31.10.21

No "Correio de Lagos" de Out 21


Talvez por distracção, o certo é que não nos apercebemos de que o premente tema da água tenha sido objecto de análise (e muito menos de debate) durante a recente campanha eleitoral. E, no entanto, o problema está a bater-nos à porta, pelo que devia ter feito soar as campainhas de alarme de todos os intervenientes, e já seria com atraso. A conversa da moda é que “a culpa é das alterações climáticas e do aquecimento global”, como se não pudéssemos fazer nada. 
Mas será mesmo assim?

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As imagens são de 15 de Setembro e de 28 de Outubro 21

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No "Correio de Lagos" de Out 21


EM MEADOS
de Julho, a página “Lagos, a Minha Cidade” (que conta com mais de 22 mil membros!), foi agitada por um ‘post’ de uma turista espanhola que se queixava de uma invasão de algas na Praia da Batata (onde, segundo dizia, vinha todos os anos, de há 25 a esta parte), e pedia que a CML fizesse a necessária remoção — o que, por sinal é o que sucede por esse mundo fora onde o fenómeno é comum.

Mas ah!, o que ela foi fazer! Como era de esperar, despertou o “sentimento aldeão” de alguns lacobrigenses, os quais, sem perceberem que “só se critica aquilo de que se gosta”, lhe atiraram com comentários soezes como «Porque não pegas numa pá e limpas tu? / Se não gostas, vai para a tua terra! / Essas algas são valiosas, boas para estrume, e algumas até se comem!» — e por aí fora, incluindo um «Vay a la mierda!» de refinado bom gosto.
Entretanto, a infestação propagou-se (e em toda a extensão) à praia de D. Ana (onde, repetindo-se dois meses depois, atingiu, junto ao inenarrável paredão que a separa do Pinhão, uma espessura de 40 cm), e, no dia de fecho desta página, também abrange largas centenas de metros da Meia-Praia, do lado da Ribeira de Bensafrim, onde chega a ter mais de meio metro de altura!
O assunto das algas invasoras no Algarve (pois é disso que se trata) foi, em Agosto, detalhadamente abordado no “Expresso”, com uma referência aos casos em que essas algas proliferam quando, por perto, há ETARs que não funcionam devidamente.
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E por aqui nos ficamos, pois certamente há quem saiba tudo sobre o assunto e, de caminho, no possa explicar (sem tergiversações) porque é que as praias da Batata e do Camilo perderam a Bandeira Azul em 2020.

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30.10.21

Grande Angular - Os perigos do vazio

Por António Barreto

A realização de eleições antecipadas é evidentemente a mais útil, menos prejudicial e mais adequada solução para os problemas dos tempos que vivemos. Ou antes, não se trata de uma solução, mas de um caminho. Que nem todos pretendem. Já há pressões e alusões, sobretudo por parte dos que derrubaram o governo (nomeadamente o Bloco e o PCP), no sentido de encontrar vias de escape: segundo orçamento, governo minoritário, a prazo, por duodécimos, etc. Nunca aos portugueses faltou a imaginação para o artificial excêntrico e a catástrofe inteligente!

Apesar de inevitáveis, a verdade é que o derrube do governo e a dissolução do Parlamento foram gestos inúteis e nefastos. Provocaram instabilidade e desgaste político interno. Criaram perplexidade e receio internacional. Perturbam o funcionamento da economia, aumentam as carências sociais, dificultam os serviços de educação e de saúde e atrasam as respostas aos mais urgentes problemas do emprego, do investimento público e privado e da luta contra a corrupção. Em tempos de grandes dificuldades decorrentes da pandemia, do nosso endividamento e da crise internacional de abastecimentos, pior não se poderia inventar! Em vez de as fortalecer, enfraquecem-se as instituições. Mas, depois da recusa do orçamento, forçada pela esquerda, desejada pela direita e não enjeitada pelos socialistas, não há outra solução razoável. E todos, infelizmente, partilham responsabilidades.

que falhou com esta dissolução e com este período estranho de coligação disfarçada e de aliança implícita foi, em primeiro lugar, a crença numa solução de esquerda, isto é, das esquerdas. Apesar de pouco recomendável, juntar todas as esquerdas, considerando a democracia e a liberdade como secundários, ainda é o desejo de alguns. Também falhou a esperança de criar um duelo entre esquerda e direita. Como falharam os projectos seja de federar a esquerda, desejo longínquo do PS, seja de submeter os socialistas, esperança dos seus quase aliados. Também não vingou a expectativa de reduzir a extrema-esquerda do PCP e do Bloco a entidades facultativas, anexas ou dependentes do PS.

Foi igualmente defraudada a hipótese de uma grande federação de direita e de centro-direita. Inibida, pelo menos por agora, ficou também a fé num grande Centro político, moderado, socialista da variante social-democrata, liberal e democrata-cristão nas franjas. Entrámos assim num período em que a política portuguesa e o seu centro de gravidade se encontram por definir e redesenhar. Quer isto dizer que os portugueses têm agora de escolher entre dois princípios: o do afrontamento e o da agregação.

O princípio do conflito parece ter falhado. Dado que falhou a federação das esquerdas, também se tornou inviável o confronto clássico entre esquerda e direita. Outros conflitos radicais parecem igualmente afastados ou, pelo menos, incapazes de orientar o futuro político. Por fraqueza do trabalho e por debilidade do capital, a luta entre capital e trabalho parece distante das perspectivas mais próximas de nós. Outro conflito possível, entre Europa e nacionalismo, não vinga nem alimenta um projecto de futuro. A luta entre democracia e não democracia também não parece ter muitos adeptos: à esquerda e à direita, o Bloco, o PCP e o Chega não são suficientes para ocupar os papéis cruciais da vida política nacional. Outros conflitos tradicionais, como os da religião versus laicismo, ou da República contra monarquia, estão de tal modo longe da actualidade que não servem para perturbar, muito menos para reorganizar o sistema e a vida política. A bipolarização, sonho de tantos políticos portugueses, é um desejo impossível.

O princípio alternativo, o de agregação ou de união, que também pode ser de convergência ou de aliança, encara actualmente dificuldades. A federação das esquerdas parece impossível. A federação das direitas também. O crescimento da extrema-direita, da direita nacionalista ou da direita populista é muito improvável. Parece que a união só seria viável ao centro.

Mas o centro da vida política nacional está vazio. À espera… De quem o ocupe, pois claro. Ou de quem o liquide, em caso de conflito radical. Os portugueses têm em geral uma atitude marialva e sectária relativamente às soluções de centro. “Bloco central” ou “Centrão” são expressões malditas na política e no comentário nacionais. Na Academia, é de bom-tom afirmar que o Centro é um Centro de interesses e de corrupção. Entre intelectuais, o Centro, por bruto e plebeu, é desprezado. É pena que assim seja, dado que as soluções “de centro” (na forma ou no conteúdo) têm sido benéficas e salvadoras. Mas é assim! O bairrismo fanático leva sempre a melhor, sobretudo em tempos de eleições. 

Mesmo antes de ser uma hipótese ou um tema real em discussão, já há, na direita, no CDS e no PSD, quem recuse liminarmente o bloco central. O mesmo na esquerda, seja entre os irascíveis comunistas e bloquistas, seja entre os moderados socialistas. Toda a gente contra o centro! A ponto de se verem transformados em virtudes os mais básicos defeitos da política: o sectarismo e o fanatismo. É de tal modo arreigada esta ideia que se chega a pensar que foram as experiências de bloco central as que mais fomentaram a corrupção. Ora, a verdade é bem diferente: foram os governos de um só partido à direita ou de um só partido à esquerda que mais corromperam, que mais se deixaram corromper, que mais negócios ilícitos promoveram e que mais usaram de favoritismo e nepotismo!

Vivemos um momento particularmente interessante, mas também arriscado, em que dois grandes princípios de organização da vida política, o do conflito e o da agregação, se confrontam, não sendo previsível o resultado. Em todas as sociedades em todos os tempos, há sempre conflito e união, há sempre antagonismo e aliança. O problema interessante é o das proporções ou das doses de cada um. Isto é, o império do conflito sobre a união ou do antagonismo sobre a aliança. Sem um princípio de reorganização da vida política, há um evidente risco de deriva, de fragmentação excessiva e de desordem pública. E certamente de estagnação económica e de carência social. E também há momentos em que nenhum dos dois princípios prevalece. Parece ser o caso da actualidade em Portugal.

Há gente a mais à direita. Há gente a mais à esquerda. E o centro está vazio. Mas é aqui que estão as soluções. Em paz, claro.

 

Público, 30.10.2021

 

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29.10.21

A TROPA

Por Joaquim Letria

Nasci e cresci no Alto de Campolide, numa confluência de quartéis que hoje já não existem. Eram Caçadores 5, Metralhadoras 1 e Artilharia 1 que, no tempo das golpadas da Primeira República, se opunham ao Quatro de Infantaria e ao Infantaria 16 de Campo de Ourique.

Naqueles tempos, ninguém roubava armas dos quarteis e as munições dos paióis caíam com abundância no jardim e quintal da casa onde nasci. Ainda me lembro de obuses por rebentar que o meu avô tornava inofensivos, fazendo com eles, em brilhante cobre, jarrões para flores ou bengaleiros para se guardar chapéus-de-chuva.

Recordo-me do aproveitamento que abertamente se fazia dos favores e privilégios dos oficiais. Tudo à vista de todos. Era a vida… os coronéis viviam em vivendas dentro dos quartéis, os impedidos iam às compras para as senhoras dos oficiais e iam esperar os meninos do comandante à escola, carregando-lhes as pastas de regresso a casa, enquanto os condutores levavam as senhoras ao cabeleireiro. Aquilo é que eram Exército e militares superiores!

O resto não existia, eram as praças a cheirar a cotim e botas cardadas, que se “faziam” às empregadas domésticas das redondezas e os sargentos carregados de sacrifícios para meterem os filhos a estudar. Era a prazenteira vida das “criadas e magalas” que o teatro levava em triunfo nas mais vistosas revistas do Coliseu e Parque Mayer, como no “fado do 31”.

Naqueles tempos os oficiais superiores andavam fardados, os de cavalaria montados em reluzentes botas altas com esporas. Não era como agora que não vemos militares de uniforme, não sei se por vergonha, mas a verdade é que não se vê uma farda número um. E quando vemos os generais a assistir a um desfile ou numa reunião com o Governo, parecem mais bombeiros voluntários da Arrentela ou flautistas da Timbre Seixalense do que garbosos generais do  Estado Maior das Forças Armadas de um  país fundador da NATO.

Os brilhantes carros pretos eram guiados por condutores que cumpriam o serviço militar obrigatório. Tinham as matrículas MX ou ME, ministérios da Guerra ou do Exército, que não enganavam ninguém quando esperavam as senhoras à porta do Grandella, ou levavam os meninos ao liceu. E assim viveram felizes até ao eclodir da guerra colonial….

O meu pai nasceu na Porcalhota, que hoje se chama Amadora, porque o meu avô mandou a família para o campo, para a poupar  aos  sobressaltos dos golpes de Estado e não levar com os estilhaços duma  granada que sobrevoasse Campo de Ourique para aterrar em  Campolide, ou duma morteirada de Cavalaria 7. Ficaram todos ilesos para eu vir a nascer mais tarde, em plena II Guerra Mundial...

Nenhuma situação deixava prever o roubo de armas de guerra do exército, ou pistolas dos cívicos da Polícia de Segurança Pública daquela época. Havia sentinelas nas guaritas que se ouviam pelas noites dentro: ”sentinela alerta!”, ”alerta está!”, ”passe palavra”…

Afinal de contas, mandavam-nos matar-se uns aos outros mas tinham muita graça.

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O chumbo do OE-2022 – Até aqui cheguei…

 Por C. B. Esperança

Hesitei entre o título «J’accuse…», do artigo de Émile Zola na sequência do caso Dreyfus e o desabafo de José Saramago perante a prisão política de mais um intelectual por um regime que defendia. Optei pelo segundo, mais de acordo com a revolta sentida com o chumbo do OE-2022, no rescaldo da maior crise económica, financeira, social e sanitária de um século, e cujo desfecho é ainda imprevisível.

Não me senti desiludido. A desilusão é o argumento romântico que os trânsfugas usam para justificar uma deserção. Eu não desertei nem mudei de campo. Sinto revolta pelo desfecho da votação e uma enorme solidariedade por António Costa, que arrostou com o azedume e a chantagem de Cavaco Silva para provar que a direita não tem o alvará para decidir a dimensão do Arco do Poder, tal como nenhum partido de Esquerda o tem para rotular quem é ou não de esquerda e, muito menos, quem é democrata.

A decisão feriu interesses dos mais necessitados, do país, dos autarcas, e o bom senso. Um orçamento que podia ainda ser melhorado em fase da especialidade, mesmo pelos que julgam que todos os limites são possíveis, do endividamento ao défice, da utopia ao aventureirismo, podiam ainda obter ganhos. Preferiram chumbar, sem apelo, o OE. 

António Costa, desde o princípio balizou como linhas vermelhas a fidelidade à União Europeia e à Nato, objetivos que cumpriu, e levou longe os entendimentos à esquerda, cuja preferência não escondeu. Ninguém o pode acusar de incoerência ou deslealdade.

Ontem, pareceu-me ver a doença infantil do comunismo e o aventureirismo trotskista de mãos dadas contra os interesses do País, dos mais pobres, dos autarcas e do futuro dos partidos à esquerda do PS na construção de soluções onde fazem falta. Lenine segredou o seu sarcasmo à revolução permanente trotskista, “tagarelice permanente”. 

António Costa resgatou para as soluções do País os partidos ostracizados, levou para o Conselho de Estado representantes seus, deu-lhes primazia nas negociações orçamentais e, enquanto o BE fez do PS o inimigo principal, o PCP acabou por se lhe associar nesta insensatez da Esquerda portuguesa. Não houve autocrítica à erosão das autárquicas, que debilitou todos os partidos de Esquerda.

Nunca a direita recebeu tão chorudo e entusiástico prémio como o que lhe foi oferecido pelo chumbo do Orçamento mais à esquerda que já foi apresentado, no limite do que as incertezas políticas, sanitárias, energéticas, económicas e financeiras permitiam.

Da Madeira, um sátrapa videirinho e sem esqueleto ainda ofereceu os votos dos lacaios, como se um deputado da República tivesse a consciência hipotecada ao líder regional e a traição ao partido fosse um negócio.

Vai ser difícil lamber as feridas, suportar as acusações mútuas dos partidos de esquerda, combater o anticomunismo primário, erguer um dique à extrema-direita, enfim, restituir ao país a confiança na solidariedade entre as esquerdas, e recuperar o que estava aceite.

No meu ponto de vista, ontem, o BE, PCP e PEV entregaram o ouro ao bandido, sem se interrogarem do que seria Portugal fora da U. E., sem vacinas, crédito e solidariedade.


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23.10.21

Grande Angular - Estratégias

Por António Barreto
Já houve outras modas. Foram os Planos, Nacionais ou Integrados. Sem falar nos de Fomento, invenção portuguesa para fugir à má fama dos planos soviéticos. Os planos mantiveram-se ao longo do tempo, mas hoje estão em perda de importância. Vieram depois os Programas e os Projectos. E finalmente os Observatórios. Criaram-se para tudo, desigualdades, violência, crime, droga, justiça, família, cultura… Há cerca de uma década, contavam-se 85 Observatórios (nacionais, regionais, municipais e sectoriais), geralmente recheados de amigos. Os resultados desta incansável actividade são por vezes interessantes, mas em maioria são medíocres. Os Observatórios dedicam-se à propaganda, mais do que à observação.
Agora, são as Estratégias! A complexidade da vida social, a preocupação em dar a entender que as autoridades têm ideias e a obsessão com a aparência fizeram com que os governos desenvolvessem esta lucrativa actividade: a da elaboração de estratégias. Estas têm todas as vantagens. Parecem inteligentes e competentes. Recorrem a numerosas contribuições disciplinares. Prometem mundos sem responsabilidades práticas. Conseguem calar as reclamações. Sugerem que o destino está sob controlo. Ocupam muita gente a elaborar, escrever e reunir. Permitem a contratação de amigos, familiares, agências de comunicação e empresas de consultoria. Assim é que, para quase todos os problemas nacionais, há estratégias. Pode mesmo dizer-se que a grande estratégia consiste em… elaborar estratégias!

Umas têm meia dúzia de páginas, outras centenas. Com gráficos ou texto. Imagens ou links. Organigramas e calendários. Coligem informação e criam emprego. Saber se as estratégias são eficazes, se são compreendidas, se contentam os destinatários… esses são outros problemas. Saber se os beneficiários (eleitores e contribuintes) querem aqueles fins e respectivos meios, isso é também outro problema.

A maior parte das vezes procuram a resolução de problemas, como a desigualdade social ou a corrupção. Isso é verdade. Mas fazem-no sempre com segundas intenções. Primeira, mostrar que toda a gente na Administração está unida. Segunda, criar uma sensação de dever cumprido. Este último facto é particularmente chocante, num país exímio em formidáveis soluções jurídicas, mas que falham diante da vida.

Estas estratégias são de uma enorme utilidade suplementar: revelam a tendência autoritária e dirigista das tradições políticas portuguesas. O que está a acontecer, a propósito do género, da idade, do sexo, da origem racial, da comunidade étnica, da nacionalidade, da natureza e da alimentação, é simplesmente insuportável. As autoridades fazem suas as ideias mais mirabolantes que se atravessam nos circuitos culturais e nos movimentos sociais, sobretudo das classes médias urbanas com gosto para ditar a virtude.

São excelentes exemplos da vontade de unificar o público e o privado, os modos de vida e as crenças, os comportamentos e as atitudes. As estratégias designam o pecado e a virtude, o Bem e o Mal. As estratégias são simulacros democráticos de ideologias autoritárias e são os sucedâneos dos dogmas religiosos ou laicos.

As estratégias são documentos e textos oficiais, aprovados por quem de direito, através de Resoluções do Conselho de Ministros e decretos-lei do governo. De muitas delas se diz que foram submetidas a debate público, o que quer dizer que se cumpriram uns procedimentos burocráticos destinados a encenar a discussão. 

Vejamos alguns exemplos das estratégias disponíveis. Estratégia Portugal 2030. Estratégia Nacional de Adaptação às Alterações Climáticas. Estratégia Nacional de Conservação da Natureza e Biodiversidade. Estratégia Nacional para as Florestas. Estratégia Nacional para o Mar. Estratégia Nacional de Educação para a Cidadania. Estratégia Nacional para o Hidrogénio. Estratégia Nacional de Educação para o Desenvolvimento. Estratégia Nacional de Inteligência Artificial. Estratégia Nacional para as Compras Públicas Ecológicas. Estratégia Nacional para os Direitos da Criança. Estratégia Nacional para as Cidades Sustentáveis. Estratégia Nacional para a Mobilidade Activa Pedonal. Estratégia Nacional para a Segurança e Saúde no Trabalho. Estratégia Nacional de Prevenção e Controlo da Dor. Estratégia Nacional de Combate à Pobreza. Estratégia Nacional de Combate à Corrupção. Estratégia Nacional de Combate ao Terrorismo. Estratégia Nacional de Combate ao Desperdício Alimentar. Estratégia Nacional de Segurança do Ciberespaço. Estratégia Nacional para a Habitação. Estratégia Nacional de Educação Ambiental. Estratégia Nacional para a Qualidade na Saúde. Estratégia Nacional para a Promoção da Produção de Cereais. Estratégia Nacional para os Pagamentos de Retalho. Estratégia Nacional para a Conservação da Natureza e da Biodiversidade. Estratégia Nacional para a Inclusão e a Literacia Digitais. Estratégia Nacional para a Integração das Comunidades Ciganas. Estratégia Nacional de Investigação e Inovação para uma Especialização Inteligente. Estratégia Nacional para as Pessoas com Deficiência. Estratégia Nacional para a Integração das Pessoas em Situações de Sem Abrigo. Estratégia Nacional para o Envelhecimento Activo e Saudável. Estratégia Nacional para a Igualdade e a Não Discriminação.

Esta última é, sem dúvida, a jóia. Começa assim: A Estratégia Nacional para a Igualdade e a Não Discriminação – Portugal + Igual” (ENIND) assenta numa visão estratégica para o futuro sustentável de Portugal, enquanto país que realiza efectivamente os direitos humanos, assente no compromisso colectivo de todos os sectores na definição das medidas a adoptar e das acções a implementar. Esta abordagem integrada potencia a colaboração e coordenação de esforços, valorizando uma visão comum que simultaneamente tenha um efeito mais estruturante e sustentável no futuro que se pretende construir”. A esta gloriosa entrada em matéria, seguem-se as considerações mais fantasiosas, alucinadas e totalitárias que seja possível imaginar. A ENIND propõe-se eliminar os estereótipos e liquidar os preconceitos próprios de todas as formas de discriminação e desigualdade, de género, de fortuna, de origem racial, idade, cultura, estatuto social… Para esse fim, recorrerá a todos os meios e todas as intervenções nas áreas publicas e privadas, no trabalho, na escola, nas instituições… Enfim, na vida.

Público, 23.10.2021

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22.10.21

AS FOFAS PRISÕES DOS SOFÁS

Por Joaquim Letria

O que acontece num sofá não tem paralelo. Verdade que se pode igualmente fazer noutro sítio mas não é a mesma coisa do que fazê-lo num sofá.

Pode-se amar, comer, dormir, ler jornais, reler livros, perder o slip, a virgindade ou a paciência, pensarmos que o mundo está louco, irmos à guerra, ouvirmos os marginais, visitarmos os bairros de lata, escutarmos o Presidente a falar só connosco, ganharmos o totoloto, acharmos que a vida está cada vez pior, pensarmos que temos muita sorte de vivermos aqui.

Tudo se encontra e se pode fazer num sofá. O problema é livrar-nos da sua dependência. Nada se perde num sofá. O problema é livrar-nos da sua dependência, a dificuldade reside na dificuldade que reside na capacidade necessária para deixar de ver, ou passar a ignorar, as coisas e loisas mais raras da realidade que escolhem e insistem em nos oferecer, de diversos ângulos e em câmara lenta, de modo a ficarmos só com a realidade alternativa  e virtual, que nos resta e, essencialmente, nos interessa. 

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21.10.21

À Libânia (meretriz e filantropa) – Crónica --- Homenagem de três gerações de estudantes...

Por C. B. Esperança

Libânia (Libaninha). Não precisava de apelidos para ser referenciada. Continuam desnecessários para ser recordada.

No seu peito nunca brilhou uma comenda, e a ele se aconchegaram muitas inseguranças em véspera de exames, muitas ansiedades a preceder esponsais, muitas inquietações à procura do primeiro emprego.

O corpo não teve a moldá-lo um escultor que o imortalizasse em bronze, mas teve milhares de corpos que, em êxtase, o ajudaram a modelar.

Três gerações de estudantes aprenderam nela a inutilidade do pecado solitário. Foi, por assim dizer, a primeira educadora sexual. Sem diploma.

Teve mais matrículas do que o mais inveterado dos cábulas. E não chumbou por faltas, não lhe minguou a competência, nem se furtou às chamadas.

Não sendo culta foi uma mulher sábia. Não pertencendo a instituições de beneficência foi solidária. Foi tolerante, generosa e boa.

Pela sua casa passaram quase todas as profissões da cidade em busca dos préstimos da sua. Nivelou no tálamo as diferenças sociais que uma cidade beata e hipócrita fomentava.

Os estudantes foram a sua paixão. O seu consolo e a sua ruína. E a memória honesta que a recorda.

Mudou-se para Lisboa quando lhe fecharam a casa. Ali encontrou muitos dos seus estudantes queridos. Alguns haviam de virar-lhe  as costas, senhores que a posição estragou, crápulas que o poder corrompeu. Mas a maior parte permaneceu fiel. Sem falsos pudores, sem atos de contrição, sem penitências.

Homenagear a Libânia, hoje, é um ato de humor e de amor. E um gesto de cultura. Trata-se de um manifesto contra a hipocrisia, duma vingança póstuma em defesa de quem foi vítima das aparências, dum libelo contra os guardiões da moral importada duma qualquer vulgata sem que, a nível pessoal, com ela se importem.

A Libânia era o desprendimento em pessoa. Parecia desprezar o óbolo que os mais endinheirados lhe deixavam, tanto quanto a remuneração do trabalho que efetuava.

Reagindo contra uma cultura que persegue o sucesso e o individualismo, contra uma postura que incensa o poder e o dinheiro, contra uma tradição que exalta a castidade e a abstinência, prestamos à Libânia a homenagem de quem a recorda com saudade e se não envergonha dos afetos que perduraram e percorrem as nossas vidas.

A vida de puta foi o ónus que a puta da vida a obrigou a pagar. A generosidade, a simpatia e a bondade foram as excelsas virtudes que a exornaram e a tornaram credora da homenagem que agora aqui lhe tributamos.

Com este ato ficamos mais aliviados de uma dívida que durante a vida nos perseguiu. E exorcizamos os demónios da hipocrisia.

Tibi gratias, Libânia!

Coimbra, Restaurante Neptuno, 26-05-2000 – (Jantar de antigos estudantes da Guarda)

Publicado: «Pedras Soltas», pág. 191 e «Guarda Formosa na Primeira Metade do Século XX», pág. 403

Ponte EuropaSorumbático


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20.10.21

“Nova Costa d’ Oiro” de Outubro de 2021

 


QUANDO, muitos anos volvidos, tornei a ler «O Cônsul Honorário», de Graham Greene, apercebi-me, sem surpresa, de que já não me lembrava de quase nada, excepto que o “herói” não conseguia atinar com a posição correcta da bandeira da Grã Bretanha (que achava muito complicada!), o que me trouxe à memória, além da rábula que a foto da esquerda documenta, uma ingénua adivinha em que se perguntava de quantas formas é que é possível hastear a bandeira portuguesa. A resposta pretendida é “oito, sendo que apenas uma é a correcta” mas, pensando bem, ainda há, pelo menos, mais quatro, pois já a vi, num hotel da nossa cidade, pendurada por um dos seus vértices (como se fosse um pano do pó), tendo até estado assim durante meses.

Quanto ao respectivo estado de conservação (que a legislação também contempla), lembro-me de que, durante anos, no início da época turística, o “Correio de Lagos” costumava mostrar, na sua página “Buracos & Companhia”, a bandeira nacional que se podia ver à entrada do Parque de Campismo da Trindade que, de tão esfarrapada que estava (até mesmo no 10 de Junho!), certamente tornava muito difícil a escolha dos adjectivos com que o facto era referido. 

Ora, e como não podia deixar de ser para algo tão importante (que, a par da língua e do hino, é um símbolo maior da identidade nacional), todos os países têm legislação que se lhe aplica. Entre nós, destaca-se o DL 150/87, de 30 de Março (*), que, apesar de ser bastante completo, não prevê nada tão radical como o que sucede no Brasil, onde até existe Dia da Bandeira como homenagem à que foi criada logo após a Proclamação da República, em 15 de Novembro de 1889: anualmente, por essa altura, há uma cerimónia pública onde são INCINERADAS (!) as bandeiras em mau estado, confiscadas durante o ano anterior um pouco por todo o país.

ORA, e como certamente já se percebeu, vem tudo isto a propósito da inenarrável situação ocorrida na nossa cidade aquando do luto nacional de três dias, decretado pelo governo em 10 de Setembro passado por ocasião da morte de Jorge Sampaio: 
Na manhã do dia 12 (SEGUNDO DIA de luto, portanto), foram divulgadas, nas nossas redes sociais, fotos mostrando o que se passava no edifício dos Antigos Passos do Concelho — e é uma delas que aqui fica para a posteridade, já agora acompanhada de uma outra, relativa à nossa Repartição de Finanças, onde, como se podia ver, o problema da “bandeira a meia haste” teve uma abordagem muito mais expedita.

A TERMINAR, informo os mais ingénuos que não vale a pena perderem tempo a fazer como eu fiz, procurando (nomeadamente na página do FB do Município) qualquer coisa semelhante a uma autocrítica ou um pedido de desculpas, nem sequer uma justificação mais ou menos esfarrapada para o sucedido. No entanto, ela até se encontra numa expressão usada pelo próprio Jorge Sampaio, quando ele, farto das cenas recorrentes por causa das touradas de morte em Barrancos (onde, todos os anos e em meados de Agosto, a autoridade do Estado era achincalhada), decretou salomonicamente que essa prática passava de PROIBIDA a PERMITIDA, graças àquilo que baptizou de “EXCEPÇÃO CULTURAL”, curiosa expressão que eu ainda pensei que lhe tivesse ocorrido nalguma das suas muitas vindas a Lagos — mas não, porque, à época, a cidade ainda estava longe do grau de incúria que actualmente a caracteriza, e de que o triste episódio da bandeira não é mais do que um exemplo entre muitos.

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(*) - Art.º 4.º: A Bandeira Nacional será hasteada em edifícios de carácter civil ou militar, qualificados como monumentos nacionais, e nos demais edifícios públicos ou instalações onde funcionem serviços da administração central, regional e local e da administração das regiões autónomas, bem como nas sedes dos institutos públicos e das empresas públicas.

Art.º 7.º: Quando for determinada a observância de luto nacional, a Bandeira Nacional será colocada a meia haste durante o número de dias que tiver sido fixado».

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Revista “Nova Costa d’ Oiro” de Outubro de 2021

 

 

 

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16.10.21

Grande Angular - Coreografia orçamental


Por António Barreto

O debate orçamental, anualmente coreografado, é de reduzida importância nacional. O orçamento é importante, com certeza, mas o debate não. Pouco ou nada se explica à população, a não ser com intuitos demagógicos. Há sessões das comissões onde alguma coisa interessante se passa, às vezes. Há documentos produzidos pela UTAO (Unidade Técnica de Apoio Orçamental) que são de real utilidade. Pouco mais do que isso. O hemiciclo destina-se a encenações ridículas, à berraria habitual, a poses para a televisão e a frases para os jornais. Realmente, pouco se passa. 

Ou antes, o que ali se passa é revelador do pobre estado em que a política nacional se encontra. O que ali se vê são tentativas obsessivas de incomodar os adversários e de se mostrar na televisão. A inclusão no debate da questão das eleições antecipadas é sintomática. 

Os debates orçamentais deveriam desenrolar-se com antecedência. Com informação e estudos de avaliação do que se fez. Com “a questão” do governo acertada na altura própria, não neste momento. Discutir uns benefícios para um grupo de pessoas, sem que a questão da maioria esteja resolvida, faz com que todas as discussões, por mais insignificantes que sejam, tenham sempre uma medida de chantagem: reprovar o orçamento e votar contra o governo. Em Portugal, não se discute orçamento nenhum, discute-se, isso sim, o governo e a maioria.

O que está em causa numa discussão sobre o orçamento? Uma percentagem reduzida da despesa e da receita. A parte flexível do orçamento ou a respectiva margem de folga é mínima. Muito mais de 90% estão comprometidos. É uma margem quase insignificante da despesa que permite, com leviandade, afirmar que o orçamento é de “esquerda” ou é de “direita”. E assim, informar a opinião, da vitória ou da derrota parlamentar.

A quase totalidade do orçamento está comprometida com despesas inadiáveis, direitos adquiridos, pagamento de juros e de dívidas, obras em curso, prestações e amortizações, vencimentos de cerca de 800.000 funcionários e pensões de alguns milhões de pessoas. As Obras Públicas, o funcionamento do Estado (com a Saúde, a Educação, a Segurança Social e as Forças Armadas à cabeça, sem esquecer os elefantes como a TAP, a CP e o BES), as pensões e os juros da dívida esgotam os recursos. A ideia de que se pode discutir muito, fazer alterações, obrigar a cedências e modificar radicalmente a orientação e a “filosofia social” das políticas públicas é falsa ou ingénua. E sobretudo uma fantasia. Quando os partidos aparecem na televisão a defender alterações radicais, mundos e fundos de nova despesa, mais subsídios e indemnizações em volume significativo, sabem que é mentira e não têm qualquer esperança de obter ganho de causa. Na verdade, o que fazem quase se esgota nisso mesmo: aparecer na televisão a fazer exigências. Para depois contar aos fiéis e aos eleitores. No caso de obterem migalhas, poderão voltar à televisão e garantir ao eleitorado que as vantagens, se as houver, foram da sua responsabilidade. Nada de novo.

O sentido da discussão orçamental é o da oportunidade de falar na televisão, de um partido se queixar de que as suas propostas não são aceites, de que as suas sugestões foram cruciais para um qualquer interesse de um grupo de pessoas. E também para se poder, meses depois, garantir ao eleitorado que o que se fez foi por causa das suas insistências e propostas.

Este ano, além da coreografia habitual, tivemos um foco, uma questão central, um enredo dramático: reprovação do orçamento, seguida de desordem política, dissolução do parlamento e eleições antecipadas. Que ninguém duvide: a transformação das eleições em arma política contra os adversários e contra as oposições dentro do partido é um recurso sórdido. O melhor que a democracia tem, as eleições livres, é transformado no seu pior, em arma vulgar, no mais baixo dos argumentos e na chantagem mais rasteira!

As eleições deveriam ser regulares e periódicas, certas como um relógio, previsíveis. Só excepcionalmente, muito excepcionalmente, teríamos eleições fora de prazo, adiadas ou antecipadas. Ao fazerem ameaças com eleições, ao aderirem à ideia de chantagem eleitoral, os democratas e os dirigentes partidários estão a tornar esse gesto e esse momento indignos e desprezíveis.

A democracia presta-se a dezenas de definições, com múltiplos adjectivos. Em geral, são descartáveis e servem para fins de circunstância. A mais simples definição de democracia é a do regime político em que todas as pessoas têm o direito de voto secreto, em eleições livres e regulares, após as quais quem ganha governa e respeita quem perde. Note-se a regularidade, que faz parte essencial da democracia. A eleição é um fim, um processo e um meio. Por isso deve ser previsível e regular. Partidos e eleitores devem saber ao que vêm. Ameaçar com eleições antecipadas, só por fraqueza e grosseria política. Utilizar as eleições antecipadas para trocar as voltas aos adversários, incomodar os correligionários ou obter vantagens indevidas é nefasto. Antecipar eleições implica quase sempre fugir ao debate político, evitar a aliança formal ou arredar a coligação conhecida. Com raras excepções, as eleições antecipadas mais não são do que golpes ou sinais de imaturidade democrática. É até possível que não haja brevemente eleições antecipadas, mas o que está em causa é a sua utilização como chantagem, própria de uma situação anormal que é a de parlamento e governo sem maioria, de arranjos provisórios e de elevação do oportunismo à categoria de arte de governo. Medida excepcional, a eleição antecipada deveria ser um recurso para reorganizar a democracia e dar nova vida ao governo, não para matar adversários.

As direitas estão tolhidas de medo perante a hipótese de eleições antecipadas. As esquerdas estão apavoradas com a hipótese de antecipar eleições. O governo já não quer antecipar eleições. Mas todos falam disso, porque pensam atemorizar os outros. Como conteúdo e estratégia de debate parlamentar orçamental não se poderia inventar pior. São dias maus para a República. E para a democracia.

Público, 16.10.2021

 

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15.10.21

AS MALDITAS CHALEIRAS

Por Joaquim Letria

Temos Internet, enviamos sondas a Marte, vemos TV digital, usamos satélites, chegámos à Lua há mais de 30 anos e ainda não fomos capazes de inventar uma chaleira que não entorne o chá onde não deve.

Para disfarçar e para os que notam estas coisas insignificantes não me levarem a mal, acrescento ao morning  tea  dois dedos de uísque irlandês, podendo sempre desculpar-me com a necessidade de combater o catarro, Há sempre quem aprecie estas futilidades e as prefira  à verdade dura e crua dum opinativo de serviço.

A criança que existe em cada um de nós não morrerá nunca. Talvez assim seja, mas parece-me que, com os anos, essas crianças a existirem, na realidade, ficam cada vez mais indiferentes perante a sorte dos seres mais recentes, tão frias e tão duras como os adultos que habitam.

Publicado no Minho Digital

14.10.21

A social-democracia está de volta?

Por C. B. Esperança

Passada a solidariedade, que o fim da guerra (1939/45) exigiu à martirizada Europa, foi-se perdendo o sentido da justiça social. A deriva neoliberal fez caminho com Margaret Thatcher, secundada por Reagan e líderes da América Latina, nomeadamente Color de Melo e Fernando Henriques Cardoso, e exerceu influência deletéria inclusive em órgãos multilaterais, FMI e Banco Mundial.

As últimas três décadas acentuaram o neoliberalismo, na Europa e no Mundo, com a descida ao inferno dos mais carenciados, da Europa e dos EUA à China onde um Estado designado comunista usa a ditadura para o mais desalmado liberalismo económico.

Os partidos conservadores europeus, com exceção da CDU alemã, onde a presença forte da estadista Angela Merkel, evitou desvios nacionalistas, tenderam para uma direita de contornos nacionalistas, fortemente neoliberais e, até, antidemocráticos. O PP espanhol, agora mais próximo do VOX do que da matriz conservadora e democrata-cristã, está a tornar-se um perturbante exemplo ibérico. 

Não parece que a mentalidade dos povos, passada a fase mais aguda da pandemia, onde os Estados tiveram forte intervenção, tenha readquirido o sentido da solidariedade ou que o perigo real da exaustão dos recursos da Terra, com a explosão demográfica, o consumo infrene e a ilusão do crescimento contínuo, tenha despertado o sentido de compaixão.

Há, no entanto, alguns sinais de esperança na Europa que parecia condenada a escolher entre a direita democrática e a extrema-direita. Os últimos resultados eleitorais dos países nórdicos levaram a social-democracia ao poder na Suécia, Dinamarca, Finlândia, Islândia e, agora, também na Noruega, embora com governo minoritário, depois de não conseguir acordo com os partidos mais à esquerda.

Na Alemanha o partido mais votado foi o SPD e, nas recentes eleições locais italianas, o PS e o Partido Democrático melhoraram os resultados.

Estamos longe de ver consolidada uma situação que recupere décadas de neoliberalismo e nos liberte das ameaças nacionalistas e fascizantes que, sobretudo a Polónia e Hungria representam. No plano económico até o governo do Reino Unido, fortemente neoliberal, foi obrigado a uma política social-democratizante durante a pandemia.

Não regressámos ao equilíbrio nem estão consolidadas as tendências recentes, mas é já um motivo de esperança para quem teme a deriva nacionalista, xenófoba e neoliberal que ameaçava dominar a Europa.

Ponte Europa Sorumbático

 

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10.10.21

Vamos falar de Geologia

 

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9.10.21

Grande Angular - Um apetite insaciável

Por António Barreto

Os últimos anos da legislatura parecem ficar marcados pela vontade socialista de alargar o Estado, de aumentar o poder do governo sobre a sociedade, de consolidar a autoridade das instituições políticas sobre a sociedade civil e de reforçar a presença do sector público na vida privada, seja na economia, na educação, na saúde, na habitação ou na cultura.

A ascensão das esquerdas socialistas dentro do partido é uma das causas. A existência de vastíssimos recursos financeiros europeus disponíveis para o investimento público é outra. A necessidade de aprofundar as alianças com os partidos ou os eleitores das esquerdas radicais é também uma realidade. O despertar do corporativismo republicano sempre dormente também conta. A volúpia de tantos dirigentes e activistas, descontentes com notícias sobre a ganância dos seus rivais da direita também pesa neste novo estado de espírito e da nação. Finalmente, para acolher estas circunstâncias, a velha crença tão socialista e tão republicana no primado do Estado e no papel do sector público como motor do desenvolvimento.

Há já alguns meses que assistimos às primeiras iniciativas ditas do PRR, Plano de Recuperação e Resiliência. Já se pode confirmar que se trata do maior plano de despesa da história do país. E já foi possível verificar que aqueles fundos ou são gastos directamente pelo governo, ou investidos de acordo com os planos do governo, ou distribuídos pelo governo. A decisão, a iniciativa e a acção pertencem ao governo. Como se sabe que o Estado não tem actualmente competência técnica e científica suficiente, vai necessitar dos contributos empenhados e muito bem pagos de empresas nacionais e estrangeiras, de faculdades e universidades, de laboratórios e organizações que, no conjunto, ficarão dependentes do governo. O sector público e o Estado crescem com este plano. Os sectores privados, civis e académicos, científicos e culturais, ficarão muito mais dependentes do governo. A convicção de que um membro do governo, um director da Administração, um funcionário público ou um encarregado de missão das autoridades, só por serem do sector público, são mais competentes, mais leais, mais sérios, mais produtivos, mais responsáveis e mais honestos, é eterna no PS. A certeza de que os funcionários públicos e os organismos do Estado, assim como os membros do governo, são mais capazes de criar emprego, investir, produzir, gerir e organizar, é inabalável.

Em paralelo, foi aprovada legislação abrindo as portas à censura da informação e da expressão por vias digitais e outras, a exercer por intermédio de instituições públicas em parceria com organismos privados transformados em controladores morais e supervisores da verdade. Reclamados por alguns académicos e intelectuais, sugeridos por academias, apoiados pela União Europeia e pelo governo, foram criados mecanismos de monitorização do pensamento e da expressão. Depois do salazarismo e dos dois anos do período dito do Gonçalvismo comunista, foram estas as piores iniciativas tomadas em Portugal no sentido do controlo do pensamento e da censura da expressão.

 

Recentemente, a questão das Forças Armadas e da reorganização dos comandos superiores foi outro exemplo do apetite socialista. É verdade que foram os problemas da exoneração e da substituição do Chefe de Estado-maior da Armada que ocuparam a atenção de todos. E com razão, dada a infâmia que o governo preparou. Mas o que realmente sobrou e estava em causa era a tutela do governo sobre as Forças Armadas. Por outras palavras, a governamentalização das Forças Armadas. Isto é, a certeza de que estas últimas servem em primeira-mão e principal instância o governo do dia. As estruturas dos comandos superiores foram de tal modo redesenhadas que parecia defender-se apenas uma concentração de poderes no Chefe de Estado-maior General. A verdade é que esta era e é uma real camuflagem para uma dependência superior do Ministério e do Ministro e para a obediência ao governo.

última questão a surgir com fragor no espaço público foi a da revisão do regime de criação e funcionamento das associações profissionais. Isto é, da lei das Ordens (médicos, engenheiros, advogados, farmacêuticos, economistas, arquitectos, biólogos, contabilistas, despachantes, enfermeiros, dentistas, veterinários, solicitadores, revisores oficiais, notários, psicólogos e nutricionistas). É possível que muitos aspectos da nova legislação mereçam atenção e constituam uma actualização necessária dos termos e dos processos de reconhecimento e de exercício de uma profissão. Como é possível que haja capacidades excessivas de defesa corporativa dos interesses de uma dada profissão. Há seguramente, neste domínio tão impregnado de reminiscências medievais e de mecanismos de “closed shop” ou de “numerus clausus”, situações a corrigir. Mas tenhamos consciência de que o essencial desta legislação, que tresanda a salazarismo e a corporativismo, consiste numa revisão das competências de auto-regulação, de autodisciplina e de parceria entre público e privado, sempre a favor do Estado e do governo. A inclusão de pessoas de fora da Ordem e da profissão favorece evidentemente as instituições públicas, o governo em última análise. A inclusão de um novo órgão de supervisão parcialmente composto por pessoas exteriores à Ordem e à profissão tem o mesmo objectivo, o de aumentar as possibilidades de dependência e tutela por parte do governo. Bem pode o projecto de lei escudar-se atrás da União Europeia, que seria, segundo o próprio texto, quem exigiria estas alterações ao regime legal. Mas só uma pequena parte se explica por essa exigência. O essencial é uma invenção do Governo e do Partido Socialista.

Oque mais acontecerá? Depois da Economia, das Forças Armadas, da Informação, da Cultura e da organização das profissões? Haverá ainda quem esteja interessado em fazer parte de uma sociedade de cidadãos, de homens e mulheres livres e de instituições independentes?

Combinam tão bem a retórica “liberal” da direita e o palavreado “anti-corporativo” da esquerda! Modernização, investimento, desenvolvimento, educação e cultura: sempre o Estado. Na dúvida, a favor do governo.

Público, 9.10.2021

 

 

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7.10.21

A Igreja católica francesa e os crimes sexuais do seu clero

Por C. B. Esperança

O presidente da comissão nacional de investigação da pedofila na Igreja católica disse ter havido em França, desde 1950, “entre 2.900 e 3.200 criminosos pedófilos”, e mais de 300 mil vítimas de padres e frades.

À monstruosidade dos crimes soma-se a multidão de vítimas que, silenciosamente, nas últimas sete décadas, 1970/2020), foram cometidos em colégios, seminários, sacristias e residências sacerdotais.

Em primeiro lugar, está em causa a prática reiterada de um crime que é particularmente repugnante, com marcas indeléveis nas vítimas. Depois, é o desabar da referência moral da Igreja católica e o labéu que passa a acossar as suas variadas instituições nas áreas da saúde, educação, assistência e solidariedade.

Temos de interrogar-nos sobre como se desenvolveram e perpetuaram tão amplas redes de crimes em tão grande impunidade, sem denúncia, suspeita, escrutínio e investigação, porque não é apenas a França que está em causa, mas o resto do mundo e não apenas os países onde a catolicidade existe. 

Não é difícil especular sobre a responsabilidade que o segredo da confissão e o celibato imposto ao clero exercem na atração de indivíduos com especial apetência para a prática de tais crimes. Os privilégios eclesiásticos foram seguramente responsáveis pela falta de vigilância policial e da sociedade laica.

Mas, se à Igreja católica cabe a reflexão profunda sobre si própria, agora que os media estão particularmente atentos aos seus crimes, cabe aos Estados aprofundar a separação das Igrejas, e serem também implacáveis com as outras Igrejas onde decerto os mesmos crimes são cometidos.

A pedofilia, que a vergonha e a baixa estima das vítimas escondem, é crime que surge com frequência em internatos, laicos e confessionais, e em família. É difícil o combate, mas não é tolerável que uma multidão de vítimas continue a alimentar as perturbações dos delinquentes paramentados e de muitos outros que passam incólumes.

Em democracia, a cidadania tem de sobrepor-se aos comunitarismos, e a sociedade laica de conhecer o que se passa nas igrejas, seminários, sinagogas, madraças, mesquitas e conventos de qualquer religião. As instituições religiosas devem respeitar a laicidade e submeter-se ao controlo democrático dos Estados onde estão sediadas.

Os crimes hediondos verificados em França, com a tradição mais laica das democracias, desde 1905, só podem multiplicar-se em países onde a conivência do Estado e da Igreja dominante é mais flagrante.

É urgente saber o que se passa em Portugal e, não apenas, com a Igreja católica, pois os crimes de pedofilia são o reflexo de sociedades patriarcais, uma manifestação perversa do domínio dos homens e do desprezo pela mulher e pelas crianças de ambos os sexos.

Seria deplorável que a vergonha recaísse apenas sobre a Igreja católica, com o primeiro Papa que se preocupa com o problema ancestral e o único a não esconder os pedófilos e a vergonha que sente.

A ausência de investigação dos crimes deixa o campo aberto à sua perpetuação e expõe ao labéu da infâmia a Igreja católica deixando incólumes as religiões onde o machismo e a misoginia são ainda mais flagrantes.

Onde a Igreja católica recua, entra a concorrência e não temo por adquirido que sejam melhores outras religiões globais.

Dos beatos não se espera apenas um ato de contrição, exige-se a autocrítica de quem foi conivente com a instituição cujos valores partilham.

Dirigida ao Governo e, especialmente, ao Presidente da República, na exibição pública da sua fé particular, termino com uma citação: «O Estado também não pode ser ateu, deísta, livre-pensador; e não pode ser, pelo mesmo motivo porque não tem o direito de ser católico, protestante, budista. O Estado tem de ser cético, ou melhor dizendo indiferentista» Sampaio Bruno, in «A Questão religiosa» (1907).

Ponte Europa Sorumbático

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3.10.21

NO PRINCÍPIO ERA O MAGMA…


À atenção dos professores de geologia

Por A. M. Galopim de Carvalho

Após a acreção do protoplaneta que antecedeu a formação deste maravilhoso corpo planetário que nos deu berço, e na sequência dos processos que determinaram a sua diferenciação como planeta (nomeadamente e em especial, a contracção gravítica e a formação núcleo), a Terra acumulou uma quantidade de calor tal que a converteu numa imensa bola incandescente.

 

Durante as primeiras centenas de milhões de anos, este nosso hoje “Planeta Azul” esteve envolvido num “oceano” de magma, em resultado da fusão da sua parte mais externa, “oceano” cuja profundidade teria sido da ordem de algumas centenas de quilómetros. Foi a partir da capa mais superficial deste invólucro ígneo que, por arrefecimento posterior, se formou a primitiva crosta terrestre (com mais de 4000 milhões de anos, desaparecida na sequência da contínua renovação da crosta determinada pela chamada tectónica de placas), separada de uma outra entidade, que se lhe segue em profundidade, também ela já parcialmente arrefecida, a que foi dado o nome de manto.

 

Entendendo por magmatismo o processo natural através do qual um material fundido, a que se convencionou chamar magma, conduz à formação das rochas (ditas magmáticas), temos de concluir que este processo geológico é uma constante na história do nosso planeta (e do Sistema Solar) e que está na origem de todos os tipos de rochas (petrogénese). Com efeito, não haveria rochas sedimentares sem as magmáticas preexistentes, nem rochas metamórficas sem que, pelo menos, tivesse existido um destes dois tipos de rochas. É, assim, lícito pensar que o mesmo acontece nos planetas telúricos, nossos vizinhos, e noutros de outros sistemas planetários da nossa e de outras galáxias. O magmatismo é, pois, uma das fases da evolução da matéria no quadro universal da sua história, como são, entre outras:

 

nucleossíntese que dá nascimento aos elementos químicos, em grande parte no interior das estrelas e na sequência das explosões (supernovas) que lhes ditam o fim; e a quimiossíntese que, por junção dos elementos químicos, dá origem aos compostos, entre os quais os minerais, fase esta que inclui o magmatismo e os restantes processos petrogenéticos, para além de outros, como são os biogénicos.

 

Foi através do magmatismo que a Terra, em formação, libertou uma atmosfera primitiva, rica (entre outros componentes) em vapor de água e dióxido de carbono. Foi a partir deste vapor de água que se formou, por condensação, grande parte da hidrosfera. E, na medida em que a vida foi gerada nas águas, torna-se evidente a sua dependência do processo magmático. Assim, é lícito pensar que, sem magmatismo, a biodiversidade, tal como a conhecemos, não teria existido. Também os seres das profundidades oceânicas associadas a fontes hidrotermais e a chaminés negras (um ecossistema muito particular que só há pouco mais de três décadas foi conhecido) dependem absolutamente da actividade magmática, neste caso, submarina. Do mesmo modo, a atmosfera actual (a que hoje respiramos e que diariamente poluímos em nome do chamado desenvolvimento), na qual o oxigénio resulta da actividade biológica das plantas com clorofila, é uma consequência, embora indirecta, do magmatismo.

 

Os magmas que, desde a existência de uma litosfera (conjunto da crosta e da capa rochosa do manto nascidas da diferenciação do planeta) geraram e continuam a gerar as rochas que, por isso, apelidamos de magmáticas, nasceram e continuam a nascer da fusão de rochas da crosta ou do manto superior, a temperaturas que variam entre cerca de 850°C, num xisto argiloso da crosta continental e em presença de água, e cerca de 1300°C num peridotito do manto, na ausência de água. No que se refere às pressões, o fenómeno pode verificar-se entre cerca de 3 a 4 atmosferas, a 10 km de profundidade, e várias dezenas de atmosferas, 100 km mais abaixo. Ao nível da crosta a fusão dos materiais rochosos, isto é, a geração de um magma acontece associada ao metamorfismo de grau mais elevado, no decurso da formação de uma cadeia montanhosa (orogénese). No manto, a fusão é praticamente anorogénica, isto é, não envolve compressões tangenciais. Está, sim, relacionada com movimentos verticais e diminuição de pressão ou com penetração de fluidos aquosos.

 

A comparação frequente do magma com a lava incandescente ou ígnea saída dos vulcões, embora sugestiva, não é correcta. Deve acentuar-se que a lava já não é, exactamente, um magma, dado que, ao descomprimir-se na saída para o exterior, perde parte dos seus componentes gasosos (vapor de água, dióxido de carbono, entre outros) e, ao arrefecer, permite a cristalização (solidificação) prematura de alguns minerais (como é o caso dos cristais de olivina ou de augite em alguns basaltos) que, por acção gravítica, decantam, saindo também desse fundido, empobrecendo-o. Um material assim, como o que se vê transbordar do vulcão e fluir à superfície, em que coexistem grãos cristalinos (sólidos), material ainda fundido e apenas parte dos gases que inicialmente o formavam, já não deve ser considerado um verdadeiro magma embora tenha mobilidade. É curioso assinalar que, na origem, a palavra magma significa “massa empedernida”. Não obstante este significado, a petrologia adoptou essa mesma palavra para designar o material ainda em fusão (na totalidade ou em parte) que, por arrefecimento, consolida e, só então, se torna pedra.

Do ponto de vista composicional, o magma pode ser então definido como um fundido de substâncias químicas, na grande maioria silicatos, existente em zonas mais ou menos profundas do planeta que, em virtude da temperatura e da pressão a que está sujeito, se mantém, pelo menos em parte, no estado líquido e, como tal, flui, ou seja, tem mobilidade. Neste banho e com uma representação muitíssimo inferior à dos silicatos, podem existir óxidos, em particular os de ferro, de titânio e de crómio, sulfuretos, fosfatos e carbonatos. Como numa sopa quente, além do caldo, que nesta imagem exemplifica a parte fundida, podem coexistir no magma fases sólidas, representadas pelos minerais, e gasosas (vapor de água, dióxido de carbono, gás sulfídrico e outros) que lhe são próprios, de que podemos ter uma ideia através das manifestações secundárias do vulcanismo, como são as mofetas e as sulfataras. As fases sólidas, quando presentes no magma, estão expressas pelos minerais que, por serem mais refractários (isto é, com um ponto de fusão mais elevado), cristalizaram prematuramente no seio do líquido magmático, o que não impede a mobilidade do conjunto, que poderá fluir enquanto houver uma fase fluida, ainda que residual, a assegurar-lhe essa característica implícita na própria definição de magma. É o que acontece, como se disse atrás, com os cristais de olivina e ou de augite em certas lavas de natureza basáltica.

Como ingredientes fundamentais do magma silicatado (ver nota abaixo) figuram quase sempre pouco mais de uma dezena de elementos químicos, os mais abundantes na crosta terrestre, e, por isso, ditos principais ou maiores (do inglês major elements), cujas percentagens, respectivamente, em peso e em volume são:


...........Oxigénio (O): 46,6% peso; 93,8 % volume
...........Silício (Si): 27,7% peso; 0,8 % volume
...........Alumínio (Al): 8,1% peso; 0,5 % volume
...........Ferro (Fe): 5,0% peso%; 0,4% volume
...........Cálcio (Ca): 3,6% peso%; 1,0% volume
...........Sódio (Na): 2,8% peso; 1,3% volume
...........Potássio (K): 2,7% peso; 1,8 % volume
...........Magnésio (Mg): 2,1% peso; 0,3 % volume

São estes, pois, os principais constituintes dos minerais das rochas magmáticas, entre os quais, como se disse, os silicatos que, por si só, representam cerca de 99% da crosta terrestre. A análise química destas rochas revela, ainda, manganês, fósforo, titânio, carbono e enxofre e hidrogénio praticamente sempre presentes, embora em menores percentagens.

Parte da água inicialmente contida no magma entra na composição de certos minerais, outra perde-se, quer em profundidade, no interior da crosta, indo alimentar outros processos petrogenéticos, quer à superfície, no vulcanismo. É esta água no estado de vapor que, com o dióxido de carbono e outros gases de menor representatividade igualmente libertados do magma, se evola nas erupções vulcânicas, originando os espessos “fumos” brancos que se dispersam no ar, acompanhando quer as projecções sólidas de piroclastos, quer a saída e progressão da lava.

 

Para além dos já referidos elementos principais ou maiores (por definição, aqueles cujas percentagens, em peso, nas rochas é superior a 1%), há ainda a considerar os elementos menores (do inglês, minor elements), entre os quais bário, chumbo, cobre cobalto, níquel, ouro, prata e muitos mais, cuja presença nas rochas se situa, em termos percentuais, abaixo de 1%. Nestes há que distinguir elementos secundários (entre 1% e 0,1%) e elementos vestigiais ou elementos-traço (do inglês, trace-elements) que, como o nome indica, estão representados em quantidades ínfimas. A presença de elementos-traço na composição dos minerais e das rochas é hoje fácil e rotineiramente pesquisada nos estudos petrológicos e geoquímicos. Consoante o rigor exigido pelas análises ou possibilitado pelos equipamentos disponíveis, a sua quantificação é expressa em ppm (partes por milhão) ou em cifras ainda menores, em ppb (partes por milhar de milhões). O termo oligoelemento (do grego, oligós, ínfimo), usado por alguns autores, é ambíguo, pois tem sido usado quer como sinónimo de elemento menor quer como de elemento-traço.

 

No que se refere ao nosso planeta, o magmatismo foi e é uma constante na respectiva dinâmica global, quer sob a forma de vulcanismo e subvulcanismo (ascensão de magma que acaba por arrefecer e solidificar a pequena profundidade, antes de atingir a superfície, como aconteceu com os maciços de Sintra, Sines e Monchique), quer de plutonismo (arrefecimento e solidificação em profundidade). Pelo que conhecemos da história da Terra, temos de admitir que o magmatismo sempre antecedeu e antecede os outros dois processos petrogenéticos (a sedimentogénese e o metamorfismo). Com efeito, só depois das primeiras rochas (magmáticas) formadas à superfície da Terra estarem expostas aos agentes externos é que pôde ocorrer a sua erosão seguida de sedimentação e/ou a sua transformação em rochas metamórficas.


Nota:

Além do magma silicatado, o mais abundante e significativo, existe um outro, muitíssimo reduzido à escala do que conhecemos, de natureza carbonatada, essencialmente formado por carbonatos (de cálcio, magnésio, ferro e outros) que está na base de rochas magmáticas designadas por carbonatitos.

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