Por Antunes Ferreira
DE ACORDO com o famigerado
OE 2015 parece que as pensões mínimas são aumentadas. Mais: dizem-me que o
aumento é de € 2,60 por mês. Quantia mais do que substancial. A titular da
pasta das Finanças Maria Luís Albuquerque disse até que: "muitas famílias vão ter mais poder de compra"
graças ao novo Orçamento. É obra.
O ar altivo e aristocrático da
governanta, digo, governante e a sua impassibilidade permitiram-lhe afirmar
esta barbaridade perante as câmaras televisivas. C’os diabos 2,60 € por mês
sempre são 2,60 € mensais. Imagine-se o que certamente se irá verificar; com
uma actualização de 2,60 € mensais,
desde as grandes superfícies até às PME soltarão, quero crer, um suspiro
de alívio; isto estava mal, mas agora e que se vão deitar foguetes pelo aumento
do poder de compra que está na directa proporção do aumento das vendas.
Mas, deixemo-nos de ironias,
aliás estúpidas e inoportunas: o aumento é vergonhoso, mas também é aviltante.
Já não basta um cidadão andar a morrer de fome, a estender a mão à caridade, a
rebuscar nos caixotes de lixo em busca de algo que ainda se possa comer, e
ainda vêm despudoradamente estes (des)governantes criminosos gozar com ele.
Porque, disso não haja dúvidas
estes 2,60 € de aumento mensal são um escarro de face dupla. A quem o recebe e
os que o “dão”. Já se sabe que não há respeito pelos mais desfavorecidos; já se
sabe que os pobres são pobres até morrer; já se sabe que os ricos são os
detentores do poder e que o antigo $ comandava
a vida e agora o € também o faz. Mas, pelo menos haja vergonha nas caras
dos que dizem que nos governam e, afinal, apenas (des)governam.
Em 1874, Tomás Ribeiro, na sua
obra “D. Jaime” utilizou pela primeira vez a expressão Jardim à beira-mar plantado. Há frases que ficam na História pela
positiva; outras que que primam historicamente pela negativa. Foi Stefan Zweig
quem criou o Brasil, país do futuro,
que funcionou como um anátema para o país irmão. A partir daí os brasileiros
tentaram esforçadamente dizer que a sua terra era o país do presente.
Neste país – mesmo que seja à
beira-mar plantado – a hora é da desmoralização, do sofrimento, da crise, da
austeridade, mas também da autoridade. Faz-se um Orçamento do Estado, o
primeiro depois da funesta troika, mas segue-se o caminho traçado pela trindade
amaldiçoada, UE, BCE e FMI. Isto quer dizer que do pouco de “autonomia” que nos
restava tirou-se tudo. A política financeira do Estado desenha-se em Bruxelas,
ou mais propriamente, em Berlim.
O primeiro-ministro (?)
afirmou, aparentemente convicto que este não era o Orçamento eleitoral,
referindo-se às legislativas que estão por aí a rebentar. Assim sendo, porquê a
aparente diminuição de impostos (onde? Quando? Como?), porquê a devolução de
roubos feitos aos funcionários públicos (agora trabalhadores da Função Pública,
para ser politicamente correcto), porquê promessas em que ninguém já acredita,
porquê a ressurreição do Pai Natal?
Todos os Executivos perante a
eminência de eleições entram pelo caminho da facilidade (e não da felicidade),
das benesses, das concessões. Nas urnas (que são a demonstração pública embora
secretas da Democracia) joga-se normalmente e em Liberdade quem ficará com o
poder. Não é novidade dizê-lo, o Amigo Bana não se envergonharia de o afirmar.
Para ganhar o poleiro, entra-se na via do vale-tudo, da desonra, do opróbrio,
da desilusão, em suma. Ou
seja, prostituem-se as eleições.
Mas dar aos pobres, aos
desgraçados, aos esfomeados um aumento de 2,60 € mensais é, além de tudo o
mais, um descaramento. No entanto, por esse país fora, em especial nas aldeias
do interior, ainda há quem vá nos 2,60 € por mês. Como ainda há quem acredite
no Pai Natal.
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