30.11.18

E o Telefutebol, hem !?

Por Joaquim Letria
A semana passada diverti-me aqui a falar do compadrio entre políticos, jornais, Rádio e Televisão. Mal sabia eu que o estava a fazer nas vésperas do Dia Mundial da Televisão, um festejo ordenado pelas Nações Unidas.
Sem ir em festas nem correr atrás dos foguetes deixem-me hoje queixar-me da pouca vergonha em que o Futebol transforma a Televisão. Garanto-vos que pouca gente gostará mais do que eu dum bom jogo de futebol. Comecei a ver quando era miúdo e fugia à GNR para dentro dos campos de futebol pelados, naqueles tempos ainda não se gastava milhões a fazer estádios.
E quando não podia ir ou estava longe, colava o ouvido ao rádio e “via” um jogo muito melhor do que aquele que se vislumbrava num campo graças ao entusiasmo e talento dos relatores. Claro que com o advento da televisão passei a ver grandes jogos e outros que me podem interessar na TV. E ainda hoje subscrevo camais de desporto que maioritariamente me trazem jogos interessantes e actualidade desportiva que nos dizem respeito e assim cumprem a sua tarefa e obrigação.
Até aqui, tudo bem. Agora quando busco informação, opiniões, comentários e notícias do que se passa no País e no Mundo e só encontro meia dúzia de fulanos aos berros numa algazarra que tem muito pouco a ver com o futebol, tenham paciência!
A gente leva com antigos futebolistas, dirigentes derrotados, treinadores desempregados, árbitros reformados, deputados de gravata de cor clubística, ex-ministros e uns cavalheiros que se dizem adeptos por alma de quem? E não estão lá só um bocadinho. Estão lá a noite toda, que Deus os proteja.
Percebo que falar de teatro, cinema, bailado, andebol, ginástica rítmica, motociclismo, voleibol, padel, remo ou rugby exige que alguém saiba alguma coisa disso e o público se interesse. Mas levar com as intrigas, os valores das transferências, a vida particular das mulheres não será demais!?  – e também já vamos no Futsal e no Futebol de Praia, enquanto as nossas mulheres vêem galas, concursos, novelas e programas que parecem concursos de cancro entre as TVs e respectivas concorrências.
Os jovens já não vêem TV. Os velhos vêem dramas de fazer chorar as pedras das calçadas. Agora usarmos a TV como um instrumento positivo que nos informe, forme e divirta parece ser muito difícil. Mas podem crer que, com gente capaz, até é muito fácil.
Publicado no Minho Digital

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O ALERTA TEVE A RESPOSTA CERTA

Por A. M. Galopim de Carvalho
Na sequência do alerta que lancei no passado dia 26, o Presidente da Câmara Municipal de Sintra, com base na vistoria conjunta desta Câmara, da Agência Portuguesa do Ambiente IP e da Capitania do Porto de Cascais, acaba de proferir o Despacho nº 65-P/2018. Que reza:
Determino o imediato encerramento da arriba sul da Praia Grande do Rodízio (Sintra) devendo os serviços dotar de imediato as necessárias medidas de execução do presente Despacho.
Paços do Concelho de Sintra, 28 de novembro de 2018
Assina o Presidente, Dr. Basílio Horta

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29.11.18

Agitação social e incertezas

Por C. Barroco Esperança

Ai de quem cala o que sente e pensa, e diz o que julga que os outros gostam, mas pior é deixar-se manietar por constrangimentos sociais, calar-se por medo, deixar de abordar assuntos incómodos ou potencialmente geradores de crispação.
Quem emite opiniões tem o indeclinável dever de estar convencido de que as suas são as melhores, e deve estar disponível para aceitar que as opiniões contrárias podem ser tão razoáveis quanto as suas.
Há verdades que se calam para não desagradar, mentiras que não se contestam para não ofender, preconceitos que se toleram por comodidade. Numa sociedade democrática é a afirmação de todos e de cada um que forma o pensamento coletivo, e mal vai quando os que intervêm no espaço público se coíbem de abordar os temas incómodos. A opinião pública é a síntese dialética da opinião de todos, enquanto a opinião publicada é a que interessa a quem detém os órgãos de comunicação social e a quem os controla.
Tenho pensado muito na agitação social que irrompeu no País e na desfaçatez com que os responsáveis de muitas injustiças tomam a vanguarda na exigência da sua reparação.
Todas as greves admitidas no ordenamento jurídico português são legítimas, mas nem todas são justas e não faltam casos de oportunismo, de estratégias partidárias e de meras invejas profissionais.
Não conheço suficientemente cada sector profissional para fazer a destrinça, mas vejo a manipulação das Ordens a substituírem-se aos sindicatos e o aventureirismo das greves que não são mediadas por forças políticas responsáveis ou as que estas acabam a apoiar, para não perderem o comboio dos votos nas eleições que hão de vir.
Há uma turbulência desproporcionada que parece indiferente aos esforços do Governo quando comparado com a governação anterior, mas o regresso numa versão pior, a que darão origem, parece ser indiferente a muitos ativistas.


Há quem esqueça que o bem-estar relativo de que gozamos se deve à pobreza de outros países e à fome de milhões de pessoas, que a qualificação académica e profissional, que permite maior capacidade reivindicativa a alguns, se deve a escolas que todos pagamos, que a legítima melhoria que cada um pretende se faz com prejuízo de alguém.
Ninguém pensa no dinheiro que o País pede para manter a economia a funcionar e que o Orçamento não é elástico e que os credores avaliam os riscos. Mas será possível atender todas as greves sem arruinar o País?
Lembro-me de uma greve, assaz justa, no Reino Unido. Foi feita com notável coragem e determinação por mineiros cuja profissão era penosa e escassamente remunerada. Foi a perda dessa greve que originou vagas de desemprego, tragédias familiares, pobreza e o encerramento das minas.
A apoteose da insensibilidade social e a vingança teve na Sr.ª Thatcher a protagonista da regressão dos direitos dos trabalhadores de um lado e do outro do Canal da Mancha.
É a vida. E ninguém se recorda.
Ponte Europa / Sorumbático


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28.11.18

TURISMO DE NATUREZA E GEOTURISMO

Por A. M. Galopim de Carvalho
Estive ontem, a convite da organização, no “Congresso, Ciência, Cultura e Turismo Sustentável”, a decorrer na Academia das Ciências de Lisboa e confirmei com satisfação que a Geologia, tão mal tratada que sempre foi no nosso ensino, começa a ter expressão a nível nacional, com destaque para a divulgação promovida pela Agência Nacional para a Cultura Científica e Tecnológica – Ciência Viva, através de alguns dos seus Centros de Ciência e do seu programa Geologia no Verão, e dos Geoparques da UNESCO em Portugal, onde a cultura geológica, a 
Geoconservação e o Geoturismo ganham visibilidade.
O texto que aqui trago hoje é uma adaptação actualizada do que 
publiquei no Jornal “Tempo Livre”, do INATEL, nº 3, Jan-Fev, 2017, sob o título “Turismo de Natureza”.
Mais de mil milhões de turistas percorrem o mundo, fruindo o que cada um deles procura, gerando um potencial económico de valor amplamente reconhecido, nomeadamente, no emprego, no comércio, indústria e serviços que o suportam.
Devido ao clima, à História, à cultura, ao bom acolhimento e à simpatia natural e espontânea do povo português, à gastronomia regional e, ainda, à sua posição geostratégica, Portugal é actualmente um dos destinos turísticos mais procurados. O número de turistas que anualmente recebe nunca foi tão grande.Só no primeiro semestre do ano que passou, bateu todos os recordes, com mais de 8,5 milhões.
Entre as diversas motivações dos que nos visitam, debruço-me, em particular, sobre o Geoturismo (uma parte substancial do Turismo de Natureza menos divulgada) que,por razões ambientais, culturais, pedagógicas e económicas, entendo dever ser devidamente promovido.
No Turismo de Natureza, em assinalável desenvolvimento no nosso país, compete-me, pois, chamar a atenção para a vertente geológica da natureza sempre arredada das preocupações e do conhecimento de quem decide nestas matérias.
O convite oficial ao Turismo de Natureza que, naturalmente, inspira as agências de viagem, não deve ficar-se, pois e apenas, como tem sido a prática entre nós, pela observação da paisagem pela paisagem, sem terem conta o respectivo suporte geológico, ouda elevada diversidade de habitats naturais, com observação de aves e outras espécies. 
Territorialmente pequeno, Portugal tem grande diversidade geológica o que determina uma igualmente grande variedade geomorfológica e elevada diversidade de geossítios e geomonumentos, sendo insignificante o número dos oficialmente reconhecidos e classificados.
Há, pois, que dar relevo condizente com as respectivas importâncias a ocorrências como, entre outras, o Complexo Metamórfico da foz do Douro, o Polje de Mira-Minde (Alcanena), as Pedras Parideiras, na Serra da Freita, as Buracas do Casmilo (Condeixa-a-Nova), o Vale do Lapedo (Leiria), a Conha de São Martinho do Porto, os Monumentos Naturais do Cabo Mondego, das Portas de Ródão e das Pegadas de Dinossáurio da Serra d’Aire e de Sesimbra, as de Vale de Meios (Santarém), ainda por classificar e proteger, o Campo de Lapiás da Granja dos Serrões (Sintra), a Arriba Fóssil da Caparica, a Pedra Furada em Setúbal, a Rota da Conheiras de Vila de Rei, a Livraria do Mondego (Penacova), o Pulo do Lobo, os Passadiços do Paiva, a Ponta da Piedade, em Lagos, a Discordância Angular da Praia do Telheiro (Vila do Bispo) e a grande e belíssima diversidade de geossítios e geomonumentos próprios da natureza vulcânica dos arquipélagos dos Açores e da Madeira.
Criado sob a égide da Comissão Nacional da UNESCO, em 2011, o Fórum Português de Geoparques Mundiaistem apoiado a entrada de Geoparques Nacionais que pretendam integrar a Rede Mundial de Geoparques. São membros deste Fórum, sob a coordenação daComissão Nacional da UNESCO, o Geoparque Naturtejo da Meseta Meridional, o Geoparque Arouca, o Geoparque Açores e o Geoparque Terras de Cavaleiros e outros em projecto.
Tendo por objectivos promover o desenvolvimento de novos Geoparques em Portugal, fornecendo-lhe apoio técnico e científico, coordenando iniciativas conjuntas e avançando com projectos, tendo em vista a valorização do nosso património geológico,o Fórum Português de Geoparques Mundiais da UNESCO, com o apoio de alguns dos colegas da minha e de outras Universidades, é uma importante mais valiana incrementação, não só do Turismo de Natureza, em geral, como também da Geoconservação e do Geoturismo, em particular.
Uma outra mais valia para a Geoconservação e o Geoturismo, com relevância científica e pedagógica, são os Centros de Ciência Viva do Alviela, de Estremoz, do Lousal, dos Açores e da Madeira.

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27.11.18

“TERRA- ROSSA”

Por A. M. Galopim de Carvalho
Sugiro ao leitor que, antes de ler este texto, leia ou releia o post MÁRMORE, de ontem.
Por agora, restrinjo-me ao solo (o chamado solo ferralítico dos pedologistas) e à capa barrenta de intensa cor vermelha que cobre e caracteriza a região de Estremoz- Borba-Vila Viçosa, geologicamente marcada pela presença de mármore calcítico, ou seja, o mármore essencialmente formado pelo mineral calcite (CaCO3, um carbonato de cálcio), como é o da pedreira que ruiu em Borba.
“Terra- rossa” é a expressão italiana aceite internacionalmente para referir um solo característico das regiões de clima mediterrâneo, de intensa cor vermelha, como é o do sul de Portugal. Trata-se de toda uma capa barrenta, incluindo o solo agrícola, composta essencialmente por barro ou argila, neste caso, uma ilite, e sesquióxido de ferro (Fe2O3, o conhecido ocre vermelho).
Toda esta capa é o que fica como resíduo insolúvel, de um inimaginável volume de mármore dissolvido pelas águas pluviais ao longo de um período de tempo que vai muito para lá da história dos homens. Estas águas ao atravessarem a atmosfera, incorporam o dióxido de carbono (CO2) sempre aí presente, adquirindo capacidade de dissolução do carbonato de cálcio da calcite.
É esta acção dissolvente que gera a “terra-rossa” e toda a variedade de aberturas e espaços vazios (algares, grutas, galerias e outros) bem conhecidos dos espeleólogos.
Na origem do calcário que, por metamorfismo, se transformou em mármore, além da sedimentação biogénica e/ou quimiogénicas do carbonato de cálcio, houve sedimentação detrítica de argila (via de regra, um silicato hidratado de alumínio e potássio) e uma contaminação por ferro, que poderá ter continuado nos processos geológicos posteriores, ou seja, a diagénese e o metamorfismo. É este ferro que, ao oxidar-se (o clima na região é suficientemente seco), gera o referido sesquióxido. 
Impregnada por um certo teor de água e sujeita à vibração de uma rodovia pavimentada a cubos (ou paralelepípedos) de granito, como foi o caso da derrocada na pedreira, esta capa barrenta entrou numa espécie de liquefacção e desmoronou, arrastando consigo as pedras e os blocos que envolvia e, tragicamente, o troço de estrada, com as lamentáveis consequências conhecidas.
Comum, não só na região mediterrânea, mas também na África do Sul, Califórnia, Austrália, entre outras, a “terra-rossa” possui boas características de drenagem, sendo considerado um bom solo para a produção de vinho. 
Para compreender melhor o processo que gera a “terra-rossa”, recuemos ao século XVIII.
A descoberta do oxigénio em 1774, pelo clérigo inglês Joseph Priestley (1733-1804), e o seu reconhecimento como o elemento mais abundante da crosta terrestre, associada à evolução da química analítica, na sequência dos trabalhos do francês Antoine Lavoisier (1743-1794) e dos suecos Carl Wilhelm Scheele (1741-1786) e Torbern Bergman (1749-1817) e de outros notáveis químicos da época, conduziram a que a composição química das rochas passasse a ser expressa em óxidos. Tais análises forneciam as percentagens ponderais de, como então se dizia, 
”terra siliciosa” (sílica, SiO2), 
“terra argilosa” (alumina, Al2O3), 
“ocres” (óxidos de ferro ferroso e férrico (FeO e Fe2O3), 
“cal” (CaO), 
“soda” ou “alcali fixo mineral” (Na2O), 
“potassa” ou “alcali fixo vegetal” (K2O), 
“magnésia” (MgO), 
“titânia” (TiO2),
“anidrido fosfórico” (P2O5),
“ar ácido” ou “ácido aéreo” (CO2). 
água (H2O), 
Este modo de caracterizar a composição química das rochas foi decisivo no avanço do seu estudo (a petrologia). Assim, para quem sabe lidar com as cifras resultantes destas análises químicas, face à composição química de um mármore, expressa em % de óxidos,
SiO2 - 3,3
Al2O3 - 0,08
MgO - 16,6 
K2O - 0,01
Fe2O3 - 0,03 
CaO - 38,1 
Deduz imediatamente que há ali sílica (SiO2), alumina (Al2O3) e potassa (KO) a revelarem a presença de argila (ilite), sílica ainda a dizer que também ocorre ali algum quartzo de neoformação, e de sesquióxido de ferro.
.
Nota:
Se o clima fosse mais húmido gerar-se-ia um hidróxido de ferro (FeO(OH)), como a goethite e outros, de cor amarelo-acastanhada o conhecido ocre amarelo. A limonite, que muitos aprenderam no liceu, é essencialmente uma mistura de hidróxidos de ferro e argila.

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25.11.18

Mármore

Por A. M. Galopim de Carvalho
A trágica derrocada na pedreira de Borba trouxe à boca dos portugueses a palavra “mármore”. Será que os nossos decisores políticos, os nossos jornalistas e comentadores de serviço e o cidadão comum sabem o que é o mármore?
Aproveitemos então a triste oportunidade para falar desta rocha ou desta pedra, como preferirem.
Muito antes de existir a ciência que dá pelo nome de Geologia e muito antes dos geólogos compreenderem e descreverem o metamorfismo, a palavra latina “marmor” já figurava entre os romanos 
Ao tempo de Agricola, o médico alemão, de nome Georgius Bauer (1495-1555), que reviu as classificações do romano Plínio, o Velho, (23-79), do persa Avicena (980-1037) e do dominicano alemão Alberto Magno (1193.1280), mármore, era toda a pedra susceptível de ser usada em cantaria. Eram “mármores” o calcário, o alabastro, o basalto (“mármore negro”, como lhe chamou Plínio), o arenito fino do “Buntsandstein” (ou Triásico germânico) e o mármore propriamente dito (o da pedreira de Borba, agora tão falada). 
Mesmo hoje, entre nós e em termos comerciais, no sector das pedras ornamentais, ainda se classificam como mármores as rochas que permitem o corte e o polimento
Para falarmos de mármore temos, primeiro, de falar de calcário. Isto porque, na generalidade e em traços muito gerais, o mármore não é mais do que calcário transformado (metamorfizado) por efeito de aquecimento e compressão sofridos no interior de uma cadeia de montanhas em formação.
Para o geólogo, mármore é uma rocha resultante do metamorfismo de um calcário. Para o construtor civil é uma da muitas rochas ornamentais existentes no mercado.
- E o que é e como se forma o calcário? – Pergunta quem não sabe.
A imensa maioria dos calcários, como os que temos aqui no Cretácico de Lisboa e Pero Pinheiro (o conhecido lioz), e no Jurássico das Serras d’Aire e Candeeiros, Arrábida e do Barrocal algarvio, é gerado em mares muito pouco profundos das latitudes intertropicais, de águas límpidas e mornas, como por exemplo os das Caraíbas do Golfo Pérsico e da Grande Barreira de Coral, no nordeste australiano (Queensland). Estes mares são propícios à formação de corais e de uma grande variedade de invertebrados (bivalves, gastrópodes, ouriços e estrelas do mar, crustáceos, briozoários, foraminíferos e outros) construtores de esqueletos de natureza calcária, e se certas algas, ditas coralígenas, igualmente construtoras de esqueletos de natureza calcária. 
Na grande maioria dos casos, é a acumulação dos restos esqueléticos (inteiros, fragmentados e/ou pulverizados) deste organismos, todos eles formados por carbonato de cálcio (aragonite e/ou calcite) que, depois de intensamente compactados e consolidados, dá origem ao calcário.
Foi assim no passado e é o que está a acontecer nos dias de hoje nos citados mares quentes da Terra?
Um parêntesis para dizer que aragonite e calcite são duas formas (ou dois minerais) diferente de carbonato de cálcio, sendo que a segunda é mais estável, razão pela qual, com o passar do tempo, a aragonite se transforma em calcite, o mineral essencial do calcário, dito calcítico, e do mármore que, igualmente, podemos dizer calcítico. Isto porque também há mármores dolomíticos.
Para falarmos do mármore alentejano (grande riqueza nacional no sector da Indústria extractiva), temos de recuar a um oceano antigo, que aqui existiu há mais de três centenas de milhões de anos, e admitir que houve, neste local do território, mas a uma latitude mais baixa (como a dos actuais mares tropicais), um mar litoral propício à proliferação de organismos, bem diferentes dos actuais, mas todos eles construtores de esqueletos de natureza calcária. 
Foi durante a formação da grande cadeia de montanhas (orogenia varisca ou hercínica de há 380 a 280 milhões de anos, no final da era paleozóica) que, entre outras rochas, deu origem aos xistos, grauvaques, quartzitos e granitos que formam a ossatura da Península Ibérica, que nasceu este mármore, por transformação do dito calcário. 
Numa descrição mais pormenorizada podemos dizer que o mármore calcítico, como o que temos em Estremoz-Borba-Vila Viçosa, os de Viana do Alentejo ou os de Trigaches tem estrutura granoblástica, isto é, apresenta grãos minerais (calcite) aproximadamente todos do mesmo tamanho (equidimensionais) e sem orientação. 
Menos importantes, mas contemporâneos e tendo sofrido as mesmas vicissitudes, temos, ainda, no Alentejo, os mármores de Sousel, Elvas, Escoural, Alvito e Ficalho. Merece, ainda, referência o mármore branco de Vimioso (esgotado), em Santo Adrião, no Nordeste transmontano.
Menos comum, o mármore dolomítico resultou do metamorfismo de dolomitos (rochas sedimentares essencialmente formadas pelo mineral dolomite, o carbonato de cálcio e magnésio). Como mármore dolomítico merce destaque a chamada “pedra cascável”, subjacente aos mármores calcíticos de Estremoz-Borba-Vila Viçosa.
Com nomes consagrados na indústria e no comércio nacionais destacam-se os mármores:
- na região de Vila Viçosa: Branco Estatuária, Branco Anilado, Creme Lagoa, Rosa Aurora e Rosa Venado.
- na região de Estremoz: Branco Corrente, Branco Rosado e Creme Venado.
- na região de Borba: Ruivina Escuro, Creme do Mouro, Rosa de Rosal e Rosa Venado:
- na região de Escoural: Verde Escoural.
- na região de Viana do Alentejo: Verde Viana.
- na região de Trigaches (Beja): Cinzento Anegrado, Cinzento Claro
- na região de Serpa: Verde Ficalho
Notas:
Diz-se marmoreado ou marmóreo, o que lembra o mármore, na cor, no frio, na insensibilidade.
Marmorite é um produto fabricado, destinado pavimentos e revestimento de paredes. Consiste, geralmente, numa mistura de fragmentos de rochas diversas (mármore, calcário e outras) aglutinados por um cimento. Uma vez seco, é serrado, polido e usado em pavimentos, à semelhança das rochas ornamentais.
Lisboa, 25 de Novembro de 2018

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UMA REFLEXÃO ANTIGA


Por A. M. Galopim de Carvalho

A tragédia na pedreira de Borba, que muitos anteviram, mas que ninguém acautelou, não deve nem pode ser usada como arma no debate político. Fazê-lo não é sério. Não é sério nem aceitável porque a verdadeira culpa só pode ser imputável a todos os que, ao longo do tempo, tiveram ali e no governo central responsabilidades como decisores.
Podemos ainda dizer convictamente que parte dessa culpa e de muitas outras está no nosso grande e triste atraso civilizacional, todos os dias demonstrado, onde o compadrio, a corrupção, a iliteracia generalizada da população, o baixíssimo nível do sistema educativo, a impreparação da maioria dos políticos e a inoperância do sistema judicial são a regra.
Como escreveu ontem Pacheco Pereira, no Público, “Está toda a gente indignada com o “falhanço do Estado” no caso da estrada que ruiu matando pelo menos cinco pessoas. E devem estar não tanto pelo “falhanço do Estado”, porque, para além de ser um falhanço, o falhanço é a regra. A excepção é as coisas funcionarem bem — ou seja, dito à bruta e sem rodriguinhos, Portugal é um dos países mais atrasados da Europa”. 
Na realidade, somos um povo que, “com excepção dos seus imediatos interesses, não quer saber muito disto é até colabora participando na pequena corrupção, na fuga aos impostos, nos pequenos truques quotidianos com o ambiente, a qualidade dos alimentos, as obras na casa, etc., etc. Só se preocupa com a pátria pelo futebol e de resto manifesta uma indiferença cívica total. (Pacheco Pereira).
Em repetição do que já aqui escrevi, a propósito da crise dos professores, a nossa classe política, no seu todo, a quem os Militares de Abril, há 44 anos, generosa, honradamente e de “mão beijada” entregaram os nossos destinos, mais interessada nas lutas pelo poder, esqueceu-se completamente de facultar aos cidadãos cultura civilizacional. Entre os sectores da vida nacional que nada beneficiaram com esta abertura à democracia está a educação e a justiça. 
Mais de quatro décadas, de liberdade em democracia, completamente desperdiçadas.
Este triste acontecimento leva-me a trazer ao presente  uma reflexão que conheci estar na mente de um dos meus antecessores e mestres, o professor Carlos Romariz Monteiro, reflexão que subscrevo e que tem a ver com a absoluta necessidade de incluir um geólogo ao serviço das Câmaras Municipais.
Se, por lei, os nossos municípios fossem obrigados a ter, pelo menos, um geólogo nos seus quadros de pessoal, arranjava-se emprego a mais de trezentos profissionais. Profissionais que procuram no estrangeiro um lugar onde possam desenvolver uma actividade científica e/ou económica de grande qualidade, pois, de grande qualidade é a sua preparação.
Acontece, porém, que a cultura geológica da imensa maioria dos nossos políticos, dos Presidentes da República aos das Juntas de Freguesia mais esquecidas, passando por Primeiros Ministros, Ministros, Deputados e Presidentes de Câmaras, é praticamente nula, ou seja, permita-se-me o exagero, zero!
Restringindo-me agora especificamente, à generalidade dos nossos autarcas municipais, quase todos homens e mulheres acomodados aos aparelhos partidários, sabemos que não dispensam, e bem, o trabalho de juristas e economistas. Muitos têm, e bem, arquitectos e arquitectos paisagistas, ao serviço da autarquia, pois são eles que sabem de urbanismo e dos sempre necessários jardins e outros espaços verdes. Vão conhecendo, e bem, o valor da Arqueologia, porque os respectivos profissionais souberam afirmar-se como detentores de um importante saber que rende. Mas desconhecem, e mal, a importância da geologia, mostrando uma desoladora insensibilidade para os problemas ligados a esta disciplina científica.
Planos Municipais de Ordenamento do Território, em toda a diversidade dos conhecimentos que exigem, sismicidade e risco sísmico local e regional, vulcanismo e suas manifestações secundárias (nos Açores), construção civil, sempre problemática em vertentes instáveis e em leitos de cheia, rodovias municipais, pontes e pequenas barragens, captação de águas subterrâneas, aterros sanitários e lixeiras, pedreiras, minas, escombreiras associadas e contaminação de solos e de aquíferos são alguns dos problemas que só a geologia sabe resolver com competência fiável.
Como remate desta reflexão, repito o que, há décadas, ando a dizer: «o nosso sistema educativo nunca deu e continua a não dar a devida importância ao ensino da Geologia». Rapazes e raparigas marcados pela consequente impreparação, são hoje homens e mulheres desconhecedores das suas reais importância e beleza.
Lisboa, 25 de Novembro de 2018

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Apontamentos de Lagos

Enquanto no caso de Borba o governo diz que "Aquilo é com a Câmara", em Lagos a Câmara diz que "Aquilo é com o Governo" — e estamos assim há quase 10 anos!

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23.11.18

A TV que querem que a gente veja

Por Joaquim Letria
Uma boa parte da minha vida profissional em Inglaterra e Portugal foi passada a produzir, editar e apresentar notícias, debates e entrevistas na rádio e na televisão. Felizmente que não me fiquei só por aí, mas quase 20 anos de audiovisual e um conhecimento experimentado do que é Política e Comunicação autorizam-me a falar-vos acerca da nossa TV, ainda que não me considere um crítico encartado.
Não vou perder tempo a analisar este meio que vai a caminho da extinção. Hoje, abaixo dos 30 anos de idade, já ninguém vê televisão, as notícias estão nos telemóveis e os mais velhos refugiam-se no cabo e nas séries para escapar do castigo que as estações portuguesas nos inflingem. No meu caso, para saber o que se passa, vejo a BBC, a Al Jazeera, o Russian Times, a France24, os venezuelanos, os cubanos e o ISNews dos israelitas. Os americanos, com quem tanto trabalhei e aprendi, não valem hoje a pena de perder tempo com eles. E não é pelas “fake news” do Trump…
Gostaria de vos falar hoje da promiscuidade entre os partidos, os políticos, os jornais e as estações de rádio e TV que nos impede de ter uma visão imparcial e credível da vida política nacional e do que se passa nas relações internacionais. As notícias, fornecidas em telejornais de hora e meia e duas horas, misturadas com festivais de culinária, notícias do entretenimento e mais futebol, são comentadas e esclarecidas por mãos cheias de políticos.
Ora vejam só quem são os comentadores das nossas três estações de televisão:
Manuela Ferreira Leite, Luís Marques Mendes, Paulo Portas, Fernando Medina, Carlos César, Marisa Matias, Francisco Louçã, Fernando Rosas, Santana Lopes, José Miguel Júdice, Rui Pereira, Morais Sarmento, Bagão Félix, André Ventura, Jorge Coelho, Lobo Xavier, Pacheco Pereira, Hélder Amaral, Bernardino Soares, José Eduardo Martins, Francisco Assis, Silva Pereira, etc.,etc.. Estes são apenas alguns dos políticos avençados e bem pagos pelas nossas TVs para em horário nobre ajudarem a formar a opinião pública.
Permitam-me que pergunte onde está a opinião independente e séria que nos é devida, para além daquela que nos chega da Manuela Moura Guedes, Ana Leal, Sousa Tavares, Sandra Felgueiras e ainda de mais uns quantos cuja independência escorre pelos fios da teia que disfarçadamente os liga aos partidos, através da qual são marionetas nas TVs, rádios e jornais e por toda a parte por onde vendem o peixe que lhes mandam vender.
Eu, que sou discípulo e admirador de Sir Robin Day, e muito aprendi com David Frost, Johnny Carson e Michael Parkinson, pergunto onde está aquilo que nos é devido pela informação das TVs portuguesas.  E  fujo para as séries da Netflix e as entrevistas  do Hard Talk na BBC ou do Larry King no Russian Times a fazer hoje interessantes entrevistas tal qual fazia na CNN.
Publicado no Minho Digital

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22.11.18

Espanha – o aniversário da morte de Franco

Por C. Barroco Esperança
Este 20 de novembro foi um dia de êxtase para os órfãos do maior genocida fascista do século XX. No Vale dos Caídos a fila de devotos foi prestar homenagem ao mais frio e cruel ditador da história da Península Ibérica.
No 43.º aniversário da morte de Franco, o nacional-catolicismo orou em êxtase e exalou ódio contra quem recusa o cadáver a dominar o espaço da humilhação dos defensores da República, e onde sucumbiram escravizadas milhares de vítimas. Foi a última romagem de aniversário ao Vale dos Caídos. No monumento da vingança contra os vencidos e da exaltação franquista ocorreu a derradeira homenagem ao ditador, em apoteose fascista.

Na localidade de Cuenca, um deputado (conselheiro) da autarquia fez-se acompanhar da foto do ditador e da bandeira da Espanha franquista com “Gracias Franco!”, a celebrar o aniversário.
Em Saragoça, os franquistas colocaram a bandeira da Falange na imagem da Virgem do Pilar, o que obrigou a diocese a declarar que aconteceu sem a sua autorização.
Há 43 anos morreu bem ungido, muito rezado e excelentemente sufragado, rodeado de sotainas e de incenso, o general que durante quatro décadas semeou o terror e o luto.
No dia do soturno aniversário El Periódico de Catalunha anunciou que a neta de Franco é dona, desde 2003, do edifício onde funcionava um bordel, na Avenida madrilena das Delícias, de onde a Polícia Nacional libertou, em 13 de novembro, 23 mulheres que se prostituíam e deteve 17 proxenetas de uma organização criminosa que ali as explorava, na vivenda de Mariola Martínez-Bordiú Franco.

Para completar as homenagens lia-se no diário El País: “A lei dos meninos roubados teve início esta terça-feira durante a tarde no Congresso com a unanimidade dos 344 deputados presentes e um emocionado aplauso de reconhecimento de todo o hemiciclo, sem cores políticas, aos representantes das associações de vítimas.  E também com algumas novidades relevantes.». Averigua-se mais uma repulsiva conduta franquista.
Enquanto os fascistas prestam a mórbida homenagem ao assassino, a Espanha começa a sentir vergonha e a reparar o passado.

O cadáver de Franco vai ser removido, o difícil é arrumá-lo.
Ponte EuropaSorumbático

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21.11.18

Apontamentos de Lagos

Praia de D. Ana - Junho 2013
Novembro 2018
Novembro 2018

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A VASSOURADA QUE TARDA

Por A. M. Galopim de Carvalho
Tenho vindo a “encher”, como dizia a minha Mãe, quando as asneiras, que eu repetidamente fazia, passavam das marcas. As nossas televisões entram-nos em casa e enchem-nos com horas e horas de alienação. Os incêndios florestais, as ilegalidades no Benfica, os mistérios de Tancos, o terrorismo de Alcochete e as prisões do ex-presidente do Sporting e do líder da claque Juve Leo  e, agora, o IVA das touradas e a “crise” nas fileiras socialistas.
Percebo toda esta estratégia das televisões privadas ao serviço, que estão, de interesses e ideologias contrárias às do PS e dos seus aliados no Parlamento. Mas já não entendo uma actuação muito semelhante por parte da televisão pública. «Com amigos destes, não precisamos de inimigos» diz o povo.
Quem me lê em todos fóruns em que escrevi e escrevo e quem me ouve sabe do meu apoio à actual solução governativa e a António Costa, político que conheço há muitos anos, que estimo e que contou com o meu voto, quer na Câmara Municipal de Lisboa, quer no Governo da Nação. Também conhece a minha absoluta independência dos aparelhos partidários, estruturas fundamentais de democracia, onde a política tem sido adaptada ao sabor de interesses, nem sempre confessados. 
Posta esta ressalva
Ocorre-me trazer hoje aqui estas palavras do nosso Primeiro Ministro, em finais de 2016, na cerimónia de entrega do Prémio Manuel António da Mota, no Palácio da Bolsa, no Porto. Disse, preto no branco:
Uma afirmação que vem ao encontro do que, há muito, ando a dizer e que, para infelicidade de todos nós, não passou de palavras e a verdade é que não vejo qualquer propósito de alteração (eu gosto de dizer “vassourada”) no ministério da tutela.
Por todo o lado, oiço dizer que, à semelhança de outras tutelas, a educação está sujeita à “ditadura das finanças” (leia-se Centeno), mas eu gostava de acreditar que o Primeiro Ministro tem uma explicação credível para esta nódoa da nossa democracia.

Lisboa, 18 de Novembro de 2018

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20.11.18

UMA TRISTEZA E UMA VERGONHA

Por A. M. Galopim de Carvalho
Que infelicidade caiu sobre uma significativa parcela do nosso povo, que rejeita, com o sorriso da ingenuidade ou da iliteracia, tudo o que convide a pensar, a reflectir, com verdadeiro conhecimento de causa, sobre o mundo que o rodeia. Um mundo, tantas vezes, nas mãos de políticos incompetentes e oportunistas de que a nossa sociedade está cheia, onde, de há muito, impera o vírus do futebol profissional e, agora, o dos admiráveis, tentadores e universalíssimos smartphones.
Uma parcela que bebe toda a alienação que lhe é servida de bandeja por uma comunicação social, em grande parte, prisioneira de interesses ligados ao grande capital?  
No que respeita o nível e exigência de ensino nas nossas escolas, não aprendemos nada com o ideal da Instrução Pública posto em prática na primeira República.No preâmbulo do Decreto de 29 de Março de 1911, lê-se  “Portugal precisa de fazer cidadãos, essa matéria-prima de todas as pátrias”. Cidadãos, diga-se, no verdadeiro sentido da palavra, tal como os gregos antigos a criaram nas suas“polis” (as cidade-estado, comoAntenas, TebasEspartae outraspara referir ospolítikoi”ou seja, os homens livres e iguais,verdadeiros protagonistas da demokratia”(palavraconstruída a partir dos elementos“demós”, povo, e “kratós”, poder) que ali se viveu e onde a fomos buscar. Foi, ainda, na Grécia que, por volta do século VI a.C., nasceuphilosophia”, outra palavra que anda na boca de toda a gente, mas que nem todos sabem que quer dizer “gosto ou amor pelo saber”, e que foi criadacom base nos elementos “philo“ (amor, gosto, interesse) e “sophia” (saber, conhecimento).
Não são, pois, polítikoi”, isto é, cidadãos no verdadeiro sentido da palavra,os mais de 50% de portugueses que se abstém de exercer o dever cívico votar, um acto elementar em demokratia”.
Não aproveitámos nada da verdadeira liberdade, em democracia, que nos foi oferecida, de mão beijada, pelos capitães de Abril. Mais de quatro décadas, em que o “gosto pelo saber” foi institucionalmente substituído pela preocupação das estatísticas, visando o “sucesso escolar”. Recuámos, mesmo, em relação ao tempo de Salazar e Caetano.
Neste quadro decepcionante todos perdemos. Perdem os professores, maltratados e amarrados que estão a ditames que não controlam, perdem os alunos e, em consequência, perdemos todos e perde Portugal. 
Uma tristeza e uma vergonha
Lisboa, 18 de Novembro de 2018

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19.11.18

PENSAMENTO E FILOSOFIA

Por A. M. Galopim de Carvalho
Deixei passar o Dia Mundial da Filosofia e, ao ler agora o texto de Helena Damião (...), de 16 de Novembro, alusivo à efeméride, parece-me oportuno deixar aqui algumas reflexões em torno deste tema.
O pensamento, todos sabemos, é um produto imaterial do cérebro e o cérebro é matéria, é oxigénio, hidrogénio, carbono, azoto e umas pitadas de outros elementos químicos Não tem dimensão física. Não tem volume nem massa, nem peso, nem cor, não é quente nem frio e não ocupa espaço. Para ele não há gravidade nem distâncias, nem fronteiras materiais. É ubiquista, podendo estar, ao mesmo tempo e a qualquer momento, aqui e nos quasares mais longínquos, nos confins do Universo, a milhares de milhões de anos-luz.
Não surgiu da noite para o dia, por obra e graça divina. É o culminar de uma evolução da matéria surgida com o começo do Universo, há cerca de 13 800 milhões de anos. 
O cérebro, cuja estrutura vai sendo a pouco e pouco desvendada, adquiriu, na espécie humana, complexidade que lhe permite pensar, criar conhecimento. Feito dos mesmos átomos do universo que conhecemos, o cérebro humano, aceite como fruto dessa evolução, além de coordenar toda a actividade vegetativa do corpo em que está inserido, é matéria que atingiu o superior patamar do pensamento, criando e combinando ideias a partir das percepções que os sentidos lhe fornecem do mundo físico que o rodeia.
Através dele, o homem adquiriu capacidade de intervir no seu próprio curso e no da Natureza que o criou e lhe permite viver, seguindo por caminhos ditados pela sua imensa capacidade de decisão 
Na sua possibilidade de obter conhecimento, de deduzir, inferir e de o transmitir, o cérebro humano, surgido à superfície da Terra, é a expressão mais complexa de uma dinâmica própria da evolução da matéria, na qual foi consumida a totalidade do tempo do Universo, os ditos cerca de 13 800 milhões de anos 
- Em que patamar evolutivo da hominização surge o pensamento mais elaborado do que o dos animais vulgarmente tidos por irracionais?
- Foi no do “Neanderthal”, aparecido há umas centenas de milhares de anos, ou foi só no do “Cro-Magnon”, que se pensa ter exterminado aqueles, há uns trinta ou quarenta mil anos?
Cingindo-nos ao “Homo sapiens”, a Pré-história ensina que, ao longo da sua evolução física e psíquica, este nosso antepassado observou, experimentou e estabeleceu relações de causa-efeito, transmitindo aos descendentes o saber que foi acumulando, servindo-se para tal da linguagem de que dispunha, de início o gesto e, mais tarde e progressivamente, a fala. Fez tudo isto e muito mais antes dos sumérios terem iniciado a arte de escrever, há cerca de 5000 anos. 
E foi só, apartir do momento em que passou a viver em grupos progressivamente mais alargados, que se deparou com questões associadas aos valores morais, estéticos, políticos e religiosos.Foi nesta caminhada que surgiram os primitivos filósofos, designação genérica pela qual são habitualmente referidos matemáticos, geógrafos, historiadores, astrónomos e outros pensadores desse tempo
Foi o confronto entre a realidade que se lhes deparou e as ideias que, a partir dessa realidade, foram formulando, que conduziu o pensamento no caminho de uma ciência embrionária que, nessa fase, se confunde com a filosofia, no sentido de interesse ou preocupação pelo saber. É nesta fase que a filosofia ganha o estatuto de “mãe de todas as ciências". Foi a admiração e, por vezes, a perplexidade decorrentes de tudo o que os sentidos traziam ao seu conhecimento, que desencadearam neles esta atitude mental que está na base do maravilhoso edifício do conhecimento científico e tecnológico que temos ao nosso alcance.
Alistoriadores, classificados por alguns como “orientalistas”, defendem que a filosofia grega teria sido herança e posterior desenvolvimento de uma sabedoria vinda de povos orientais. Tem havido controvérsias sobre a origem desta forma de organização do pensamento, se na Grécia, se em civilizações orientais mais antigas, na Pérsia, na Índia, na China...
Actualmente parece haver unanimidade em considerar a Grécia como o berço da filosofia, o que parece ser confirmado por estudos recentes, com ênfase nos arqueológicos. 
Terá sido, então, que foi entre os gregos que começou a audácia e a grande aventura do pensamento. Terá sido no decurso do século VII a. C., com o desenvolvimento e progresso nos trabalhos diários, que alguns gregos começaram a esboçar explicações racionais que foram conduzindo à progressiva rejeição das explicações míticas da realidade.
É hoje consensual que a filosofia, como superior elaboração do pensamento, nasceu da recusa ao carácter sobrenatural dos mitos, que então dominavam as crenças, não só da sociedade grega, mas de toda a Ásia Menor. 
A passagem de uma mentalidade fundamentada em crenças de carácter religioso, a uma outra, assente no raciocínio, marca, pois, o início da filosofia.
A filosofia surge, assim, como uma espécie de rompimento com a visão mítica do mundo grego. Enquanto que os mitos não dispunham de qualquer suporte racional, a filosofia inaugurava o discurso abstrato e universal, amparado na reflexão e argumentação, formulando concepções do mundo isentas de contradições e imperfeições no que respeita o raciocínio lógico.
Ao contrário da religião, baseada na fé, que não contesta, respeita e, praticamente, não se afasta da tradição e dos textos sagrados, a filosofia serve-se exclusivamente da razão para aceitar ou rejeitar as teses que se lhe deparam. 

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18.11.18

A percentagem do IVA

Por Antunes Ferreira
Corre por aí uma polémica que considero estapafúrdia – a que diz respeito à percentagem do IVA a aplicar às touradas ou corridas de touros (deixo aos interessados o livre alvedrio da escolha) – que já motivou inclusive alguma confusão dentro do Partido Socialista. Ora se mo permitem (e mesmo que não mo permitam) vou meter aqui a minha colher porque a bem da verdade não se trata de questão entre marido e mulher…
Os meus progenitores, o sr. Henrique Silva Ferreira e a dona Glória Hermínia Prata Antunes eram aficionados, diria mais, aficionadíssimos. Tourada a preceito era tiro e queda, fosse ela a normal, fosse aquela à portuguesa. Seguiam-nas quase todas aqui e no país vizinho, normalmente atrás da estrela maior do toureio português, o célebre Manuel dos Santos, natural da Golegã, que tinha como apoderado o sr. Patrício Cecílio (que diziam as más línguas era o pai putativo do rapaz)
O meu pai era regente agrícola pela Escola Agrícola de Santarém e, vejam lá, forcado do Grupo de Amadores da mesma cidade, o seja o Grupo de Forcados Amadores de Santarém e tinha a especialidade de cernelheiro isto é pegava os cornúpectos de cernelha com outro camarada. Era então o cabo do grupo um homem que ficou para a história dele de seu nome António Abreu.
Um dia, tinha eu doze anos, o meu pai levou-me à estalagem Gado Bravo, ali na Recta do Cabo na outra margem em plena lezíria ribatejana, local de reunião de aficionados tauromáquicos, que possuía um tentadeiro anexo. Nele decorria uma garraiada com uma pequena novilha (quiçá de mama…) no redondel e muita rapaziada que iam tentando pegá-la ou novilhá-la com mais ou menos sucesso. O pai Ferreira disse-me então para ir também para a praça e ensaiar os dotes que sabia que eu tinha para a pega e citou – estou a relembrar a cena como se fora hoje – filho de peixe sabe nadar! Queria ele dizer na sua filho de pegador de touros à unha sabe pegar!
Porém quando eu lhe respondi muito envergonhado e enfiado que não senhor, não ia, que o bicho tinha dois paus na cabeça (na altura não dizia cornos na frente do meu  progenitor) a tristeza com que recebeu a minha cobarde negativa ainda hoje a tenho bem viva diante dos olhos.
Daí a qualificativa estapafúrdia que empreguei sobre a polémica que corre sobre a percentagem do imposto sobre o alor acrescentado. Ainda se fosse sobre a proibição ou a continuação da actual situação poderia ter algum significado. Que me desculpe o PAN mas tenho de fazer a pergunta calina: então e Barrancos?

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17.11.18

ALERTA DE DERROCADA NAS PEGADAS DE DINOSSÁURIOS DA PRAIA GRANDE (COLARES, SINTRA)


Por A. M. Galopim de Carvalho
Estive ontem, como aqui noticiei, com um grupo de alunos e respectivos professores, junto das pegadas de dinossáurios da Praia Grande (Colares, Sintra). 
E estive, como se costuma dizer, «com o coração ao pé da boca», desejoso de tirar dali, especialmente as crianças. Uma parte da camada de calcário (sobrejacente à que contém as pegadas), com perto de uma dezena toneladas, ESTÁ PRESTES A RUIR.
O projecto de reutilização da escada que liga a Praia à estrada de Almoçageme e dá acesso às pegadas (diga-se que muito bem protegida por um sólido corrimão), concebeu, e bem, um pequeno patamar, frente a um dos trilhos, com capacidade para uma dúzia de adultos. Pois é, precisamente, sobre as cabeças de quem ali estiver que irá cair, SUSPEITO QUE A QUALQUER MOMENTO, a dita porção de rocha.
Já há mais de uma quinzena de anos, consciente da vulnerabilidade, face às intempéries,  das camadas de calcário, ali empinadas quase à vertical, junto à dita escada, solicitei o parecer de um técnico do Laboratório Nacional de Engenharia Civil que, não só confirmou os meus receios, como indicou o tipo de intervenção a fazer, designadamente, a impermeabilização e consolidação do topo das camadas. Desde então as correspondentes autoridades têm conhecimento (mas nada fizeram) desta dramática situação e do risco que isso representa como perda, para todo o sempre, de um testemunho valioso e raro do nosso passado mais antigo. Esta vulnerabilidade do grande afloramento rochoso representa, ainda, um risco latente para os utilizadores desta escada e dos que, cá em baixo, frequentam a praia.
De então para cá, a jazida com pegadas de dinossáurios da Praia Grande já ruiu e bem, uma vez, felizmente sem causar danos pessoais. Esta derrocada levou-lhe a parte superior da camada, atulhando e atravancando a dita escada, no troço que lhe fica na base, privando os utentes habituais de usar aquele útil percurso.
Recentemente aberta e beneficiada pelo referido corrimão, convida a visitar as pegadas. Nada se fez, porém, quanto à consolidação da jazida e das camadas de rocha associadas, para além da informação do perigo latente, em dois painéis afixados no topo da escada. 

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