Por A. M. Galopim de Carvalho
A moderna concepção nebular para a origem do Sistema Solar, com raízes nas ideias pioneiras do alemão Immanuel Kant (1724-1804) e do francês Pierre Simon Laplace (1749-1827), explica os primeiros condensados pela passagem de uma fase líquida (antecedida de uma gasosa) a uma fase sólida.
Podemos admitir que os primeiros condensados, gerados a partir da nébula solar, depois de graviticamente concentrada num glóbulo (o embrião do Sol) e que deram existência a todos os corpos sólidos do Sistema Solar, se formaram a partir de “gotas” de um fundido equiparável a um magma. Os côndrulos que caracterizam um tipo particular de meteoritos líticos, primitivos e indiferenciados, a que chamamos condritos, formaram-se a partir de gotículas (fluidas) posteriormente solidificadas sob a forma de material parcialmente vítreo associado a silicatos ferromagnesianos como olivinas e piroxenas.
A acreção (junção ou aglomeração) destes materiais levou à formação de corpos progressivamente acrescentados, os planetesimais, entre os quais, os maiores puderam experimentar fusão e diferenciação no seu interior. Os meteoritos apelidados de diferenciados (acondritos, siderólitos e sideritos) são hoje vistos como fragmentos desses corpos maiores nos quais tudo indica ter havido fusão seguida de arrefecimento e solidificação e, portanto, magmatismo. Os materiais que resultam deste processo são formados por minerais, e, por isso, devem ser considerados rochas.
Os planetas rochosos ou pétreos como a Terra resultaram da acreção de planetesimais de dimensão variada, processo que, implicando grandes colisões (megaimpactos), foi acompanhado pela libertação de enormes quantidades de energia térmica (energia de acreção) suficiente para levar à fusão dos corpos planetários em crescimento. Estes poderão ter passado por vários ciclos de solidificação e fusão, numa repetição assegurada pelo incomensurável número desses corpos, nos começos do nosso Sistema Solar, e também pela imensidade de tempo envolvido no processo.
Lembremos que megaimpactos de imensa magnitude, ocorridos no nosso satélite Lua, deram origem a grandes áreas deprimidas (bacias), posteriormente preenchidas por lavas basálticas (com idades entre 3800 e 2500 milhões de anos) geradas a partir da fusão de materiais rochosos do manto selenita, em resultado do calor libertado nessas megacolisões. Os “mares” lunares são vastas áreas planas (17% da superfície), de tonalidade mais escura, correspondentes às últimas escoadas das referidas lavas. Estas planuras contrastam com as terras altas, os “continentes”, muito claras, constituindo a crosta primitiva, igualmente magmática, representada por anortositos com 4400 a 4500 milhões de anos (Ma). A crosta lunar sobreviveu graças às relativamente pequenas dimensões do respectivo corpo que, assim, já arrefeceu a ponto de ter aí cessado, praticamente, toda a actividade magmática, o mesmo sucedendo e pela mesma razão, a Mercúrio e a Marte.
A contracção gravítica, inerente a um corpo suficientemente grande e indiferenciado (chamemos-lhe protoplaneta), gerado por sucessivas e progressivas acreções, e a desintegração radioactiva de certos isótopos foram fontes de calor a acrescentar ao processo que, pensamos, esteve na origem da Terra.
A evolução que, a partir do corpo protoplanetário relativamente homogéneo (indiferenciado) então criado, conduziu a um planeta diferenciado, isto é, com individualização de um núcleo férrico, de um manto e crosta silicatados, envolveu igualmente um conjunto de processos nos quais o magmatismo teve papel fundamental.
Este processo de diferenciação correspondeu à migração gravítica do ferro disseminado no corpo do protoplaneta, em direção ao respectivo centro, num imenso colapso gravítico, ele próprio gerador de calor (energia de colapso). Igualmente fundido, em parte maior ou menor, ficou o invólucro essencialmente silicatado e magnesiano correspondente ao manto. Nesta fase, a Terra e, certamente, os outros planetas rochosos eram “bolas de fogo” envolvidas num “oceano de rocha em fusão, ou seja, de magma. Só depois, após arrefecimento de milhões e milhões de anos, se formou a já referida crosta primitiva, num processo igualmente magmático.
Admite-se que com a diferenciação magmática da crosta teve lugar a correspondente libertação de vapor de água, de dióxido de carbono e de outros gases, à semelhança do que acontece no vulcanismo actual. Logo que o arrefecimento o permitiu, o vapor de água condensou, gerando parte da água existente na Terra. A outra parte, pensa-se, terá sido trazida por cometas nas primeiras fases da evolução planetária. Torna-se, assim, evidente que a atmosfera primitiva e parte da água do planeta buscaram origem no magmatismo que aqui teve lugar. O ar que hoje respiramos, o mesmo que diariamente poluímos em nome do chamado desenvolvimento, já não é o da atmosfera primitiva nascida da referida diferenciação, mas o que evoluiu a partir dela numa estreita ligação com os organismos fotossintéticos de então.
Temos, pois, de concluir pelo carácter também essencial do magmatismo na origem e manutenção da vida.
No que se refere ao nosso planeta, o magmatismo foi e é uma constante na respectiva dinâmica global, quer sob a forma de vulcanismo (de Vulcano, deus do fogo, na mitologia romana), quer de plutonismo (de Plutão, deus dos Infernos, na mitologia romana).
A finalizar lembremos que os magmas que geraram e geram as rochas magmáticas que nos rodeiam nasceram e nascem todos da fusão parcial de rochas preexistentes, quer no manto superior e, neste caso são referidos por magmas primários, quer na crosta, recebendo então o nome de magmas secundários.
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