31.10.11

O direito e a obrigação, no Reino das Leis-da-Treta

ESTA é uma versão corrigida e aumentada daquilo que, em tempos, se podia ler em avisos afixados nos consultórios médicos: os doentes eram informados de que eram obrigados a pedir recibo - quando o correcto era serem informados de que tinham o direito de o exigir, sendo o médico - ele, sim - obrigado a passá-lo.
Como é evidente, esta, de hoje, é apenas uma medida para troika ver...

Das rochas sedimentares (8)

Exemplos de conglomerados
Por A. M. Galopim de Carvalho

FORMADOS por blocos que, em termos meramente sistemáticos e académicos, correspondem aos clastos de diâmetro mediano superior a 256mm, merecem destaque alguns depósitos conglomeráticos muito grosseiros. Os blocos mais arredondados ou boleados são próprios de ambientes litorais e fluviais de alta energia. Blocs, em francês, e boulders, em inglês, estes megaclastos correspondem aos “matacões” dos nossos colegas do Brasil. Outros depósitos ricos em blocos são as moreias glaciárias e as rañas. (...)
Texto integral [aqui]

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As mamas das ucranianas

Por Ferreira Fernandes

TIRANDO as sociedades sem válvula de escape para o vapor - como vimos em alguns países árabes -, as manifestações não servem para derrubar governos. O mais longe a que chegam é amplificar uma ideia, e, aí, o tamanho conta pouco.
Um dia, o então líder radical italiano Marco Pannella fez uma greve de fome. Ele, que era pela desobediência civil, na esteira de um Luther King, por que escolhera uma forma violenta de manifestação individual (mais, só imolar-se pelo fogo)? No dia seguinte, Pannella recebeu os jornalistas a comer uma perna de galinha. Explicou-se: "Respeito demasiado a vida humana para fazer uma greve de fome sem comer."
As ucranianas do grupo Femen seguem esse respeito por nós próprios e essa eficiência em passar a mensagem. Elas atacam o governo por fechar os olhos aos bordéis e temem o pior quando os turistas vierem ao Europeu de Futebol, em 2012. Então, elas dão o corpo ao manifesto: vão para a rua de mamas ao léu.
As fotos têm corrido mundo e nunca se viram polícias tão felizes a correr atrás de manifestantes. Mas, além da propaganda eficiente, há também a justeza com que defendem a sua causa. Ser contra bordéis é identificado com moralismo, o que a exposição dos corpos das mulheres do Femen desmente: elas não são contra o sexo, mas contra a violência empregada pelo submundo no tráfico das mulheres.
Da perna de galinha de Pannella às mamas das ucranianas, um ponto comum: manifestar-se com a cabeça.
«DN» de 31 Out 11

Nota (CMR): a foto é uma das que vêm publicadas no «DN» de hoje

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30.10.11

Sugestão

O SEMPRE interessante blogue «Casal das Letras» (dos jornalistas Maria Augusta Silva e Pedro Foyos) entrevistou, recentemente, o Antunes Ferreira, contribuidor do Sorumbático. A entrevista, com o título «Tudo-nada sobre mim», pode ser lida [aqui].
NOTA: para ler (e, em certos casos, até ouvir) outras entrevistas feitas para o mesmo blogue, clicar [aqui].

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Luz - Comboio de Vila Real à Régua, Linha do Corgo, 1983 (*)

Fotografias de António Barreto- APPh

Clicar na imagem, para a ampliar
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Esta linha está hoje “fechada para obras” há vários anos. Já se percebeu que nunca mais abrirá. Nos últimos anos em que funcionou, já não era esta preciosa locomotiva a vapor, mas uma automotora a diesel. Este percurso era fantástico, quase tão espectacular como o da Linha do Tua, igualmente fechada. Fiz este trajecto centenas de vezes. Por aqui se ia de férias, ao Porto, a Lisboa, para o mundo... Nas descidas, o comboio acelerava à velocidade estonteante de 50 km à hora. A subir ou em plano, o normal eram uns vinte a trinta à hora! Os 24 km de Vila Real à Régua percorriam-se em cerca de uma hora, com seis apeadeiros. Os soldados que viajavam neste comboio, atrevidos, várias vezes saltavam da composição, corriam uns metros e voltavam a entrar. Faziam-no para apanhar uvas e impressionar as raparigas!
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(*) Actualização em 10 Dez 11
ERRATA
A 30 de Outubro deste ano, publiquei, no Sorumbático e no Jacarandá, uma fotografia de uma linha de comboio, em zona de montanha, com carris de via reduzida, com locomotiva ao fundo e algumas pessoas ao lado da via. O título que lhe dei foi: “Comboio de Vila Real à Régua, Linha do Corgo, 1983”.
Entre a correspondência que então recebi, conta-se a observação de Dario Silva. Dizia ele, no essencial, que não podia ser na linha do Corgo. Este leitor conhecia tudo de comboios em Portugal e garantia que aquela locomotiva não podia ter circulado em Portugal.
Fiquei impressionado com os argumentos. Procurei nos meus arquivos (ainda não completamente catalogados e arrumados como deveriam estar... mas não perdem pela demora!) e finalmente encontrei. Dario Silva tinha toda a razão. A fotografia foi feita em 1971, no Peru, na linha de comboio que vai de Cuzco a um apeadeiro perto de Machu Pichu (o último troço da viagem era feito, naquela altura, em camionetas).
Aqui fica a rectificação, com um agradecimento e uma vénia ao meu correspondente Dario Silva, que, aliás, me brindou com várias mensagens e documentação própria de uma verdadeira enciclopédia ferroviária!”.

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29.10.11

O brasileiro, D. Rosalina e nós

Por Ferreira Fernandes

OI, MEUS irmãos. Estou sabendo de D. Rosalina, embora não muito. Vossa patrícia, viúva, ou assim, de um cara cheio de grana, a idosa apareceu morta aqui no estado fluminense, para lá de Niterói. A polícia do Rio investigou e tem suspeito, mas não pega ele, não sei as razões. Por ele ser graúdo, político? Não sei, não.
As autoridades portuguesas devem estar dando em cima dos policiais brasileiros, mandando ofícios, precatórias, inquirições: "Então, como é? O caso da D. Rosalina, cidadã lusa, está resolvido?"
Se calhar o vosso Presidente até na cimeira ibero-americana vai cobrar da nossa Presidenta Dilma o atraso com D. Rosalina.
Portugal é Europa e tem de mostrar ao Terceiro Mundo que com a Justiça não se brinca.
Enfim, sobre D. Rosalina as autoridades lusas estão empenhadíssimas, eu sei. O meu causo é outro: há um suspeito de assassínio no Brasil - repito, não segui nos detalhes, não sei se o sujeito está no Complexo do Alemão ou na Amazónia - e vocês não estão prevenindo os turistas que estão vindo para cá? Deixam vir sem avisar? Devia haver uma campanha, aí, na santa terrinha, a dizer: "Há um suspeito de assassínio à solta, as autoridades locais não estão ligando, nem interrogam, nem uma perguntinha no homem nem nada, e você acha que aquilo lá é seguro para visitar?"
Repito, meus irmãos, não segui as minúcias da morte de D. Rosalina, mas se eu fosse a vocês ficava aí, nesse Portugal sereno.
«DN» de 29 Out 11

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Copular é preciso

Por Antunes Ferreira

CHICO BUARQUE da Holanda cantou «navegar é preciso»; hoje temos de entoar tão moduladamente quanto nos for possível «copular é preciso». Escolhi terminologia moderada, e penso que civilizada, pois poderia ter usado o vernáculo. Mas, e não se tratando de qualquer auto-censura puritana, muito menos de desrespeito aos leitores deste blogue, há verbos e há… verbos.
Permito-me abrir aqui uma parentética. PC (leia-se Passos Coelho) saiu da cimeira europeia que parece ter tentado resolver a crise da UE, quase eufórico. Portugal tinha sido elogiado, bem como a Irlanda, pelas medidas já adoptadas para resolver os seus problemas financeiros. Isto é, reduzir o défice, consolidar as contas públicas e coisas assim.
Mas, nas conclusões da reunião histórica e salva-vidas, ainda que o Instituto de Socorros a Náufragos não tenha estado presente, o Conselho também expressou que os dois países devem prosseguir os seus esforços, devendo porém estar prontos a tomar quaisquer medidas adicionais necessárias para atingir essas metas.
Ou seja, os cidadãos – e, no caso particular, nós, os Portugueses - devem estar prontos para continuar a ser copulados e ainda com maior intensidade e mais frequentemente. Ou seja, estar receptivos a cumprir o ditado que diz que quanto mais me bates, mais gosto de ti. No caso, cumprir os ditames da troika, e mais especificamente da Senhora Merkel, do Senhor Durão Barroso, dos Senhores Vítor Gaspar, Álvaro Pereira e uns quantos mais. Fecho o parênteses.

Volte-se à afirmação inicial. De acordo com gente sábia das Nações Unidas, o decréscimo populacional em Portugal, um dos países com mais baixa taxa de fertilidade em todo o mundo, vai afectar a produtividade e o crescimento económico. Por isso, e ainda que não o tenham declarado aberta e taxativamente, os Portugueses e, obviamente, as Portugueses têm de fornicar mais.
A taxa de natalidade deste torrão natal é tão baixa que a tendência da população é… encolher. Donde, as consequências são muito preocupantes. Avança o envelhecimento nacional e recua o crescimento económico. Mais sublinharam os especialistas em Nova Iorque que Portugal vai ter nos próximos quatro anos a segunda mais baixa taxa de fecundidade do Mundo, com apenas 1,3 filhos por mulher, apenas ultrapassado pela Bósnia-Herzegovina (1,1).
Antevê-se, por conseguinte, uma verdadeira catástrofe «espermatezóidica» e um terrível tsunami ovular. E ou fazemos mais filhos, ou nos dedicamos à pesca à beira Tejo. Ou aproveitamos todos os momentos e desprezamos qualquer controlo de natalidade – abaixo o preservativo e quem o apoiar, sobretudo quem o utilizar – ou, consequentemente, renegamos o aumento do horário de trabalho que, segundo o Governo, fará renascer, qual Fénix, a economia (?) lusitana.
É, pois, um dilema que o primeiro-ministro e afins bem poderão qualificar de colossal. Alguém, por certo mal intencionado, face a este horizonte mais do que sombrio, levantou já a hipótese de que, para incentivar o esforço colectivo, se mudem umas estrofes da Portuguesa. Por exemplo, em vez do consabido «contra os canhões, marchar, marchar!», deverá cantar-se a plenos pulmões «contra a abstinência, copular, copular!» Um tanto reaccionário, mas bem intencionado.
Sendo assim, queiramos ou não, se não passarmos a fazer mais amor, estamos feitos. Ou melhor, estamos copulados.

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28.10.11

Ganhando por dois "carrinhos" (ou mais...)

EM RESPOSTA a este comovente apelo ministerial, aqui fica uma sugestão múltipla:

«Senhor ministro, peça ao seu colega do MAI que mande cobrar as verbas correspondentes a quem se mostra disposto a pagar para fazer o que aqui se documenta. Ao mesmo tempo, providencie para que vão para olho da rua os indivíduos que são pagos para evitar que isto suceda e não o fazem; assim, o Estado poderá ganhar pelo lado da cobrança e pelo da redução da despesa. Claro que estou a referir-me aos peões que, pretextando não poder usar os passeios, circulam pelo meio da faixa de rodagem, infringindo o Código da Estrada».
Lisboa - Rua Violante do Céu
Ontem e hoje

«Roriz, História de uma quinta no coração do Douro»

Por António Barreto

ÀS VEZES, dava jeito falar de livros que não foram escritos por amigos; editados ou produzidos por amigos. Poderia falar, não com mais liberdade, que é sempre a mesma, mas com mais crédito: ninguém pensaria que digo o que digo por amizade.
Este é um caso desses. O Gaspar Martins Pereira, o João Van Zeller e membros da família Symington estão entre os meus amigos.
Feita esta declaração de interesses, tenho a dizer-vos que este livro é maravilhoso. Por isso não só felicito o seu autor e os seus editores e produtores, como lhes agradeço. Prestaram um excelente e raro serviço à História, ao país e ao Douro. (...)
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O Corvo - Em jeito de telegrama e não mais

Por Alice Vieira

VENHO ao Corvo em trabalho e aterro na ilha a saber só o que toda a gente sabe: é a mais pequena dos Açores.
O Presidente da Câmara explica que não vou ficar na Residencial porque em Outubro está cheia, “e até 2015 está tudo reservado”.
O Corvo é o paraíso dos ornitólogos. Em Outubro eles vêm de todo o do mundo, para filmar as aves em trânsito, captar-lhes o canto, tentar perceber as rotas que as trouxeram aqui.
Largo a bagagem e dizem-me que é melhor ir já ver a cratera do vulcão, “porque a gente aqui não se pode fiar no tempo e, se houver nuvens, não se vê nada.”
Minutos depois, no alto da estrada, abre-se a nossos pés a cratera do antigo vulcão, um manto de turfa a rodeá-la, de um verde que faz doer os olhos. Dizem-me que estas turfeiras são as menos conhecidas da Europa, e eu acredito. Quem se arrisca a vir a este fim do mundo e, por precipícios e rochas negras de basalto, chegar até aqui? (...)
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27.10.11

O que eles fizeram pelas Ciências da Terra (13)

James Hutton
(1726 - 1797)
Por A. M. Galopim de Carvalho
ILUSTRE cidadão escocês de Edimburgo, no chamado século das luzes, concluiu medicina, foi agricultor e, por fim, dedicou-se intensamente à geologia, numa clarividência e numa notoriedade que fizeram dele um dos maiores vultos de todos os tempos neste ramo ciência. Pôs ponto final na Teoria Neptunista de Abraham Gottlob Werner (1749-1817), uma concepção errónea, nascida na prestigiada Academia de Minas de Freiberga, que fazia escola na Europa na segunda metade do século XVIII. Ao demonstrar a origem magmática, não apenas do basalto, mas também do granito, Hutton inovou a ideia de plutonismo e deu o golpe final no neptunismo. (...)
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É bandido? Atropela-se

Por Ferreira Fernandes

OS NOMES são gentis, mas Pidá, Palavrinhas, Chibanga, Tiné e mais dois estão a ser julgados pelo assassínio de um rei da noite do Porto, em Agosto de 2007. Naquela madrugada houve tiroteio com pistolas de 9 mm e caçadeiras shotguns.
Já tinha havido mortes a montante e iria haver a jusante, mas aqueles seis do gang do Pidá respondem agora, no Palácio da Justiça, no Porto, pela morte daquela madrugada.
A juíza pediu ao inspector-chefe da PJ pormenores sobre o relatório da acusação. O polícia disse ter fontes anónimas. Quem? O polícia preveniu: identificando-a, não "podia prever consequências". A juíza insistiu. E o polícia atirou com um nome, Fernando "Beckham", condenado por outro assassínio cometido com Pidá - estando ambos presos na cadeia de Paços de Ferreira. Segundo o inspector, "Beckham" é uma pessoa "desesperada", que "teve necessidade de desabafar com alguém". Calculem como estará ele, agora, quando sabe que Pidá sabe que o delatou - espero que não partilhem uma cela.
Aqui chegado, peço aos leitores para não desprezarem o episódio só porque os bandidos são de outro mundo. Este episódio é do nosso mundo, aconteceu num nosso tribunal. Uma fonte anónima foi identificada sem se "prever consequências" do que lhe acontecerá. Em linguagem de bandidos diz-se "foi dada à morte". É a linguagem de bandidos que deve ser usada porque naquele nosso tribunal, naquele dia, as palavras oficiais foram disparadas por shotguns.
«DN» de 27 Out 11

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Como é gasto o nosso dinheiro...

Cena de todos os dias na Av. Roma, junto à R. Violante do Céu.
Estão de parabéns, também, os que tiveram o cuidado de - ali e só ali -, não colocar os pilaretes.

Da Primavera Árabe ao inverno muçulmano

Por C. Barroco Esperança

O JÚBILO da comunicação social dos países democráticos com a queda das ditaduras do Norte de África pareceu-me sempre exagerado. Não que a queda dos ditadores me deixe triste mas porque, em contexto religioso, pressinto os piedosos facínoras que se seguem.

Assustou-me a amnésia colectiva em relação à ascensão da Frente Islâmica de Salvação (FIS) na Argélia cujo pavor levou ao golpe de Estado que impediu a segunda volta das eleições em 1992, eleições que, a terem lugar, como estava previsto e era justo, dariam a vitória aos fanáticos religiosos. Não esqueço a onda de euforia que percorreu o Irão após a queda de Xá Reza Pahlavi, um déspota corrupto, com o regresso do exílio do aiatola Khomeini, com cheiro a santidade. (...)

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26.10.11

Talvez para compensar o "residêncial", aqui temos uma "agencia"...

Pela crise

Por João Paulo Guerra

UM GRANDE amigo meu foi de Lisboa a Mogadouro - 463 km, cinco horas e tal de condução não havendo problemas - por uma boa causa: participar na cerimónia de entronização numa confraria enóloga e gastrónoma, com mais causa pelo facto de ele próprio ser um dos entronizados. Razão acrescida pelo facto de Mogadouro, para além do património natural e construído e das riquíssimas tradições, ser a terra da posta e da marra, das cascas e do bulho, do estufado de javali e do cabrito assado, da caça, mas também dos peixinhos do rio em escabeche, dos cogumelos e das castanhas, do azeite do Vale do Sabor, tudo isto bem no centro da região do Douro Superior, o Alto Douro Vinhateiro como o designou o Marquês de Pombal.

Tudo isto para dizer que o meu amigo, chegado a Mogadouro, estacionou no meio de uma discussão sobre a crise, animada por um dos confrades que insistia em procurar respostas para uma singela pergunta que o inquietava: «Mas para onde é que foi o dinheiro?».

Cada cabeça, sua sentença, não se atinava com a pista do dinheiro. Até que outro confrade, com mais razão que emoção, aparentemente mudou de conversa, perguntando ao meu amigo como lhe tinha corrido a viagem. A resposta desenvolveu-se ao longo do mapa das auto-estradas - agora todas elas com custos para o utilizador -, com sugestões alternativas por itinerários principais e complementares. A verdade é que o meu amigo tinha saído de Lisboa pela A1, seguindo depois pela A23 e A25, saindo depois pela N324, mais tarde pelas N340, 332, 221 - circundando por 12 rotundas - e ei-lo que tem Mogadouro à vista, com seu castelo altaneiro. O interlocutor do meu amigo recapitulou o mapa real do percurso, enumerou rigorosamente os itinerários alternativos, e concluiu: «Vieste pela crise».

«DE» de 26 Out 11

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Exemplares exemplares

Ontem, pelas 19h20, junto à Assembleia Municipal de Lisboa
DESCULPEM a pergunta: os carrinhos que em cima se vêem em paragem proibida (mesmo ao lado de um parque de estacionamento com 3 pisos e 636 lugares - às moscas, como sempre...) são de gente que manda alguma coisinha cá no burgo? Se sim, bem podem limpar as mãos às paredes - que não faltam, por ali, e bastante brancas.
Será que merece um big smile?

Nem tudo é economia!

Por Baptista-Bastos

QUE NOS aconteceu para nos acontecer esta gente? Claro que esta gente é a soma de numerosas parcelas de indigência política, que fomos adicionando a uma espécie de esperança renovada de cada vez que o Governo mudava. Tínhamos perdido a fé na ideologia, negligenciando que outra ideologia seria a substituta da que perdêramos. Fé. Isso mesmo. Entráramos nos domínios do irracional. A consciência das nossas derrotas acentuou o oportunismo de muitos. Sabemos quem são. Estão nos jornais, nas televisões, nas grandes empresas, na política. O geral está subordinado ao individual, e implica que os comportamentos ou o escrúpulo de cada um sejam determinados pelas rígidas referências da nova ideologia.

Olhamos para esta gente, lemos e ouvimos o que esta gente diz e, com nitidez crescente, percebemos que a deriva das suas impreparações chega a ser criminosa. Fazem, decidem, ordenam, desconhecendo, ignorando ou descurando os resultados. Subsiste uma relação pouco estruturada, e por isso mesmo mais perigosa, com um nacionalismo rudimentar. A expressão da actividade governativa reflecte o que se passa na Europa do Partido Popular. O predomínio da Direita e da Extrema-Direita espelha-se na prática do Executivo de Passos Coelho. Só não vê quem não quer ver ou não lhe interessa ver.

Os diversos sectores da sociedade portuguesa estão a ser atingidos por uma ordem "reformista", que tende a ocupar todo o espaço de definição política. Não há "reforma" nenhuma: apenas se manifesta a vontade de uma regressão, que caracteriza a lógica da subordinação política à finança e à economia. Nem tudo é economia, como persistentemente no-lo impingem. Há valores que a economia espezinha, através de um diferencialismo que alimenta a exclusão, a dualização socioeconómica e, por consequência, o desemprego e todo o cortejo de misérias. Passos Coelho não só obedece à cartilha como a ultrapassa em zelo e solicitude.

Estamos numa situação social e política muito delicada e perigosa. A teoria do quero, posso e mando não conduz a soluções viáveis; momentaneamente pode, acaso, resultar, mas apenas momentaneamente. Inculcam-nos a ideia de que não há alternativa. A salvaguarda da nossa saúde mental impele-nos a contrariar esta tese. Em nada, em nenhuma actividade humana há, somente, uma saída. Outras alternativas teriam de nos ser apresentadas. Mas essa ausência de propostas também faz parte da lógica do sistema.

Já o escrevi e repito-o: Pedro Passos Coelho abriu a caixa de Pandora e não sabe, nem pode, voltar a fechá-la. Curiosamente, ele é, a um tempo, refém das resoluções que toma e da surpresa que elas lhe provocam, por conduzirem à desagregação social. Um processo de desestruturação está em marcha. Temos força e convicções para o fazer parar? Eis a questão.

«DN» de 26 Out 11

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25.10.11

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«Dito & Feito»

Por José António Lima

EMPOBRECIMENTO, empobrecimento e mais empobrecimento. É este o cenário que espera a esmagadora maioria dos portugueses nos próximos anos.

É esta a má notícia já confirmada nas duríssimas medidas de austeridade do Orçamento para 2012. E é esta, sobretudo, a receita que os nossos financiadores internacionais, a senhora Merkel, o senhor Olli Rehn e milhões de contribuintes do centro e norte da Europa exigem que se aplique a um país incumpridor e que se habituou a viver bem acima das suas possibilidades e à custa do dinheiro que vai pedindo emprestado.

Endividamento é, assim, outra palavra-chave desta equação portuguesa. Uma colossal dívida pública do Estado, que há muito pratica um irresponsável despesismo sem regras nem limites. Um endividamento a cada dia mais incomportável para centenas de milhares de famílias, que já mal conseguem pagar as prestações do crédito à habitação (sem esquecer os créditos fáceis para automóveis, viagens, novidades tecnológicas, etc.). E uma dívida igualmente incontrolável dos bancos e de milhares de empresas nacionais. É este o estado da sociedade portuguesa no final de 2011. Já era assim há 10 ou 15 anos. Entretanto, apenas se agravou.

Encarecimento é, em consequência, outra palavra-chave nos tempos que aí vêm. Preços mais caros dos transportes, da alimentação, da saúde – acentuando o empobrecimento generalizado. Encarecimento, até, de produtos fornecidos por empresas que continuam a ter lucros de muitos milhões, como são os casos do gás, da electricidade ou das telecomunicações.

Nesta situação de penúria a que nos conduziu a irresponsabilidade despesista, a espiral da dívida e a governação do PS nos últimos anos, não deixa de ser extraordinário ouvir alguns socialistas que parecem continuar a viver noutro planeta. «Fiquei muito chocado com a total falta de sensibilidade e a iniquidade» do OE, diz agora João Cravinho, que foi o ideólogo das ruinosas parcerias público-privadas e de empurrar com a barriga os colossais custos da dívida para as gerações futuras.

Endividamento, encarecimento e empobrecimento. São as palavras que definem o nosso futuro próximo. Só cá falta outro socialista, António Vitorino, a aconselhar com cinismo: habituem-se!

«SOL» de 21 Out 11

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Como, em Lisboa, é acarinhada a calçada portuguesa

Lisboa - Rua 1.º de Dezembro
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Ver mais horrores [aqui]

Vitalício, hoje, só como alcunha

Por Ferreira Fernandes

ÂNGELO Correia, o último dos ingénuos (e isso, claro, é elogio), interrogado sobre as pensões vitalícias dos ex-políticos e actuais gestores de empresas, quase se engasgou perante a hipótese de ficar sem aquela verba de arredondar o fim do mês (no caso dele, 2200 euros). Aquela pensão é, disse, um "direito adquirido".
Adquê?, espanto-me eu. Em Outubro de 2011, direito adquirido pertence à família de ceroula, é termo que nos é muito chegado mas que caiu em desuso.
Entre as catástrofes que nos acontecem, incluindo o fim dos direitos adquiridos, acontece-nos também termos de perder a ilusão de que os direitos adquiridos eram direitos e adquiridos.
Mesmo os funcionários públicos mais angélicos já sabem que os 13.º e 14.º meses, para o ano e para o ano a seguir, já eram (e até suspeitam o mesmo para os anos seguintes aos a seguir).
Os únicos crentes num mundo imutável parecem ser os ex-políticos gestores de topo: acreditam na pensão vitalícia. Homens de demasiada fé!
Hoje, para muitos, pode mudar-se do emprego certo para a indigência, e só não se podia, para uns poucos, mudar de pensão vitalícia, é? Pois não é. Seria se aos políticos que mandam lhes interessassem mais os políticos que mandaram do que lhes interessa continuarem a mandar.
Ontem, quando havia (ou se julgava haver) margem de manobra, podia ser-se corporativamente generoso. Infelizmente para Ângelo Correia, hoje os que mandam têm, mesmo, de parecer justos.

«DN» de 25 Out 11

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24.10.11

Na Terra das Leis-da-Treta

Av. João XXI:
O caos habitual e o enxovalho a que estão sujeitos os transportes públicos na capital
Av. Roma/Tr. Henrique Cardoso:
Ainda me faltava ver esta, antes de morrer!
HOJE, o convidado do forum da TSF foi um senhor do governo que foi dizer de sua justiça acerca dos transportes em Portugal. O tema principal era o fecho de mais umas centenas de quilómetros de linhas da CP, mas também se falou de transportes em geral.
As fotos foram tiradas pouco depois de debitadas as boas intenções.

Das rochas sedimentares (7)

Por A. M. Galopim de Carvalho

A PAR da dimensão, a forma dos fenoclastos é aceite como outra característica importante dos ruditos. Há, pois, que ter em conta a forma inicial dos fragmentos, inerente à sua separação do afloramento rochoso a que pertenciam, a forma resultante da sua eventual fracturação posterior e, ainda, a adquirida por dissolução ou por desgaste mecânico (abrasão), no decurso da erosão e do transporte. (...)

Texto integral [aqui]

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Equidade

Por João Paulo Guerra

A EQUIDADE, ou idade da equidistância, entrou de supetão no discurso de Cavaco Silva. O chefe de Estado escolheu a questão do corte dos subsídios de férias e de Natal aos funcionários e pensionistas do Estado para manifestar esta sua preocupação, considerando que o Governo está a praticar uma iniquidade ao penalizar os trabalhadores do sector público, poupando os do privado.

Ou seja, Cavaco Silva entrou em conflito com o Governo, no âmbito da discussão sobre um Orçamento brutal, que esmaga as pessoas, asfixia a economia e subdesenvolve o País, por achar que uma medida orçamental peca por defeito. Ora a verdade é que a questão da iniquidade marca todo este processo da austeridade, e do respectivo Orçamento, destinada a tapar buracos. Porque é sem dúvida iníquo que sejam os assalariados da classe média e os pensionistas, públicos ou privados, a pagar a crise da ganância e da delinquência financeira.

A questão quebrou o verniz nas relações entre Belém e São Bento, uma persistência que atesta a menoridade da vida democrática do País e da respectiva classe política, seja qual for o pólo que tenha aberto as hostilidades. Eanes contra Soares e vice-versa, Eanes contra Balsemão, Soares contra Cavaco e Cavaco contra as «forças de bloqueio», Sampaio contra o Guerreiro Menino, Cavaco a causar faísca na «cooperação estratégica» com Sócrates e, ao fim de 120 dias, a apresentar a Passos Coelho a factura da «magistratura activa». A novidade é que nunca um conflito institucional começara por uma denúncia de falta de equidade.

É talvez por isso que Portugal é o país mais desigual da Europa. O pior é que, com a iniquidade desta austeridade e deste Orçamento, a equidade tem tanto futuro como o 13.º mês. Para públicos como para privados.

«DE» de 24 Out 11

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23.10.11

Luz - Califórnia, 1978

Fotografias de António Barreto- APPh

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Não consigo recordar o local exacto desta fotografia. Pode ter sido num dos vários sítios de concertos ao ar livre que visitei: Seattle, San Francisco, Los Angeles... Já não eram novidade absoluta, Woodstock estava longe. Mas ainda eram impressionantes. E, apesar da erva, havia um ambiente de inocência... Dois pormenores dão nas vistas: a posição dos braços, em arco, à volta dos joelhos; e a quantidade inacreditável de blue jeans... Parece um uniforme!

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Novo conselho a Passos Coelho

Por Ferreira Fernandes

HÁ DIAS, escrevi, aqui: "Eu gostava, mesmo, era de convencer Passos Coelho a não abandonar aquela ideia de nos convencer de que os governantes estão no nosso barco."
Gostava, disse, de o convencer a mudar isto: dois membros do Governo, Miguel Macedo e José Cesário, com casa própria em Lisboa, recebiam, por serem da província, um subsídio de alojamento. Subsídio legal, note-se, mas quando se tira aos portugueses subsídios também legais seria justo retirar aos ministros regalias inexplicáveis em tempos de vacas esqueléticas.
Ontem, colegas meus do DN dirigiram-se a Miguel Macedo e José Cesário a pedir-lhes explicações: estariam dispostos a abdicar do subsídio? Como era de esperar, eles disseram que não.
Por isso é que eu abordei o assunto de forma gramatical (sujeito/predicado) diferente. Na crónica, a minha proposta tinha o mesmo predicado que foi perguntado aos ministros - a acção de acabar com aqueles subsídios -, mas usei o sujeito certo: o primeiro-ministro.
A Macedo e a Cesário não cabe agir, o máximo que poderiam fazer era caridade. Eles disseram não querer dar para este peditório (compreendo, também eu não abdico do meu pequeno-almoço, apesar da fome no Sudão), mas esse não é o problema.
O problema daqueles subsídios não é moral, é político. Por isso eu me dirigi a quem deve agir, Passos Coelho. E este só tem de explicar aos seus colegas espoliados o mesmo que achou suficiente explicar-nos: tem de ser.
«DN» de 23 Out 11

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22.10.11

Convite

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Com Cavaco é mais mina antipessoal

Por Ferreira Fernandes

OS PRESIDENTES da República têm um poder, derrubar o Governo, a que os noticiários chamam "bomba atómica". O termo é ridículo e, diga-se logo, o actual primeiro-ministro, Passos Coelho, não vai tornar-se uma Hiroxima. Primeiro, porque é da mesma cor política do actual Presidente e, sobretudo, porque não vai com o carácter de Cavaco usar uma arma tão definitiva. Cavaco Silva, a ser qualquer coisa explosiva, é mais mina antipessoal.
Como sabem, o próprio destas armas (nas mais sofisticadas) não é matar. A mina antipessoal tem a dose de explosivo que não faz desaparecer a vítima (que rapidamente seria esquecida) mas que só lhe estilhaça uma perna. Passeando-se, ela e as muletas, a vítima transforma-se em propagandista de quem pôs a mina: "Vejam na minha desdita como ele é forte..."
Pois Cavaco é assim, uma mina aqui, um recado ali, com uma perfídia pelo meio. Uma sua vítima não é um morto; é a prova de vida, dele, Cavaco.
Esta semana, foi mais uma vez dessa arma que ele fez uso. Minou o Orçamento de Passos Coelho, concluíram alguns. Mas não, minou foi pessoalmente Passos Coelho. Sobre o acontecer, não muda nada: o corte dos dois subsídios vai passar (se fosse para não passar, uma conversa privada em Belém teria resolvido). Sobre o que pode acontecer, mudou tudo: Portugal que precisa de ser governado volta a ter, pairando, a sombra de Cavaco Silva.
Acreditem, é pior que a perda de três subsídios.

«DN» de 22 Out 11

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Esmola e desconfiança

Por Antunes Ferreira

E NO MEIO da crise, das medidas violentíssimas de austeridade e de autoridade, concretizadas em verdadeiras agressões do Poder aos cidadãos, surge uma notícia boa. De tal modo que é legítimo que nos perguntemos se ainda estamos anestesiados ou se já começamos a esfregar os olhos. E, mais legítimo é começarmos a tentar perceber o que se passa e eliminar a dúvida que (ainda) existe.

Já se sabe que 2012 será o annus horribilibis para nós. Impostos sobem, nomeadamente o IVA, e de que maneira. Que o mesmo é dizer sobem as tarifas da electricidade, do gás, da água, sobem os transportes, sobem os restaurantes, sobem os bens alimentares, diminuem os subsídios que ainda existam, acabam-se os 14 meses de salários, enfim, a recessão sobe e por aí fora. Resumindo: estamos f…ritos.

Mas, de acordo com o semanário Sol, eis que podemos saber que a companhia mineira Rio Tinto está a preparar um investimento que rondará os 3,5 mil milhões de euros em Trás-os-Montes. Trata-se, de acordo com o jornal, «do maior projecto de investimento que já existiu em Portugal», ao qual o ministro da Economia, Álvaro Santos Pereira, aludira no final de Setembro, durante o Prós e Contras, da RTP, sem na altura ter dado mais pormenores. A prudência parece que ainda é uma virtude.

Continua o Sol que a empresa anglo-australiana quer explorar as reservas de minério de ferro existentes na zona de Torre de Moncorvo. A concessão tinha sido adjudicada em 2008 à portuguesa MTI-Ferro de Moncorvo. Esta tem vindo a avaliar o potencial das reservas existentes na região e, efectuados os estudos, tomou a iniciativa de contactar a gigante mundial do sector mineiro, devido ao elevado investimento que será necessário efectuar.

«Não há dinheiro para investir em Portugal. A RioTinto foi escolhida por ter capacidade para suportar um investimento desta dimensão e possui tecnologia bastante avançada», publicou o Sol dando conta que a declaração provém de fonte próxima do processo. A fórmula, aliás usual, é típica de nós, os Portugueses. Com a sua utilização escuda-se contra um desmentido possível. Mas, também aqui vigora o nosso típico diz-se ou disseram-me mas não posso dizer quem. Conjugar este enigmático verbo é prática que se tornou rotineira.

Ora, como se sabe, até agora, o maior investimento efectuado no país foi realizado na fábrica de automóveis da Autoeuropa, em Palmela. Ali, em 1991, foram aplicados dois mil milhões de euros na unidade. Depois, houve projectos de grande envergadura, megalómanos até, que se esfumaram na bruma das promessas incumpridas.

O noticiário, hoje, alimenta-se de sangue, crime, manigâncias do jet set, sexo com as correspondentes trocas e baldrocas, corrupção, fugas às obrigações, colarinho branco, troca de influências, compadrio e outros que tais. Cada vez mais o aforismo «a notícia não é o cão morder no homem; é o homem morder no cão» nos é oferecido quotidianamente.

O rol das desgraças é o prato forte do que ainda se chama «informação». Jornal, rádio, televisão lutam desesperadamente pelo share, por outras palavras, pela sobrevivência. No Brasil, em tempos que já lá vão, havia um periódico, o Dia, que quando se torciam as suas páginas, pingava sangue. Eu conheci-o, com estes olhos que o forno crematório há-de esturrar até às cinzas.

Dir-se-á que o povo, essa entidade mítica que, até há pouco tempo, cheirava mal dos pés e dos sovacos – e pelo andar da carruagem pode ser que regrida a tal situação… - gosta disso e as percentagens do consumo de tais meios é elucidativa. E que é assim por todo esse desgraçado Mundo. Clara que há sempre a resposta calina: com o mal dos outros posso eu bem. Porém, é o mesmíssimo povo que também diz que quando a esmola é grande, o pobre desconfia.

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21.10.11

Morreu o tirano e nosso sócio...

Por Ferreira Fernandes

ENTÃO, Kadhafi foi apanhado com vida, e morto para que as câmaras o vissem bem morto. Foi morto pelos seus, ou que ainda há pouco eram dos seus a aplaudi-lo e não a enfiar-lhe um balázio da sua própria pistola folheada a ouro. Tudo como deve ser morto um tirano: pelos seus, com a certeza de ficar bem morto e um corpo que, espera-se, será feito desaparecer.
Nunca confiando com a morte dos tiranos.
Obama, Cameron e Juppé (ministro dos Negócios Estrangeiros francês) congratularam-se - e com razão, o morto, além de palhaço, o que é só uma questão de gosto, era um tirano dos autênticos, com mortes em casa e na casa dos outros. Mas também era líder de um país com petróleo e isso há que ter em conta, como não nos ensinam nas escolas onde útil e moral seriam aulas sobre cinismo, a mais cívica das educações. Ontem, teria ajudado os nossos jovens a não se surpreenderem com o alívio pela morte não do nosso aliado, que nunca foi, mas do nosso sócio, que foi (de Lisboa, Madrid, Paris, Londres, Washington...)
Mas, repito, que lhe escondam o corpo! Mal comparado, o tirano Júlio César também foi morto pelos seus (até Brutus...), mas no enterro o amigo Marco António fez um discurso que mudou a opinião da populaça romana sobre César, que de tirano morto virou saudoso chefe.
Todos os cuidados são poucos com aquelas cabecinhas populares que ontem nas ruas de Tripoli saudavam a troika salvadora: "Alá, o Comité Revolucionário e a OTAN!"

«DN» de 21 Out 11

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20.10.11

O que eles fizeram pelas Ciências da Terra (13)

Abraham Gottlob Werner
(1749-1817)
GEÓLOGO e mineralogista alemão, autor de uma estratigrafia geral, à escala do planeta, e de uma teoria que fez história e ficou conhecida por Neptunismo . Foi professor ilustre da Academia de Minas de Freiberga, na Saxónia, de enorme prestígio na Europa do seu tempo, e director do Geognostische Landesuntersuchung Sachsens. (Serviço de Investigação Geológica e Mineira) deste estado germânico.

Segundo a sua concepção neptunista, todas as rochas, excepto as lavas solidificadas dos vulcões activos, eram tidas como materiais depositados e petrificados no fundo do que designou por Oceano Primordial que, segundo ele, outrora cobrira toda a Terra, incluindo os cimos montanhosos.(...)

Texto integral [aqui]

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A URSS tinha estatísticas maravilhosas

Por Helena Matos

«A UNIÃO Europeia (UE) quer proibir as agências de rating de avaliar Estados, noticia hoje o matutino alemão Financial Times Deutschland, que teve acesso a um projeto ainda confidencial do comissário europeu para o mercado interno, Michael Barnier.» - Num passo seguinte a União Europeia terá de proibir os investidores de seguirem os rankings das agências.

«No projecto de reforma da lei sobre as agências de rating, Barnier propõe que a nova agência europeia de supervisão de títulos bolsistas, a ESMA, passe a ter o direito de «proibir temporariamente» a publicação de avaliações sobre a solvibilidade financeira dos Estados» - Nem a ESMA nem qualquer outra agência pode ter o direito de proibir a divulgação de informação. Aliás, como os dados em que as agências de rating se baseiam não são secretos, a ESMA terá de proibir também a publicação pelos Estado de informação que permita avaliar a sua solvibilidade financeira.

«A Comissão Europeia quer ver esta proibição aplicada sobretudo a Estados que negociaram ajudas externas com a União Europeia ou com o FMI.» O que ganham esses estados com isso? Maior desconfiança em relação às suas contas.

«Uma proibição podia impedir que haja uma avaliação de uma agência de rating em momento inoportuno, com consequências negativas para a estabilidade financeira do país em questão, e eventuais efeitos desestabilizadores para a economia mundial», afirma-se no projecto citado pelo Financial Times Deutschland. Como é óbvio nunca um momento será considerado oportuno.

«Barnier está convicto de que as agências de rating «nem sempre conseguem avaliar devidamente a situação» em momentos de crise, e propõe, consequentemente, que se examine a possibilidade de as proibir de publicar as suas conclusões.» O comissário Barnier faz jus ao nome do cargo que desempenha: é um comissário. Como todos os comissários estimulará um mercado paralelo de documentos não autorizados.

Se o comissário Barnier levar a sua avante teme-se o pior para os países da UE sobretudo daqueles que precisam de ajuda externa.

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«Dito & Feito»

Por José António Lima

ALBERTO João Jardim alicerçou a sua prolongada hegemonia regional na Madeira num modelo de acção política que reúne o que de pior há na esquerda com o que de pior há na direita.

À esquerda foi buscar a vocação controleira sobre a comunicação social, ao estilo Chávez das ilhas atlânticas, condicionando e perseguindo órgãos de imprensa, da rádio e até da televisão pública. O extraordinário caso do Jornal da Madeira, subsidiado e submetido aos milhões que lá coloca Jardim, está ao nível da imprensa do continente subjugada e ao serviço do PCP nos tempos do PREC. E é um símbolo da impotência dos Governos do país para impor a Jardim regras elementares de vida colectiva em democracia.

À direita foi Jardim assimilar a propensão para distribuir poder, influência e negócios por um núcleo restrito de apaniguados – como forma de manter, obediente e devedora, uma clique de indefectíveis apoiantes. De Jaime Ramos aos Sousa são várias as fortunas que nasceram e cresceram nos corredores do PSD madeirense ao longo das últimas décadas.

À esquerda foi, ainda, Jardim absorver os modelos de governação baseados no peso do aparelho de Estado e no seu despesismo sem limites. Estado que tem, na Madeira, um peso asfixiante na vida económica e social – dele dependendo milhares de empregos, de clubes e colectividades, de negócios que prosperam ou são bloqueados. O Estado cresceu como um autêntico Big Brother da sociedade madeirense. Exigindo, para se alimentar a si próprio e às muitas obras que fazem ganhar eleições, um endividamento galopante e irresponsável que atinge os 7 mil milhões de euros. E que ultrapassa em muito, em termos relativos, a loucura despesista de Sócrates que deixou Portugal afogado na crise da dívida .

A OBRA feita, à mistura com uns laivos populistas de direita ou de esquerda, é a receita básica da manutenção do poder, para lá das transgressões éticas e dos atropelos democráticos. É o que se tem visto com Jardim, com Isaltino ou com Valentim. Mas é uma receita que não dura sempre. E que, no caso de Jardim, irá ser paga duramente com enormes sacrifícios dos madeirenses ao longo da próxima década. Já sem ele, seguramente.
«SOL» de 14 Out 11

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Consensos

Por João Paulo Guerra

QUEM disse que “os portugueses estão asfixiados com impostos que incidem sempre sobre os mesmos” não foi nenhum dos oradores da concentração dos Indignados, nas escadarias do Parlamento, mas o engenheiro Belmiro de Azevedo no Encontro sobre a Re-industrialização do Norte.

Quem afirmou que o Orçamento do Estado para 2012 é "um suicídio assistido à classe média", contribuindo para "um ambiente de amargura e de falta de ânimo" na população não foi um esquerdista anónimo participante na concentração, em Lisboa ou outra cidade do país, mas um docente da ISCTE - Business School.

Quem declarou que "aquilo a que assistimos, cujas consequências se estenderão por muito tempo, do ponto de vista jurídico chama-se um desvio de bens, porque o tratamento do dinheiro foi feito não por gente honesta mas por aves de rapina, que no vocabulário português têm o nome de ladrões" não foi o secretário-geral do PCP, mas o bispo das Forças Armadas, D. Januário Torgal Ferreira.

Quem disse que "a nacionalização do BPN está a custar ao Estado, neste momento, o montante preciso de 4,5 mil milhões de euros" não foi o professor Francisco Louçã, mas o próprio Ministério das Finanças, em resposta a perguntas do grupo parlamentar do Bloco de Esquerda.

Quem considerou a Madeira uma "ilha desonesta" não foi nenhum dirigente do Partido da Nova Democracia, mas sim o Financial Times.

Quem declarou que não paga "nem mais um tostão" não foi qualquer pensionista, funcionário público, desempregado, ou chefe de família endividada, mas sim o doutor Alberto João Jardim.

Quem proclamou que o povo português é dos mais insatisfeitos com a vida que leva não foi qualquer dirigente oposicionista, nenhum sindicalista, nem mesmo um porta-voz da Geração à Rasca, mas sim 64% dos inquiridos para um estudo da OCDE.

«DE» de 20 Out 11

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A mocidade portuguesa do PSD e do CDS

Por C. Barroco Esperança

A MOCIDADE portuguesa dos partidos da direita confunde a responsabilidade política que se julga em eleições com a responsabilidade penal que é do foro dos tribunais.

Em vez de apurar os crimes do BPN e as contrapartidas dos submarinos (aparentemente do foro criminal), a mocidade descobriu que as malfeitorias do Governo PSD/CDS podem ser esquecidas com ruído mediático sobre o défice do último Governo. Para essa central de intoxicação não houve crise internacional nem o chumbo do PEC – 4 porque Passos Coelho não admitia aumentar impostos e sacrifícios. Só queria cortar despesas, e os eleitores não pensaram nas próprias, julgando que se referia às do Estado. (...)

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19.10.11

Amanhã, vou comprar um iPad

Por Maria Filomena Mónica

NUMA semana em que toda a gente escreveu sobre Steve Jobs é difícil ser-se original, por isso nem tentarei, mas desejo louvar uma sua invenção menos referida, o iPod. Sem este aparelho, que permite ouvir música fora de casa, há muito que teria deixado de fazer as caminhadas que me salvaram a vida. Habituada ao meu walkman, quando este desapareceu do mercado, fiquei sem saber como amenizar o tédio dos meus forçados passeios. Finalmente, em Janeiro, comprei um iPod nano.

Mal abri a caixinha transparente, contendo um rectângulo com uma rodela, apercebi-me que, estética e tecnologicamente, estava a ingressar num mundo novo. Tudo – o grafismo, os fios, a cor – era diferente. (...)

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Mais uma discussão errada

Por Ferreira Fernandes

A RTP convidava gente para explicar-nos o mundo e o País e, feito o trabalho, a RTP pagava uma avença. Agora, veio o ministro da tutela, Miguel Relvas, e disse: se esse explicador tem cargo público deixa de se pagar. A RTP aceitou.
Esses, os factos. Diagnóstico do comentador deste cantinho: tudo errado.
A pergunta é: os políticos avençados pela RTP iam à televisão por serem políticos ou porque eram capazes de nos esclarecer?
Se o político é convidado a comentar porque nos forma e informa (e a Direcção de Informação da RTP deveria ser a única, gerindo o pouco ou muito dinheiro que tiver, a decidir se é assim), ele tem todo o direito em cobrar pelo bom serviço prestado. Se escrever um livro, apesar de ser deputado, não recebe uma percentagem pelas vendas?
Toda a questão está enviesada porque se parte do princípio - confirmado pela maioria dos casos reais (na RTP e outras estações televisivas) - de que o político é convidado, não pelos seus méritos, mas para preencher a quota do partido. Tipo debate de futebol com a camisola do clube vestida. E aí, de facto, o que surpreende é que seja necessário aconselhar a RTP a poupar, e não ela a lembrar-se de cobrar pela publicidade pessoal ou partidária permitida.
Um comentador televisivo é um sábio e um comunicador, uma cabeça que pensa, de quem podemos suspeitar ou conhecer as suas tendências mas com quem nunca ficamos a perder escutando. Um homem assim nunca nos pode ficar grátis.

«DN» de 19 Out 11

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Sobre os "indignados"

Por Baptista-Bastos

TUDO INDICA que o capitalismo está sem resposta para os desafios que lhe estão a surgir, um pouco por todo o lado. Os "indignados" dos oitenta países que se manifestaram no último fim- de-semana constituem um sinal, entre muitos outros, do mal-estar das populações. O empreendimento totalitário do "mercado" começa a fazer emergir novas formas de cidadania, com o pessoal mais novo a repegar nas bandeiras dos seus pais e a dar um outro sentido à resistência ideológica. Os turiferários do sistema podem esbracejar contra o movimento geral de protesto, alegando que o capitalismo tem sempre encontrado formas de se renovar, mas os seus argumentos não passam de autolimitações de recurso. A verdade é que os sinais são facilmente apreensíveis e negar ou contornar esta recomposta versão da luta de classes é tapar o sol com a peneira.

Sempre que nos mobilizamos estamos a decidir. E, lentamente embora, tudo induz a uma mudança considerável de mentalidades. Os mais jovens, sendo os porta-vozes do descontentamento generalizado, não se contentam com ser sujeitos passivos daquilo que lhes impõem. Os modernos mecanismos de informação e de relação uns com os outros representam uma etapa importante dos laços sociais, reatados, com outros métodos, após décadas de manipulação e de propaganda.

A verdadeira dimensão da acção dos "indignados" é, ainda, imprevisível e, acaso, não imaginável quanto aos resultados finais; no entanto, a própria distribuição assimétrica do protesto admite o renascimento de uma certa forma de convívio. Ora, o poder sempre combateu a convivialidade para discricionariamente governar, mesmo em democracia.

Algumas débeis adaptações que o capitalismo tem feito às exigências históricas nasceram das acções conjuntas dos "indignados" dessas épocas. O "equilíbrio pelo terror", da guerra-fria, permitia algumas cedências, e uma confortável estabilização das classes trabalhadoras. A implosão do "socialismo real" e a queda do Muro inverteram, ou subverteram, como se queira, o estado de coisas. Esta situação concebeu um desafio ético, que o capitalismo ignora e espezinha, como se está duramente a ver. A ausência de discussão e de debate, a ascensão de uma Direita integrista e intolerante criaram um vácuo insuportável, a que a Esquerda não soube ou não quis dar resposta, por inércia, incompetência e traição.

Os "indignados" emergem, inorganicamente, à margem dos partidos e das organizações sindicais, pela simples razão de que não se sentem representados nem defendidos. Este tipo de iniciativas, sem fórmulas nem linhas regulamentadas, pode fazer despertar os nossos adormecimentos e as nossas fatigadas indiferenças. E repor em causa as origens dos poderes que dominam os valores morais, e nos causam desgraça, infelicidade e medo.

«DN» de 19 Out 11

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Excepção

Por João Paulo Guerra

A NOTÍCIA, ontem publicada na imprensa, sem reservas nem desmentidos, segundo a qual as pensões vitalícias de ex-titulares de cargos políticos escapam à regra geral da austeridade que o Governo fez abater sobre o País, é motivo de escândalo e de justa indignação.

Tais pensões vitalícias, precedidas de um subsídio de reintegração na sociedade civil, já de si são dificilmente defensáveis. Só têm explicação na simples e prosaica razão de que o legislador, nessa matéria, legisla em proveito próprio e, vai daí, aproveita-se. De resto, excluindo as funções, como as de chefia do Estado, que acarretam responsabilidades e encargos para o resto da vida, não se entende por que razão alguém ganha direito a uma pensão vitalícia por aceitar e exercer a função de administrar o País em nome do povo. Mas que se mantenham ao arrepio da austeridade geral, sem alteração nem cortes, tais pensões vitalícias, conquistadas muitas vezes em poucos anos de serviço, quando toda a Nação aperta o cinto e enfrenta privações e bem próximo e palpável o espectro da miséria, é um sinal de arrogância do poder, com desprezo pelo povo em cujo nome se exerce a soberania, absolutamente condenável, que afronta a democracia e desmerece o nobre e desinteressado exercício da política.

Enquanto alguns atiram areia aos olhos do povo, sugerindo a responsabilização criminal de outros tantos, julgados previamente únicos responsáveis pela chamada crise - quando responsáveis, por acção ou omissão, seriam todos os que passaram pelo poder -, os retirados da cena política preparam-se para gozar, por inteiro, o bem-bom de uma benesse auto-atribuída. Não foi seguramente para isto que alguns militares generosos fizeram o 25 de Abril, devolvendo a democracia aos portugueses.

«DE» de 19 Out 11

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18.10.11

Eis uma boa solução para os problemas suscitados pelo Novo Acordo Ortográfico: escrever a mesma palavra, na mesma montra... mas com grafias diferentes!

Sobre o valor facial da mentira

Por Ferreira Fernandes

UM PROFESSOR do Laboratório de Expressão Facial da Emoção, da Universidade Fernando Pessoa, no Porto, vai propor que o próximo Código Penal permita a análise das expressões faciais nos inquéritos da polícia. Ele diz que os interrogatórios de suspeitos deveriam ser filmados, para que os especialistas possam separar a verdade da mentira: "Na face vê-se tudo", garante. Enfim, o "Lie to Me" a passar do canal Fox para a PJ.
Nada contra, e até simpatizo com a iniciativa do professor que faz pela vida (vai fornecer a lista de peritos que as polícias vão precisar). O que não entendo é a pouca ambição na escolha do nicho de mercado.
Já o patrono da universidade do professor - Fernando Pessoa ("O poeta é um fingidor./ Finge tão completamente, etc.")... - se tinha dedicado às mentirinhas de um grupo social irrelevante. O professor eleva a fasquia dos candidatos a analisar, os criminosos (mais numerosos e com maior impacto social que os poetas), mas mesmo assim a léguas das preocupações actuais dos portugueses. Hoje, estes o que queriam era meter a análise das expressões faciais não no Código Penal, mas no Código Eleitoral.
Por exemplo, quando um político em campanha diz que não mexe nos subsídios, no caso de ser promessa vã, topa-se na face? Levanta as sobrancelhas? Gira os olhos? Passa a mão na melena?...
"Na face vê-se tudo", garante o professor. Chamou-nos ceguinhos.

«DN» de 18 Out 11

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17.10.11

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Das rochas sedimentares (6)

Por A.M.Galopim de Carvalho

DADAS as suas dimensões, os fenoclastos estão maioritariamente representados por fragmentos de rochas (litoclastos). Estes são de vários tipos e origens, com acentuada predominância dos mais resistentes aos agentes de meteorização, erosão e transporte, como são o quartzito , o sílex e outras rochas siliciosas (silicitos) ou silicificadas, como, por exemplo jaspe, lidito e ftanito, entre os mais frequentes. (...)

Texto integral [aqui]

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A Internet é muito traiçoeira

Por Ferreira Fernandes

O DIRIGENTE do PS francês Paul Quilès foi herói involuntário das primárias. Ao meio da tarde, ainda sem resultados, os jornais receberam um comunicado dele saudando a vitória de Hollande. Ele explicou a precipitação: tinha preparado dois comunicados, mas "A minha bateria foi abaixo e quando voltei a ligar o computador um dos comunicados partiu!"
A Internet é traiçoeira, quem nunca mandou uma mensagem errada que atire o primeiro sms. Mas o Twitter francês, ontem, explodiu em falsas mensagens inspiradas no erro de Quilès...
As frases que se seguem sou eu a imitar desculpas à la Quilès. "A minha bateria estava um buraco, quando liguei o computador, toda a gente viu" (Jardim). "A minha bateria era de energia renovável, quando quis reiniciar o computador o contrato com este não tinha sido renovado" (Sócrates). "A minha bateria apagou-se por causa da insuportável política do Governo, quando liguei o computador já a culpa era da crise internacional" (Cavaco). "A minha bateria estava tão em baixo que eu protestei, quando liguei o computador já não havia nem computador nem bateria" (Louçã ou Jerónimo). "A minha bateria foi-se abaixo, quando liguei o computador a culpa era da bateria do Sócrates" (Passos Coelho). "A minha bateria estava em baixo, quando liguei o computador, claro que a Mota-Engil foi indemnizada" (ex-secretário de Estado das Obras Públicas Paulo Campos). "A minha bateria pode extinguir-se" (António Barreto)...

«DN» de 17 Out 11

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16.10.11

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Entrevista ao «Expresso» de 8 Out 11

Por António Barreto

Esta semana, a Fundação Francisco Manuel dos Santos, presidida por António Barreto, apresentou um estudo, encomendado à Escola Nacional de Saúde Pública, sobre os custos da assistência médica em Portugal. O estudo foi realizado por uma equipa dirigida pelo Professor Carlos Costa. Convencido de que o sistema de saúde não sobrevive se for totalmente universal e gratuito, Barreto avisa que é preciso racionar os cuidados.

- Neste momento, sempre que se fala em Saúde fala-se em cortes. A obsessão com os custos não pode ser perigosa?


- Perigoso? Perigoso é não se falar. Nos últimos 20 ou 30 anos pensámos sempre na factura como uma coisa secundária. Estabeleceu-se o princípio de que quando alguém fala nos custos está a ser economicista. Detesto este termo, porque não olhar para os custos significa obrigar o povo a pagar. E agora damo-nos conta que o povo está esganado e de que os sistemas não aguentam. (...)

Texto integral [aqui]

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15.10.11

No Reino do Absurdo

A imagem de baixo (pormenor da de cima) é uma das que enriquece a colecção intitulada «A nossa 'vantagem competitiva'», que se pode ver [aqui]

Leite e mel

Por Antunes Ferreira

DESENGANE-SE quem contava que o discurso do nosso primeiro na quinta-feira fosse mau; foi pior, na realidade, foi péssimo. Foi o discurso da desgraça, foi o discurso do aumento das cargas (fiscais e outras) sobre os Portugueses, foi o discurso da ameaça, foi o discurso da retaliação. Contra (quase) todos os Executivos que antecederam o actual. Sem os nomear – e assim os de Cavaco escaparam.

No entanto, Pedro Passos Coelho, PPC, sempre foi dando uma pequeníssima alegria progressiva ao povo: em 2012 será o tsunami, em 2013 será a emersão, e finalmente, em 2014 será o país do leite e do mel. Há quem duvide? Eu, não. Acredito habitualmente, sem rebuço, em quem nos governa, nas suas rectas intenções, nos seus bons propósitos e, sobretudo no que se propõem fazer. Ingénuo? Crente. Porém, cuidado, fui católico, mas curei-me.

Diz quem sabe dessas coisas que há que sofrer na terra para se ganhar o Céu e, especificamente, a felicidade eterna. Cada vez mais me espanta a asserção, pois todos ambicionamos ser o mais felizes possível nesta vida que, aliás, para mim é a única que temos. A esmagadora maioria dos homens almeja a felicidade no quotidiano. Esperar por um lugar numa qualquer nuvem com direito a harpa individual é despicando.

Alcançar a terra do leite e do mel é aspiração que já vem do Antigo Testamento. Umas quantas lendas judaicas igualmente a isso se referem. Um exemplo, apenas. «Um sábio, de su nome Rami ben Yechezkel certa vez visitou Bnei Brak. Quando andava num campo, perto da cidade, encontrou três figueiras repletas de frutos doces e maduros. Muitos já estavam caídos no solo e o seu mel fluía deles. Naquele mesmo, algumas cabras, que pastavam por perto, vieram a correr, e comeram os figos que estavam no chão. Os úberes das cabras ficaram tão cheios que o leite gotejou na terra, precisamente em cima do mel dos figos. Rami ben Yechezkel ficou emocionado. "Vejam", bradou, - "isto é exactamente o que Hashem nos prometeu - uma terra com abundância de leite e mel!"». Si non è vero, è bene trovato.

Pois foi o muito pouco que eu pude deduzir dos quase vinte minutos de palavreado com que o primeiro-ministro nos mimoseou. O que, não sendo animador, bem pelo contrário, foi esclarecedor. Isto está num buraco tal que tem de haver quem pague para que o tapem. Ao buraco colossal, entenda-se. Não haja dúvidas: serão os mesmos, ou seja, os funcionários e os pensionistas. Remédio santo e fácil.

Espantou-me um tanto que Coelho não tenha também incluído nesta gentalha, os jornalistas. Mas, hony soit… Mas enfatizou uma ajuda para a posteridade e para a produtividade. Os molengas dos trabalhadores da privada, para que não se fiquem a rir, vão trabalhar mais meia hora por dia. Os patrões queriam mais, mas foi o que se pôde arranjar.

Descuidado ou desatento não ouvi nada sobre a nossa economia. O nosso chefe deve ter enunciado os caminhos para o crescimento e, já agora, para o desenvolvimento, mas não dei por isso. Da consolidação orçamental e da correcção das contas públicas, disso, dei conta. E vejam que não desliguei o aparelho auditivo, muito simplesmente porque (ainda) não o uso.

Porém, o desejado aumento da famosa produtividade não resultará desse bendito, ainda que escasso, acrescento laboral de trinta minutos diários. Vai-se aos feriados – e pimba, juntam-se aos fins-de-semana e outros mesmo deverão ser executados, precisando, abatidos, eliminados. A Igreja que nestes transes não é de modas, já admitiu que nem os feriados católicos escapem. Eu pergunto-me: os Santos Populares, vá que não vá. O António, então, é só balões, sardinha assada com pimentos, marchas e vinhaça. Mas, e o 24/25 de Dezembro?

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O Grande Inquisidor

João Magueijo
Por Carlos Fiolhais

O PINTOR Salvador Dali disse um dia: "Vou ser génio. Talvez incompreendido e desprezado mas um génio grandioso”. Pois, em 1906, dois anos após Dali vir ao mundo, nascia em Catânia, na Sicília, um físico que foi um génio grandioso mas quase ignorado. Chamava-se Ettore Majorana e, se não deixou mais obra, isso deve-se em parte à brevidade da sua vida. Como diz uma placa na casa natal: “O seu génio tímido e solitário escrutinou e iluminou os segredos do Universo com o brilho de um meteoro precocemente desaparecido de entre nós, em Março de 1938, deixando-nos o mistério do seu pensamento.”

O seu tutor, o italiano Enrico Fermi, um dos maiores físicos do século XX, colocou-o nos píncaros da ciência, ao lado de Galileu e Newton, e, portanto, acima dele próprio. Majorana era um prodígio no cálculo mental e Fermi, numa disputa para ver quem fazia mais depressa contas complicadas, nem ajudado por uma régua de cálculo o conseguiu bater. O professor ficava irritadíssimo quando via o discípulo garatujar num maço de cigarros uma nova ideia científica, expressa em belas equações, e, no fim de fumar, deitar o maço ao lixo. A Majorana bastava o prazer solitário da descoberta, não sendo necessário o reconhecimento dos pares. Fermi e os seus outros alunos eram extrovertidos, discutiam muito, competiam entre si para serem os primeiros. Mas o siciliano preferia a contemplação, o recolhimento e o silêncio. Ele era o único que conhecia o mistério da sua mente.

O físico português João Magueijo, professor no Imperial College de Londres, acaba de publicar, em português, na Gradiva, uma biografia do enigmático sábio: O Grande Inquisidor. O autor revela-se, nesse livro, fascinado pela vida e pensamento de Majorana e tenta penetrar no mistério. Tenta compreender o génio, criativo e extravagante. Porquê Grande Inquisidor? Pois a famosa escola de Fermi foi fundada, na Roma de Mussolini, por um senador, em geral ausente, a quem chamavam Deus. Fermi era o Papa, o representante de Deus na Terra. E Majorana só podia ser Inquisidor pois se comprazia em pôr tudo e todos em causa. Apesar de resistir à publicação, a sua originalidade ficou bem patente numa teoria quântica relativista alternativa à do inglês Dirac, num modelo das forças nucleares paralelo ao do alemão Heisenberg e na proposta de um neutrino diferente do que foi concebido pelo austríaco Pauli e baptizado por Fermi. Todos estes foram grandes nomes da física moderna e com todos eles Majorana pediu meças.

A lenda de Majorana ganhou proporções maiores quando ele desapareceu, sem deixar rasto, depois de ter deixado uma nota de despedida à família: “Recordem-me, se puderem, nos vossos corações, e perdoem-me”. Ter-se-á deitado ao mar num navio entre Palermo e Nápoles, mas não se sabe ao certo.

«SOL» de 7 Out 11

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