31.5.16

Sem Emenda - As Minhas Fotografias

.
Retornados e seus caixotes à chegada a Lisboa – Durante uns meses de 1974, chegavam os últimos vapores das colónias. Uns traziam soldados, outros repatriados, refugiados ou retornados que abandonavam definitivamente África. Com eles, ou em cargueiros, vinham caixotes e contentores. Muitos dos que regressavam não eram retornados, isto é, não tinham nascido em Portugal. Eram Angolanos e Moçambicanos. Não foi assim que os quiseram cá, queriam-nos retornados. Não era assim que os queriam lá, eram colonos. Parecia que ninguém os queria. Mas foi um dos acontecimentos mais importantes dos últimos séculos: num só ano, chegaram perto de 700.000 pessoas, naquela que foi uma das maiores deslocações humanas da história da Europa em condições de paz. Mal ou bem, integraram-se e recomeçaram tudo. E muito fizeram pela recuperação económica dos anos oitenta. Sem nada ou com pouco, traziam uma energia infinita, não perderam tempo com lamúrias nem acreditaram em revoluções idiotas: fizeram-se à vida!

DN, 22 de Maio de 2016

Etiquetas:

29.5.16

Luz - Judeus à conversa em Piccadilly street, Londres

Clicar na imagem para a ampliar
Na grande rua comercial que é Piccadilly, um pequeno grupo de Judeus conversa diante da entrada de uma grande livraria, a Waterstones (cadeia de livrarias que cobre a Inglaterra inteira). (2015)

Etiquetas:

28.5.16

A deriva nacionalista e ultraliberal da União Europeia (EU)

Por C. Barroco Esperança
Milton Friedman foi provavelmente o economista mais influente da segunda metade do século XX e a influência deletéria, que o brilhante académico e excecional comunicador exerceu, subsiste. A sua teoria é hoje o catecismo capitalista que excluiu os mais fracos e acumulou 50% da riqueza mundial nas mãos de 62 pessoas.


Beneficiário do New Deal, de Franklin D. Roosevelt, que permitiu a sua sobrevivência e a de jovens economistas, tornou-se o principal teólogo de uma nova religião. Líder do grupo ultraliberal, ‘bando de Chicago’, foi consultor do Partido Republicano dos EUA e moldou o capitalismo, convertido à vulgata ultraliberal, cruel e amoral, de que Ronald Reagan, Margaret Thatcher e João Paulo II foram as referências políticas.

A URSS, em fase de implosão, facilitou o uso da democracia política como argumento estimulante, para acelerar a queda do comunismo, e acabou por ser mero pretexto para a imposição de uma ditadura do capital financeiro. O Chile foi o laboratório da primeira experiência, que só resultou graças à repressão violenta e assassínios seletivos.

O ultraliberalismo está para o capitalismo como o Antigo Testamento para as religiões monoteístas, irrevogável e totalitário. Não será uma maldição vitalícia, mas deixará um rasto calamitoso, com o poder económico a comandar a política e o capital financeiro a determinar a ideologia.

A UE, refém do modelo único imposto pelo FMI, BCE, CE, agências de rating, PPE e outros agentes do terrorismo financeiro, vai deslizando para modelos fascizantes de que o último susto foi a eleição presidencial austríaca onde toda a esquerda, aliada a toda a direita de rosto humano, venceu a extrema direita por escassos 0,6% dos votos, precária vitória que prenuncia o triunfo extremista nas próximas eleições legislativas.

Na segunda-feira foi o Partido da Liberdade da Áustria que esteve à beira da vitória, um partido que há década e meia a UE não tolerava. Em breve poderá ser poder, depois das próximas eleições legislativas. A Polónia e a Hungria já se renderam à extrema-direita. Frente Nacional (França), Partido Nacional Democrático (Alemanha), Aurora Dourada (Grécia), Partido dos Finlandeses, Partido do Povo Dinamarquês, Partido da Liberdade (Holanda) e Liga Norte (Itália) são monstros que, como a Hidra de Lerna, matam com o seu hálito.

O Partido Popular Europeu (PPE), hegemónico, cada vez pior frequentado, anda muito preocupado com o eleitorado ibérico, enquanto adapta a pituitária ao hálito que exalam os partidos, atrás referidos, que caminham para o poder.

Conheço da História uma conjuntura semelhante. Nasci durante a guerra que ateou.


Etiquetas:

Mourinho o Salvador

Por Antunes Ferreira
Como costumo fazer (quase) sempre alinho à minha frente uma panóplia de temas que entendo que podem dar comentário. É um procedimento meu, que entendo ser válido e outros absolutamente não. A possibilidade de opção é para mim uma das componentes – talvez a mais importante… - da Liberdade e da Democracia, por isso entendo que os crimes de opinião foram e são um malogrado exemplo das ditaduras nelas incluindo naturalmente a salazarenta.
Este foi uma decisão que embora já conhecida por muita gente que não concorda comigo, é inteiramente minha. Como dizia um Senhor chamado Winston Churchill é melhor ter uma ideia, ainda que não seja muito boa, do que não ter nenhuma. Não sei se o estadista britânico tenha plagiado Monsieur Jacques de la Palice, mas aderi absolutamente à sua sentença proferida durante a II Guerra Mundial. Mas também no outro prato da balança nunca me esqueço da quadra que foi feita ao militar francês:
Hélas, La Palice est mort,
Est mort devant Pavie.
Hélas, s'il n'était pas mort,
Il ferait encore envie
.
Foi com esta chacota que começou a grassar a lapalissada…
Pois bem desse alinhamento constavam o debate parlamentar em que cada quinze dias o Governo vai a São Bento discutir o “estado da Nação”, (uma herança de Sócrates); o homem que matou em Montemor-o-Velho a tiros de caçadeira a mãe e os avós e se suicidou; a homenagem de Obama à hecatombe atómica em Hiroxima; as possíveis sanções de Bruxelas a Portugal; a saga dos colégios privados; a greve dos estivadores, enfim a estória do vai e vem do petróleo e mais uns quantos que seria despiciendo apontar.
Rejeitei-os todos, não porque não tivessem óbvia importância – decisão minha… Por favor ver acima o que escrevi sobre a capacidade decisória. De resto quem sou eu para ignorar essa enorme importância. Pronto, rejeitei-os. Porquê? Escolhi um assunto que pela dimensão de que se rodeou, pelas “cabeçalhos” da informação, por uma atenção mundial (estive quase a escrever universal): após um folhetim “dramático” José Mourinho assinou pelo Manchester United.
Este é um exemplo, acho, do poder da globalização, do ultra milionário negócio do futebol, da alienação dos cidadãos e do poder financeiro. Porque não haja dúvidas de que quem manda neste triste planeta azul é a finança. E os 15 milhões de euros anuais que o special one fazem com que os sujeitos normais se sintam invejosos à enésima potência. Mou vai salvar o Reino Unido (?) salvando Old Trafford das misérias de resultados que já custaram as cabeças doutros treinadores desde que se ausentou Sir Alex Ferguson.
As coisas são o que são, a vida é o que é. E as parangonas também; vão desaparecendo: é o share, é o que se vende e o público compra. Entre a Rússia e a Ucrânia continua uma guerra assassina, mas a notícia saiu de moda, ultrapassada pelos jihadistas ou pelos emigrantes, duas tragédias e duas impotências da nossa velha Europa. E seguir-se-ão outras questões comandadas pelo dinheiro…

Por isso escolhi Mourinho e pelo estúpido Mundo que o idolatra. Pensando bem: o estúpido sou eu.

Etiquetas:

26.5.16

CIÊNCIA E COMUNICAÇÃO

Por A. M. Galopim de Carvalho

Ao cumprirem as funções essenciais à sobrevivência, em particular, a procura de recursos alimentares e de defesa, os nossos mais longínquos antepassados interagiram de muito perto com o meio físico e, ainda que de forma muito embrionária, podemos aceitar que se iniciaram nos conhecimentos que, milénios mais tarde, integraram as diversas disciplinas científicas. Entre os objectos e os mecanismos que lhes foi dado observar no mundo físico que foi o seu, experimentaram o que puderam experimentar, estabeleceram relações de causa-efeito, deduziram o que souberam deduzir, inferiram o que conseguiram inferir e transmitiram aos descendentes o saber que foram acumulando, servindo-se para tal das linguagens de que dispunham, nomeadamente o gesto e, mais tarde e progressivamente, a palavra falada e só muito depois a escrita.
À semelhança da transmissão destes saberes rudimentares também a ciência é inseparável da comunicação. Entendida como um conjunto de conhecimentos acerca de parcelas maiores ou menores do todo universal, obtidos através da observação, da experimentação e/ou da elaboração mental, a ciência é um edifício do colectivo, cujos alicerces se perdem nos confins do tempo da humanidade. Edificada pedra sobre pedra, o seu fio condutor sempre foi e será a comunicação. Sem comunicação, o conhecimento científico não avança. Morre com quem o cria. Comunicar ou comungar, do latim, communicare, significa partilhar com outrem. Comunica-se através da linguagem escrita, falada ou gestual. Comunicam entre si, e até connosco, muitos dos animais que conhecemos. A comunicação entre os humanos utiliza sobretudo a palavra falada e escrita. Quando falada, apoia-se quase sempre no gesto e na expressão fisionómica e corporal. Comunicam entre pares, ao mais alto patamar de erudição, os sábios nas academias e os investigadores nos congressos e outras reuniões científicas. Comunicam entre si professores e alunos. Comunicam, através dos livros ou dos media, e aos mais diversos níveis, os poucos divulgadores que se dispõem a fazê-lo.
Quase tudo o que nos rodeia e de que constantemente nos servimos, ou com o qual nos articulamos diariamente, resultou das conquistas da ciência e da tecnologia. Os alimentos, os medicamentos, os transportes e comunicações, os equipamentos mais variados da indústria, da saúde, da cultura ou do lazer, radicam, em grande parte, nestas conquistas do génio humano. O conhecimento científico e as tecnologias com ele relacionados são alguns dos pilares sobre os quais assentam as sociedades humanas, o progresso social e o bem-estar da humanidade.
O paralelismo entre a produção científica e o avanço das técnicas de comunicação é, sobretudo nos dias que correm, uma evidência espectacular. Do texto manuscrito enviado por mar e à vela, ou por terra, na bolsa de um estafeta a cavalo, ao Morse e ao correio expresso, ou dos já antiquados telexes e faxes, ao actualíssimo e-mail e à inesgotável internet, a generalização e o aperfeiçoamento constante e progressivo dos meios de comunicação de pessoas e ideias fez crescer exponencialmente o hoje imenso e inabarcável edifício da ciência. Esperemos que o instantâneo da comunicação, que caracteriza os nossos dias, possa acautelar muitos dos riscos que os avanços da ciência e da tecnologia também acarretam. Lembremo-nos da pólvora, da dinamite, da energia nuclear, da química e da biologia ao dispor de arsenais bélicos, e não esqueçamos a clonagem, os transgénicos, a nanotecnologia e tudo o mais que já está aí e, ainda, o que se adivinha, com inevitáveis reflexos, bons ou maus, na vida dos cidadãos.



Etiquetas:

22.5.16

Luz - Fachada do Arquivo Fotográfico Municipal, com passeantes e fotógrafo, Lisboa


Clicar na imagem para a ampliar
Na Rua da Palma, ali à Almirante Reis, diante da fachada da sede do Arquivo Fotográfico Municipal de Lisboa, uma senhora africana passa com seu filho pela mão, assim como senhor a caminhar de canadiana e em sofrimento evidente. No reflexo, imagem de fotógrafo aparentemente descuidado… (2015)

Etiquetas:

21.5.16

Sem emenda - Paralaxe

Por António Barreto
As memórias e as biografias dos dirigentes políticos são interessantes. Já não têm influência, mas oferecem a oportunidade de rever a história. E ajudam-nos a compreender episódios que, sem a dimensão pessoal, poderiam ficar misteriosos. O problema é que as versões contraditórias sobre os mesmos assuntos são inevitáveis.

O que, esta semana, sobre a Cimeira dos Açores, nos disseram Jorge Sampaio e Durão Barroso, não foge à regra do erro de paralaxe. Este decorre, segundo os dicionários, de um desvio óptico. Muda o observador, mas parece que é o objecto que mudou. Isto é: tudo depende do ponto de vista. Se, com observadores, o erro é possível, com protagonistas é provável. Os ângulos de visão de Sampaio e Barroso provocam visões diferentes do objecto. Este último, no caso vertente, não é pequeno: é a guerra e a paz.

Foi em 2003 que se realizou a cimeira que precedeu a guerra do Iraque. Bush, Blair, Aznar e Durão Barroso conversaram durante umas horas. O Português era o anfitrião. A participação de Portugal nas operações que se seguiram não estava em causa. Mas a hospitalidade tinha valor político. A meio do Atlântico, acolhida por um membro da NATO cujos membros estavam divididos, o local da reunião tinha mais significado do que o expediente geográfico.

É um momento forte da diplomacia e da posição de Portugal no mundo. De avaliação das alianças internacionais. E de decisão importante para a paz e a guerra. O então Chefe de Estado, Jorge Sampaio, e o então Primeiro-ministro, Durão Barroso, não têm hoje a mesma visão do que se passou. Tinham ideias diferentes sobre os méritos da questão, o que não é inédito nem grave. Que tenham hoje recordações diferentes é mais aborrecido. Mas útil. Porque podemos aprender com a história. Ou antes, com as histórias.

Dias antes do início da guerra, já os jornais portugueses falavam dessa iminência, garantiam que a reunião dos Açores era a última tentativa pacífica e relatavam declarações do presidente americano segundo as quais os americanos estariam dispostos, com ou sem autorização das Nações Unidas, a atacar o Iraque. Os mesmos jornais sublinhavam que Durão Barroso concordava com o ataque militar.

Temos duas versões do mesmo acontecimento. Em quem confiar? Não tenho nenhum motivo para acreditar piamente no que me dizem Sampaio ou Barroso, sobretudo se estão um contra o outro. Creio que nunca saberemos a verdade. A não ser por fé, o que não parece ser bom critério. Mas é possível, mesmo sem testemunhas autênticas, reflectir sobre o caso.

Se Sampaio tem razão, não é admissível que, sobre assunto tão importante, o Primeiro-ministro o tenha informado tardiamente. Ou lhe tenha ocultado o que estava em causa e omitido conversas com os aliados. Se Sampaio tem boa memória, o que se passou é inadmissível. Ou antes: é sintoma do sistema de semipresidencialismo em que vivemos. Sampaio não devia, em tema tão grave, dizer apenas “nada a opor”. Sampaio não pode dizer que ficou estupefacto e deixou correr. Sampaio não podia desconfiar da urgência e nada ter feito para impedir a precipitação. Sampaio não pode dizer que tinha reservas e desculpar-se com a falta de competências do Chefe de Estado.

Se a memória de Barroso é mais fidedigna do que a de Sampaio, não é admissível que em assunto tão grave o Presidente da República tenha apenas dito “nada a opor”. Nem que se tenha mantido passivo. Se Barroso está a dizer a verdade, o que se passou é inadmissível. Dois dias de prazo são insuficientes. Dispensar o acordo do Chefe de Estado ou satisfazer-se com o “nada a opor” é erro. Aceitar o “nada a opor” é não perceber que o presidente “lavava as suas mãos”.

Portaram-se ambos mal! Por decisão ou ocultação. Mais uma pérola para as aventuras do semi-presidencialismo!


DN, 15 de Maio de 2016

Etiquetas: