31.8.08

Tão felizes que éramos!

Por António Barreto
SARAH ADAMOPOULOS seleccionou um pouco mais de trinta pessoas a quem pediu para contarem um pouco da sua experiência de criança. Este é o resultado. Atraente e estranho. Não se trata de uma amostra representativa. São escolhas de Sarah, feitas, creio, ao ritmo e à circunstância de amizades, conhecimentos, camaradagens e afinidades.
Muitos deles vêm das letras e das artes. Valem por eles, não valem por universos estatísticos. Mas têm comunidade de experiência e de recordação. A felicidade, em primeiro lugar. Quase todos os entrevistados tiveram infâncias felizes. Depois, vem o espaço, que é uma maneira de sentir a liberdade. Referem os espaços largos da infância e queixam-se da falta de espaço, hoje, o que também quer dizer falta de liberdade. A descoberta do mundo, a seguir. E a descoberta dos outros. Para quase todos, eram tempos em que os pais davam o exemplo e ensinavam coisas, enquanto as mães davam afectos. Vindos de meios cultivados, aprenderam artes e letras: com os pais ou em escolas privadas, nesta que é mais uma revelação da miséria cultural da nossa escola de ontem e de hoje.
(...)
Texto integral [aqui]
NOTA: esta e outras crónicas do mesmo autor estão também no seu blogue, o Jacarandá

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(...)
PELOS VISTOS, até André Brun, esta semana, nos vem com uma história de polícias e ladrões... Seja! E, como habitualmente sucede, o texto integal (que, hoje, é o Capítulo VI da colectânea Sem Cura Possível) está [aqui].

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ESTA 'CONCORDÂNCIA' «Falta / impedem» dá razão a um velho amigo meu que se farta de desabafar: «Que falta faz, a certa gente, uma boa 4ª classe!»
A propósito, ver o texto «É de mestra!», do livro Jeremias dá uma mãozinha - [aqui]

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Do arquivo Humor Antigo

A PROPÓSITO DAS AFIRMAÇÕES que remetem para a brandura dos juízes a responsabilidade de libertação de criminosos, leia-se o que escreve António Cluny, no «DN» de hoje:
(...)
Já parece, contudo, correcto afirmar, sem riscos de demagogia, que o sentimento de insegurança, de impunidade, de desmotivação das forças de segurança e de inutilidade do sistema judicial tem muito a ver com os efeitos daquelas reformas.
(...) muitos práticos, académicos, analistas e jornalistas, alertaram, em tempo, para os riscos evidentes que elas comportavam.
(...)
Foi por causa dessas excêntricas, rígidas e desadequadas normas de interpretação desse Código que muitos delinquentes foram sendo sucessivamente soltos, apesar de, alguns, terem sido detidos mais de uma vez por semana pela prática dos mesmos crimes.
(...)
Os delinquentes acabam, assim - eles próprios - inexplicavelmente soltos e crescentemente convencidos da sua impunidade.
(...)
Aqui, mais do que no agravar de penas e pressupostos da prisão preventiva, residem as causas de muita insegurança, de muita impunidade e do crescente descrédito da autoridade do Estado.
(...)
Texto integral [aqui].

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30.8.08

Barrancos, 2008 - C. M. de hoje
Se não se consegue reprimir um comportamento ilegal, decrete-se que deixa de o ser.
A genial directiva poderia ter vários autores, de quase todos os quadrantes políticos, como podemos ler em «A Barraca de Barrancos», crónica publicada no «Expresso», há seis anos - [v. aqui].

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O crime na internet (*)

Por Antunes Ferreira
NÃO HÁ DUAS SEM TRÊS, dizia-se. Agora, sem margem para dúvidas, não há dias sem muitos. Leia-se: actos criminosos. Aqui há umas semanas rabisquei aqui uma «coisa» em que dizia, mais ou menos, «vou ali assaltar o banco e volto num instante». Agora, no mínimo, terei de utilizar muitos plurais. Demasiados, infelizmente.
Por estes conturbados tempos, há de tudo: para além dos já calinos assaltos a bancos e outros alvos, rouba-se, a dinamite em plena autoestrada, mata-se quem quer que seja, sobretudo porque o infeliz tentou negar-se a entregar a carteira, o cartão de crédito, e muito mais. Como o nosso Povo comenta, mata-se, esfola-se, viola-se, vigariza-se e rouba-se.
Estamos feitos. Estaremos? Tudo aponta para isso. Os «brandos costumes» característicos dos portugueses estão, como estavam os dinossauros, em vias de extinção. (Desculpe Professor Galopim, meti a foice em seara alheia, digo, sua…). E as imensas quantidades de armas que «andam por aí», como acentuava o outro, ajudam e participam. E entram, ao contrário dos testículos.
(...)
Texto integral [aqui]
(*) - A. F. e o Sorumbático oferece(ra)m um livro policial ao autor do melhor comentário feito a esta crónica até às 24h do dia 2 Set 08. V. blogue Travessa do Ferreira - [v. aqui].

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29.8.08

Agora é o ministro?!

Por Joaquim Letria
QUANDO A CRIMINALIDADE AUMENTA e o crime violento cresce, vem uma certa oposição, que durante anos contribuiu para esta situação, que inventou as super-esquadras, que matou a tiro inocentes, que deixou paraplégicos simples cidadãos, que ajudou a mudar o código do Processo Penal, que destrambelhou as cadeias, exigir a demissão do ministro Dr. Rui Pereira, da Administração Interna, porventura o mais equilibrado e democrático naquela pasta dos últimos 30 anos.
Limitei-me em toda a vida a trocar três parágrafos amáveis com o Sr. Ministro Rui Pereira, mas lembro-me das suas judiciosas e democráticas considerações quando esteve à frente dos serviços de segurança que sempre fez questão de pautar pelos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos.
Quem que ele se vá embora!? Tenham vergonha e respeitem o Dr. Rui Pereira. Não andem com jogos sujos! Nem dum lado, nem do outro. A gente compreende que lhes convém. E muito! Tenham paciência!
«24 Horas de 28 de Agosto de 2008

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Agosto em Lisboa

Por Alice Vieira
“O MELHOR MÊS para viver em Lisboa é Agosto”, diz a mulher, piscando os olhos diante do reflexo do sol na água do pequeno lago da esplanada. Lago artificial, numa esplanada criada no centro de Lisboa, ou num dos vários centros que Lisboa agora vai tendo, à medida que os shoppings lhe vão dando outro rosto.
Quem passa da rua nem dá por ela, o arquitecto foi engenhoso, colocou-a numa espécie de pátio interior do prédio, “até parece que estamos muito longe de Lisboa, nem se ouvem os carros nem nada.”
A amiga concorda e, no íntimo, agradece ao desconhecido arquitecto que assim lhe proporciona uma ilusão de férias, uma ilusão de esplanada à beira-mar, com a vantagem de ter o “Corte Inglés” a dois passos.
“Já reparaste que nesta zona todos os euros são espanhóis?”, diz, “todos os trocos que nos dão nas lojas trazem nas moedas o Juan Carlos a rir para a gente...”
Na mesa ao lado, uma estrangeira estoira ao sol, um chapéu de linho branco amarrotado enfiado pela cabeça, pulseiras a treparem-lhe por ambos os braços.
O empregado que lhes serve o café já a conhece, “ vem aqui todos os dias e tem cá uma saída que nem calculam... Mas não quer nada com estrangeiros. O portuguesinho valente é o único que lhe serve...”
O homem ri e acrescenta:
”Diz que é para aprender a língua!... Se fosse para aprender a língua, também eu servia, não era? Posso não ter grandes estudos, mas para lhe ensinar bom dia, boa tarde, com licença, obrigada, se faz favor e desculpe, ainda chegava!”
Elas sorriem com a história, até nisso a esplanada lisboeta se parece com qualquer esplanada de praia em Agosto, cheias de estrangeiras loiras e disponíveis.
“Esta gente não tem horas para nada”, diz uma delas, “almoçam quando calha, se calhar nem jantam, haviam de ter um marido como o meu”.
Trinca raivosamente o mil-folhas grande demais para a sua boca, o creme a espalhar-se todo, a cair na blusa, “chatice, lá vou ter de a lavar, ainda ontem fiz uma máquina de roupa, já hoje tenho de fazer outra, muita roupa se suja lá em casa!”
A outra concorda, lá em casa é a mesma coisa, e depois dizem que estão de férias, ela já nem se lembra de quando é que teve férias, férias mesmo a sério, e já não é mau haver esta esplanada mesmo à porta de casa.
Calam-se por momentos, e olham uma vez mais para a rapariga loira, que não tem de certeza problemas desses, nem marido em casa a refilar se o jantar não vem a horas para a mesa, ou se o fio do feijão verde não está bem tirado, ou se a sopa ficou esturrada e a cerveja morna.
Pagam a despesa, lá recebem mais uns euros com a cara do rei espanhol, sorriem ao empregado, regressam ao barulho da cidade.
Ao final do dia, a rapariga loira regressa à esplanada, com o sorriso beatífico de quem passou uma tarde inesquecível, mergulhada nas subtilezas do conjuntivo, na descoberta do nome predicativo do complemento directo, ou na maravilha das frases idiomáticas.
Quando voltar à sua terra estará perfeitamente capaz de explicar às amigas, com apetências linguísticas iguais às dela, se a língua portuguesa é, ou não, muito traiçoeira.
«Tempo Livre» de Agosto de 2007
Passatempo-relâmpago (CMR): será premiado, com um exemplar do livro cuja capa aqui se vê, o primeiro leitor que souber dizer o nome da respectiva editora. Actualização (17h35m): ver [aqui] o resultado do passatempo.

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Aqui se deixa uma 'deixa'...

Do Arquivo Humor Antigo - Ano de 1934

A CRÓNICA de Joaquim Letria «Vou dar em vegetariano...» remete-nos, invariavelmente, para as actuais campanhas de saúde à força - contra o tabaco, o sal, o açúcar, os ovos, as gorduras... e tudo o que, de uma forma ou de outra, pode tornar a vida mais fácil de suportar. Costuma até dizer-se que, a seguirmos esses conselhos, todos viremos a morrer de perfeita saúde.
*
Perguntar-se-á o que é que isso tem a ver com a anedota aqui afixada. Bem... trata-se de uma associação de ideias, que passo a explicar:
Da mesma forma que, de facto, ninguém morre de perfeita saúde (no atestado de óbito tem de constar um motivo qualquer), também para que se dê um descarrilamento de comboio (como no caso recente da Linha do Tua) há-de haver uma razão - que compete aos responsáveis apurar.
Assim, fez bem Mário Lino em não aceitar as bizarras conclusões do inquérito preliminar segundo as quais não houve quaisquer motivos para o desastre se dar!
*
Em tempo: uma ressalva ao que atrás disse: em certos casos, os médicos podem indicar que a morte se deu por velhice - a que dão o nome mais pomposo de senilidade... Não é uma boa deixa para a rapaziada da CP?

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28.8.08

Vou dar em vegetariano…

Por Joaquim Letria
HÁ MÉDICOS que nos mandam beber vinho tinto à refeição que faz bem ao colesterol. Outros aconselham-nos: não beba que dá cabo do fígado. Olhe a cirrose. Há ilustres clínicos que recomendam: coma peixe quatro vezes por semana!
Outros dizem-nos para comer só carne branca. Não coma doces e, se não dispensar uma sobremesa, escolha uma peça de fruta e coma-a lentamente. Mas ainda a gente não acabou de dizer que sim e já temos outros clínicos a dizerem-nos para começarmos as refeições por peças de fruta, o que contribui para comermos menos. E ainda há os que nos falam da receita mediterrânica e os outros que nos recomendam margarina e nos condenam a manteiga.
Agora até os membros do Green Peace mandam vir. Coma bacalhau mas pouco, escolha entre a Islândia e a Noruega, não coma do Canadá. Acho que vou dar em vegetariano: ou dobrada, ou iscas à portuguesa…
«24 Horas» de 27 de Agosto de 2008
NOTA (CMR): esta crónica inspirou um passatempo-relâmpago: ver comentário das 20h50m, e resposta (certa) dada 19 minutos depois.

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Luz XIX

Fotografias de António Barreto - APPh
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Tomar - Aqueduto construído pelos monges há quatro ou cinco séculos, para abastecer o convento, o mosteiro e a cidade de Tomar. Os locais chamam-lhe os “Pegões”, como noutras partes do país. É um magnífico aqueduto, muito bem conservado. (1995).
NOTA: estas fotos, juntamente com crónicas diversas do mesmo autor, estão também no seu blogue, o Jacarandá

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27.8.08

Memórias achadas

Por C. Barroco Esperança
QUANDO AGOSTO SE FAZ MÊS regressamos às origens para ver quem resta e abraçar os que estimamos.
Os corpos mudam com o tempo. Nos rostos esculpiram-se sulcos que lavram a pele e alteram os traços que nos caracterizaram. A memória devolve a saudade. Uns minutos bastam para acordar afectos, adormecidos durante décadas, que irrompem com fúria e perturbam a razão e a compostura.
Basta um olhar mais terno, um abraço mais estremecido ou um beijo que se alonga uma fracção de segundo, para agitar os sentidos, humedecer os olhos e acelerar as pulsações. O raio do tempo só hiberna os sentimentos, não sepulta afectos, que resistem décadas e mantêm prazos de validade que a conveniência e o decoro deviam ter sepultado.
A vida é uma arma carregada que nos segue com o cano apontado. Tropeçamos em memórias e logo uma descarga nos atinge para voltarmos ao passado, a sangrar por dentro e com fracturas expostas.
O diabo do sono altera-se enquanto as lágrimas nos marejam os olhos. Que insegurança é essa que nos conduz pelo lado proibido da estrada, em sentido contrário?
É apenas um pesadelo de Verão com que o Outono da vida nos sufocou numa derradeira viagem à Primavera? Não tarda que as folhas caiam e, com elas, desfeitas em pranto, as recordações que nos apoquentam. Há um solstício à espera dos equinócios que restam.
NOTA: outras crónicas do mesmo autor - no blogue Ponte Europa

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As anedotas que habitualmente aqui se afixam são obtidas em velhos Almanaques Bertrand. Não é o caso desta, da autoria Stuart de Carvalhais - por sinal bem a propósito dos tempos que correm...

A protecção da Banca

Por Joaquim Letria
A BANCA EM PORTUGAL ganhou uma medalha olímpica de prata em ineficácia, incapacidade, incompetência e custas aos clientes. Quem tal proclama é uma espécie de Comité Olímpico da Banca Mundial que nem precisa de contar duas vezes, ou tirar as provas dos noves, para chegar a essa brilhante e incontestável evidência.
Injustamente, as autoridades internacionais da banca não atribuem o valor individual de tais prémios nem anunciam a quem cabe o mérito de tão honrosa classificação de Portugal, mas com o passado indesmentível do BCP, não há recordistas que escapem injustamente.
Uma coisa é inegável: a vergonha é portuguesa, mas não deveremos ser exclusivistas nem xenófobos. A banca, em geral, tem sido mais protegida do que o Banco Ambrosiano e os banqueiros já não os penduram das pontes nem são presos, quando lhes descobrem as falcatruas.
«24 Horas» de 26 de Agosto de 2008

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«Acontece...» - Passatempo com prémio

Por Carlos Pinto Coelho

Pergunta-se: de que nacionalidade é este guarda?
Cada leitor poderá dar uma única resposta, que não deverá ser na forma interrogativa.
NOTA: Esta fotografia, como todas as outras aqui afixadas em posts com o título genérico «ACONTECE...», é da autoria de CPC.
-
Actualização-1 (11h15m): a resposta certa foi dada por Eira-Velha, a quem se pede que, nas próximas 48h, contacte sorumbatico@iol.pt, escrevendo em assunto «Acontece de 27 Ago 08». Ver também comentário de António Vasques.
Actualização-2 (18h27m): no seguimento do comentário/correcção, pede-se a Ricardo Martins Pereira que, nas próximas 48 horas, contacte sorumbatico@iol.pt, escrevendo em assunto «Acontece de 27 Ago 08».

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POBRE POVO NAÇÃO DOENTE

Por Baptista-Bastos
ESTÁ UMA BATALHA LÁ FORA e os políticos não encontram melhor forma de reconhecimento do que se passa senão com dizer coisas sem sentido. A violência está a mudar (mudou) a nossa sociedade e põe em causa não apenas a face social do País como favorece a emergência de ataques à liberdade, em nome da segurança. As primeiras páginas dos jornais, os "alinhamentos" dos noticiários televisivos não se baseiam em princípios abstractos: a gestão do medo traduz a realidade do medo, e uma falta de confiança na avaliação dos políticos.
Impressionamo-nos com a crueza das imagens de brutalidade mas, a seguir, admitimo-las porque nos resignámos. Criou-se a mentalidade difusa, volatilizada, de que esta realidade é a concepção subjacente da "modernidade". Oculta-se a verdadeira razão: o capitalismo contemporâneo criou um indivíduo que recusa e resiste a qualquer forma de compromisso. Os laços sociais foram destruídos e o homem "moderno" encerra-se em si próprio, indiferente não só ao "outro" como relapso aos assuntos públicos.
(...)
Texto integral [aqui]

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26.8.08

DE POUCO ADIANTA andarem governantes, procuradores e polícias a perorarem sobre 'segurança' quando não se consegue, sequer, impor a legalidade mais comezinha nas ruas da capital.
A imagem mostra um parquímetro na Av. de Paris (uma 'zona fina' de Lisboa...), onde, como sucede em muitos outros lados, a lei (pelo menos em matéria de estacionamento) é ditada pelos arrumadores - sem que isso pareça preocupar muito aqueles a quem pagamos para que tal não suceda.
*
NOTA: Segundo me explicou um graduado da PSP, a empresa proprietária não costuma apresentar queixa contra os ladrões de parquímetros. Assim, mesmo que os artistas sejam apanhados, NADA lhes acontece - trata-se da tal história do crime semi-público, como sucedeu com os verdeufémios. E por falar nisso: alguém sabe como está essa história da destruição do milho transgénico de Silves?

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Sugere-se, a quem se deparar com o número 567890 do site-meter, que faça o respectivo print-screen e o envie para sorumbatico@iol.pt.
Actualização: o vencedor foi o leitor F. Passos (com o print-screen que aqui se vê), a quem já foi enviado o livro que, entretanto, escolheu.

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Olimpíadas gregas

Por Nuno Crato
SE O LEITOR ESTAS FÉRIAS FOR À GRÉCIA, não deixe de passar por Atenas, que possui alguns dos testemunhos mais belos da civilização grega. Não se esqueça de ver a Torre dos Ventos e não perca o Museu Arqueológico. Neste, entre pela secção micénica e deslumbre-se com a máscara de Agamémnon. Percorra os artefactos minóicos e pré-clássicos e espante-se com o avanço daquela civilização.

Máscara de Agamémnon
Há algumas décadas, parecia fora de moda falar do milagre grego. Mas nada do passado é tão actual. Os Gregos foram extraordinários na arte e na ciência. A arte é tão espantosa que os visitantes do museu arqueológico podem esquecer-se da ciência.
Mas explore bem as diversas alas e não saia sem ver o mecanismo de Antiquítera.

O mecanismo de Antiquítera
Encontra-se numa sala modesta, mas é um dos produtos mais extraordinários da ciência e da técnica gregas. Foi encontrado em 1901 no fundo do mar, frente à ilha de Antiquítera, o que lhe deu o nome. É um mecanismo extremamente complexo, com dezenas de rodas dentadas de que sobrevivem 29. Servia de relógio astronómico. Calculava as posições do Sol e da Lua, as estações, as fases lunares, os meses e as posições de Vénus e Marte.
Nada de semelhante foi construído até à Idade Média, quando foram inventados os relógios mecânicos com sistemas de rodas dentadas. Descobriu-se há poucas semanas que o mecanismo podia prever eclipses e que continha ainda um calendário dos jogos olímpicos.
Num dos discos, conforme relata o estudo publicado na «Nature» (vol. 454, pp. 614–617), estão marcados os jogos pan-helénicos, que se realizavam em ciclos de quatro anos. Nada de mais actual.
«Passeio Aleatório» - «Expresso» de 23 de Agosto de 2008 (adapt.)

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25.8.08

Os Jogos

Por Joaquim Letria
ACABARAM, FINAMENTE, os Jogos Olímpicos de Pequim e Portugal, como todos nós sabemos, oscilou entre o garrote, o desespero e a vergonha e a heroicidade, o sacrifício e o bem comum. Bastou a medalha de Ouro dum costa-marfinense e a de prata duma heroína do Norte para se obter a diferença. A Marinha já não morreu na praia, até vai reformular as guarnições e preparar os próximos desembarques e as Associações, o governo tutelar e os atletas portaram-se melhor do que o Churchill, e os combatentes nas pistas e mares foram melhores do que os vencedores da batalha de Inglaterra.
A maioria ainda se recordará do espírito de Coubertin, a necessidade absoluta de se ser amador, a importância única e vital de participar, a vergonha de receber subsídios, bolsas e “cachets”. Já não é assim. Todos gritam pela necessidade de se ser profissional e brioso. Daqui a quatro anos, em Londres, ainda vai ser pior.
«24 Horas» de 25 de Agosto de 2008

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POR MUITO QUE PESE a alguns dos meus amigos, há dois tipos de "agremiações" com as quais me recuso a gastar um chavo: trata-se dos partidos políticos e dos clubes de futebol, para os quais - como se costuma dizer - já dei...
Basta referir que o último jogo a que, até à semana passada, eu havia assistido ao vivo foi em 1971, um ano que, para muitos, tem sabor a pré-História!
No entanto, e como sou apreciador de um bom jogo de futebol (independentemente de quem o pratique), foi com prazer que anteontem aceitei o brinde de um ingresso e de uma jantarada (ambos oferecidos por familiares sportinguistas) - e lá fui, com eles, "ajudá-los a ver" o Sporting-Trofense.
Pareceu-me um jogo fraquito, mas o importante é que estive entretido, e a rapaziada que me rodeava (todos sofredores com lugar cativo...) também apreciou, à parte a cena do penalti manhoso. Ainda bem. Esta velha anedota de Humor Antigo, de 1934, é-lhes, pois, dedicada.
*
NOTA: já que se fala de futebol, chama-se a atenção dos leitores para um passatempo com prémio que está a decorrer no blogue Corta-Fitas, e em que será atribuído um exemplar da obra «Morte no Estádio», de Francisco José Viegas. O livro, que em tempos já aqui foi oferecido, é quase um clássico do género e vale bem a pena. Ver [aqui].

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Como já aqui foi dito, os prémios existem para serem atribuídos; no entanto, também há prazos para eles serem reclamados. Assim, e como já terminou o prazo para reclamação do 1.º dos 3 prémios do «passatempo «Lolita», o par de livros correspondente será atribuído ao primeiro leitor que escreva, aqui, em comentário, as palavras «Quero eu o prémio»; mas - atenção! - num momento em que o grupo hora-minuto dê noves-fora-nada (como, p. ex., 9h27m). O prémio será um exemplar dessa obra de Vladimir Nabokov e ainda um outro livro, surpresa. Cada leitor poderá concorrer duas vezes. Boa sorte! Actualização: o passatempo foi ganho por Luís Bonito, às 10h08m

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Núcleo museológico do Alto de São Bento

Por A.M. Galopim de Carvalho
Núcleo museológico do Alto de São Bento, em Évora
DOIS ANOS DEPOIS DA CONQUISTA DE ÉVORA, em 1165, por Geraldo Geraldes, o Sem Pavor, e do foral que lhe foi dado por D. Afonso Henriques, erguia-se, a 2 km da cidade, no sopé de uma colina, uma pequena ermida dedicada a São Bento, italiano nascido no ano de 480, em Núrsia, fundador do monaquismo ocidental e criador da ordem religiosa que alude ao seu nome - a Ordem Beneditina. Um século mais tarde, sobre esta ermida nascia o convento cisterciense de São Bento de Castris, uma das mais antigas instituições religiosas femininas e, oito séculos depois, no cimo do cabeço, ali ao lado, o Núcleo Museológico do Alto de São Bento.
Numa tradição vinda dos avós, muitas famílias de Évora comiam o “assado” neste cabeço arborizado e fresco onde, há mais de 3000 anos, existiu um castro da Idade do Ferro. Reminiscência pagã, a anunciar a primavera, esta romaria popular, no dia a seguir ao Domingo de Páscoa, ou seja, na Segunda-feira de Festa, como ainda por lá se diz, não tinha deuses nem santos. Para mim e para os que ali confraternizavam, São Bento era apenas o nome de uma colina de granito com três ou quatro moinhos abandonados e em ruína.
(...)
Texto integral [aqui]; v. outras crónicas do mesmo autor no seu blogue Sopas de Pedra.

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24.8.08

Clicar na imagem, para a ampliar
Do arquivo Humor Antigo - Ano de 1934

Aniversário do incêndio do Chiado

Por António Barreto
A RECUPERAÇÃO DO CHIADO teve boas e más soluções. Mas o problema não é apenas, nem sobretudo, o do gosto. É o do ambiente geral que se vive no centro da cidade. A noite do Chiado é de abandono, a sugerir um princípio de vida marginal. Ao fim-de-semana, a “cena” repete-se. Como, aliás, em grande parte da Baixa pombalina. O que se passa neste centro histórico é lamentável.
As causas têm de ser encontradas em questões mais gerais: a lei das rendas, a especulação, os horários dos comércios, o privilégio aos centros comerciais, a prepotência camarária... Tudo foi muito mais grave do que o incêndio!
Daqui a vinte anos, gostaria de ver um Chiado com residentes, rendas livres, mais emprego, divertimentos e comércio aberto dia e noite”.
«Expresso» de 23 de Agosto de 2008
NOTA (CMR): esta e outras crónicas do mesmo autor estão também no seu blogue, o Jacarandá

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Texto integral [aqui]
PROSSEGUINDO a divulgação da obra «Sem Cura Possível», de André Brun, aqui fica mais uma divertida história - desta vez, a de um casalinho que, pretendendo ficar a sós numa carruagem de comboio, recorre a um estratagema que parecia ter tudo para dar certo; só que...

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23.8.08

Viagem "sem rede" no País do Faz-de-Conta

(...) A falta de comunicações obrigou ontem algumas das vítimas do descarrilamento, que fez uma vítima mortal, a percorrerem centenas de metros para pedirem socorro (...) - Texto integral [aqui]
Do arquivo Humor Antigo - Ano de 1934

Évora e o 8 ou o 80

Por Antunes Ferreira
PRONTO, ACABOU-SE. E foi o porta-bandeira da delegação portuguesa que a fez subir no mastro olímpico. Nelson Évora. Um novo herói a juntar aos três anteriores campeões olímpicos: Carlos Lopes, Rosa Mota e Fernanda Ribeiro. E como continuamos a praticar um desporto tipicamente luso-especial – o 8 ou o 80 – de um dia para o outro, a desgraça tornou-se euforia. Já começáramos a dar uma volta com a Vanessa Fernandes de prata. Mas não chegava. Agora – foi.
O pessoal já andava de muito má catadura com o mísero desempenho dos desportistas de verde e vermelho. Tinham-se criado expectativas outrossim muito características da nossa maneira de ser miscigenada. Íamos ganhar uma caterva medalhas! Tínhamos a melhor representação de sempre. O paraíso entreabria-nos as portas. Foguetes e champanhe já estavam na bagagem da delegação. Uma festa antecipada, olarilolé.
Começaram os sucessivos desastres, terramotos lusitanos em terra de terramotos… chineses. Uma gaita! Frente aos ecrãs televisivos a consternação já andava de braço dado com o insulto. Para quê terem ido a Pequim 67 praticantes? Para averbarem derrotas? Para apresentarem justificações bacocas para os respectivos desaires? Para fazerem turismo… olímpico?
Estas coisas têm o seu preço. Já não bastava o cataclismo da equipa lusitana. Ainda por cima, diziam uns quantos mais puristas, «estes gajos da Comunicação Social são umas bestas» porque confundem Jogos Olímpicos com Olimpíadas. Toda a gente sabe que a Olimpíada é o período de quatro anos entre cada edição dos Jogos Olímpicos, desde que em 1896 ganhou corpo a ideia do barão Pierre de Coubertin de fazer renascer a tradição dos jogos da antiga Grécia.
Que se lixe a questão linguístico-cultural, retorquiam os menos abonados em conhecimentos de tal índole. «O que nos dá motivo para termos o pó que temos a esses gandulos é a imagem de parvos que dão de nós». Assim mesmo. De nós, leia-se, dos que ficaram por cá, sem fardas nem equipamentos, uns bons milhões. Os preços dos combustíveis, os crimes violentos e por aí fora eram minudências de um processo muito mais complexo – e grave: a figura de tanso. A famosa (estranha) crise fora de férias. E as Ligas só lá mais para o princípio de Setembro.
Nisto, o Évora tri-saltou. Calmo, tranquilo, sabedor do seu valor, consciente do que era capaz, aparentemente impávido e sereno – saltou. Três grandes pulos, ritmados, calculados, estudados e muitíssimo bem treinados, sacrificados – pelo menos nas horas imensas de trabalho do atleta. Saltou e ganhou.
Disse Tavares da Silva dos treinadores de futebol que hoje eram bestiais, amanhã já seriam umas bestas. Tinha inteira razão o prestigiado jornalista. Nós, os Portugueses, não somos de modas: militamos, convictos, em especial no sofá, por vezes na bancada, o oito ou o oitenta. Que nos havemos de nos fazer? Passe o pleonasmo e a construção espúria, está visto.
NOTA (CMR): blogue do autor: Travessa do Ferreira.

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22.8.08

ESTA MANHÃ, recebi um mail de um amigo cujo assunto, à primeira vista, parecia referir-se ao Nelson Évora e ao seu triplo-salto de ouro; mas, vendo melhor, o que estava em causa era - como ele lhe chamava - um sOltador e não um sAltador!
Quanto à possibilidade, também sugerida por ele, de premiar o melhor comentário que viesse a ser feito, o melhor é esquecer, pois o que é que se pode dizer que não tenha já sido dito?!

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Um passatempo inesperado...

ESTE PASSATEMPO não devia estar aqui nem agora... - e explico porquê:
Ontem, no seu Portugal dos Pequeninos, o João Gonçalves referiu esta obra, e eu pensei em desafiá-lo a promover um passatempo que premiasse o melhor comentário que fosse feito - mas no blogue dele, evidentemente.
Ora, o certo é que não clarifiquei a minha ideia, pelo que ele acabou por, numa simpática actualização ao seu post, remeter os leitores para o Sorumbático.
Cá estamos, pois; e agora eis-me na dificuldade de arranjar um critério para atribuição do prémio! Seja, então, o seguinte:
«Tratando-se de uma obra de peso na literatura internacional, quantos gramas pesa o livro na edição que aqui se mostra?»
*
As respostas deverão ser dadas aqui, em comentário, entre as 12h00m e as 20h00m de hoje (inclusive), sendo o prémio atribuído ao leitor que mais se aproxime do valor certo. Cada leitor poderá concorrer com 2 palpites, no mesmo comentário ou não.
Actualização (21h08m): ver resultados [aqui].

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21.8.08

Passatempo-relâmpago

NOS BLOGUES «O Carmo e a Trindade» e [neste] está em curso um passatempo com prémio para o qual não é preciso grande sabedoria: são dadas 30 fotos (tiradas no mesmo local ao longo dos tempos...), e o vencedor será o primeiro leitor que adivinhar qual delas é a mais recente.
Actualização (22 Ago 08/10h04m): a resposta certa já foi dada; o nome do vencedor está indicado no comentário das 9h50h.

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O milagre das couves

Por A. M. Galopim de Carvalho
NO TEMPO EM QUE FUI CRIANÇA e adolescente os castigos corporais, longe de serem considerados crime, como hoje, felizmente, acontece, eram perfeitamente tolerados pela sociedade e até vistos, por muitos cidadãos respeitáveis, como a forma mais eficaz de educação.
Era o par de açoites à criancinha, por causa da sopa rejeitada ou como castigo pelas mais diversas diabruras. Eram as reguadas e orelhadas, na escola primária, usadas como estímulo pedagógico, e o sonoro estalo na cara, dado pelo reitor do liceu, como o melhor garante da boa disciplina. Era o pontapé no cu do recruta que não conseguia acertar o passo na formatura de espingarda ao ombro. Era a bordoada de criar bicho, no interior da esquadra da polícia ou no posto da GNR, para não falar das sevícias infringidas pela Pide aos comunistas e demais opositores do regime dos Doutores Salazar e Caetano.
Dos menos aos mais violentos, os castigos corporais estiveram na ordem do dia das nossas vidas. Sopapos, nalgadas, chineladas (dadas com o chinelo), bofetadas, cascudos, torcegões de orelhas e outros mimos do género, convenhamos que suaves, fizeram parte do meu aprender a ser gente. A menina-de-cinco-olhos, o cavalo-marinho e o cinto do pai foram expressões correntes usadas como ameaças nunca cumpridas. Sova, surra, coça e tareia eram vocábulos cedo aprendidos. Felizmente, não senti, na carne, certas modalidades correctivas, cujos nomes, só de os ouvir, desencorajavam muitas das asneiras a que se é tentado nesses anos de preparação para a vida adulta.
A ameaça do cinto do pai não impediu que o Vasco, um primo por afinidade, na altura um rapaz nos seus treze ou catorze anos, tivesse cometido uma daquelas tolices de bradar aos Céus, como era costume dizer. Logo ali castigado pela mãe com um vigoroso par de tabefes, prometeu-lhe esta que teria de se haver com o pai, quando ele chegasse a casa, à hora do jantar.
Bem dito, bem feito. Ao fim da tarde, a mãe do Vasco, ainda muito acalorada pelo comportamento do filho, relatou ao marido, na presença do rapaz, a asneira cometida por ele. O semblante do homem ia-se carregando, à medida que ouvia o desenrolar do acontecido, ao mesmo tempo que o do meu primo denunciava a expectativa do correspondente castigo.
Ouvido o relato, nos seus pormenores, seguiu-se aquilo que o Vasco já conhecia de experiência própria. O desapertar do cinto e o sair deste, lento e ameaçador, das presilhas das calças. O passo seguinte, bem interiorizado por ele, era debruçar-se sobre a mesa e oferecer a retaguarda à acção correctiva que o esperava. Aos primeiros açoites, milagre! Grossas folhas de lombarda começaram a despontar das pernas dos calções do rapaz, acabando por cair no chão.
Na verdade, não houve aqui nada de equiparável ao que se passou com a nossa Rainha-santa Isabel que, à pergunta intimidatória de D. Diniz, seu esposo, respondeu, graciosa e segura:
- São rosas, Senhor!
O que se passou foi que, conhecedor deste tipo de castigo, o Vasco tinha-se prevenido. Assim, nessa tarde fora à horta e enchumaçara o traseiro com as folhas da dita crucífera.
NOTA: esta e outras crónicas do mesmo autor estão no seu blogue Sopas de Pedra.

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Luz - XVIII

Fotografias de António Barreto - APPh
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Uma vinha nova em socalcos modernos - Nas extremas, podem ver-se socalcos e patamares mais antigos. Nestes socalcos modernos, deve assinalar-se o facto de muitos deles estarem amparados por muros antigos, daqueles que já quase se não fazem hoje. Em cada socalco, apenas dois “bardos”, duas filas de videiras devidamente aramadas. A grande distância entre os dois bardos é feita em previsão da passagem das máquinas. Esta vinha parece excepcionalmente bem tratada. (2007).
NOTA: estas fotos, juntamente com crónicas diversas do mesmo autor, estão também no seu blogue, o Jacarandá

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Crimes religiosos

Por C. Barroco Esperança
A TRAGÉDIA QUOTIDIANA de crimes com motivações religiosas não pára. Há quem, em nome do respeito pelo multiculturalismo e pela fé individual, contemporize com a fanatização de crianças, através da catequese, e de adultos com enraivecidas homilias.
As catequistas da minha infância incutiam nas crianças o ódio aos judeus, comunistas, maçons e ateus, ao mesmo tempo que, com inflamada piedade, dedicavam orações a um reles ditador que apelidavam de salvador da Pátria e cujas funções atribuíam a desígnio divino.
A experiência pessoal ensinou-me a estar atento à educação deletéria de todos os beatos, particularmente dos religiosos, e a recusar as escolas do crime, que visam o proselitismo e a perseguição às liberdades individuais.
As religiões são associações de fiéis, idênticas aos partidos políticos e a colectividades, sujeitas ao primado da lei e ao escrutínio dos tribunais. Não se lhes pode permitir que, em nome de Deus, combatam o Estado de direito e defendam o racismo, a xenofobia e a violência. Não se lhes pode tolerar o terrorismo e o desprezo pelos princípios que regem as sociedades civilizadas nem que se tornem organizações totalitárias.
Segunda-feira foi cometido mais um atentado, na Argélia, contra uma escola superior militar. Morreram mais de quarenta pessoas, quase todas civis, vítimas de um suicida islâmico que conduziu um veículo com explosivos que atingiram um autocarro de passageiros e vários automóveis que ali circulavam.
Se um partido político fizesse a apologia terrorista contra os adversários era ilegalizado, mas a religião gera cumplicidades e medos que lhe permitem aumentar o poder e tornar a sociedade e a civilização reféns de um deus violento, cruel, vingativo e esquizofrénico semelhante aos homens que o criaram em períodos tribais, bárbaros e patriarcais.
É tempo de pôr cobro à demência prosélita dos crentes fanatizados, julgando e punindo os pregadores do ódio.
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NOTA: esta crónica, juntamente com outras do mesmo autor, está também no blogue
Ponte Europa

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20.8.08

A PRINCIPAL CARACTERÍSTICA dos livros de Michael Crichton, que faz com que pareçam tão verídicos, é o extremo cuidado que o autor dedica aos temas sobre os quais escreve, estudando-os com raro pormenor.
Neste thriler de 1992, ele aborda em detalhe muitos aspectos da sociedade nipónica, de entre os quais sobressai o facto de a criminalidade no Japão ser extremamente baixa - não porque as penas sejam elevadas, sublinha ele, mas sim porque a probabilidade de um criminoso ser apanhado e punido ronda os 100%, independentemente da gravidade do acto que cometa.
Não sei se, actualmente, a realidade ainda será essa. Apenas sei que estive, já depois disso, em Osaka (e noutras localidades menos conhecidas), e andei por lá, mesmo de noite, com um à-vontade que, por cá, não teria.
*
Lembro-me sempre desta obra de cada vez que vejo, em Portugal, gente responsável (?) a 'desvalorizar', a 'desdramatizar', a 'minimizar' e a 'relativizar' o crime menor, adubando assim alegremente o caldo de cultura onde a impunidade medra - a ponto de parecer, aos olhos dos beneficiados com ela, que é um direito adquirido!
Claro que nada disso é novo - mas olhem que, às vezes... até parece!

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«Acontece...» - Passatempo com prémio

Por Carlos Pinto Coelho

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Uma mesa e duas cadeiras vazias numa cidade de Israel. Fazemos-lhe a seguinte proposta: ponha ali duas pessoas e invente para elas uma situação ou um diálogo.
Haverá prémios (em livros, como sempre) para os textos mais criativos que venham a ser afixados até às 12h da próxima terça-feira, dia 26.
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Actualização (26 Ago 08): desta vez, a atribuição dos prémios foi particularmente difícil! Foi decidido premiar: JSA, CNS, Cristina, Bernardo Moura, Fernando Sosa e Mateso. Pede-se-lhes, pois, que, nas próximas 48 horas, contactem sorumbatico@iol.pt, escrevendo em assunto «Acontece de 20 Ago 08»

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«No reino do absurdo» é uma sequência de 13 posts, ilustrados com fotografias tiradas recentemente em Lisboa. Testemunham cenas diversas - entre o caricato, o absurdo e o revoltante. Estão no blogue «O Carmo e a Trindade» - [aqui].

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Pequenas e vãs excitações

Por Baptista-Bastos
A AUSÊNCIA DE MANUELA FERREIRA LEITE na Festa do Pontal fez estremecer de ira os dois terços de militantes do PSD que nela não votaram. Ofegante de indignação, Mendes Bota ainda foi tentado a escrever uma xácara pungente, sob o tema espesso e trágico do abandono. Mudou de ideias e proferiu dilaceradas metáforas acerca da "cisão" e do intransigente destino daqueles (ou daquelas) que escolhem a solidão como irreversível "razão de ser".
Ângelo Correia, orador oficial, não esteve com meias-medidas. Servindo-se da eloquência que fez dele uma espécie de incorporação ornamental de todos os valores, de todos os princípios e de todos os padrões fundadores do PSD - Ângelo, inclemente e esbaforido, acusou a ausente de "criar o vazio". Por seu turno, uns dias antes destes funestos episódios, Santana Lopes, o fatal Santana, blogou a excitação ideológica numas frases cruéis, embora trôpegas, que deixaram de rastos a grande faltosa: "Até pode nem falar. Mas deve estar junto daqueles que se dispõem, numa altura tão difícil para mobilizações, a estar juntos pela bandeira partidária, com a história que simboliza e as causas que representa.
"Estava a pátria estarrecida, eis senão quando surge António Borges. Grave, solene e fúnebre como um caixeiro de praça de uma loja de caixões, Borges, que gosta muito de dizer coisas, disse, lapidar, e acima de qualquer argumento: "A Festa do Pontal é uma festa para quem quiser passar uma noite divertida." Inferiu-se, desta atroz afirmação, que a dr.ª Manuela não gosta de "passar uma noite divertida", e que a natureza do encontro no Calçadão da Quarteira se reduz a um concentrado de futilidades. Notoriamente, o dr. António Borges é uma concessão à gaffe e cada intervenção que faz mais acentua a ideia de que, sobre estar no lugar errado, não tem jeito nenhum para a função.
Nessa mesma noite, uma das televisões exibiu um filme retrospectivo, no qual se via e ouvia Sá Carneiro a vituperar Ramalho Eanes, por "usurpação de poderes". A multidão, apopléctica, gritava como se estivesse a partir para uma guerra santa. O extraordinário dr. Borges, cujas confusões começam a pertencer ao anedotário político português, é a favor e contra a reunião no Pontal. A favor dos folgazões, bem entendido. Mas também contra quem lá vai por entender pouco sério os que apreciam "uma noite divertida". Não se percebe nada. Mas o dr. Borges não está ali para explicar: sim para complicar.
O alvoroço criado por estes desgraçados acontecimentos fez esquecer um relevante facto político: o novo visual do dr. Nuno Rogeiro.
O estimável comentador político apresentou-se à puridade desprovido das enormes guedelhas, que haviam sido grisalhas, agora pintadas de negro, e aparadas no moderno corte "à búlgaro".
«DN» de 20 de Agosto de 2008

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19.8.08

Callas em Agosto

Por Alice Vieira
ERA UM DIA DAQUELES em que o mundo está longe, em que nada nos parece afectar, em que aguentamos silêncios e abandonos, em que esquecemos salas de espera do hospital e horas do antibiótico.
Em que precisamos apenas de quem também precisa de nós.
Em que descobrimos que nos damos muito bem connosco, e que Lisboa em Agosto é o que mais se assemelha ao paraíso — e se for numa esplanada com o Tejo ao fundo, é quase o nirvana.
Um velho amigo tinha combinado um almoço, a conversa decorreu até quase às quatro da tarde, e aí ele lembrou-se de uma coisa que tinha de escrever e lá foi, e eu andei a pé, a embebedar-me de sol e rio até que dei comigo diante do Museu da Electricidade, com a exposição da Maria Callas anunciada em grandes painéis.
Entro, e por lá ando no escuro dos corredores, com a sua voz a acompanhar-me, a Callas desde os seus tempos de menina, as fotografias, as cartas (“Battista mio, sono felice”, escreve em Novembro de 47 ao Sr. Meneghini, com quem viria a casar dois anos depois), as ofertas, os vestidos, os recortes da imprensa, os programas, os contratos, os telegramas — até que desemboco numa sala dedicada à sua passagem por Lisboa, em Março de 58.
Sento-me - e de repente acabei de fazer 15 anos e estou à porta do Hotel Avis. Chove, faz vento, e eu tento convencer o porteiro a deixar-me ficar lá dentro até que ela chegue, e eu a veja e lhe estenda o meu livro de autógrafos.
Vou ouvi-la no dia seguinte ao São Carlos.
Mas o porteiro está habituado a lidar com celebridades. Sorri e diz-me que o mais certo é ela chegar tarde, maldisposta, a odiar a humanidade, e a querer que a deixem em paz.
Insisto.
Ele diz que, por ele, até nem vê problema mas, acrescenta, “se fosse à menina, eu ia recordá-la apenas por aquilo que vai ver amanhã no palco. A Maria Callas é isso — e não esta cliente do nosso hotel.”
Ainda hoje me lembro desta conversa — e por ela lhe fiquei sempre grata. E sobretudo pelo remate: “a menina deixe cá ficar o seu livro, e um dia destes venha buscá-lo. Eu consigo que ela o assine.”
Conseguiu.
E na verdade o que me ficou na memória foi a maravilha daquela “Traviata”, a primeira que eu ouvi, a música, os fatos, os cenários, o perfume da sala - e as palmas, aquelas palmas que pareciam não acabar nunca (há quem jure que houve 42 chamadas ao palco).
E que, nas minhas mãos, duram até hoje.
«JN» de 17 de Agosto de 2008

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EU SEI QUE O ASSUNTO se presta a muita demagogia, a muita conversa-fiada, mas não resisto, especialmente porque hoje fui interpelado, até à náusea, por um pedinte com cerca de 20 anos e bom corpo para trabalhar. Para me ver livre dele, dei-lhe as 3 moedas que tinha, e mostrei-lhe que não tinha mais. Saltou-me a tampa quando, em vez de me agradecer, me perguntou o que é que ia fazer com tão pouco!
*
Ontem, ao ver este homem, juntamente com outro - ambos portugueses -, a apanhar à mão o lixo que muitos lisboetas atiram para os jardins da cidade, não resisti: pedi-lhe para o fotografar e falei um pouco com ele. O curioso - e é por isso que aqui fica a referência - é que ambos pertencem a uma empresa que os traz, todos os dias... de Alcobaça para Lisboa!
E fica a pegunta - a tal que se presta a demagogia e a conversa-fiada, mas que é inevitável:
Então é preciso vir gente de Alcobaça?! Não há, em Lisboa e arredores, homens e mulheres em condições de fazerem estes trabalhos? Estou a pensar, evidentemente, em muitos dos que recebem o RSI, sem que sejam inválidos-coitadinhos...

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Ciência para Extraterrestres

Por Nuno Crato
SE OS MARCIANOS que, como toda a gente sabe, não têm ouvido para a música viessem à Terra investigar o sucesso musical, talvez gostassem de saber quem são os grandes compositores terrestres.
Podiam começar por ir a algumas lojas e ver quais são os mais vendidos. Claro que era uma aproximação, mas de certeza que não falhavam Mozart, nem Beethoven, nem Amy Winehouse. Em seguida, se quisessem ser prudentes, viam as datas das composições. «Rehab», desta última artista, data de 2006, enquanto «A Flauta Mágica» foi composta por Mozart em 1791 e sobrevive como uma das obras mais vendidas de sempre.
De volta ao seu planeta, os marcianos podiam ir seguros de que este último compositor era um dos grandes. Falhavam certamente alguns, mas acertavam em muitos.
De igual forma, se os marcianos aterrassem na Praça do Comércio e procurassem saber quem são os grandes cientistas portugueses, talvez começassem por ir a algumas bases de dados de publicações científicas: o ISI, o PubMed, ou o MathSciNet. Escolheriam uma base internacional — também não seria perguntando a alemães que se convenceriam da qualidade de Beethoven — e veriam quais os artigos científicos que tiveram mais repercussão. Veriam o número de vezes que os artigos são citados, pois essa é a medida mais simples da influência a prazo de um artigo.
Soube-se esta semana qual é o artigo mais citado internacionalmente em que um português é co-autor. Esse artigo ultrapassou as 5600 citações, o que é absolutamente extraordinário.
Os marcianos talvez falhassem alguns dos grandes cientistas portugueses, mas não lhes escaparia Carlos Fiolhais.
«Passeio Aleatório» - «Expresso» de 12 de Agosto de 2008
Nota (CMR): no decorrer da habitual tarefa de desencantar uma imagem para ilustrar esta crónica, achei que, em vez de um boneco de um ET ou da fotografia do Carlos Fiolhais, ficava melhor a capa deste livro, que foi o primeiro que li dele. Não é por acaso que o Fiolhais é um dos muitos autores convidados do Sorumbático, e que o seu blogue , o DE RERUM NATURA, está nos meus favoritos há muito tempo.

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18.8.08

Manual do ladrão inteligente

Por Pedro Barroso
Subsídios para a minimização do erro em assaltantes distraídos
OBS. - Alguém considerará estes conselhos desajustados e politicamente incorrectos por constituírem uma descarada ajuda a assaltantes disléxicos e desastrados. Pois. Mas diariamente somos roubados no peso dos congelados, nas comissões do Banco, no restaurante, nos cálculos para a reforma, nos direitos ao lazer e ao bem estar, no acesso à Justiça e à Saúde, na taxa de esgotos, no combustível, no alcatrão das empreitadas públicas e na Arte e Cultura que nos sonegam. Assim que me lembre, de repente.
Somos, portanto, reféns de uma sociedade que nos castra e manipula e rouba ao seu próprio jeito. Resta-nos um Agosto repleto em toda a parte, como estímulo de viver. Coisa pouca, para quem aspire a vida que se preze. Por tudo isso, e como me falta a má formação para assaltar seja quem for, aqui deixo o meu modesto contributo para todos os aprendizes de gatuno, ao jeito levezinho da silly season em que nos deixam fingir que somos prósperos e felizes.
Posto isto, afivelem um sorriso estival e leiam estes dez conselhos para gatunos desatentos. Depois desta leitura, espera-se uma margem de sucesso acrescida.
*
1 . Deve antes de tudo o ladrão previdente estudar bem o espaço e o ramo de negócio a assaltar. Não interessa por aí além assaltar, por exemplo, lugares de hortaliça, sedes de partidos políticos ou estações de alta tensão da EDP. Evitar residências de operários em empresas em crise, desempregados de longa duração, empresários em falência ou residências de funcionários públicos.
2. Estudar bem previamente a envolvência social e geográfica. Evitar assaltar dentro do Ministério das Finanças, gabinetes de dentistas ou advogados, pois são profissionais sempre muito mais experimentados e sabedores do que qualquer assaltante, contra os quais não há armas nem argumentos. Evitar também assaltar a sede dos GOE ou quartéis da GNR. Há também quem tenha tentado assaltar esquadras de Policia e se tenha dado mal, sem resultados práticos famosos.
3. Em caso de engano por distracção sair rapidamente para não despertar alarme. Alguns profissionais menos atentos têm assaltado fornos de padaria e de siderurgias, tendo dado azo a episódios de trágicas consequências. Aconselha-se uma revisão aos olhos e uma consulta a um bom oculista para não trocar um Banco com uma pastelaria só porque ambos se chamam “popular”, por exemplo.
4. Se a encomenda é, por exemplo, de jóias, convém assaltar uma ourivesaria e não um supermercado; se o objectivo são lagostas, não assaltar ourivesarias nem escolas pré-primárias, onde raramente se encontra marisco em boas condições. Se o objectivo é ouro ou prata, são desaconselhados os esforços para arrombar o cofre de um restaurante ou de uma sapataria. Assim sucessivamente.
5. Em caso de estarem rodeados por forças de segurança, não pedir Ferraris na negociação para a fuga, pois as forças policiais não os possuem, e quem os possui normalmente não os empresta para esse fim. Contentem-se em aceitar o carrinho que vos derem e certifiquem-se de que foi fornecido com volante, bancos e rodas. Não espreitar pela porta para perguntar as horas em caso algum, pois há atiradores que podem não ter consigo relógio e aproveitar o pretexto para um desenlace fatal.
6. Evitar excessos de vaidade e publicidade como, por exemplo, deixar cartões-de-visita, números de telemóvel ou assinaturas tipo “sou o Zé das Monas e estive aqui no dia tal as tantas horas, para qualquer serviço no género faço descontos para grandes quantidades e preços módicos para reformados carentes”. Gabar-se na cervejaria de que acabou de assaltar o Banco da esquina também se revela normalmente prejudicial.
7. Usar disfarces fiáveis e nunca poupar na cola dos bigodes e barbas postiços por motivos óbvios. Usar caraças de Carnaval em Agosto também pode conduzir a suspeitas prematuras sobre as intenções de alguém que acaba de entrar na sede da CGD.
8. Nunca perguntar ao segurança a que horas é que há menos clientes e a coisa está mais sossegada, nem onde é possível aparcar um carro discretamente o mais perto possível e que possa ficar a funcionar.
9. Recentes acontecimentos revelam que, afinal, nem todas as dependências bancárias têm fundos significativos para que valha a pena assaltá-las. Convém saber, portanto, se se trata de uma agência de câmbios especializada em dracmas da Samoa, dinares do Nepal, dólares do Mali ou swi-zxjy da Coreia do Norte. A troca de moedas estranhas revela-se sempre com grandes prejuízos para o cliente que, de boa fé, julga sempre valerem muito mais e afinal, fica invariavelmente prejudicado no câmbio. Agências para aconselhamento e simulação de crédito também raramente têm numerário efectivo. Convém saber.
10. Fazer a revisão ao carro que vai servir no assalto revela-se essencial. Muitos assaltos ficam comprometidos por uma simples limpeza de velas ou afinação de platinados que não se fez. O primo sem carta, portador de dezoito dioptrias e com espasmos nervosos também nunca será o condutor ideal para uma situação de emergência.
*
Seguindo este simples conselhos temos a certeza que a margem de sucesso ficará acrescida.
Atentamente.
(Assinatura ilegível)
Nota (CMR): na imagem vê-se o cadastrado Chico Pi-Olhos, personagem de «Jeremias e o Incrível Coronel Reboredo», que pode ser lido [aqui] ou [aqui].

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O Café Arcada

Por A. M. Galopim de Carvalho

COM UM VASTÍSSIMO ESPAÇO, aberto sob as arcadas da Praça do Geraldo, o café cujo nome nelas se inspirou, nasceu para o público eborense da classe média, nos anos 40 do século passado. Com linhas muito modernas, um sem número de mesas, muitos criados e música ao vivo nas tardes de Domingo, assegurada por uma pequena orquestra, ao estilo de café-concerto, enchia-se até à porta, onde ficavam muitos dos que esperavam uma possibilidade para entrar. Por oito tostões (0,04 euros), nas ditas tardes de Domingo, mandava vir um “garoto” e, na companhia do meu irmão Mário e de mais três ou quatro amigos, à roda de uma mesa redonda, ouvíamos as músicas mais em voga, jogávamos à batalha naval e conversávamos. Só nessas tardes musicais era aceite, sem reparos, a presença das senhoras e das filhas adolescentes, desde que acompanhadas dos respectivos maridos e pais. No resto do tempo, o “Arcada” era espaço dos homens. De manhã dava assento e convívio a uns tantos reformados e a alguns ociosos com gente a trabalhar por sua conta. Depois do almoço, tomava-se ali a bica na companhia dos amigos, fazendo tempo de voltar ao emprego e, depois do jantar, enchia-se com todos aqueles que quisessem conviver fora de casa, sempre muitos nesse tempo, enquanto as mulheres ficavam a lavar a loiça, a costurar e a cuidar dos filhos.
Às terças-feiras, o grande café, transformado em bolsa de valores e em câmara de comércio, fervilhava de homens ligados à lavoura. Neste formigueiro de gente, entre produtores, compradores e intermediários, transaccionava-se toda a cortiça de um montado, a azeitona de um olival ou uma vara de porcos, alugava-se uma debulhadora ou uma porção de hectares de terra para fazer uma seara de pão. Também por ali andava um ou outro agiota, cuja presença era providencial no fecho de muitas transacções. Combinavam-se preços, datas e taxas de juros e os negócios eram fechados, sem papéis, com apertos de mão. Na grande maioria, estes homens conviviam bem com o regime político de então mas, entre eles, havia um muito pequeno número de donos de terras, cuja ideologia social e política apontava noutras direcções, e isso fazia com que, também no meio desta pequena multidão, andassem por ali, vendo e ouvindo, alguns informadores da Pide.
NOTA: esta e outras crónicas do mesmo autor estão no seu blogue Sopas de Pedra.

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