas que atingem outras, directa ou indirectamente. Neste último caso, a transmissão é feita por intermédio das superfícies onde essas partículas pousam e onde o vírus se mantém activo durante horas, o que nos levaria ao tema das máscaras, que passaram de desaconselháveis a recomendadas, e logo depois a obrigatórias, fazendo-nos pensar quanta gente terá podido morrer por seguir o conselho inicial.
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III — QUANTO à nossa terra, não posso calar que vi na Ameijeira, onde, durante todo Estado de Emergência (e até para além dele!), um parque bio-saudável, dois infanto-juvenis e ainda um skate-parque estiveram completamente escancarados à utilização pública (com acesso directo por duas ruas), sem quaisquer avisos nem fitas inibidoras, situação que só se alterou no dia 6 deste mês (já o Estado de Calamidade ia no 4.º dia!) com a colocação de fitas nos três primeiros, mas deixando o último em utilização livre — assim propiciando as aglomerações de jovens e obrigando, de vez em quando, à intervenção da PSP, para REMEDIAR o que talvez pudesse ter sido PREVENIDO.

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14.6.20

Grande Angular - Ainda não vimos nada!

Por António Barreto
É triste confessar, mas ainda estamos para ver até onde vão os revisores da História. Uma coisa é certa: com a ajuda dos movimentos anti-racistas, a colaboração de esquerdistas, a covardia de tanta gente de bem e o metabolismo habitual dos reaccionários, o movimento de correcção da História veio para ficar. Serão anos de destruição de símbolos, de substituição de heróis, de censura de livros e de demolição de esculturas. Até de rectificação de monumentos. Além da revisão de programas escolares e da reescrita de manuais. Tudo, com a consequente censura de livros considerados impróprios, seguida da substituição por novos livros estimados científicos, objectivos, democráticos e igualitários. A pujança deste movimento através do mundo é tal que nada conseguirá temperar os ânimos triunfadores dos novos censores, transformados em juízes da moral e árbitros da história.
Serão criadas comissões de correcção, com a missão de rever os manuais de História (e outras disciplinas sensíveis como o português, a literatura, a geografia, o meio ambiente, as relações internacionais…), a fim de expurgar a visão bondosa do colonialismo, as interpretações glorificadoras dos descobrimentos e os símbolos de domínio branco, cristão, europeu e capitalista.
Comissões purificadoras procederão ao inventário das ruas e locais que devem mudar de nome, porque glorificam o papel dos colonialistas e dos traficantes de escravos. Farão ainda o levantamento das obras de arte públicas que prestam homenagem à política imperialista, assim como aos seus agentes. Já começou, aliás, com a substituição do Museu dos Descobrimentos pelo Memorial da Escravatura!
Teremos autoridades que tudo farão para retirar os objectos antes que as hordas cheguem e será o máximo de coragem de que serão capazes. Alguns concordarão com o seu depósito em pavilhões de sucata. Outros ainda deixarão destruir, gesto que incluirão na pasta de problemas resolvidos. Entretanto, os Centros Comerciais Colombo e Vasco da Gama esperam pela hora fatal da mudança de nome. Praças, ruas e avenidas das Descobertas, dos Descobrimentos e dos Navegantes, que abundam em Portugal, serão brevemente mudadas. Preparemo-nos pois para remover monumentos com Albuquerque, Gama, Dias, Cão, Cabral, Magalhães e outros, além de, evidentemente, o Infante D. Henrique, o primeiro a passar no cadafalso. Luís de Camões e Fernando Pessoa terão o devido óbito. Os que cantaram os feitos dos exploradores e dos negreiros são tão perniciosos quanto os próprios. Talvez até mais, pois forjaram a identidade e deram sentido aos mitos da nação valente e imortal. Esperemos pois para liquidar a toponímia que aluda a Serpa Pinto, Ivens, Capelo e Mouzinho, heróis entre os mais recentes facínoras. Sem esquecer, seguramente, uns notáveis heróis do colonialismo, Kaulza de Arriaga, Costa Gomes, António Spínola, Rosa Coutinho, Otelo Saraiva de Carvalho, Mário Tomé e Vasco Lourenço.
Não serão esquecidos os cineastas, compositores, pintores, escultores, escritores e arquitectos que, nas suas obras, elogiaram os colonialistas, cúmplices da escravatura, do genocídio e do racismo. Filmes e livros serão retirados do mercado. Pinturas murais, azulejos, esculturas, baixos-relevos, frescos e painéis de todas as espécies serão destruídos ou cobertos de cal e ácido.
Outras comissões terão o encargo de proceder ao levantamento das obras de arte e do património com origem na África, na Ásia e na América Latina e que se encontram em Portugal, em mãos privadas ou em instituições públicas, a fim de as remeter prontamente aos países donde são provenientes.
Os principais monumentos erectos em homenagem à expansão, a começar pelos Jerónimos e pela a Torre de Belém, serão restaurados com o cuidado de lhes retirar os elementos de identidade colonialista. Os memoriais de homenagem aos mortos em guerras do Ultramar serão reconstruídos a fim de serem transformados em edifícios de denúncia do racismo. Não há liberdade nem igualdade enquanto estes símbolos sobreviverem.
Muitos pensam que a história é feita de progresso e desenvolvimento. De crescimento e melhoramento. Esperam que se caminhe do preconceito para o rigor. Do mito para o facto. Da submissão para a liberdade. Infelizmente, tal não é verdade. Não é sempre verdade. Republicanos, corporativistas, fascistas, comunistas e até democratas mostraram, nos últimos séculos, que se dedicaram com interesse à revisão selectiva da história, assim como à censura e à manipulação. E, se quisermos ir mais longe no tempo, não faltam exemplos. Quando os revolucionários franceses rebaptizaram a Catedral de Estrasburgo, passando a designá-la por Templo da Razão, não estavam a aumentar o grau de racionalidade das sociedades. Quando o altar-mor de Notre Dame foi chamado de Altar da Liberdade, caminharam alegremente da superstição para o preconceito. E quando os bolchevistas ocuparam a Catedral de Kazab, em São Petersburgo e apelidaram o edifício de Museu das Religiões e do Ateísmo, não procuravam certamente a liberdade e o pluralismo. E também podemos convocar os Iconoclastas de Istambul, os Daesh de Palmyra ou os Taliban de Bamiyan que destruíram símbolos, combateram a religião e tentaram apropriar-se tanto do presente como do passado.
Os senhores do seu tempo, monarcas, generais, bispos, políticos, capitalistas, deputados e sindicalistas gostam de marcar a sociedade, romper com o passado e afastar fantasmas. Deuses e comendadores, santos e revolucionários, habitam os seus pesadelos. Quem quer exercer o poder sobre o presente tem de destruir o passado.
Muitos de nós pensávamos, há cinquenta anos, que era necessário rever os manuais, repensar os mitos, submeter as crenças à prova do estudo, lutar contra a proclamação autoritária e defender com todas as forças o debate livre. É possível que, a muitos, tenha ocorrido que faltava substituir uma ortodoxia dogmática por outra. Mas, para outros, o espírito era o de confronto de ideias, de debate permanente e de submissão à crítica pública.
O que hoje se receia é a nova dogmática feita de novos preconceitos. Não tenhamos ilusões. Se as democracias não souberem resistir a esta espécie de vaga que se denomina libertadora e igualitária, mergulharão rapidamente em novas eras obscurantistas. 
Público, 14.6.2020

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