31.3.16

O combate da civilização contra a barbárie

Por C. Barroco Esperança
Massacres em Istambul, Damasco ou Bagdad não aterrorizaram os europeus, apesar de a primeira cidade se encontrar no seu continente, e ainda menos os da estância de Bassam ou de Ouagadougou, porque a Costa do Marfim ou o Burkina Faso são países arredados da geografia das preocupações europeias. O ataque suicida, em Lahore, contra a minoria cristã, no domingo de Páscoa, fez mais de 70 mortos e 280 feridos, num parque infantil, mas o Paquistão fica longe e as notícias foram parcas e efémeras!
 Nova Iorque comoveu o mundo civilizado, esquecido dos seus erros e crimes e da troca de princípios por interesses. As Torres Gémeas sepultaram milhares de inocentes e houve um clamor internacional, mas quando se esperaria a severa punição da Arábia Saudita, cuja origem e financiamento do ataque esteve na base dessa tragédia, quatro ‘Cruzados’ atacaram… o Iraque, liderados por Bush, aconselhado por Deus –, disse ele.
 Agora, depois de Madrid, em 2004, Londres, em 2005, Paris (janeiro e novembro), em 2015 e Bruxelas, em 2016, a Europa hesita entre a cedência dos valores e a resposta aos ataques que levam o medo e a desconfiança, que promovem a xenofobia e o racismo.
 Os europeus estão cansados de ouvir dizer que o Islão é pacífico, como, aliás, todas as religiões. Não há a mais leve suspeita ou o menor indício de que isso seja verdade, nem a História o confirma. A civilização, de que nos reclamamos, permite combater todas as ideologias políticas, da social-democracia ao fascismo, do liberalismo ao comunismo, mas inibe o combate às religiões, por mais insanos que sejam os princípios e obsoletos os seus livros sagrados. A blasfémia ainda é crime em várias democracias!
 Os partidos políticos combatem opções de partidos rivais, sem bombas, mas as religiões são livres de apelar à violência em nome do seu deus e de organizarem o proselitismo, exortando à violência nos templos e fanatizando crianças nas escolas.
 O problema europeu não é com muçulmanos nem com o radicalismo islâmico, é mesmo com o Islão, um problema sério e insanável que, à semelhança do que sucedeu já com o cristianismo, se resolve com a repressão política ao seu clero.
 Não é com diálogo entre as religiões que se combate o terrorismo, é com a exigência do respeito pela Declaração Universal dos Direitos Humanos a todas as religiões e a todos os indivíduos, crentes e não crentes, autóctones, imigrantes e refugiados.
 Ponte Europa / Sorumbático

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27.3.16

Sem emenda - Moral e política

Por António Barreto
Sempre fizeram mau casamento. Quando uma, a moral, é invocada a propósito da outra, a política, é quase sempre mau sinal. Pode ser impotência da política, isto é, da justiça e da lei para pôr cobro a certas atitudes e determinados comportamentos. Também acontece ser sinal de despotismo ou de ambição totalitária: por exemplo, políticos que desejam impor um código moral de que carecem para os seus actos de governo. Poderá ainda ser, à falta de argumentos racionais, uma tentativa de impor regras por outras vias que não sejam as dos métodos políticos tradicionais, com o que se transforma a religião e a moral em instrumentos de poder. E já não me surpreende que, tantas vezes, os privilegiados e favorecidos reclamem “ética” e comportamentos “morais” para que os seus dependentes obedeçam e aceitem o estado presente e “natural”. Não me canso, finalmente, de ouvir, todos os dias, gente de várias gerações queixar-se da “falta de ética” e da inexistência de “valores morais” por parte daqueles que, simplesmente, têm valores diferentes e crenças diversas. Nas ruas, nas empresas, nas escolas, nos estádios de futebol, nos recintos de espectáculos, nas repartições, nos comércios e até nas igrejas, muitos que querem conservar e manter a ordem estabelecida reclamam contra a ausência de moral dos outros.

Por vezes, em certas circunstâncias, em determinadas épocas e em vários países, assiste-se a fenómenos ainda mais complexos, tais como o da presunção de que a política de alguém implica uma moral, uma cultura, uma ciência e uma visão de classe totalmente opostas à do outro. E que a verdade de um é incompatível com a verdade do outro. Melhor ainda: à verdade de um opõe-se, por definição, a mentira do outro. A moral de um é combatida pelo interesse do outro. E a honestidade de um é contrariada pela corrupção do outro. Estas são as raízes do fanatismo, político ou religioso. A que não são alheios fenómenos tão diversos como o sectarismo nacionalista ou o facciosismo desportivo.

O que se passa no Brasil, com Lula da Silva à beira de ser nomeado ministro, a fim de evitar ser preso por corrupção, e um juiz federal a tentar impedir aquele gesto, merece toda a atenção. Não para resmungar, mais uma vez, contra a “falta de valores” e a “ausência de moral”, mas sim para perceber o modo como as tribos políticas transformam em virtude não só as suas ideias, como também os seus interesses, os seus crimes e os seus roubos. No Brasil ou na Venezuela, em Portugal ou em Itália, políticos ou banqueiros, empresários ou sindicalistas, assumem a sua mentira e a sua corrupção como actos legítimos na defesa dos seus interesses e pontos de vista que são obviamente lícitos, contra os dos outros, que os combatem com meios evidentemente ilegítimos. Um governante que mente e rouba, um banqueiro que esconde e desfalca, um empresário que corrompe e disfarça, um gestor que favorece e dissimula ou um deputado que falsifica e engana, tem todo o interesse em demonstrar que os seus inimigos são, não a lei nem as instituições democráticas, mas os opositores, os outros partidos, as outras classes sociais, as outras nacionalidades. Por isso, os envolvidos nestes casos procuram, na imprensa, nas televisões e na rua, ganhar as batalhas que nunca venceriam na justiça. Por isso há bandidos que tentam vencer, com a política, o que nunca obteriam com a lei. Por isso, os grandes delinquentes consideram que a justiça e os magistrados estão “ao serviço do inimigo”.
Na América Latina e na Europa, lá como cá, não estamos diante de mais uma escaramuça, mas sim de um grave conflito de cujo resultado depende a democracia. A vitória desta última só pode ser ganha com a justiça. Não chegam as maiorias políticas. Nem os poderes sociais e económicos. Nem a força da rua.
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DN 20 de Março de 2016

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Sem Emenda - As Minhas Fotografias

Por António Barreto
Nicolau Breyner como José do Canto, em “Uma família açoriana”, com Maria João Luís – Há cinco ou seis anos, Nicolau Breyner assediou-me na rua. “Não quer fazer um guião para mim?”. Perguntei-lhe se estaria interessado numa série de televisão que a Maria Filomena Mónica e eu tínhamos escrito vinte anos antes e tinha ficado à procura de realizador... Disse logo que gostava de ler. Era na altura “Os Cantos”, que mais tarde viria a ser “Uma Família Açoriana”. Tínhamos uma condição: a de que o protagonista, José do Canto (na série Vasco Ataíde Câmara) fosse desempenhado por ele, Nico. Três anos depois, a série estava terminada. Feita pela Cinemate para a RTP, com realização de João Cayatte e direcção de Nicolau Breyner, foi exibida em 2013. Nicolau fez uma notável composição da personalidade complexa e contraditória de José do Canto. Tive o privilégio de acompanhar a rodagem em vários momentos. Aproveitei a oportunidade para fazer algumas fotografias e ver a maneira como ele, entre duas cenas, se preparava, entre o silêncio concentrado e a galhofa com os amigos.
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DN, 20 de Março de 2016

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Luz - Senhora às compras, na Piccadilly Arcade, em Londres

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Na zona de Piccadilly, há duas destas galerias, datam do século XIX ou do princípio do século XX, são ainda hoje de comércio muito sossegado e de lojas especiais: jóias, antiguidades, alfaiates, acessórios de vestuário, gravatas, luvas, meias, lingerie, prata, relógios e perfumaria. Há a Burlington arcade e a Piccadilly arcade. Esta última mais pequena, talvez mais exclusiva, certamente mais cara. Tem duas entradas, por Piccadilly e por Jermyn street (antiga rua de Londres, famosa pelos seus alfaiates e costureiros para homens). Foi inaugurada em 1909. (2015)

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24.3.16

Carlos Cruz e a Justiça

C. Barroco Esperança
Carlos Cruz, foi um dos mais populares apresentadores da televisão portuguesa. Coautor do zip-zip, figura central de numerosos programas, diretor de informação, diretor de programas e diretor-coordenador da RTP1, foi o excecional comunicador que criou com os telespetadores uma notável empatia.
 Foi julgado pelo crime de pedofilia. Públicas virtudes, vícios privados. Foi com mágoa que vi condenado o homem por quem nutria simpatia, mas jamais duvidei da prova e da justeza da condenação. Teve bons advogados e todos os meios legais para se defender. Arruinou a imagem, a honra e a carreira. Foi preso.
 Repito, jamais duvidei da culpabilidade, apesar dos protestos reiterados de inocência. A justiça pode cometer erros – e comete –, mas é mais provável a negação do crime pelo arguido do que o erro judicial. A dúvida, para além do razoável, conduz à impunidade.
 Carlos Cruz já cumpriu o tempo de prisão suficiente para que lhe possa ser concedida a liberdade condicional. O juiz recusa-a porque ele insiste em negar a culpa, como sempre o fez. E continuará preso.
 negação do crime aconteceu sempre e, decerto, foi levada em conta na graduação da pena, não devendo servir agora de justificação para considerar o preso não recuperado, sob pena de parecer chantagem para a confissão do crime por quem sempre o negou.
 Não duvidei da adequação da pena, mas indigna-me o pretexto usado que lhe recusa a liberdade condicional. A opinião pública, que sempre se entusiasma para influenciar os julgamentos, raramente se interessa pela defesa da liberdade.
 Que raio de país!
Ponte Europa / Sorumbático

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21.3.16

CANJA DE AMEIJOAS

Por A. M. Galopim de Carvalho

Nesse tempo, o da minha infância, nos anos 30 do século passado, ainda a minha irmã mais nova não tinha nascido, as ameijoas verdadeiras, (as de nome científico Ruditapes decussatus, Lineu 1758), mais do que quaisquer outros bivalves, eram comuns e relativamente abundantes no mercado municipal de Évora. Ao contrário de hoje, eram acessíveis, em termos de preço, entrando com frequência nas casas das famílias mais modestas, como a nossa, de pai empregado de escritório, mãe doméstica e cinco filhos, três rapazes e duas raparigas, a alimentar.
Como confecção de caldo a anteceder o prato de um almoço ou de um jantar, fazendo de sopa, a minha mãe fazia muita vezes (e eu retive na memória como se faz) canja de ameijoas.
Terrina na mesa a fumegar e a libertar o saudoso aroma a maresia, a mãe servia, primeiro, o pai, depois por ordem de idades, os filhos, a começar pelo mais velho. E só depois de me servir a mim, o mais novo, se servia a ela, já a ouvir as reclamações deste ou desta porque o irmão ou a irmã ficara com mais um ou dois “bichos” do que ele ou ela.
- Calem-se e comam. – Ralhava. - Eu não posso estar a contar as ameijoas que vão no cace. Para a próxima ficas tu com mais.
Algumas vezes, com três ou quatro ameijoas buscadas no fundo da terrina, rapidamente se conseguia a igualdade reclamada e a necessária compostura à  mesa. O pai não dizia nada. Comia calado, indiferente a estes e outros desaguisados de pequena monta. Habitualmente, não intervinha nestas contendas menores. Sempre se reservou para as situações mais graves, que as houve, naturalmente, como em quaisquer famílias.
Mas voltemos à canja de ameijoas.
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Receita
1 kg de ameijoas verdadeiras, vivas e bem depuradas
100 g de arroz carolino
1 L de água
1 cebola média muito bem picada
1 ou 2 pés de salsa
1 golada de azeite
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Leve a água a ao lume e, estando a ferver, introduza as ameijoas.
Deixe-as abrir completamente e retire-as com a escumadeira, um ou dois minutos depois.
Retire e rejeite a salsa.
Retire os “bichos”, reserve-os e rejeite as cascas.
Volte a pôr a água ao lume, com a cebola e a salsa, tempere de sal, junte o azeite e coza o arroz.
Momentos antes de retirar do lume, retire a salsa, acrescente o miolo das ameijoas e sirva bem quente.
Se gostar adicione, no prato, umas gotas de limão.
Bom apetite
Nota: Cace é uma maneira muito alentejana de dizer conha de servir a sopa.


Nunca experimentei confecionar este prato com mexilhão, mas vou experimentar.

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20.3.16

Luz - Família de chinesas, com telemóvel, GPS e Trip Advisor, em Alfama, Lisboa

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O que parece ser uma família de raparigas chinesas ou simplesmente um grupo de viajantes bem novas. A curiosidade era que procuravam sítio para ficar, quartos ou apartamentos, com a ajuda dos telemóveis com GPS e uma delas ligada ao Trip Advisor. Nunca tal tinha visto! Pelo que percebi, nem sequer tinham feito reservas de apartamento ou quartos. Ou talvez não tenha percebido bem a sua conversa… (2015)

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