31.12.13
30.12.13
29.12.13
Luz - Docas de Barcelona
Fotografias de António Barreto- APPh
Clicar na imagem para a ampliar
Acostagem de um barco no porto de recreio. (2012).
Etiquetas: AMB
9115 palavras que falam de pedras e do que com elas se relaciona
Por a. M. Galopim de Carvalho
QUANDO eu era aluno da licenciatura em Ciências Geológicas, em finais da década de 1950, já se fazia sentir a falta de um Dicionário de Geologia, no seu sentido mais abrangente, isto é, que incluísse as diversas disciplinas que a integram. Era um tempo em que a globalização da ciência não tinha o desenvolvimento dos dias de hoje. Um tempo em que o francês dominava as relações académicas, os compêndios e os manuais de estudo. Nesse período áureo da penetração da inteligência gaulesa na nossa vida cultural e científica, em particular, no ensino superior e na investigação, a maioria dos estágios dos nossos assistentes e jovens investigadores tinha lugar em França. As nossas comunicações e artigos científicos, na maioria, para consumo interno, eram quase todos escritos em português e os poucos que faziam excepção a esta regra usavam, quase exclusivamente o francês, para nós, a segunda língua. (...)
Texto integral [aqui]
Etiquetas: GC
27.12.13
26.12.13
«Dito & Feito»
Por José António Lima
Rui Rio geriu durante 12 anos a Câmara do Porto. Impôs rigor nas contas
do município, contrariou o despesismo e o endividamento reinantes em
muitas autarquias (contrastando com o exemplo da vizinha e
superendividada Gaia), fez finca-pé na separação de campos da política
com outros poderes como o do FC Porto, enfrentou alguns lóbis e
incompreensões dos meios artísticos, conviveu sempre mal com a liberdade
crítica da comunicação social que lhe era desafecta, foi conquistando
influência e mais votantes de eleição para eleição.
Mas, ao longo
desses 12 anos, Rio raramente ultrapassou a sua condição regional e
pouco revelou sobre um pensamento político mais amplo e estruturado: não
ficaram na memória ideias ou intervenções suas sobre a crise da dívida,
a dimensão do Estado social, a baixa produtividade da nossa economia, a
sustentabilidade das pensões ou o federalismo na UE.
Essa
indefinição, essa espécie de folha em branco programática, talvez tenha
contribuído para Rio ter sido, agora, colocado na sebastiânica lista de
promessas políticas com grande futuro. O curioso é que Rui Rio decidiu
dar corda a esse sebastianismo e tem-se desdobrado em colóquios,
conferências e monólogos em locais tão improváveis e politicamente tão
surpreendentes como a Casa-Museu do pai de Mário Soares ou a Associação
25 de Abril.
E o que foi propor Rio a tão sugestivas audiências?
Coisas tão populistas, demagógicas e inquietantes como cavalgar a onda
de desancar nos partidos que “não põem cá fora o que a sociedade
precisa”, apoucar os “políticos de hoje” que são de “qualidade
inferior”, denegrir o “sector da Justiça que causa aflição” ou agitar o
papão de “uma ditadura sem rosto ao virar da esquina”. Para obstar a
tamanha degradação, Rio sugere receitas tão básicas e perigosas como as
de “a abstenção eleger cadeiras vazias no Parlamento” ou “o voto
obrigatório”. Tudo o mais no seu périplo conferencista são tiradas
politicamente balofas dirigidas aos desencantados com os partidos.
Parece
que Rui Rio, apesar desta vacuidade populista, tem ambições de chegar
alto no partido e na política nacional. Porque não? Não chegou, também,
Luís Filipe Menezes a líder do PSD? Tudo é possível.
«SOL» de 20 Dez 13 Etiquetas: autor convidado, JAL
Apontamentos de Lisboa
Rossio e Praça da Figueira - Natal de 2013
Na minha ingenuidade,
eu ainda acho que alguns locais (especialmente os mais
emblemáticos - como praças, monumentos, etc.) deviam ser objecto
de cuidados elementares, estando ao abrigo de certas intervenções (nomeadamente as comerciais e as dos "engraçadistas").
(Note-se que estas fotos foram tiradas a partir dos enfiamentos pelos quais as estátuas são melhor observadas).
Ateu, graças a Deus
Por C. Barroco Esperança
Há quem por graciosidade ou provocação goste de dizer aos que
elegem a consciência como única fonte de valores, que são «ateus, graças
a Deus».
E não é que têm razão? Deus é uma explicação por defeito para todas as dúvidas, uma boia para todos os naufrágios, um arrimo para todos os medos – especialmente, para a mãe de todos os medos –, o medo da morte.
Não fora a invenção desse ser imaginário, à semelhança dos homens que o criaram, não haveria necessidade do contraditório. Não há antítese sem tese, nem síntese sem ambas. (...)
Texto integral [aqui]E não é que têm razão? Deus é uma explicação por defeito para todas as dúvidas, uma boia para todos os naufrágios, um arrimo para todos os medos – especialmente, para a mãe de todos os medos –, o medo da morte.
Não fora a invenção desse ser imaginário, à semelhança dos homens que o criaram, não haveria necessidade do contraditório. Não há antítese sem tese, nem síntese sem ambas. (...)
Etiquetas: CBE
25.12.13
24.12.13
Uma Noite Silenciosa
Por Maria Filomena Mónica
A INTUIÇÃO vale muito, mas a Ciência
vale mais. Desde há anos que suspeitava sofrer de hiperastesia (sensibilidade
anormal ao barulho), mas não tinha provas. Agora, possuo-as. A fim de verificar
quando tinham lugar os arrasadores «picos» da minha tensão arterial sistólica,
o médico obrigou-me a estar ligada a uma máquina que a mede ao longo de 24
horas. Acabo de receber os resultados: está tudo bem até ao momento em que entro
num Centro Comercial.
Sempre me defendi do barulho: na
Universidade, depois de me ter refugiado num corredor húmido do antigo Convento
das Trinas (hoje ISEG), mandei colocar fibra de lã nas paredes do meu gabinete
da Rua Miguel Lupi, com o intuito de me defender das conversas dos colegas que
ocupavam os escritórios vizinhos. Só me sentia bem em bibliotecas, fosse ela a
Nacional, em Lisboa, ou a Bodleian, em Oxford. Quando os
meus filhos saíram de casa, optei por vir trabalhar para uma cave onde não
chega o rumor do mundo. Não desejo a paz do sepulcro, mas tão só a oportunidade
para me ouvir pensar. O silêncio é-me tão essencial quanto o oxigénio que
respiro.
Para quem pensa como eu, chegou
a pior época do ano. A estes, lembro que a arte é um antídoto espiritual ao
materialismo do Natal moderno. Foi por saber isto que ressuscitei as
reproduções que possuo de algumas telas de V. Hammershoi, um pintor dinamarquês
praticamente desconhecido em
Portugal. Vi a sua pintura, pela primeira vez, na Tate Modern.
Estava eu junto a uma sala de onde saíam ruídos de uma qualquer «obra-prima»
contemporânea, quando, na secção «Natureza Morta, Objectos e Vida Real», me
deparei com um quadro diferente. Em «Interior, Luz do Sol no Soalho» (1906), raios
do sol poente penetram por uma janela, ao lado de uma porta fechada. Apesar de
o pintor ser nórdico, nada há ali de gélido. Pelo contrário: a luz doce,
reflectindo-se no soalho, consola. É um daqueles momentos de harmonia que, uma
vez por outra, os deuses nos oferecem ao fim da tarde.
No passado mês de Outubro,
quando fui a Paris, voltei a encontrar um dos seus quadros no Museu d´Orsay. Em 0 Repouso (1905), vemos uma mulher de costas, sentada a uma mesa
onde, sobre uma toalha grossa, está uma taça branca. Lembrei-me de outro
quadro, presente numa exposição organizada, em 2008, pela Royal Academy de Londres, no qual a mesma mulher, ainda e sempre de
costas, está a tocar música (Interior com
uma Mulher num Piano, 1901). A figura é Ida, sua mulher e sua musa. Mas não
é ela que me atrai, mas a paz que à sua volta se respira.
As telas de Hammershoi constituem
o oposto do Natal moderno, rodeado de barulho, de objectos e de sentimentos
desencontrados. Apesar de, em menina, ir à Missa do Galo numa capelinha em S. Pedro de Alcântara, onde
ouvia o Adeste Fideles (supostamente composto pelo nosso rei D. João
IV), não permaneci uma adepta. A canção natalícia de que mais gosto é a
austríaca Stille Nacht. A todos, um
Natal silencioso, é o que desejo.
«Expresso» de 21 Dez 13Etiquetas: FM
23.12.13
Contributos para o debate sobre a calçada portuguesa (4)
Lisboa - Zona do Largo da Mouraria
Na realidade, não há nada a objectar em relação às 3 primeiras fotos - a utilização da calçada portuguesa como faixa de rodagem é, ali, autorizada, e manda quem pode...
O reparo está apenas na imagem de baixo: quando, como é inevitável, o empedrado é danificado, entram em cena os esforçados profissionais do "é igual ao litro"...
22.12.13
Contributos para o debate sobre a calçada portuguesa (3)
Av. de Roma, frente ao n.º 10
Uma vez levantada a calçada, por um motivo qualquer, a reposição das pedras da imagem do Pato Donald foi feita como se vê. É a calçada portuguesa entregue à malta do "é igual ao litro"...
NOTA: repare-se nas pedras especialmente trabalhadas que formam o laço, o rabo e os botões do pato. Tudo indica que tenha havido um molde próprio para a figura - o mesmo sucedendo, aliás, no caso das outras duas ("marcas registadas").
NOTA: repare-se nas pedras especialmente trabalhadas que formam o laço, o rabo e os botões do pato. Tudo indica que tenha havido um molde próprio para a figura - o mesmo sucedendo, aliás, no caso das outras duas ("marcas registadas").
Roby Amorim
Uma das minhas canções é La Mer, Charles Trenet canta-a no feminino, como é em francês, e eu sempre a ouvi sem estranhar o género. Alguém me disse que o mar, enquanto foi calmo e doce como o Mediterrâneo, era assim, mulher, mas quando se transformou connosco mar-oceano, brutal e viril, mudou de género - "o mar" como dizem os Albuquerques. Acontece às palavras ao saltar das fronteiras e, até, ao passar do tempo. Disse-me alguém: "Fim" em francês é feminino, "la fin", e por cá também já o foi. No túmulo de Pedro I e Inês, escreve-se na pedra: "Até a fim do mundo." Em aldeias do Minho, às ruazinhas estreitas chamava-se cangostas, de angusta, estreito. Mas de que me serve sabê-lo quando os becos já não se chamam assim?, perguntei a alguém. Encolheu os ombros, talvez seja quase inútil, mas terei eu reparado que angusta também deu angústia, a do aperto no coração, a do nó na garganta, a da estreiteza algures em nós?... Esse alguém, Roby Amorim, começou a ser jornalista no ano em que nasci, conheci-o quando ele publicou um livrinho: Elucidário de Conhecimentos quase Inúteis. Era sobre a sua ferramenta, a palavra. Falei com ele uma só vez, como deve ser com os jornalistas, que são para uso breve. Roby Amorim tinha cara de poucas palavras porque estava ocupado com elas: "É fascinante saber porque se designa um certo animal por cão, uma peça de mobiliário por cadeira..." São fascinantes os homens apaixonados, digo eu. Morreu ontem.
«DN»de 22 Dez 13Etiquetas: autor convidado, F.F
Luz - Local de embarque no porto de recreio de Barcelona
Fotografias de António Barreto- APPh
Clicar na imagem para a ampliar
É um ponto de encontro entre o velho e o novo. Atrás das árvores, começa a grande “Rambla”. À direita, iniciam-se as docas restauradas dos Olímpicos. (2012).
Etiquetas: AMB
Pedras bulideiras
Por A. M. Galopim de Carvalho
PEDRAS bulideiras ou baloiçantes são expressões usadas em diversos lugares do país para designar grande penedos ou fragas de granito, mais ou menos arredondados, com uma base mínima assente sobre um afloramento rochoso da mesma natureza, o que lhes permite balouçar ou oscilar. Há ainda quem lhes chame pedras cavaleiras ou pedras encavaladas.(...)
Texto integral [aqui] Etiquetas: GC
21.12.13
13 a 0, o resultado sem dó
Por Ferreira Fernandes
Albert Einstein, como tão bem sabem, escreveu "Folgerungen aus den Kapillarität Erscheinungen". Quando a prestigiada revista científica Annalen der Physik publicou o artigo, em 1901, os jornais portugueses no dia seguinte devem ter sido enfadonhos. A mecânica dos fluidos, para aqui, a tensão de superfície, para ali, o princípio de Bernoulli e as equações de Navier-Stokes devem ter enchido as gazetas... Não li, mas suponho porque ontem li e ouvi os nossos comentadores. Desta vez é sobre constitucionalismo, como há cento e tal anos era sobre os fenómenos de capilaridade de Einstein - continuamos todos a saber tudo. Somos, para tudo, o que o Luís Freitas Lobo é para o futebol - refinadíssimos especialistas. Isso é bom, com um porém: às vezes, aparece um William de Carvalho e não damos por ele.
Ontem, no meio da multidão do constitucionalismo, ninguém fez uma conta simples: 13 a 0. Era o essencial do assunto.
O Tribunal Constitucional tem de subordinar as leis à Constituição. O TC são dez juízes escolhidos pelos partidos e três pelos próprios juízes - se as votações são renhidas pode suspeitar-se de que o partidarismo teve alguma influência. Mas se a votação for unânime, uma coisa é certa: quem fez a lei é um nabo incapaz de prever o óbvio. Como um chumbo atrasa e prejudica o País, esse governante que nem sabe ver uma obviedade deve ser apontado.
O 13 a 0 era para ser dito e passar a outro assunto, 13 a 0 é um resultado sem dó.
«DN» de 21 Dez 13Etiquetas: autor convidado, F.F
Lisboa, Reino do Absurdo
Av. da Igreja
Rua L. Augusto Palmeirim
Rua Frei Amador Arrais
As fotos mostram 5 carros estacionados numa estranha "2ª fila" ("estranha", pois nem sequer há, ali, 1ª fila). Apesar do espaço disponível para um estacionamento correcto (e, em certos casos, gratuito!), esta gente prefere estorvar meio-mundo, amiúde provocando engarrafamentos monstruosos numa das principais entradas de Lisboa (para quem vem do Norte) sem que nada lhes aconteça...
«Dito & Feito»
Por José António Lima
No momento em que se celebra a grandeza da figura política de Nelson
Mandela, a esquerda portuguesa não resistiu à tentação de utilizar
demagogicamente a morte do líder sul-africano como arma de arremesso em
mesquinhos ajustes de contas caseiros.
No Parlamento, o PCP, pela voz
de António Filipe, apareceu a acusar Cavaco Silva de ter votado na ONU,
em 1987 (quando era primeiro-ministro), contra uma resolução que exigia
ao regime do apartheid a libertação incondicional de Mandela. Helena
Pinto, do Bloco, apressou-se a acrescentar que “em 1987 Portugal estava
do lado errado”. E foi quanto bastou para o tema alastrar em indignadas
proclamações nas redes sociais e nalgumas rádios e televisões.
Acontece
que, nessa ocasião, Portugal votou a favor uma resolução da ONU pela
“eliminação do apartheid” e que pedia “a libertação imediata e
incondicional de Nelson Mandela e de todos os outros presos políticos”.
Apenas votou contra um outro documento que incitava à violência para
derrubar o regime sul-africano. Recorde-se que, nessa altura, em 1987,
as ex-colónias portuguesas vizinhas da África do Sul, Angola e
Moçambique, estavam mergulhadas em violentas e intermináveis guerras
civis.
Mandela conseguiu, também, essa proeza em que quase ninguém
acreditava: substituir o mais odiado regime colonialista de segregação
racial, o do apartheid, por uma democracia e em paz - sem mergulhar a
África do Sul num banho de sangue, sem provocar a debandada em massa dos
brancos como acontecera em todas as ex-colónias africanas, sem
desencadear incontroláveis confrontos tribais e partidários pelo poder.
Mandela
foi um exemplo único de luta pela liberdade, pela reconciliação, pela
dignidade humana e pela convivência multirracial. Tornou-se o mais
inspirador dos líderes da política contemporânea. Era, por isso, a
figura mais admirada em todo o mundo, da América à China, da África ao
Japão - por todas as raças, todas as religiões e todos os regimes. “Um
gigante da História”, na feliz definição de Obama. Em Portugal, a
esquerda do PCP e do Bloco quis reduzir essa dimensão de Mandela à
pequenez das baixas querelas partidárias. Sem pudor. E sem sucesso.
«SOL» de 13 Dez 13 Etiquetas: autor convidado, JAL
20.12.13
Plano B: Governo vai fazer de advogadas!
Por Ferreira Fernandes
Neste Governo, minirremodelação é pleonasmo. Ninguém espera que saia grande coisa de um buraquito. Mas anunciada uma mini junto ao chumbo do Tribunal Constitucional parece termos um grande problema. Calma: há um plano B! Embora este seja outro pleonasmo: com este Governo, o plano é sempre B, deve saltar-se o A. Nos Conselhos de Ministros, quando um ministro diz "chefe, tenho uma ideia!", Passos Coelho devia dizer: "Deixa cair essa, diz-me lá a seguinte." É o nosso sonho era ter um Governo q.b., de medida certa, mas calhou-nos um Governo Pb, símbolo de plumbum, chumbo. O chumbo é um metal tóxico, pesado e maleável. Confere. E mau condutor de eletricidade (olha, vender a EDP deve ter sido a sua única medida certa...) Enfim, este é um Governo chumbado a zagalote do TC, mas, felizmente, há um plano B: fazer um vídeo. O enredo já meio Portugal conhece, há só que mudar as personagens. Aparece uma ministra que tenhamos loura, de passada firme pelos passeios de Lisboa, enquanto se ouve uma voz ao fundo: "Maria Luís Albuquerque e Associados é hoje uma boutique vocacionada para a recuperação de impostos." Entretanto, vão aparecendo um a um os morenos do seu escritório. Passos Coelho no Terreiro do Paço, de cabelos esvoaçantes (há que fazer, rápido, o vídeo...), Paulo Portas a entrar para um táxi, Aguiar-Branco numa arcada... No fim, todos os morenos à volta da loura. E a voz-off: "Os resultados obtidos falam por nós." Oh quanto!
«DN» de 20 Dez 13 Etiquetas: autor convidado, F.F
19.12.13
“A Identidade Cultural Europeia”, Vasco Graça Moura
Por António Barreto
TENHO um grande prazer e muita
honra em apresentar o livro de Vasco Graça Moura. É um grande pequeno livro, de
enorme oportunidade, de indiscutível interesse e de uma evidente erudição.
Sublinho este último aspecto: numa altura em que as frases feitas, os
lugares-comuns e os clichés têm cada vez mais saída, é reconfortante ver as
virtudes da erudição, sentir que uma cultura sólida nos pode ajudar a
compreender o mundo em que vivemos e que se nos apresenta, de modo crescente,
como um mundo confuso, complexo e incerto. Para já não dizer inseguro. É um
pequeno livro sobre um tema difícil e complexo, mas um livro claro, que nos
satisfaz um prazer em perigo de extinção: o prazer de saber, de conhecer, de
perceber. (...)
Texto integral [aqui]
Etiquetas: AMB
Dois lados, pelo menos, dois lados
Por Ferreira Fernandes
Não é mais do que uma guerra do alecrim e manjerona, trava-se entre dois países amigos, EUA e Índia. Mas já chegámos ao ponto de a Índia retirar as barreiras de betão que protegem a embaixada americana em Nova Deli... Causa do conflito: uma criada. Na semana passada, Devyani Khobragade, vice-cônsul indiana em Nova Iorque, foi presa pela polícia. Meteram-na numa cela com outras detidas e foi revistada na modalidade strip-search, que inclui apalpar cavidades. A vice-cônsul era acusada de ter apresentado dados falsos para o visto de trabalho da sua empregada doméstica, que trouxe da Índia, e de lhe pagar um terço (2,5 euros à hora) do que é o mínimo em Nova Iorque. Para ser libertada, ela teve de pagar caução de 190 mil euros e vai a tribunal. O escândalo focou-se na violação da imunidade diplomática (há controvérsia legítima sobre isso) e na brutalidade policial. As duas razões levaram o Governo indiano a retaliar como já vimos (além de deixar de permitir que a embaixada americana importe whisky). Esse o lado, digamos, de salão da questão. O outro é a condição humilhante com que algum pessoal doméstico de diplomatas é tratado.
Na peça Guerras do Alecrim e Manjerona - e já no século XVIII -, o nosso António José da Silva, se falava dos conflitos dos de cima, não deixou de se ocupar dos amores de Semicúpio e Sevadilha, simples criados. A vida é multifacetada, como os espelhos das embaixadas mostram.
«DN» de 19 Dez 13 Etiquetas: autor convidado, F.F
A mulher, a eterna ameaça e vítima ancestral
Por C. Barroco Esperança
Há dias publiquei esta foto de Annette Kellerman (1886/1975) a promover o Direito das mulheres ao uso do maiô, em 1907. Era um fato de banho que apenas deixava o pescoço e os braços à mostra. Valeu-lhe a prisão.
A nadadora australiana, atriz e escritora, foi presa por atentado ao pudor. Não podia ser o que descobria a causa de tão cruel punição, era o medo da emancipação, da igualdade de género que, durante milénios, justificou a violência das instituições contra a mulher, como se a humanidade pudesse existir sem ela, como se cada um de nós pudesse nascer, sem ser asfixiado, de pernas atadas, como os homens a queriam. (...)
Texto integral [aqui]
18.12.13
O (ex) tiro de Draghi
Por Antunes Ferreira
Debaixo dos pés
levantam-se os trabalhos. O acerto deste ditado é total no que respeita
ao tema dum programa (chame-se-lhe o que se quiser, desde cautelar até
segundo resgate) que não se vê bem onde e quando parará. O (des)Governo
começara a embandeirar em arco e, de repente descobriu que metera água –
e de que maneira.
Não
adianta tecer mais comentários sobre o que foi o tiro de Mario Draghi
ao declarar em Bruxelas que o nosso país vai precisar de mais um
programa quando o actual programa de resgate terminar, de tal forma ele
atingiu o porta-aviões de São Bento, os submarinos de Portas, a nau
Catrineta do Imóvel de Belém que os vai levar a naufragar, para não
dizer mesmo, a ir ao fundo. (...)
Texto integral [aqui]Etiquetas: AF
Quem está por trás de Cristiano Ronaldo
Por Ferreira Fernandes
Se calhar, Cristiano Ronaldo é mesmo de natural boa índole - e o facto é que não foge aos impostos como o seu adversário maior. Mas, nisto de ser e parecer, vale sempre a pena ter um bom assessor de imagem. Já repararam no percurso sem falha que ele tem feito este ano? Quando Mourinho saiu do clube comum, foi deselegante com Cristiano Ronaldo e, querendo dizer que falava do brasileiro Ronaldo, o Fenómeno, especificou: "Ronaldo, o verdadeiro." O português não deu bola à polémica. Depois, sobre a Bola de Ouro que este ano, para ele, é uma questão de vida ou de morte, Cristiano Ronaldo teve as palavras certas: não é uma questão de vida ou de morte. Se sim, muito contente, se não, paciência: "Ficar contente ou triste é a lei da vida."
A qualidade da atitude deste Cristiano Ronaldo está nas pequenas frases que tem, certas. Entre o Quim Berto que diz "o Quim Berto acha" e o Valdano que escreve como um bom romancista, Cristiano Ronaldo encontrou o lugar certo: fala como Zidane recebia a bola. Depois foi o discurso na homenagem ao seu "pai no futebol", Alex Ferguson. Tudo certo e comovente. Agora, foi a carta ao tribunal que julga o fã que saltou para o relvado em Miami e, sendo estrangeiro, arrisca a expulsão...
Não sejamos ingénuos, nos casos raros em que distribui o génio, o destino só dá um por pessoa. Então? Se Passos ou Seguro descobrem quem aconselha Cristiano Ronaldo ainda nos arriscamos a vê-los interessantes.
«DN» de 18 Dez 13 Etiquetas: autor convidado, F.F
Contributos para o debate sobre a calçada portuguesa (2)
Uma vez retirados os equipamentos
(cartazes, anúncios, mupis, semáforos, caixas dos CTT, quiosques, postes
de sinalização, etc.), os respectivos suportes são, frequentemente,
simplesmente cortados rente ao chão (em vez de desmontados, com a subsequente reposição das pedras da calçada).
As imagens que aqui se vêem foram obtidas na mesma avenida, sendo apenas uma pequena amostra do que nela se pode ver... e, já agora, tropeçar...).
As imagens que aqui se vêem foram obtidas na mesma avenida, sendo apenas uma pequena amostra do que nela se pode ver... e, já agora, tropeçar...).
O PS não está cá
Por Baptista-Bastos
Os
dois principais membros do Governo (a saber, para quem ignore: Passos e
Portas) têm andado numa maratona de encontros, reuniões, declarações,
que fazem pensar, feita a soma, de nada terem a dizer às pessoas. Um
velho realejo de música encardida, ressurgida com as banalidades do
costume. Aos jotas da sua tribo, Portas presenteou-os com um contador do
tempo, que vai encolhendo os dias à medida que se aproxima o fim da
presença da troika em Portugal. A empresários do Norte, num discurso
emperrado por supressões contínuas da preposição, e pejado de adjectivos
cujo sainete e clareza são desconhecidos, Passos Coelho afirmou,
inconvicto e lúgubre como agora anda, que o Governo está atento. Não
disse a quê nem a quem. A António José Seguro não é, porque este
desapareceu completamente, sem brio nem timbre, deixando-o a ele, Passos
Coelho, tão feliz que já revelou ir recandidatar-se. Sabe que os seus
inimigos estão no interior do PSD, como a intriga larvar que rasteja no
PS é ameaça de morte para Seguro. Assim não vamos lá. Já avisou Soares,
perante o vazio sem alma desta oposição que se diz socialista, é raro
falar em trabalhadores, e suprimiu dos seus comícios o punho esquerdo
cerrado.
De vez em quando aparece um atrevido expondo, timidamente, o
velho símbolo de uma esquerda que se desfaz. Já se sabe o que deseja
este PSD: deixar-nos de mão mais estendida do que até agora, esmoleres
de uma ideologia feroz e sem detença. Mas o PS, o PS de almofadinha e
algodão em rama, que quer este PS? Soares sabe muito bem o que está em
causa, e que a debilidade do PS corresponde a uma perda de identidade
que arrastará consigo uma mais funda resignação nacional. Esperam-nos
grandes desesperos e liças terríveis. A inquietação de quem "veio da
luta", de quem provém de antigos combates foi salientada, igualmente,
por Jerónimo de Sousa, no final da reunião do Comité Central do PCP, o
qual aludiu à linguagem intraduzível utilizada pela Direita para induzir
em erro os que crêem não haver "alternativa." Jerónimo de Sousa
expressou a ideia de que as teses defendidas, com insistência de
rataplã, pelos panegiristas deste sistema, têm deixado, atrás de si, um
rasto de fome, de desgraça e de miséria, mas que nada está encerrado.
O
exercício de hipocrisia a que assistimos, tendo como protagonistas os
sorrisos de Portas e a gelada serenidade de Maria Luís Albuquerque, ao
falarem da décima "avaliação" da troika, não convenceu ninguém. E chega a
ser doloroso assistir aos comentários dos habituais "analistas" e
"politólogos" debruçados a escavar palavras que justifiquem os
estipêndios. Uns e outros equivalem-se. E a encruzilhada política em que
nos encontramos constitui uma espécie de charneira entre duas visões do
mundo e um conceito de sociedade de cuja defesa o PS parece ter-se
ausentado.
«DN» de 18 Dez 13 Etiquetas: BB
17.12.13
O nosso oficial de ligação com invasões
Por Ferreira Fernandes
O Governo colocou o ex-diretor nacional da PSP, Paulo Valente Gomes, como oficial de ligação na embaixada em Paris. Paulo Gomes vai tratar de terrorismo, droga e migrações ilegais, no âmbito do projeto de segurança G4 (Portugal, França, Espanha e Marrocos). Numa reunião, em janeiro passado, os ministros das polícias desses países decidiram que haveria oficiais de ligação em três cidades. E só falaram dessas três: a espanhola Algeciras (a do célebre Museu Municipal, com sete salas), a senegalesa Dacar (a dos melhores bubus em pano estampado) e a ganesa Acra (a dos bares, na Avenida Kwame Nkrumah, que chegam a ter cerveja fresca). Destinos de sonho que foram logo cobiçados por quem tinha as melhores cunhas. Tendo sido preenchidos esses lugares tão desejados - foram, não foram?... -, Portugal decidiu mandar também um oficial de ligação para Paris, a dos bidonvilles. Claro que ninguém quis ir e só patrioticamente se encontrou quem aceitasse. Onde está o problema? Não será no profissionalismo de Paulo Gomes, do qual não duvido. Está numa imagem, que eu vi. Em novembro, Paulo Gomes demitira-se de diretor nacional da PSP por, na famigerada manifestação dos polícias, [se] ter deixado as barreiras de segurança serem derrubadas e os polícias subirem a escadaria do Parlamento aos gritos: "Invasão! Invasão!"
Hmmm... Para discutir como se guardam as fronteiras, não seria possível encontrar um oficial de ligação com outra imagem?
«DN» de 17 Dez 13 Etiquetas: autor convidado, F.F
16.12.13
A tragédia dos seis e o drama dos seus
Por Ferreira Fernandes
Sete jovens, numa praia em noite de luar. O mar pode ser encrespado ou chão de onde saltam ondas raras e vigorosas, mas a praia é larga e engana. A onda veio mesmo, levou os sete e só um devolveu com vida. No Meco, seis jovens envolvidos numa tragédia daquelas que não podem ser medidas pelos de fora. As mortes políticas ajudam os correligionários a cerrar fileiras e, aí, a tragédia ganha um sentido. As mortes cometidas por criminosos têm o mérito de nos relembrar a maldade.
As mortes de acidente alertam-nos para os erros cometidos, da velocidade a mais, numa estrada, aos crimes contra a natureza, nos tufões... São todas mortes com sentido, embalam causas, acirram revoltas e até educam. No Meco foram sete jovens numa praia de areal vasto a quem um destino inesperado veio pedir contas. Levou seis, devolveu um, em contas de deuses. Não há lição a tirar, há só que aceitar o balanço. Não há nada a aprender para o futuro, não há como apontar culpados. Então, à tragédia dos seis junta-se o drama dos seus. Nem raiva podem ter. Os seus foram-se sem porquê. Ou porque sim, convencer-se-ão com o peso que arrasta as comissuras dos lábios para baixo e faz encolher os ombros. Esse drama dos amigos e familiares de uma tragédia sem sentido obriga-nos a todos, os de fora, ao silêncio. Eu também remeter-me-ia a ele, não fosse ter lido os nojentos comentários no online do meu jornal. Só passei por cá para dizer que estou envergonhado.
«DN» de 16 Dez 13 Etiquetas: autor convidado, F.F
15.12.13
“E assim, acontece”
Por A. M. Galopim de Carvalho
“E ASSIM, ACONTECE” era a frase com que Carlos Pinto Coelho rematava as emissões do seu magnífico magazine cultural na RTP 2.
“E ASSIM, ACONTECE” era a frase com que Carlos Pinto Coelho rematava as emissões do seu magnífico magazine cultural na RTP 2.
Completam-se hoje, dia 15 de
Dezembro de 2013, três anos sobre o falecimento do saudoso autor e apresentador
do também saudoso ACONTECE, iniciado em 1994 e estupidamente extinto em 2003. O ministro da tutela, Morais Sarmento criticara a quantidade de dinheiro gasto para
produzir o programa, dizendo “ser mais compensador oferecer uma volta ao Mundo
a cada espectador”. Na sequência, o presidente da RTP, Almerindo Marques,
anunciava o fim do programa.
No dia do seu funeral, ainda
sob a comoção do seu súbito e doloroso desaparecimento, escrevi no
«sopasdepedra» e no «sorumbático»: “Acontece
a todos.
Uns hoje, outros amanhã. Sempre assim foi e assim será. Foi agora a tua vez.
Amanhã será a dos que te viram partir. De todos, sem excepção. Dos bons como
tu, que fazem falta à sociedade e que nós desejaríamos ter por cá muito mais
tempo, e dos outros, incluindo os que não prestam, como aqueles que,
estupidamente, te cilindraram na RTP, privando-nos do único e, até hoje, o
melhor programa cultural televisivo em Portugal, e aqueles que, afastada a
rapaziada que sancionou esse atentado à inteligência, não quiseram ou não
souberam ir buscar-te e repor-te no lugar de onde nunca devias ter
saído”...”Vais deixar saborosas saudades em muitos dos teus concidadãos e eu
sou um deles. É um privilégio póstumo de que nem todas as almas se podem gabar.
Mas com a tua, isso acontece”.
Carlos Nuno de
Abreu Pinto Coelho, de seu nome completo, nasceu em Lisboa a 18 de Abril de 1944. Foi um jornalista de muito prestígio, professor de
jornalismo durante dois anos na Escola Superior de Tecnologia do Instituto Politécnico de Tomar, tendo revelado notáveis aptidões para a
fotografia e a literatura.
Viveu em Moçambique desde a idade de um
ano até aos dezoito, em 1963, tendo regressado a Lisboa para cursar Direito,
licenciatura que abandonou a poucas cadeiras de concluir a licenciatura.
A sua carreira de jornalista iniciou-se,
em 1968, como repórter, no Diário de
Notícias, e prosseguiu como um dos fundadores do Jornal Novo, redactor da Agência Noticiosa de Informação (ANI),
correspondente em Portugal da rádio Deutsche
Welle e
redactor da revista Vida Mundial, dirigida pela igualmente saudosa Natália
Correia. Na RTP
foi director-adjunto de informação da direcção, chefe de redacção da Informação/2,
director de programas e director de Cooperação e Relações Internacionais. Na
rádio, deixou obra na TSF, na Rádio Comercial, na Antena 1 e na Teledifusão
de Macau.
Numa carreira de pouco mais de três
décadas, o autor do ACONTECE foi conferencista no Instituto de Altos Estudos Militares, membro do Conselho de Administração da
Europa TV, coordenador dos Encontros de Televisões de Língua Portuguesa,
presidente dos Comités Est-Ouest e Nord-Sud da Université Radiophonique et
Télévisuelle Internationale, representante da RTP nos Comités de Informação e de Programas da União Europeia de Radiodifusão, da União das Rádios e Televisões
Nacionais de África e da Organização das Televisões Iberoamericanas, representante do Ministério
da Cultura na
Reunião de Televisões Ibéricas, júri dos Prémios Emmy de Jornalismo de Investigação e dos
Festivais de Cinema de Troia, Fantasporto, Cinanima e ICAM.
Pela vultuosa e útil obra que realizou,
este nosso amigo foi distinguido como comendador da Ordem
do Infante D. Henrique, oficial da Ordre des Arts et des Lettres do Ministério da Cultura da França, Prémio
Bordalo, na categoria de Televisão, pela Casa da Imprensa, o Grande Prémio Gazeta, do Clube dos Jornalistas e o Prémio Carreira Manuel Pinto de
Azevedo Jr., de O
Primeiro de Janeiro.
Hoje, mais do que nunca, sentimos a sua
falta.
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