28.6.21

No "Correio de Lagos" de Junho de 2021

 

Etiquetas: ,

27.6.21

No "Correio de Lagos" de Junho de 2021

 

Etiquetas: ,

26.6.21

Grande Angular - Livres e iguais

Por António Barreto

A mais temível ameaça actual contra a liberdade e a democracia é a desigualdade. Seja esta social, racial, cultural, política ou económica. A desigualdade crescente envenena de tal modo as relações sociais que a liberdade e a democracia se encontram sob ameaça. No passado, a pobreza estava escondida e a desigualdade disfarçada. Hoje, uma e outra são universalmente visíveis. Associada a outros factores de carácter político e cultural, a desigualdade é fonte de conflitos que põem em causa a solidez das instituições. Por isso, é o mais premente.

Esperava-se que a democracia poderia liquidar as desigualdades. Há décadas que essa luta prossegue, com notáveis vitórias da democracia. Na política, na escola, na economia, na saúde, no trabalho e na cultura, as vitórias da democracia são inegáveis. A criação de sistemas de saúde e a promoção da escola para todos deram um enorme contributo para a democracia. A solidez dos Estados de protecção social é talvez o mais seguro alicerce da democracia contemporânea.

Ainda há número excessivo de casos de pouca ou nenhuma liberdade e de demasiada desigualdade. Nas fábricas da China e da Índia, nos bairros urbanos de África e nos campos de refugiados do Próximo Oriente, não faltam sociedades sem liberdade, sem democracia e com enorme desigualdade. E mesmo em democracias não é raro encontrar fenómenos de grande desigualdade e fragilidade social. Mas é consolador verificar que, no mundo, justiça e igualdade têm uma correlação forte com democracia e liberdade.

Mas a desigualdade ameaça também a liberdade de modos imprevistos, os de certos tipos de luta contra a desigualdade. Como se viu em tantas experiências ditas comunistas, da União Soviética à China, da Albânia ao Camboja. Criar a igualdade à força só com enorme prejuízo da liberdade. O combate contra o racismo, nas suas modalidades radicais, degenera rapidamente em racismo. A luta contra a autoridade provoca frequentemente o nascimento de poderes autoritários. Sem mérito, a luta pela igualdade educativa pode provocar empobrecimento do conhecimento.

Ora, as políticas de promoção da igualdade, indispensáveis para consolidar a democracia e criar justiça social, devem ser aceites pela maioria dos contribuintes e dos eleitores. Caso contrário, estão condenadas. A política de combate à desigualdade não deve ser de tal modo concebida que se transforma ela própria em fonte de desigualdade e de injustiça. Com o objectivo de promover a igualdade, não se devem criar situações em que as minorias, os grupos vulneráveis, os segmentos mais fracos da população e os grupos mais frágeis acabem por se encontrar em situação privilegiada relativamente aos que não foram beneficiados por intervenções oficiais, mas que vivem do seu trabalho, dos seus rendimentos e dos seus esforços.

São nefastas as leis e as políticas destinadas a promover direitos de grupos especiais, a conceder privilégios que causem nova injustiça. Os direitos gerais devem ser promovidos de modo igual para todos. Os direitos são dos cidadãos, dos seres humanos, não de minorias ou de grupos, de velhos, de mulheres, de crianças, de doentes, de LGBTQ, de imigrantes, de negros, de ciganos, de transmontanos ou de ilhéus.

A promoção do imigrante, da mulher, do negro, do judeu, do trabalhador, do desempregado, do analfabeto, do recluso e do doente não deve fomentar a criação de novos grupos, mas sim aquilo a que se chama actualmente a inclusão. A inclusão deve aumentar a integração e não a construção de sociedades fragmentadas, em tabuleiros de xadrez ou em guetos.

É racista a lei que crie sistemas e dispositivos especiais para certos grupos com características ditas raciais particulares. É racista a política que crie e defenda privilégios, garantias e direitos especiais para qualquer grupo nacional. São sectárias e desiguais as leis e as políticas destinados a proteger direitos gerais a grupos especiais.

A última fantasia da União Europeia é a da aprovação de uma moção de apoio às pessoas ditas LBGTIQ+ e de condenação da legislação repressiva húngara. Muitos países assinaram. Portugal não assinou, mas disse que estava de acordo. Parece Bill Clinton, que fumou mas não engoliu. A verdade é que este texto, carregado de boas intenções, é mais um passo no mau caminho: o que gradualmente constrói uma nova ortodoxia, um mundo feito de fragmentos, de federações e de comunidades rivais.

A propensão demagógica para criar direitos e favorecer grupos tem levado a criar um Estado repleto de novos confrontos. Não se passa um dia sem que surjam novos direitos para novos beneficiários, aumentando ou insistindo na separação, em vez de integração. Direitos dos trabalhadores, das crianças, dos velhos, dos imigrantes, dos negros, dos ciganos, dos rurais, dos urbanos, dos residentes no interior, dos analfabetos, dos LBGTIQ, dos desempregados, dos estudantes e dos doentes são direitos sectários, desiguais, racistas e discriminatórios. Todos esses direitos e garantias podem simplesmente ser os direitos de todos, dos residentes, dos cidadãos ou simplesmente dos humanos. Caso contrário, transformam-se em privilégios. Que aliás são, entre nós, favorecidos pela Constituição, que consagra mais direitos parcelares e de grupos especiais do que se pode imaginar.

O importante é a desigualdade e a pobreza. Seja esta moral, educativa ou económica. Saúde? Educação? Alojamento? Alimentos? Rendimento? Não faltam preocupações para um governo. Mas não deveria ser especialmente para ciganos ou negros. Nem para gente do interior ou dos subúrbios. Se for, é racismo, privilégio ou desigualdade. Se for para todos, é mais fácil que a população aceite e o contribuinte pague. É mais fácil que as populações aceitem politicamente pois não são forçadas a ajudar grupos especiais.

Propinas especiais para negros? Para ciganos? Para asiáticos? Nem pensar. Será racismo, desigualdade e discriminação. E é provável que a maioria da população e dos contribuintes não esteja de acordo. Bolsas e subsídios, incluindo custos de propinas, para todos os que não têm? Todos os que precisam? Sim e é mesmo possível que grande número dos beneficiários venham a ser negros, ciganos e imigrantes. Mas não é por isso, por serem negros, ciganos e imigrantes que são apoiados, mas simplesmente porque são pobres, porque não têm recursos e porque merecem.

 Público, 26.6.2021

Etiquetas:

25.6.21

UM PAÍS CHEIO DE COISA NENHUMA

Por Joaquim Letria

Construímos um País de grandes feitos e poucas ideias. Distraímo-nos com raros pensamentos, evitamos estratégias, não pensamos no que vai ser o amanhã e preferimos que outros se ocupem em aprofundar a democracia  pela simples razão de que gostamos muito dela mas dá muito trabalho pensarmos na liberdade.

Devia ser obrigatório pensarmos em quem somos como Nação e para onde vamos como Povo. Ainda que tal possa resultar incómodo, seria importante sairmos deste Portugal adormecido pela miragem do bem-estar, esquecidos e sem nos resignarmos no ai-Jesus, vagamente lamurientos na alegria e satisfeitos com o mal menor.

Temos de pensar para além das coisas, esquecermos o desenvolvimento das coisinhas-de-ter-e-mostrar, e deixarmos de nos satisfazermos com os efeitos das fórmulas caducas e dos remédios de bem-fazer.

Acredito que os nossos jovens sentem e sabem que têm desde já essa obrigação. E nós temos a obrigação de ser exigentes, fiscalizadores, forçando-os ao exercício duma crítica construtiva e confiante sem nunca abdicarmos, uns e outros, do indispensável direito à indignação, protestando sempre que uma qualquer promessa não seja cumprida.

Se não fizermos isto, uns e outros, acabaremos por ter vergonha daquilo que deixarmos em legado.

Será uma herança de vazio, um País cheio de coisa nenhuma.

Publicado no Minho Digital

Etiquetas:

24.6.21

Pergunta de algibeira


Mudar a posição de 1 fósforo por forma a acertar a equação.

Uma "dica": Há mais do que uma solução

Etiquetas: ,

O indulto aos secessionistas catalães

Por C. B. Esperança

A Espanha é um país de várias nações com língua própria e tradições independentistas de longa data. Aliás, Portugal é o exemplo de uma secessão conseguida há quase quatro séculos e ora alheado dos problemas que se vivem do lado de lá da fronteira que deixou de ser.

Durante a longa ditadura franquista, o assassínio de centenas de milhares de espanhóis e a ferocidade da repressão não extinguiram as pulsões independentistas, mas a autonomia que a democracia concedeu, apesar de ampla, não saciou as aspirações nacionalistas que procuram desfazer o País.

A repressão é a única arma que os conservadores conhecem, e a independência a que os nacionalistas aceitam. No caldo de cultura de um país com tradições sangrentas e débil experiência democrática, que perpetuou o aparelho franquista, torna-se difícil a solução.

Os nacionalismos que se exacerbam em toda a Europa, que destruíram a ex-Jugoslávia e a Sérvia, separaram a Checoslováquia e ameaçam o Reino Unido, a Grécia, a Itália e a Bélgica, são, em Espanha, armadilhas que é preciso desmontar para a pacificação.

A Catalunha é só a primeira e mais feroz provocação ao Estado espanhol e à unidade de Espanha, país que deixaria de existir se a primeira independência tivesse sucesso.

A democracia encontrou a Catalunha com a língua própria em vias de extinção, proibida nas escolas e departamentos do Estado, sendo hoje o castelhano excluído e obrigatória a língua autóctone.

A pacífica tentativa sediciosa catalã teve a pior resposta – a repressão –, e os dirigentes foram julgados e presos como vulgares delinquentes, transformado o problema político em caso de polícia.  

Quem conhece a tragédia dos nacionalismos e teme as guerras civis que provocam, com consequências sistémicas na própria União Europeia, não apoia ímpetos autonomistas e alterações de fronteiras, mas não é alheio à tentativa de pacificação das relações entre as partes.

A decisão do Governo de Espanha, com o PP e o VOX a digladiarem-se para exibirem a maior violência na oposição ao indulto de Pedro Sánchez, é a tentativa equilibrada para abrir espaço ao diálogo sem desacreditar o poder judicial (indulto em vez de amnistia).

Os custos eleitorais são imensos, mas seria injusto não reconhecer a coragem do perdão do primeiro-ministro aos presos para permitir o diálogo e terminar com o que, em vários países da Europa, era visto como prisões por motivos políticos.

Cabe agora aos catalães, sobretudo aos 52% que exigiam independência, a ponderação e vontade de diálogo para aprofundar a autonomia sem pôr em risco a unidade espanhola.

A grandeza e coragem do gesto do primeiro-ministro merecem ter êxito na Espanha que ainda lambe feridas da guerra civil, violenta de ambos os lados, e a posterior vingança franquista.

Ponte Europa / Sorumbático

Etiquetas:

20.6.21

No "Correio de Lagos" de Junho de 2021

 

Etiquetas: ,

19.6.21

Grande Angular - Dois casos longe demais

Por António Barreto

Foram entregues dados pessoais de manifestantes a várias dezenas de Embaixadas, de esquerda e de direita, umas de países amigos, outras de países assim-assim. Esta variedade é suficiente para dizer que o Governo e a Câmara não tiveram um comportamento sectário. Mas também para revelar um condenável grau de subserviência perante os Estados estrangeiros, o que quer dizer que os direitos dos cidadãos são secundários.

Depois de um longo silêncio por parte do governo e de um crispado nervosismo do Presidente da Câmara de Lisboa, houve finalmente explicações. A extensa e notarial explicação de Fernando Medina não é convincente. Defende a irresponsabilidade. Apoia-se numa auditoria feita pela própria Câmara, não por entidade externa. E remete as responsabilidades para os serviços administrativos. É verdade que, em vez da tradicional negação, ele escolheu a via da condenação dos factos (“procedimento inadequado”). Considerou que a Câmara fez mal. Mas a afirmação repetida da sua inocência não é convincente. Ora, a sua responsabilidade é indiscutível: ou por acção deliberada e conhecimento; ou por desconhecimento e indiferença.

Sabemos agora que, nos últimos anos, as Embaixadas estrangeiras em Lisboa foram informadas da ocorrência de mais de 150 manifestações de carácter político, das quais 52 desde 2018. Essas manifestações dirigiram-se às Embaixadas, ou tiveram lugar noutros sítios, mas tinham países ou governos estrangeiros, como alvo. Além destas, realizaram-se mais umas centenas ou milhares de manifestações que motivaram comunicações semelhantes, mas não a Embaixadas.

Segundo o Presidente da Câmara de Lisboa, que mudou de atitude relativamente a estes factos, os dados pessoais eram transmitidos às Embaixadas, tal como ao Ministério da Administração Interna, à polícia, a instituições e empresas. Estes procedimentos foram habituais, durante perto de vinte anos. Segundo o Presidente da Câmara, os responsáveis políticos não sabiam o que se passava e o ex Presidente António Costa terá mesmo assinado um despacho alterando as regras. Durante dez a vinte anos, os responsáveis políticos não se interessaram pelo assunto, nem pela lista de destinatários. Nem sequer pelo cumprimento das instruções.

Segundo o Presidente da Câmara, estes procedimentos foram inadequados e devem ser imediatamente corrigidos. Para já, o responsável pela protecção de dados foi exonerado. E o Gabinete de Apoio ao Presidente foi transformado em Direcção de Serviços de Expediente. Assim é que culpa os funcionários, por desatenção e inconsciência e isenta os políticos de responsabilidades.

As declarações do Presidente da Câmara de Lisboa constituem facto notável e inédito na história política portuguesa. Têm excepcional valor, pois confirmam a delação e a denúncia. Além de desculpas, que já tinha pedido, o político reconheceu a ilegalidade e condenou os comportamentos. Em vez de negar, como outros fazem, reconheceu o carácter inadequado, para utilizar a sua expressão preferida. Menos notável e muito menos inédito é o facto de ter culpado os subordinados, que castigou. Não muito original é também o facto de se ter ilibado de qualquer responsabilidade política. 

Há duas hipóteses a considerar. Primeira: o Presidente da Câmara e os vereadores não sabiam o que se passava, pela simples razão que algumas questões de direitos dos cidadãos lhes eram indiferentes. Não sabiam, nunca souberam, não são culpados de delação deliberada, de traição ou negligência. Mas são culpados de indiferença perante os direitos dos cidadãos seus compatriotas.

Segunda hipótese, bem mais grave: o presidente da Câmara e os vereadores sabiam o que se passava, estavam informados das rotinas e consideravam normal que assim se procedesse, pela simples razão de que alguns direitos dos cidadãos lhes são indiferentes. As declarações do presidente da Câmara sobre estes factos não são esclarecedoras.

ausência do Governo deste processo é notável. Para o Primeiro-ministro, o assunto é meramente administrativo e camarário. Ele e os seus ministros da Justiça, da Administração Interna e dos Negócios Estrangeiros nada têm a ver com isto. Não têm responsabilidades, nem competências. Nada foi esclarecido. Nem se sabe quantas câmaras em Portugal fazem o mesmo.

Mas há outro problema. O da entrega de dados às polícias. Mesmo às polícias portuguesas, tal gesto, é condenável. Trata-se de cidadãos que se querem exprimir ou manifestar. Não se trata de criminosos, foragidos, terroristas ou procurados pelas polícias. A presença numa manifestação não é assunto de polícia. A entrega desses dados às polícias é tão condenável quanto a entrega às Embaixadas. Pela mesma razão: os nomes são entregues a essas entidades para que estas controlem, vigiem e exerçam poder sobre cidadãos.

O mais confrangedor, quase arrepiante, é a reacção do governo e do autarca perante as críticas e as objecções. Ficaram crispados e ofendidos. Mostraram-se despóticos e nem sempre verdadeiros. Acusaram os seus críticos de fazer política… de mentir… de oportunismo, epítetos que lhes servem a si próprios. Ridicularizaram os críticos e os que fizeram perguntas. Na verdade, reagiram com o nervosismo dos mentirosos e dos apanhados em flagrante.

Mas há também o caso dos “direitos na era digital” e das tentativas de monitorização das ideias, do pensamento e da opinião. A coincidência temporal dos dois acontecimentos, a delação e o controlo da expressão, é curiosa e irónica. Não há, evidentemente, uma relação factual e causal entre os assuntos. Mas há uma cultura comum. A do controlo da informação. A do controlo da expressão. A ideia de que se pode e deve invadir as áreas privadas ou pessoais dos cidadãos em defesa do Estado. E dos próprios cidadãos, segundo alguns mais atrevidos. 

Seja como rotina administrativa, seja como decisão política, é claro que a transacção de dados traduz uma ideia e uma cultura para as quais a privacidade, o recato e a confidência tão pouco valor e significado. Vigiar as “narrativas” e as comunicações dos cidadãos é tão vil e tão despótico quanto entregar dados pessoais às polícias e às embaixadas. Mesmo políticos que parecem cultivar o valor das liberdades, dos direitos e das garantias dos cidadãos, mesmo eles submetem tais valores à sua duração e ao seu interesse.

Público, 19.6.2021 

Etiquetas:

18.6.21

ETERNIDADE NA ARENA RESPEITOSAMENTE DEDICADA À SRA. MINISTRA DA CULTURA

Por Joaquim Letria

Restam hoje na galeria da minha memória, etiquetados conforme cada caso, muitos amigos meus chamados a Deus servir mas todos eles arrumados na secção geral da grande saudade.

Um dos casos mais marcantes terá sido o desaparecimento de D. António Ordoñez, Senhor de Ronda, em cuja praça pontificava com cultos goyescos e a arte eterna de figuras e gestos irrepetíveis, daqueles a quem entendia merecerem a graça que lhes concedia de nos transcenderem na areia morena daquele rincão andaluz.

Durante muitos anos, quase todos os da minha infância e muitos da minha adolescência, segui-lhe os passos por terras de Espanha, dele se servindo quem em aulas práticas me exemplificou e ensinou o que era a sua arte, coragem, rasgos de estética, beleza da cadência, elegância do toureio. Quando cortou a colecta e se retirou para o que haveria de ser o seu labor de empresário, foi para mim como quando os padres deixaram de celebrar em latim.

Essa mesma verdade que Ordoñez fora para mim fora para outros Paco Camiño, António Bienvenida, ou Curro Romero. No caso particular de Curro Romero e desde os meus 14 anos de idade, na Praça do Montijo, fiquei e perceber que à verdade adulta se pode acrescentar a medida de alguns exageros, convertendo-se o racionalismo sensível numa crença quase religiosa, sujeita a uma muito particular liturgia de fracassos e desmaios sem que com tal se possa perder a fé. Na arte de Curro cabem todos, mesmo aqueles para quem o Mestre continua a ser Antoñete. Muito especialmente, depois de ambos pedirem licença para aos 67 anos voltarem a paramentar-se e a celebrarem o rito, patenteando a dignidade dum bispo e a sabedoria dum cardeal. Já lá vão 20 anos.

Antoñete é grande e inolvidável a sua faena. Mas toureia Curro e o Guadalquivir pára, o vento amaina, as nuvens desfazem-se, o sol brilha com mais força porque os elementos compreendem a busca do milagre. Os milagres são fugazes como sabem os exorcistas, por isso uma verónica suspensa, um natural desmaiado, compensam meses de horas e horas de desespero e humilhações, quilómetros e quilómetros de fiéis sofredores e seguidores.

Se Ordoñez era Bach, Antoñete era Beethoven e Curro foi Mozart, o génio de todos eles merece mais do que a simples paciência. Como disse o meu amigo  Burgos, Curro fez tudo na Real Maestranza menos a Primeira Comunhão. Antes da pandemia eu seguia Juli e Jesulin por Olivenza, Albacete, Nimes, Madrid e Pamplona, às vezes também em  Quito, Cali, Lima e México onde igualmente pregam Enrique Ponce e José Tomás, a magia religiosa do toureio continua monoteísta, a ter um único Deus e esse é Curro Romero. Um toureiro com mais de 60 anos é algo muito especial. E Curro com os seus 87 anos é eterno.

Publicado no Minho Digital

Etiquetas:

17.6.21

O PR, a pandemia e os sinais errados para o seu controlo

Por C. B. Esperança

Com indícios alarmantes a prenunciarem nova vaga de contágios, de difícil contenção, não podem os responsáveis políticos dar sinais errados à população, ansiosa de retomar a vida normal e de compensar longos meses de restrições.

O país, especialmente a região de Lisboa, com o número de novos infetados a disparar e o R (t) e o número de mortes a aumentarem, está a regressar à angústia e a comprometer os esforços de relançamento económico.

A comemoração de um campeonato de futebol, com alguma incúria das autoridades, foi o início de uma vaga de leviandades, multidões que violam os mais elementares deveres de respeito das normas sanitárias, comprometendo a saúde própria e a coletiva.

A recente provocação de um partido político (IL), cujos direitos políticos lhe garantiram a liberdade de manifestação, além da graçola boçal de atirar setas a adversários, impeliu militantes, e a população ansiosa de se divertir na data tradicional de um popular arraial, a desprezarem as recomendações sanitárias das autoridades e a ajudarem a disseminação das infeções.

Perante a difícil situação sanitária nem o PR teve a ponderação que as funções exigem, e deu um sinal errado com declarações infelizes que o prestígio e a popularidade agravam. Ao declarar que “comigo o país não volta atrás, no confinamento, comigo nunca mais”, contrariou a pedagogia das autoridades de saúde e exerceu uma intolerável pressão nas decisões que cabem ao Governo.

A benevolência de que goza nos média permite-lhe não ser confrontado com a enorme leviandade das declarações e, do mal feito, ficou apenas, como ruído, a gratuita ofensa ao PM, por reprodução de declarações de virologistas, em linha com anteriores decisões do Governo.

Não se sabe se o PR tem agenda oculta, mas a deselegância da bravata e, sobretudo, a infelicidade das declarações acima referidas, são a nódoa indelével na sua magistratura de influência e um enorme perigo na política de combate à pandemia.

O pior que pode suceder a Portugal é tornar-se o PR, garante do regular funcionamento das instituições, ator partidário ou, levado pelo narcisismo, um perturbador, pondo nas suas ações o peso da popularidade e da simpatia que granjeou.

Ponte Europa / Sorumbático 

Etiquetas:

15.6.21

No “Correio de Lagos” de Maio de 2021

DAS VIAGENS que, em finais dos ‘anos 90’, tive de fazer à República do Congo, retive dois factos que, hoje em dia, se me afiguram relacionados com a nossa realidade actual:

Um deles foi a obrigatoriedade da vacinação prévia contra a febre-amarela (ainda aqui tenho o certificado internacional...) — de que agora me lembro quando se fala de algo semelhante em relação à Covid-19.

O outro foi a surpresa que tive quando, antes de partir para Brazzaville, me deparei com a ausência de informações na Comunicação Social acerca da realidade local — o que me preocupou de sobremaneira porque o trabalho consistia na recuperação de equipamento eléctrico destruído numa cruenta guerra civil, ainda cheirando a pólvora (literalmente!) — e, como se sabe, quando a C. S. não reporta os acontecimentos, é como se eles não existissem.

Ora este último aspecto vem a propósito do drama que se vive em Odemira, pois há quem faça de conta que os problemas são apenas de agora. De facto, eles “só agora” apareceram à luz do dia porque não foi possível calar o surto de Covid-19, ficando a descoberto problemas da maior gravidade social e humana que já se arrastam há muito, não só ali como noutros lugares pelo país fora, «na criação de gado, nas vindimas (...), olivais e estufas chegadas aos regadios, especialmente na área de influência de Alqueva, (...), nos perímetros do Baixo Alentejo e do Ribatejo, o uso e o abuso (...) da força de trabalho imigrante e desprotegida são quase a regra...» (*). Portanto, esses trabalhadores, «marroquinos, árabes, sudaneses, nepaleses, tailandeses, romenos, indianos e outros» (*) não são só “viajantes” das suas terras para a nossa, mas também por cá se deslocam de umas para outras, ao sabor das necessidades das mais diversas actividades sazonais.
Claro que, no que respeita às condições que envolvem tudo isso, «os ministérios da Agricultura, do Trabalho, da Administração Interna, da Saúde e da Economia, o SEF, a PJ, a GNR e a PSP estão perfeitamente ao corrente do que se passa, há anos» (*), mas isso não sucede com o cidadão-comum que, como atrás refiro, só sabe aquilo que lhe dão a saber. No entanto, e se é compreensível que essa ignorância afecte o referido cidadão-comum, já não se acredita que alaste a jornalistas, sindicatos, políticos, movimentos anti-racistas e anti-não-sei-quê, com destaque para os que estão sempre de unhas afiadas quando lhes cheira à mais pequena manifestação que se afaste do “politicamente-correcto”.

Aliás, comparem-se os protestos que por cá tivemos no seguimento do assassinato de George Floyd (em Minneapolis, em Maio de 2020) com a passividade com que a nossa sociedade reagiu ao do ucraniano Ihor Homeniuk, ocorrido dois meses antes quando estava à guarda do Estado Português. 

E compare-se, também, a fúria relacionada com a escravatura dos tempos do Infante (há mais de meio milénio!), com o silêncio face a algo semelhante que sucede mesmo à nossa porta.

 

EM SUMA, é bizarro ver como há quem dê mais atenção a problemas que estão longe (no espaço e no tempo) do que aos que tem debaixo do seu nariz — precisamente o contrário do que refere Eça em «As catástrofes e as leis da emoção», deliciosa rábula em que uma senhora lê, em voz alta, as notícias do jornal, contrastando a APATIA dos ouvintes a propósito das catástrofes distantes... com o HORROR com que acolhem a notícia de que a vizinha Luisinha Carneiro se lesionou num pé.

-

(*) – Da crónica de António Barreto «Toda a gente sabia», publicada no «Público» do passado dia 8, e disponível em o-jacaranda.blogspot.com


Etiquetas: ,

12.6.21

Grande Angular - Delação!

Por António Barreto

Em 2021, na Europa, continente dos direitos e das liberdades, terra de asilo e refúgio, em Portugal, Estado democrático há quase cinquenta anos, mais propriamente na capital, Lisboa, a Câmara Municipal tem gesto horrendo de delação e insídia.

É possível que o presidente da Câmara, Fernando Medina e o seu gabinete de apoio não tenham querido expressamente agradar ao governo russo e entregar os cidadãos que se manifestaram em Lisboa. É também possível que a Câmara de Lisboa não tenha desejado encantar os governos de Israel, da China e da Venezuela, fornecendo-lhes coordenadas de opositores. É finalmente provável que, dada a diversidade de governos em causa, a Câmara de Lisboa não esteja a seguir os caminhos da cumplicidade política. Muito bem. É sempre bom deixar a porta aberta a uma explicação inocente. Ma a verdade é que a Câmara de Lisboa praticou, durante anos, actos moralmente reprováveis e politicamente condenáveis.

O Presidente da Câmara pediu desculpas. Mas não respondeu a dúzias de perguntas. Não revelou responsabilidades, não esclareceu o comportamento da sua instituição. O Presidente da Câmara pediu perdão, mas defendeu-se mal e não foi convincente. Depois das desculpas de mau pagador, criticou os adversários políticos. Donzela ferida, tratou-os de oportunistas. Contra-atacou, na crença de que era essa a melhor defesa. Mas admitiu que as informações poderiam ser dadas a países democráticos.

O Governo, a quem se exige explicação pronta, parece estar ausente. Pretende que o problema se limite a Lisboa e seja uma questão municipal. Mas não pode escapar a várias exigências, como seja a de verificar quantos municípios fazem o mesmo. Assim como de responder a afirmações claras do embaixador russo, segundo as quais a sua embaixada recebe muitas informações deste tipo e que as outras embaixadas também.

Os silêncios e os adiamentos do Primeiro-ministro foram confrangedores. Assim como os dos Ministros dos Negócios Estrangeiros, da Administração Interna e da Justiça. Onde está a decisão de mandar efectuar inquérito urgente? Que outros organismos fornecem dados pessoais e políticos às embaixadas? E às polícias? Quantas câmaras municipais (são 308 no país inteiro) têm as mesmas rotinas? Quantas enviam dados pessoais e políticos às embaixadas? E aos serviços de informação?

Em tudo quanto se vê, ouve e lê sobre este assunto, há frequentemente um gosto amargo. Muita gente, autoridades, jornalistas, comentadores e académicos, sugere que há modos aceitáveis e denúncias justificadas. “Se é um país democrático…”, alvitra um. “Se for um país da União Europeia…”, sugere outro. “Se ainda fosse um país da NATO…”, aconselha ainda outro. 

Ou então, há quem aceite facilmente que nomes de pessoas possam ser enviados para a PSP, a GNR, o SIS e outras polícias. Nomes individuais? Com dados e coordenadas? Para as polícias? Enviados pela autarquia? A que título? Denúncia? Vigilância? Moralidade de costumes? Espionagem politica? Custa acreditar que os nossos contemporâneos, portugueses ou europeus, estejam assim tão insensíveis às questões de direitos fundamentais e da liberdade individual.

Parece que estão aceites normas condenáveis. Por exemplo, pode enviar-se informação pessoal e política a embaixadas de países democráticos, amigos e aliados! Tal é errado! Não se deve enviar informação deste tipo a nenhuma embaixada, amiga ou não. Desde que ao abrigo de tratado internacional e sem qualquer implicação política, as únicas informações pessoais que poderão ser objecto de transmissão cuidadosa e condicional são as que dizem respeito a criminosos procurados pela INTERPOL, assassinos, salteadores e traficantes de qualquer coisa.

Parece que se pode enviar informação pessoal e política a países democráticos que respeitem a Convenção dos Direitos Humanos. Falso! Não se pode nem deve enviar informação deste género a nenhum país, seja qual for o regime. Até porque seria necessário avaliar, caso a caso, a democracia de cada Estado. 

Há quem não veja inconveniente em que se possa enviar informação pessoal e política aos países da União Europeia com os quais existe já uma tradição de partilha de informação e de canal aberto entre as polícias. Errado! A informação pessoal e política não deve ser enviada a nenhum pais, seja ele da União Europeia, da NATO, da CPLP ou de qualquer outra associação internacional. Tanto faz que seja a Rússia ou a China, a Espanha ou a Itália! Isto não se faz, ponto final!

Pode uma câmara municipal, no quadro das actividades da liberdade de manifestação, enviar informação pessoal e política às polícias portuguesas, à PSP, à GNR, ao SEF e ao SIS. Errado! Isso também é próprio de Estado policial. A Câmara só deve saber onde se desenrolam as manifestações e disso, apenas disso, informar as polícias e os agentes de trânsito. Não tem de dar nomes de pessoas.

Dizem ainda que se pode enviar informação pessoal e política a empresas, instituições e organizações diante das quais se fazem manifestações. Errado! A Câmara pode informar sobre a ocorrência prevista, o local e a hora, mas nada deve dizer sobre as pessoas e as suas coordenadas!

O problema não é o de protecção de dados, como tanta gente diz. Não é um problema de segredo informático, nem de procedimento administrativo. O problema é político e fundamental. Uma Câmara não pode usar prerrogativas oficiais para obter dados pessoais e políticos a fim de os transmitir seja a quem for!

Medina garante que a delação foi um erro técnico administrativo de procedimentos. Não é verdade! Trata-se de cultura de poder! De Inquisição! De espionagem política. De denúncia e delação. Não é um caso de protocolo, nem um erro de rotinas, é uma questão de controlo da liberdade de expressão!

A ideia de que esta é uma “partilha de dados” é sinistra e faz pensar em relações comerciais, burocráticas e similares. Aqui não se trata de partilha do que quer que seja. Há entrega, delação e denúncia de pessoas cujas coordenadas podem facilitar a espionagem, a perseguição e a represália. Não estamos a falar de hábitos de consumo ou de preferências comerciais, dados que aliás nunca deveriam ser recolhidos sem autorização. Estamos a tratar de liberdades, de garantias constitucionais e de direitos fundamentais. E de instrumentos, aparentemente neutros, que podem servir eficazmente para a perseguição pessoal e política. Falamos de liberdade!

Público, 12.6.2021

 

 

Etiquetas:

11.6.21

FUTEBOL QUE DEVIA DEIXAR BEM PORTUGAL

Por Joaquim Letria

O futebol português é de encher o papo. Vamos lá ver uma coisa: jogadores e treinadores portugueses são magníficos no estrangeiro. Sem sombra de dúvida! Equipas portuguesas são igualmente de nos satisfazerem a nossa vaidade e de nos deixarem a abarrotar de orgulho.

Todos sabemos isto e ninguém pode pôr em causa o valor de uns e outros nesse jogo na disputa de valores que só temos pena de não serem igualmente admirados muitos outros em muitas outras actividades, sejam elas desportivas, políticas, académicas, de diferentes modalidades e de restantes desportos que no mundo são também apreciados.

Infelizmente, nos últimos tempos, nas autoridades sanitárias e nas de administração interna, houve quem permitisse ganhar taças e conquistar campeonatos com um acrescento que obrigatoriamente se devia dispensar, susceptíveis de merecidos castigos e penalidades políticas por deixarem mal o País e fazerem sofrer os portugueses.

Refiro-me à vitória do campeonato e à conquista da taça de Portugal. Para os ganhar não era necessário infectar o país e empestar regiões de gente estimável que não merecia o que aconteceu. Os festejos do Sporting em Lisboa, a alegria demonstrada por muita gente na cidade de Braga, a alegria em Coimbra, respectivamente, eram perfeitamente dispensáveis até pelas formas como ocorreram.

Claro que não há só culpas dos clubes envolvidos. Sabemos que há autarcas comprometidos, houve incompetência na direcção da Polícia, desleixo e interesses na política do Governo. Nem sequer o executivo socialista resistiu a portar-se bem na final da Champions, impedindo público em redor de “O Dragão”, que sabem muito bem que pode degenerar na má prática que experimentou, sem aprender com o grande prémio automóvel do Algarve.

Também agora a incompetência os arrastou para espalharem a variante britânica por uma cidade e por uma região que há anos se portam bem, mesmo quando o seu principal clube ganha sucessivamente o campeonato, como sucedeu ainda no ano passado, ao refrear festejos exagerados como aqueles que vimos na Câmara de Lisboa, na Direcção do Sporting e nas autoridades da ordem pública.

Por isto e por aquilo há gente que prefere, em vez de empestar o País, pertencer aos tristes grandes clubes que não vêem o padeiro nem duma maneira nem de outra. Oxalá que a final da Champions não traga as consequências que infelizmente nós receamos e que as gentes do Porto consigam repetir o exemplo com que têm honrado a sua nobre cidade.

Publicado no "Minho Digital"

Etiquetas:

10.6.21

A Regionalização do Continente

 Por C. B. Esperança

O que era obrigação constitucional e necessidade de ordenamento territorial passou a ser depois da maquiavélica proposta de Marcelo Rebelo de Sousa, então líder do PSD, e do exótico mapa das nove regiões, proposto por António Guterres, a arma de propaganda partidária, alheia à necessidade de tornar eficaz a regionalização administrativa do País.

Os referendos à Regionalização e à despenalização do aborto foram moeda de troca para a aprovação do OE, o que permitiu a Guterres cumprir uma legislatura sem maioria. 

A escassa votação, sem valor vinculatório, mostrou que os referendos são instrumentos ideais para adiar decisões, como se viu igualmente no caso do aborto, mas não se pode ignorar a dimensão da derrota infligida por tão poucos, os que se incomodaram a votar.

Os passos deste Governo para regionalizar o País vão no caminho certo, consolidando as cinco CCDR com a sua eleição pelos autarcas de cada região e transferindo para elas os atuais serviços do Estado suscetíveis de regionalização e os respetivos meios financeiros.

É a última oportunidade para a democracia representativa fazer o que é preciso sem os erros da Regionalização das Regiões Autónomas, exemplos que geraram desconfiança, com órgãos faraónicos em número de deputados, membros do Governo e organismos parasitários, sem fiscalização eficaz e com obscenos custos nacionais.

A absurda Regionalização dos Açores e da Madeira impede ao PR a dissolução das suas Assembleias Regionais, poder que lhe cabe em relação à Assembleia da República, e os estatutos autonómicos impedem, na prática, a autoridade dos Tribunais e dos órgãos de fiscalização da administração pública, e convidam à impunidade. 

Todos os impostos arrecadados nas Regiões Autónomas são dos respetivos governos e apenas representam cerca de 60% dos seus Orçamentos, cabendo o restante ao Estado Central e aos fundos da União Europeia para as regiões ultraperiféricas, sem que as RA contribuam para as despesas com Tribunais, Segurança, Forças Armadas, representação externa do Estado português e, nem sequer, para quaisquer organismos internacionais, nomeadamente para os fundos da UE de que recebem cerca de 20% do seu orçamento.

É minha convicção de que a Regionalização prevista moderará os apetites dos caciques regionais e o pior do que o bairrismo é capaz.

O que assusta não é a regionalização do País em 5 Regiões, é a incapacidade de reduzir os 308 municípios e as 3092 freguesias, bem como a de limitar o número de vereadores, assessores e outros dispendiosos ornamentos do poder local em municípios onde três ou quatro mil habitantes não os justificam.

Se tiver êxito, como se prevê, a regionalização deste Governo porá fim à fuga a decisões melindrosas através do recurso a um referendo, sem poder ser acusado de incapacidade de decidir ou de falta de coragem para assumir riscos, criando as necessárias instâncias intermédias entre os municípios e o poder central.

As eleições legislativas não se destinam a escolher quem convoca referendos, mas quem governa e delibera sem manobras dilatórias e maiorias conjunturais de geometria variável. O eleitorado julgará o Governo nas próximas eleições legislativas.

Apostila – A componente técnica de muitas decisões – a regionalização é uma delas –, recomenda que os referendos sejam usados a título excecional e com razoável expetativa de que haja uma participação suficiente para produzir efeitos legais, o que, muito provavelmente, não se verificaria em novo referendo à Regionalização.

Ponte EuropaSorumbático


Etiquetas:

8.6.21

No “Correio de Lagos” de Maio de 2021

 

Etiquetas: ,

7.6.21

No “Correio de Lagos” de Maio de 2021

 

Etiquetas: ,

6.6.21

No "Correio de Lagos" de Maio de 2021

Há uns anos, denunciámos à ASAE (com o apoio de fotos ilustrativas) 7 situações, um pouco por toda a cidade, semelhantes à que se vê na imagem da esquerda, que também lá constava.
A referida entidade reencaminhou a nossa reclamação para a CML e ficámos à espera. Dessas situações, houve 4 que vieram a ser atendidas, tendo ficado as outras para bem mais tarde, nomeadamente esta, na Rua Cândido dos Reis, que ainda teve de esperar uns anitos. Não sabemos exactamente em que data foi feita esta intervenção, mas agora já está, para sossego dos que se contentam com a velha frase do “mais vale tarde do que nunca”.

Etiquetas: ,

5.6.21

Grande Angular - O Político e o Soldado

Por António Barreto

É uma das mais difíceis relações humanas e sociais que se conhecem: entre um político e um soldado. Ou entre a política e a defesa. Milhares de páginas foram já escritas sobre o tema. Que ainda é actual e surpreende.

São relações muito próximas, de autêntica cumplicidade, de indiscutível rivalidade e de permanente conflito. Um precisa do outro tanto que pode ser doentio. Por isso desconfiam um do outro. Mas sabem que em oposição não há futuro. Por isso, quase sempre, sobretudo em democracia, encontram vias de cooperação.

Não parece ser este o caso, actualmente, a propósito das alterações às leis da Defesa Nacional e de Bases de Organização das Forças Armadas. Órgãos de soberania e detentores do poder político comportam-se como se pudessem dispensar a cooperação das chefias militares ou como se bastasse ter a concordância de um muito pequeno leque de responsáveis. É inexplicável que o governo e os dois maiores partidos parlamentares estejam prontos para abrir conflitos entre a política e a defesa. É incompreensível que tal suceda sem motivos aparentes, sem necessidade ou urgência, sem uma história recente de dificuldades, sem a premência da correcção de erros e sem a evidência de melhoramentos.

Na discussão actual, não é apenas a disputa entre políticos e soldados, que está em causa. Na verdade, há militares prestigiados no campo dos políticos, como há políticos reputados no campo dos soldados. Mas é certo que o conflito coloca frente a frente o soldado e o político. O oficial e o governante. O que é pior. Com efeito, se estivéssemos apenas diante de um conflito de ideologia, a democracia acabaria por resolver os problemas. Mas não. Estamos diante de confronto de instituições, de autoridades, de legitimidades e de responsabilidades. O que é mais grave e exige mais cuidado no debate.

É estranho, tão estranho e significativo que, perante reais problemas de defesa, se estejam a gastar energias e a abrir feridas. Há bastantes anos que os governos têm marginalizado as Forças Armadas e a Defesa. Esta afirmação é incontroversa, mesmo se avaliada de modo diferente. Para uns, esta tendência é positiva, pode conduzir a um Estado sem militares, a uma despesa pública reorientada para obras sociais e a um abandono do envolvimento militar do país. Para outros, este é um caminho negativo, que prejudica a independência e a autonomia do país, que enfraquece a segurança e que põe em causa a cooperação com os aliados.

Esta divergência é antiga. Hoje, tem aumentado a força dos que gostariam de ver Portugal desmilitarizado (como dizem), sem despesas militares e sem empenho em alianças. Estas convicções não se fazem muito sentir na praça pública, não são tonitruantes, mas crescem. Na verdade, ao contrário das funções de polícia, as de defesa e segurança têm registado definhamento. Com a colaboração de vários partidos.

Sob a pressão de quase todos os grupos políticos, as Forças Armadas portuguesas têm sido votadas a uma evidente secundarização. Há vários anos que se assiste à diminuição de recursos. Que se nota a falta de renovação de equipamento. Que é preocupante a quebra de recrutamento e de efectivos. Que diminuem as perspectivas profissionais dos militares desmobilizados. E que está em curso uma miniaturização das Forças Armadas. Tudo isto num quadro de maior incerteza, até por causa do afastamento dos EUA e da crescente indeterminação da União Europeia quanto ao futuro da sua defesa colectiva e da NATO.

Raramente na história se assistiu a um diferendo tão aberto e um conflito tão público entre as autoridades políticas e as chefias das Forças Armadas. A maior parte dos chefes actuais e um elevadíssimo número de antigos chefes de Estado Maior, incluindo o antigo Presidente da República Ramalho Eanes, tomaram posições públicas, discordaram dos planos do governo, fizeram as suas propostas e estranharam o modo de trabalho imposto pelo Governo, que nem sequer deu a conhecer a tempo as suas sugestões. É verdade que já várias vezes, nas últimas décadas, se verificaram divergências entre autoridades políticas e chefias militares. Mas nunca essas atingiram uma tão elevada magnitude, nunca foram tão públicas e nunca as autoridades políticas revelaram um semelhante grau de crispação e uma tão clara falta de vontade de cooperação.

Os motivos apresentados pelo Governo são geralmente do domínio da abstracção. Coordenar, articular, operacionalizar e fazer como os outros são as palavras-chave. Mas não aparece argumentação política e histórica que nos diga que estas alterações surgem por força de necessidades reais, em resultado da análise de situações concretas e com o fim de corrigir erros. O Governo pretende aumentar a sua intervenção directa em assuntos militares.

Mais do que as opções de fundo, é o método que está em causa. E não é uma questão de lealdade e cortesia, a que aliás o governo faltou. É muito mais importante do que isso. O governo entende ser possível e ser seu direito reestruturar e reformar as Forças Armadas e a Defesa sem a colaboração concordante e empenhada dos dirigentes militares. Ora, tal não é possível sem a cooperação permanente dos chefes dos três ramos. Só uma estranha aliança entre o PS e o PSD concebe que seja possível reformar as Forças Armadas contra ou sem a vontade dos chefes militares.

Em todo este processo, os principais chefes militares nunca concordaram com as escolhas do governo. Conheceram as propostas tarde e a más horas, sem tempo de reflexão e sem quadro de colaboração. O governo achou muito mais importante e urgente obter o acordo do PSD antes de ter o dos chefes militares. Diante das reticências destes, o governo entendeu que não era com eles, mas sim com os deputados, que as discussões se deveriam desenrolar. A clivagem, de que o governo é responsável, está feita. Ainda não se conhece a posição do Comandante Supremo das Forças Armadas, o Presidente da República. Agora, só ele pode travar este erro flagrante.

A crença em que a Defesa Nacional é assunto exclusivamente político e que as Forças Armadas se devem comportar como mero sector interessado é sinistra. A hipótese de passar a considerar os chefes militares como meros consultores é nefasta. A ideia de que a política comanda a defesa é certa: a legitimidade das Forças Armadas, em democracia, vem disso mesmo, do povo e da democracia. Mas vem também da história, das instituições e da responsabilidade dos militares que é única e singular.

Público, 5.6.2021

 

Etiquetas:

4.6.21

CORRIDA SEM PARAR

Por Joaquim Letria

Antigamente, quando as pessoas eram criteriosas em vez de serem só espertas, as coisas eram medidas de maneira diferente. Hoje, tudo se mede pelo padrão do êxito.

O melhor programa é o que tem maior audiência, as pessoas são melhores à medida dos likes e do número de seguidores. A pessoa a deitar abaixo é aquela que atinge quotas elevadas de popularidade e o que importa, seja no que for, é chegar primeiro, e não interessa donde e é irrelevante como. Há muito tempo que a sociedade classificou de corridas de ratos esta atitude hoje glorificada e que com desempregados a espreitarem a cada esquina persiste  sem alterações nem mudanças de sentimentos.

Dantes, as coisas mediam-se de maneira diferente. As pessoas compreendiam que o livro de maior sucesso não era necessariamente o melhor, o programa com mais audiência era invariavelmente o mais detestável, entendiam que o futebol, mau grado despertando grandes paixões e arrastando multidões pelo mundo era um jogo muito interessante embora o xadrez não deixar de ser um jogo inteligente e também apaixonante. Também não era preciso explicar que a opinião dum comentador, por muito popular e profissional que este fosse, não era mais acertada do que a dum especialista em matérias levianamente abordadas.

Tudo isto é uma questão de medida. Estabeleceu-se o êxito como metro-padrão, pois então se tratava da tradução mais correcta para dinheiro, partindo-se do princípio de que o melhor filme, melhor livro, melhor programa, melhor personalidade seriam sempre aqueles que mais lucros gerassem.

Não vale a pena ser nostálgico, recordar o antigamente, ter saudades do antes, pensar que dantes era melhor. Era só diferente. Por isso, nesta corrida para que muitos se deixam arrastar, depressa se descobre que não podem mais parar. Se abrandam, pisam-nos, se perguntam para onde vão ninguém lhes sabe responder. Só uma coisa se lhes afigura certa – a pressa de todos é muito grande, a vontade de perceber o labirinto que percorrem muito pouca ou nenhuma. Que alguém tenha pena deles quando não tiverem outro remédio senão parar sem ser por vontade própria nem esclarecimento pessoal. 

Publicado no Minho Digital

Etiquetas:

3.6.21

A democracia e o regresso de regimes autoritários

 Por C. B. Esperança

A democracia, como disse Churchill, é o pior regime, com exceção de todos os outros, mas depois do advento do liberalismo, do reconhecimento de direitos individuais e das modernas democracias, aparecem recorrentemente apelos ao regresso de modelos autoritários.

Hoje, na Europa, onde a democracia moderna nasceu com a Revolução Francesa, onde o respeito pelos direitos individuais se instituiu e os direitos humanos se consagraram, já há regimes autoritários, sufragados, a excluírem as minorias, perseguirem adversários e substituírem a separação de poderes pelo controlo político da Justiça.

Tal como na década de trinta do século passado, os ideólogos dos regimes iliberais são os arautos da mudança, e o regresso de partidos fascistas ameaçam a arquitetura jurídica das democracias pluripartidárias, explorando, como sempre, o medo e a diferença, com apelos à ordem, ao progresso e à exclusão.

Em Portugal, onde o mais longevo ditador europeu do século XX morreu na cama e a ditadura caiu com estrondo numa madrugada de Abril, arrastando as de Espanha e Grécia, começa a esquecer-se a ‘apagada e vil tristeza’ do regime que conduziu o País ao Estado policial, com censura, fome, prisões arbitrárias, torturas, degredos, iliteracia, assassinatos, na via pública e nos presídios, massacres, e ao desastre da guerra colonial.

É a possibilidade de repetição da tragédia, após a pandemia que fragilizou as pessoas, a economia e as finanças públicas, e lesou as liberdades com medidas sanitárias, que torna urgente revisitar o regime de onde saímos quando a sua apologia, perdida a vergonha, anda aí nas redes sociais e no coração dos salazaristas, e já chegou aos média.

Vale a pena recordar o “Portugal em inho” “A Bem da Nação”, das licenças de isqueiro, bilhetes de gare para acesso às estações dos Caminhos de Ferro, de alvarás das tabernas e caixas de esmolas numeradas da Santa Casa da Misericórdia; do “proibido” cuspir no chão, andar descalço, pedir esmola; dos escarradores das repartições públicas, dos fatos de banho com ocultação do tronco de homens e mulheres, reforço das partes pudendas e cabo de mar a fiscalizar; das aldeias de casas de terra batida, paredes sem reboco e telha vã, de escolas primárias rurais onde meninos e meninas aliviavam as necessidades fisiológicas em quintais diferentes.

É imperioso denunciar o regime que vedava a administração de bens próprios à mulher casada, que concedia ao marido o direito à violação, da correspondência e do próprio corpo, da autorização, ou não, da saída para o estrangeiro, que manteve indissolúvel o casamento canónico, que exigia autorização de casamento às professoras e chegou a negá-la a enfermeiras, que impediu todas as mulheres do acesso à magistratura, forças militares e de segurança e carreira diplomática.

Quem se lembra do atestado de bom comportamento e certificado de batismo, passados pelo pároco católico, para entrar num curso de enfermagem, ou da necessidade de prova de que o noivo de uma professora do ensino primário tinha rendimentos superiores aos dela, para ser deferida autorização de casamento? Ou que eram injustificadas as faltas por motivo de parto de mães solteiras e, superiores a trinta dias, motivo de demissão?

Por ser curta a memória, com os fascistas de volta, é preciso avisar a malta e sermos vigilantes quando sobram meios para voltarmos a ser vigiados.

Ponte EuropaSorumbático

Etiquetas:

2.6.21

No "Correio de Lagos" de Maio de 2021

 

Etiquetas: ,

1.6.21

No "Correio de Lagos" de Maio de 2021

 

Etiquetas: ,